Diante da Teoria do Processo Constitucional, no qual a participação das partes é de fundamental importância para a construção da sentença, encontramos decisões nos Tribunais brasileiros que aplicam tal posição e tecemos algumas críticas de modo a defender que o processo constitucionalizado[1] é verdadeira efetivação de um direito fundamental: o contraditório.
A Teoria do Processo Constitucional revela inegável a importância do contraditório para o processo justo, princípio essencial que se encontra na base mesma do diálogo judicial e da cooperação. A sentença final só pode resultar do trabalho conjunto de todos os sujeitos do processo, restabelecendo o caráter isonômico do processo. Para tanto, mister se faz o fortalecimento dos poderes das partes, por sua participação mais ativa no processo de formação da decisão, em consonância com uma visão não autoritária do papel do juiz e mais contemporânea quanto à divisão do trabalho entre o órgão judicial e as partes.
Sobre o tema transcrevo, abaixo, a seguinte ementa:
DECISÃO: Embora a prescrição seja matéria de ordem pública, passível de conhecimento de ofício pelo juízo, nos termos do art. 219, § 5º, do CPC, tenho que, em homenagem ao princípio do contraditório, o juiz, ao constatar a possibilidade de ocorrência da prescrição, deve abrir vista para manifestação das partes, na hipótese de não ter havido prévio debate a respeito da questão. Além de garantir a participação das partes no processo de convencimento do juízo, tal providência também atende ao princípio da lealdade processual, haja vista não ser adequado que as partes sejam surpreendidas por decisão baseada em aspectos que não foram objeto da controvérsia. Neste sentido, considerando a possibilidade de eventual ocorrência de prescrição das parcelas anteriores a cinco anos do ajuizamento da presente ação (ou seja, antes de 28.jul.2003), intimem-se as partes para manifestação a respeito desta questão, no prazo de 5 (cinco) dias. Intimem-se. (TRF4, AC 2008.71.10.002551-4, Quarta Turma, Relator Valdemar Capeletti, D.E. 25/09/2009
Neste diapasão, para proferir a decisão, inobstante a prescrição tratar-se de questão de ordem pública, o Tribunal Regional da 4º Região entendeu por bem intimar as partes a fim de se manifestarem, ou seja, abriu o contraditório, privilegiando, assim, a efetiva participação. Tudo isso em consonância com a moderna Teoria do Processo Constitucional.
Cite-se, in verbis, também, Ementas de algumas das decisões prolatadas pelo Tribunal Regional da 1 Região:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPANHEIRA. COMPROVAÇÃO DE VIDA EM COMUM. RATEIO COM EX-ESPOSA. NECESSIDADE DE PARTICIPAÇÃO DO ATUAL BENEFICIÁRIO DA PENSÃO.
1. Demanda versando sobre pensão por morte e a autora, alegando ser companheira do falecido, pretende receber 50% da pensão.
2. O INSS sustenta que a autora não provou que era companheira do falecido e que já paga a pensão.
3. Os atores processuais não atentaram para a necessidade de participação, no processo, do atual beneficiário da pensão, que tem o direito ter saber do processo para exercer o contraditório e seu direito de defesa, pois a autora pretende assumir 50% dos valores que o INSS já está pagando.
4. Não se sabe se a pensão está sendo paga à esposa do falecido, a algum filho dele ou até mesmo a outra companheira, pois as partes não cuidaram de analisar esse relevante fato.
5. Se o resultado do processo afetará a órbita do direito de outrem, com grave redução financeira, é indispensável que ele participe do processo, nos termos do artigo 47 do CPC.
6. Declaração de nulidade da sentença, que deverá retornar à primeira instância para que seja promovida a participação do atual beneficiário da pensão.
(AC 2006.01.99.041438-4/MG, Rel. Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, Conv. Juiz Federal Reginaldo Márcio Pereira (conv.), Primeira Turma,e-DJF1 p.447 de 05/10/2010)
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL - EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE PARA EXCLUIR CO-RESPONSÁVEL DA EF - FATOS GERADORES DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO CONTEMPORÂNEOS À PARTICIPAÇÃO NA SOCIEDADE: REJEIÇÃO EM RAZÃO DO DISPOSTO NO CTN (ART. 121, PARÁGRAFO ÚNICO, II, C/C ART. 128 E ART. 134, III) - PRESCRIÇÃO INOCORRENTE - SEGUIMENTO NEGADO - EMBARGOS DECLARATÓRIOS RECEBIDOS COMO AGRAVO INTERNO: NÃO PROVIDO.
1 - Como os (assim nominados) "embargos de declaração" (da decisão monocrática que negou seguimento a agravo [art. 557 do CPC]) têm nítido intuito infringente, são recebidos (em atenção aos princípios da celeridade e economia processual; da instrumentalidade das formas; e da fungibilidade) como "agravo interno", recurso próprio na forma do §1º do art. 557 do CPC (evitando-se o manejo residual de instrumentos recursais outros que não os estritamente cabíveis, que induz prejuízo à prestação jurisdicional).
2 - A execução fiscal, espécie de "processo de execução", é instruída com o titulo executivo (CDA) e nada mais. Decorre do direito de ação da exeqüente redirecionar a execução contra o sócio reputado, nos termos da lei, co-responsável tributário (solidário), ainda que seu nome não conste da CDA, não cabendo ao magistrado, nesse instante, nenhum juízo de valor, senão que, no momento próprio (embargos), resolver eventual recusa da "responsabilidade" em sede de contraditório (para ambas as partes), arcando o(a) exeqüente, se o caso, com os ônus de sua eventual incúria ou leviandade.
3 - O art. 135 do CTN cuida da responsabilidade "pessoal", em que "contribuinte" é o gerente que agiu com excesso de poderes por infração à lei, não a empresa, que sequer é executada.
4 - Na hipótese de dívidas das pessoas jurídicas geradas no giro comercial regular, a citação dos seus gestores, gerentes, administradores (eventualmente até os demais sócios [inciso VII]) tem justa causa e comando normativo obrigatório outro ("ex vi" do parágrafo único do art. 121 do CTN [conceito de sujeito passivo da obrigação, ora "contribuinte", ora "responsável"]): o art. 134 do CTN (que trata da "Responsabilidade de Terceiro"). A tributação, pois, dos atos societários usuais e legítimos induz a responsabilidade tributária objetiva do art. 134, III, do CTN (necessitando-se provar apenas que a sociedade não tem patrimônio hábil para assunção da obrigação).
5 - Ocorrido atraso na citação em razão de múltiplas e frustradas tentativas de sua realização em decorrência da não-informação ao fisco das alterações de endereço da devedora, não há falar em inércia da exeqüente indutora de prescrição (Súmula 106/STJ).
6 - Embargos de declaração recebidos como agravo interno: não provido.
7 - Peças liberadas pelo Relator, em 02/06/2009, para publicação do acórdão.
(AGTAG 2005.01.00.060408-7/MG, Rel. Desembargador Federal Luciano Tolentino Amaral, Sétima Turma,e-DJF1 p.243 de 12/06/2009)
Na primeira decisão, como se pode observar, a aplicação da Teoria do Processo Constitucional exige a participação na lide da pessoa que será atingida com a decisão de mérito. Já na segunda ementa, a falta de contraditório na fase de provas nulifica os atos processuais posteriores.
No paradigma da Teoria do Processo Constitucional, se revela inegável a importância do contraditório para o processo justo, princípio essencial que se encontra na base do diálogo judicial e da cooperação. O provimento só pode resultar do trabalho conjunto de todos os sujeitos, restabelecendo o caráter isonômico do processo.[2]
Sendo o processo um espaço de diálogo, devem existir maiores oportunidades de participação. A decisão sem efetiva participação das partes no processo está indo de encontro ao Estado Democrático de Direito, que exige decisões com qualidade e. Quanto melhor o espaço de diálogo entre as partes, melhores serão as decisões judiciais.
REFERÊNCIAS
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BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e Processo: influência do direito material sobre o processo. 3. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003,
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. São Paulo: Revista dos tribunais, 1994,
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.
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DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Processo Constitucional e Estado Democrático de Direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2010;
DIDIER JUNIOR, Fredie. O princípio da cooperação: uma apresentação. Revista de processo. Porto Alegre, v. 30, n. 127, set. 2005,
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MITIDIERO, DANIEL. Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo 3, Editora Memória Jurídica, 2006.
MOREIRA, José Carlos Barbosa. O Novo Processo Civil Brasileiro, Ed. rev. W atial.Rio de Janeiro, Forense, 2007.
NUNES, Dierle José Coelho, Processo Jurisdicional Democrático/ 1ª Ed. (ano 2008), 2ª reimpr./Curitiba: Juruá, 2010. 282 p.
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, 23ªed., p. 111, Ed. Malheiros Editores Ltda, 1998.
SOARES, Carlos Henrique. Considerações preliminares sobre o relatório do novo Código de Processo Civil, Texto extraído do Jus Navigandi
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=14854
SOUZA, Artur César de. Contraditório e revelia. Perspectiva Crítica dos efeitos da revelia em face da natureza dialética do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
TAVARES, Fernando Horta (Coord.). Constituição, Direito e Processo. Princípios Constitucionais do Processo. Curitiba: Juruá, 2008, 338p.
[1] O processo democrático é aquela estrutura constitucionalizada, que confere a todos os interlocutores uma condição ideal de fala. Trata-se de uma instituição dimensionada por todos os preceitos constitucionais dinâmicos, mormente contraditório e ampla defesa, que concretizam a idéia nuclear do Estado de Direito – sujeição do poder a princípios e regras jurídicas – garantindo às pessoas e cidadãos liberdade, igualdade perante a lei e segurança (CANOTILHO apud DIAS, 2010, P. 63).
[2]A democratização exige a interdependência e co-responsabilidade de todos os sujeitos processuais, com o conseqüente fortalecimento da advocacia, magistratura, e demais partícipes, na busca de formação técnica e poderes processuais.
O juiz democrático não pode ser omisso à realidade social e deve assumir função jurisdicional decisiva, na análise dos argumentos endoprocessuais, sem extrapolar o campo do discurso argumentativo. E Importante se faz o fortalecimento dos poderes das partes, por sua participação mais ativa no processo de formação da decisão, em consonância com uma visão não autoritária do papel do juiz e mais contemporânea quanto à divisão do trabalho entre o órgão judicial e as partes.
Advogada da União, Integrante do Grupo Permanente de Combate a Corrupção, Pós Graduanda em Advocacia Pública pelo IDDE em parceria com o Centro de Direitos Humanos da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, especializada em Direito Civil e Processual Civil pela UNICOC e em Direito Público pela Pontifícia Universidade católica de Minas Gerais, Graduada em Direito pela Fundação Educacional Monsenhor Messias.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MARTINS, Valkiria Silva Santos. Construção Participativa da Sentença, direito das partes e qualidade do provimento judicial Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 abr 2012, 08:39. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/28416/construcao-participativa-da-sentenca-direito-das-partes-e-qualidade-do-provimento-judicial. Acesso em: 22 dez 2024.
Por: ELISA CARDOSO BATISTA
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
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