No julgamento da Adin nº 4357 ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, no dia 14-3-13 o STF, refletindo os novos tempos, declarou a inconstitucionalidade parcial da Emenda nº 62/09, conhecida como “Emenda do calote” e que à época da tramitação da respectiva Pec denominavamos de “obra de Satanás”.
Aliás, pensando melhor, creio que nem Satanás em dia de mau humor teria produzido coisa tão ruim para os direitos humanos e para a saúde da Democracia.
A Corte Suprema, em decisão estritamente técnica, sem a preocupação com as finanças das entidades públicas, o que é raro nos dias atuais, enterrou de vez a polêmica Emenda que instituiu, pela vez terceira, a moratória constitucional dos precatórios para pagamento em 15 anos. A primeira foi de 8 anos e a segunda, de dez anos. Com essa decisão, por ora, desencoraja-se uma nova moratória para pagamento em 20 ou 30 anos.
De fato, não cabe ao Judiciário preocupar-se com a saúde financeira do Estado, preocupação essa cabente a outros Poderes. Ao STF, como guardião da Constituição Federal, cabe-lhe apenas zelar pela constitucionalidade das leis e das Emendas.
Assim, em memorável decisão, foram declarados inconstitucionais os §§ 9º, 10, 12 e 15, do art. 100 concernentes, respectivamente, à compensação unilateral dos créditos dos precatoristas (§§ 9º e 10), à castração de juros moratórios e compensatórios e à faculdade de estabelecer, por lei complementar, o regime especial de pagamento de precatório. E evidentemente foi fulminado o diabólico art. 97 do ADCT que parcela os precatórios em 15 prestações anuais e institui outros mecanismos atentatórios à dignidade do Poder Judiciário.
Realmente, esses dispositivos apontados afrontam os princípios da coisa julgada, do direito adquirido e o princípio da separação dos Poderes, protegidos por cláusulas pétreas. Esses vícios, já havíamos apontados, em inúmeros artigos escritos a respeito.
Com a decisão retromencionada os demais preceitos permanentes da Constituição (art. 100 e parágrafos) voltam a ter eficácia, isto é, os precatórios requisitados até o dia 1º de Julho de cada ano deverão ser incluídos no orçamento do exercício seguinte, para serem pagos atualizadamente até o final desse exercício (§ 5º, do art. 100, da CF).
Ante os pagamentos já realizados, bem como diante dos depósitos mensais nos termos da Emenda parcialmente enterrada há que se modular os efeitos da decisão para validar, tantos os pagamentos consumados, assim como os depósitos já efetuados à disposição do Poder Judiciário.
Dessa forma, os pagamentos realizados devem ser abatidos do montante do crédito de cada precatorista. Os depósitos judiciais em percentuais mensais da receita corrente das entidades políticas devem ser deduzidos do montante das requisições a serem consignados no orçamento de 2014, que deverão abranger todas as requisições entregues até o dia 1º de julho de 2013.
Durante o exercício de 2013 os pagamentos deverão obedecer as regras das disposições permanentes da Constituição concernentes ao pagamento de precatórios até o esgotamento das importâncias depositadas pelas entidades políticas à disposição do Poder Judiciário. Outra alternativa seria a de prosseguir no pagamento dos precatórios pelo critério da EC nº 62/09 até o esgotamento das verbas já depositadas sob sua égide.
A solução retro-aventada contorna adequada e razoavelmente os efeitos da declaração de inconstitucionalidade em meio à execução da Emenda 62/09. Como até agora não houve pagamento de precatório integral, ao que saibamos, não haverá problema com a redução inconstitucional da taxa de juros. Ainda que tenha havido quitação integral, em um ou outro caso, sempre restará ao credor a alternativa de reclamação da diferença, em face da declaração de inconstitucionalidade da diminuição de juros prevista na Emenda nº 62/09.
Considerando que os depósitos feitos até agora nem de longe correspondem ao montante dos débitos existentes até o advento da EC nº 62/09 restarão dívidas que não terão previsão de pagamento no orçamento de 2014, pois não seria razoável exigir-se a inclusão orçamentária no exercício de 2014 de todos os débitos existentes até o dia 1º de julho de 2013. Isso leva à velha tese defendida pela OAB no sentido de federalizar as dívidas de precatórios para amortização gradual pelos Estados e Municípios valendo-se, se for o caso, da compensação por ocasião da entrega das parcelas do FPE e do FPM. E com um pouco de boa vontade essa solução é perfeitamente possível.
SP 15-3-13.
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