Resumo: O objetivo do presente artigo é refletir sobre os desafios a serem superados para garantir a efetivação dos instrumentos de soberania e participação popular nos entes e órgãos administrativos da região canavieira de Alagoas, de modo a consolidar o Estado Democrático de Direito como regulador das relações sociais e vetor do desenvolvimento pautado na dignidade humana.
Palavras-chave: Estado democrático de direito. Participação popular. Soberania. Região Canavieira. Alagoas.
Abstract: The purpose of this article is to reflect on the challenges to be overcome to ensure the effectiveness of instruments of sovereignty and popular participation in administrative entities in the sugarcane region of Alagoas, in order to consolidate the Democratic State of Law as a regulator of social and vector of development based on human dignity.
Keywords: Democratic rule of law. Popular participation. Sovereignty. Sugarcane Region. Alagoas.
A região canavieira de Alagoas abarca 53 dos 102 municípios do estado, incluindo sua capital, compreendendo uma população de cerca de dois milhões de habitantes e uma área equivalente a pouco mais de treze mil quilômetros quadrados. Excluindo as cidades que integram a Grande Maceió, a região canavieira é composta em sua maioria por municípios com população não superior a 20 mil habitantes, Índice de Desenvolvimento Humano abaixo da média estadual, que já é a pior do Brasil, renda per capita não superior a R$ 300,00 e cujas receitas públicas dependem quase que exclusivamente das transferências de recursos da União e do Estado. Em muitos deles, as plantações de cana ocupam mais de 40% de seu território, podendo chegar a 80%[1].
Os desafios da administração pública na região canavieira alagoana não são pontos fora da curva entres os pequenos municípios brasileiros, imensa maioria dentre os entes públicos no país, na árdua tarefa de garantir o pleno acesso à democracia e a prestação de serviços públicos de qualidade à população, transformando em realidade uma linguagem técnica do Direito construída, muitas vezes, desde a perspectiva das grandes metrópoles, sem levar em consideração as características socioeconômicas e as fontes materiais do Brasil profundo.
Mas, no universo cultural dos canaviais, há um ingrediente peculiar que exige atenção redobrada. Para entendê-lo, faz-se necessário uma breve digressão histórica.
Registros indicam que a primeira remessa de açúcar do Brasil colônia para Portugal se deu no ano de 1526, a partir da feitoria de Itamaracá, localizada no atual território do estado de Pernambuco. Essa mesma feitoria foi o destino dos dez primeiros escravos africanos a chegarem ao Brasil, trazidos por Diogo Leite naquele mesmo ano, a fim de se dedicarem a trabalhos agrícolas. Surgia aí o inextricável vínculo que uniria, por todo o decorrer da história colonial brasileira, a cana-de-açúcar e o trabalho escravo.
Contudo, após quatro séculos de simbiose, no advento do século XIX, o preço do escravo se tornou cada vez maior, influenciado pelas restrições ao tráfico na Europa. Somando-se isso à venda de grande parte da população escrava para os emergentes cafezais da região sul do país, o número de escravos caiu drasticamente na zona canavieira nordestina. Para reverter tal situação, os proprietários começaram a facilitar o estabelecimento de moradores nas suas terras.
Esses moradores eram constituídos em sua origem de índios civilizados, mulatos e negros livres. Em troca de proteção e de um pequeno pedaço de terra, os proprietários exigiam que cultivassem lavouras de subsistência e que lhe pagassem um pequeno aluguel anual. Além disso, na época de maior trabalho nos engenhos, esses moradores costumavam dar ao proprietário alguns dias de trabalho por semana, às vezes gratuita, às vezes em troca de ínfimos salários: era a condição ou cambão. Além dessas condições, os proprietários, como forma de reter os moradores, emprestavam determinada quantia a estes, só permitindo que os devedores deixassem a sua propriedade quando o débito fosse quitado.
Tal fenômeno social, conhecido como “sistema de morada”, fortaleceu-se no fim do século XIX após o fim da escravidão, tornando-se nas décadas seguintes elemento fundamental para a continuidade do modelo de produção açucareira ao longo do século XX. Por conta de sua centralidade, vale reproduzir algumas análises científicas oriundas da sociologia e antropologia sobre esse sistema[2].
Em primeiro lugar, é preciso ter em mente que, a partir do século XX, “tornar-se morador significava se ligar ao senhor do domínio de uma maneira muito específica, numa relação que supunha residência e trabalho simultaneamente”[3]. Havia forte significado simbólico em se pedir uma morada ao invés de trabalho. Solicitar morada era reconhecer não ter outra escolha melhor, não ter para onde ir. Sem meios de organizar sua existência social, o trabalhador “vinha pedir ao senhor que os fornecesse, ou mesmo que a organizasse para si. Caíam assim sob a estreita dependência do senhor”[4].
Surge, então, mais que uma relação de trabalho, uma “dívida moral”, uma “forma específica de dominação”[5] que gravitava entre a gratidão e a submissão. Isso porque, “o simples fato de ser o próprio trabalhador quem pedia casa de morada fazia com que, no próprio ato de ser constituído morador, contraísse uma dívida moral, um reconhecimento para com o senhor de engenho que lhe concedia, por esse mesmo ato, uma casa e trabalho”[6].
A morada e as vantagens dela advindas (roçado, criação de animais, festas comunitárias) eram consideradas como um “dom” recebido, uma benevolência dos grandes proprietários. No entanto, por essa característica de favor, havia sempre uma incerteza velada quanto à permanência das “vantagens” materiais e simbólicas, que poderiam “ser reduzidas a zero por meio de uma decisão unilateral do senhor”[7].
Diversas foram as tentativas de romper esse circuito fechado de dominação ao longo da século XX, principalmente a partir da segunda metade do década de 1950, com o surgimento das Ligas Camponesas, o fortalecimento dos sindicatos dos trabalhadores rurais e a aprovação, em 1963, do Estatuto do Trabalhador Rural, que estendia alguns importantes direitos dos trabalhadores urbanos para os trabalhadores rurais, como salário mínimo, 13º salário, férias anuais pagas e aviso prévio, além de prever, em caso de conflito, a mediação da Justiça trabalhista.
Essa intermediação de instrumentos do Estado Democrático de Direito, como no caso da atuação do Poder Judiciário na solução dos conflitos trabalhistas, representou um abalo sísmico na lógica do favor e da subserviência na zona canavieira, justamente porque tinha um “efeito simbólico preciso: colocava no mesmo plano a palavra do morador e do senhor e materializava a existência de um poder acima do senhor”[8].
Os sindicatos rurais e o Estatuto do Trabalhador Rural se transformaram em um ponto de ruptura entre duas épocas, ao subverterem por completo as relações tradicionalmente estabelecidas[9]. Entender como isso se deu é relevante para se compreender o papel do direito e da moral na conformação das relações sociais e da vida pública na região canavieira.
Em estudo antropológico com o sugestivo título de Armadilhas da honra[10], Lygia Sigaud relembra que, desde o início dos anos 50, estava em curso uma drástica mudança nas regras do sistema de morada. Isso porque, com a crise econômica que se espraiou no setor sucroalcooleiro, os grandes proprietários de terra começaram a buscar meios alternativos de aumentar os ganhos de produtividade com a expansão da área de cultivo da cana. Para isso, não só retiraram dos moradores o usufruto das terras da morada, como passaram a modificar as formas de remuneração do trabalho feito, reduzindo os valores pagos pela cana cortada. Com isso, passaram a negligenciar as obrigações morais de protetores e doadores, pilar do sistema de morada. Essa quebra unilateral das regras do jogo criou “possibilidade da ruptura de outras regras que os moradores aceitavam como parte da ordem natural das coisas, notadamente aquelas que os obrigavam a serem leais a seus patrões e a não questionarem sua autoridade”[11].
Esse contexto irá influenciar a organização dos trabalhadores rurais, seja por meio da formação de ligas, associações e sindicatos, que pressionará cada vez mais a regulamentação das relações de trabalho no campo. Fruto dessa pressão, o Congresso Nacional aprovará, em 1963, o Estatuto do Trabalhador Rural, que regulamenta as obrigações dos empregadores rurais e prevê, em casos de conflito, a mediação da Justiça trabalhista.
O texto da nova lei tornou-se verdadeiro objeto de luta política. Sindicatos passaram a promover greves e manifestações pelo pagamento dos novos direitos e apoiaram os primeiros processos judiciais de moradores contra as violações dos direitos trabalhistas. Cortadores de cana que nunca tinham recorrido à Justiça contra seus patrões começaram a fazê-lo. Não por outro motivo, nesse período, em Pernambuco, durante a gestão do governador Miguel Arraes, foi firmado o primeiro contrato coletivo de trabalho da região canavieira entre representantes sindicais e proprietário de terra, que estabelecia, dentre outras cláusulas, uma tabela pré-definida dos preços e dimensões das tarefas agrícolas, razão principal dos conflitos nos engenhos de cana, uma vez que eram os patrões os impunham e modificavam arbitrariamente.
Como alerta Sigaud, seria incorreto, e até leviano, computar a introdução do direito como regulador das relações sociais na região canavieira como efeito direto da promulgação do Estatuto do Trabalhador Rural, como se os direitos sociais dos trabalhadores passassem a ser respeitados apenas porque a lei assim o exigia. Claro que a existência de novas normas jurídicas e a consolidação do Poder Judiciário como instituição estatal na região contribuíram para essa mudança na ordem social. Mas elas, por si só, não teriam o condão de modificar a estrutura de poder que regia as relações sociais no mundo da cana.
Para que esses direitos sociais se tornassem efetivos, foi necessária uma ampla mobilização social, com a participação de dirigentes sindicais e lideranças comunitárias. Contudo, seria de um voluntarismo ingênuo acreditar que a organização classista dos trabalhadores teria o condão, por si só, de romper com o sistema de morada. Nesse sentido é significativo o fato de que, nem todos os trabalhadores - a bem da verdade, nem sequer a maioria deles -, decidiu por se juntar aos sindicatos rurais ou mesmo por “colocar os patrões no pau”, levando os conflitos trabalhistas para a Justiça. Por conta disso, seria mais condizente tratar a sindicalização e judicialização dos conflitos como consequência e não causa da crise do sistema de morada[12].
A causa principal, a raiz da introdução do direito como um dos reguladores das relações sociais, se dá a partir do rompimento da tradição, da perda da proteção que os “patrões” deveriam conceder aos “moradores”, base do sistema de morada. Esse abandono desobrigou, mesmo que momentaneamente, a subserviência dos trabalhadores do mundo da cana e os impeliu a buscar nos “direitos”, na intermediação dos acordos coletivos e ações judiciais, uma compensação a essa ruptura unilateral da proteção[13].
Fala-se em desobrigação “momentânea” porque as relações de favor e subserviência do sistema de morada persistiram e se reinventaram ao longo das últimas décadas. Se levarmos em consideração que nos municípios da zona canavieira, como os de Alagoas, as relações de poder econômico foram transpostas para o seara político, concentrando nos mãos dos proprietários de terra as funções e cargos da administração pública municipal, é possível compreender como a “coerção moral” do sistema de morada se transformou em uma “armadilha da honra” que se sobrepõe às instituições democráticas e atua como uma sombra a constranger todo exercício de soberania popular nestas cidades. Afinal, como me opor ao senhor-proprietário-prefeito-vereador, se ele me "deu" tanto?
Não seria errado afirmar, desta forma, que o sistema de morada é uma das principais chaves de interpretação para compreender o contexto social marcado pelo misto de medo, subserviência e gratidão que perdura até os dias de hoje nas cidades canavieiras alagoanas, e que se constitui como obstáculo a ser superado para a consolidação definitiva do Estado Democrático de Direito como regulador das relações sociais e vetor do desenvolvimento pautado na dignidade humana nos municípios da região.
Se a perspectiva sociológica e antropológica permitiu compreender a dimensão social dos problemas vividos no mundo da cana alagoano, é possível trazer novas luzes a essa discussão se pensarmos o sistema de morada por meio da perspectiva do Direito Fundamental à Liberdade.
Em seu clássico Discurso da servidão voluntária[14], Etienne de La Boétie busca saber por que a pessoas obedecem, isto é, por que, na sociedade moderna que se constituía no momento de sua escrita, as pessoas ou povos ainda se permitiam renunciar voluntariamente à própria liberdade, submetendo-se, por livre vontade e iniciativa, às ordens e arbítrios de um agente externo, governante.
Para ele, existiriam três motivos para a servidão voluntária: o costume, a covardia e as estruturas de poder. E se a servidão é um ato de vontade, o rompimento desses grilhões também o é. Como são os próprios indivíduos e povos que se fazem dominar, bastariam o firme desejo em ter sua liberdade de volta para assim o conseguir. Em suas próprias palavras: “Sede resoluto em não servir mais e estareis livres”.
Já na metade do século 20, Isaiah Berlin, em seu seminal ensaio Dois conceitos de liberdade[15], vai trabalhar a noção da liberdade em duplo viés. O primeiro deles, chamado negativo, gira em torno da ideia da ausência de interferência externa na disposição das atividades de um indivíduo. A extensão de liberdade, em seu viés negativo, consistiria na ausência de obstáculo não simplesmente às escolhas reais dos indivíduos, mas também às escolhas potenciais – ao modo de agir de uma forma ou de outra, conforme opção de cada ser.
O sentido positivo da noção de liberdade se relacionaria com as ideias de autonomia e autodeterminação. Origina-se do desejo de cada indivíduo em ser seu próprio senhor, de modo que suas decisões dependam dele mesmo e não de forças externas de qualquer tipo. A liberdade positiva, desta forma, nada mais seria que a vontade alimentada por todo ser humano de decidir por si mesmo os rumos de sua vida.
Problematizando as perspectivas de liberdade feitas por La Boétie e Berlin, seria necessário perguntar se é possível falar em uma liberdade inata, em sentido puro, natural, livre de todas as conjunturas e pressões sociais e históricas; uma ideia de liberdade individual que se aplique prévia e universalmente a todo um país ou território, sem levar em consideração recortes culturais, políticos e socioeconômicos. Em outras palavras, pergunta-se: a liberdade individual faz parte do âmago humano ou é uma construção social?
Parece-nos mais condizente com o contexto social do mundo da cana nordestino adotar o pressuposto de que a liberdade é uma construção social, onde os aspectos negativo e positivo funcionam como tese e antítese necessárias à síntese dialética da liberdade possível em cada contexto histórico. Desta forma, a efetivação do direito à liberdade passa a ser fruto do consenso provisório e em constante construção dos interesses particulares de indivíduos e classes sociais em disputa num determinado tempo e lugar.
E essa síntese dialética só pode ocorrer a partir de um Estado que se abra à participação popular, à escuta ativa dos interesses conflitantes, de modo a absorver a maior quantidade e qualidade de informações para se adotar a decisão capaz de proporcionar a melhor resposta possível aos conflitos sociais e à concretização do direito à liberdade.
Neste ponto, parece-nos pertinente dialogar com as reflexões do jurista inglês Herbert L.A Hart. Em sua obra O conceito de Direito[16], publicada nos anos iniciais da década de 1960, Hart busca construir uma compreensão do direito para além das ideias de ordem, ameaça e obediência. Para ele, não é possível reduzir o fenômeno jurídico à visão simplificadora que vê nele um meio de controle social em que as pessoas se submeteriam às ordens oriundas de um poder soberano por conta, exclusivamente, do medo da punição e coerção física em caso de descumprimento. Na visão de Hart, “é óbvio que a previsibilidade do castigo é um aspecto importante das regras jurídicas; mas não é possível aceitar isto como uma descrição exaustiva”[17].
Partindo de uma perspectiva oriunda da filosofia da linguagem comum, em que a construção do conhecimento não é fruto de um exercício artificial de purificação da linguagem ordinária, mas sim de um aprofundamento e esclarecimento de seus termos e usos cotidianos, Hart vai desenvolver o conceito de regra jurídica a partir da distinção “entre a asserção de que alguém foi obrigado a fazer algo e a asserção de que essa pessoa tinha a obrigação de o fazer”[18].
Uma regra jurídica se diferenciaria tanto de hábitos regulares em uma sociedade como de condutas sociais baseadas em ameaças de castigo: não se pode confundir a obrigação oriunda daquela, por exemplo, com a obediência às ordens de um assaltante armado ou ao costume de ir semanalmente ao cinema. Para Hart, uma pessoa obedece às regras jurídicas não porque tem medo ou por mero hábito, mas, em última instância, porque acredita que aquilo é o mais correto a se fazer, porque concorda com a própria razão de existir daquelas regras, “porque se crê que são necessárias à manutenção da vida social ou de algum aspecto desta altamente apreciado”[19].
É esse ponto de vista interno que explicará tanto a pressão social pelo cumprimento das regras jurídicas como o fato destas serem seguidas mesmo quando em conflito com os interesses individuais da pessoa que as cumpre. Daí o fato de se aproximar mais à ideia de dever, de ter a obrigação de fazer. Não será por outro motivo, explicará Hart, que “dizemos que censuramos ou castigamos um homem porque violou a regra e não meramente que era provável que o censuraríamos ou castigaríamos”[20] .
Essa perspectiva fornece uma explicação da obrigação jurídica isoladamente, mas não de seu funcionamento em um contexto social complexo, dentro um ordenamento jurídico como um todo. Para fornecer esse panorama geral, Hart partirá de uma distinção entre obrigação e regra, ao afirmar que “as regras são concebidas e referidas como impondo obrigações quando a procura geral de conformidade com elas é insistente e é grande a pressão social exercida sobre os que delas desviam ou ameaçam desviar-se”[21]. Regras seriam, portanto, a junção entre as obrigações socialmente aceitas com a pressão social para seu cumprimento.
Essas regras podem ser ter sua origem nos próprios costumes de uma comunidade, não se exigindo um sistema central organizado de castigos contra sua violação. O controle social para o cumprimento destas regras poderia se resumir a uma reação hostil ou desaprovação generalizada. Em situações como essa, quando a pressão social é exercida por meio do apelo coletivo a sentimentos de vergonha, remorso ou culpa, seria mais correto classificar “as regras como parte da moral do grupo e a obrigação decorrente das regras como obrigação moral”[22]. Por outro lado, quando a pressão social se vale de sanções físicas, mesmo quando não centralizadas em estruturas oficiais e deixadas à comunidade em geral, seria possível classificar as regras de tal tipo como uma forma primitiva ou rudimentar de direito.
Seguindo essa linha de raciocínio, Hart afirmará que uma sociedade de baixa complexidade, fixada num ambiente minimamente estável em que seus membros compartilham sentimentos, crenças e tradições comuns, poderia abrir mão de um sistema centralizado de regras e castigos oficiais. Nelas, bastaria como único meio de controle social a atitude geral do grupo em relação aos modos-padrão de comportamento. A essas regras que impõem e controlam diretamente os deveres e condutas sociais, que exigem dos membros da comunidade que ajam ou se abstenham de agir, quer queiram ou não, Hart chamará de obrigações básicas ou primárias[23].
Contudo, a partir do momento em que essa comunidade se torne mais complexa, a sustentabilidade desse tipo de sistema social começa a ruir e seus membros se deparam com, ao menos, três tipos de problema[24]. O primeiro deles é o da incerteza. Devido à constante mudança e aumento das regras existentes, as pessoas já não sabem ao certo quais regras são válidas e obrigatórias e quais não são. O segundo é o problema do caráter estático. Em sociedades deste tipo, não há um reconhecimento de formas institucionais ou de pessoas dotadas de autoridade para adaptar as regras existentes à realidade em constante mutação, seja por meio da introdução de novas regras, seja por meio da eliminação das existentes. Consequência destes, o último problema identificado por Hart seria o da ineficácia. A incerteza e a incapacidade de adaptação das regras primárias, somadas à ausência de uma instância oficial e centralizada capaz de determinar sanções às violações, enfraqueceriam a pressão social para o cumprimento destas regras, permitindo-se cada vez mais seu descumprimento.
A superação da incerteza, inaptidão e ineficácia, avalia Hart, só seria possível se as regras primárias de obrigação fossem complementadas com outros tipos de regras que assegurassem aos membros da comunidade criar, extinguir ou modificar as regras primárias, determinando os diferentes modos de aplicação e fiscalização. Enquanto às regras do primeiro tipo imporiam deveres, as do segundo tipo atribuiriam poderes, públicos ou privados, para a criação, modificação e aplicação destes deveres. São regras instrumentais, que não regulam condutas, mas sim a forma como essas condutas serão reguladas[25]. A essas regras complementares ou parasitas, Hart chamará regras secundárias.
Haveria, portanto, um tipo de regra secundária para cada um dos problemas identificados nas regras primárias. Contra o problema da incerteza, o remédio seria a introdução de uma “regra de reconhecimento”, que institui um critério formal para decidir quando uma regra é ou não é válida e obrigatória. Ao introduzir esse método puramente formal, independente, portanto, de concordância íntima ou apreciação do mérito de seu conteúdo,[26] elimina-se a dúvida e se supera a incerteza quanto à validade e cumprimento dos deveres oriundos das obrigações primárias[27].
Já para superar problema do caráter estático, a comunidade deveria instituir “regras de alteração”, que definiriam quem são as pessoas dotadas de autoridade e legitimidade para criar, alterar ou extinguir regras primárias, bem como o procedimento preciso que devem seguir, de modo a evitar incertezas sobre quais regras quais são as regras vigentes ou não[28].
O último complemento ao regime simples das regras primárias de obrigação, destinado a remediar o problema da ineficácia, seria a introdução de “regras de julgamento”, que definiriam quem são as pessoas dotadas de autoridade responsáveis por mediar os conflitos entre os membros da comunidade, identificando quando um regra primária foi ou não violada e as consequências dessa violação, autorizando, inclusive, a aplicação das sanções oficiais centralizadas do sistema[29].
Para Hart, e aqui vale a citação mais extensa, “a introdução de um corretivo para cada defeito poderia em si ser considerado um passo na passagem do mundo pré-jurídico para o jurídico, uma vez que cada um desses remédios traz consigo muitos elementos que vão permear o direito: os três remédios em conjunto são sem dúvida o bastante para converter o sistema de regras primárias naquilo que é indiscutivelmente um sistema jurídico”[30]. Desta feita, um sistema jurídico poderia ser conceituado como a estrutura resultante da “combinação das regras primárias de obrigação com as regras secundárias de reconhecimento, alteração e julgamento”[31], em que o hábito geral de obediência é fruto de uma aceitação compartilhada das regras, tantos pelos cidadãos comuns com pelos agentes públicos, que reconhecem os mesmos critérios dotados de autoridade para identificar as regras primárias de obrigação[32].
Esse conceito hartiano do Direito traz, de fato, novas luzes à compreensão da concretização do fenômeno jurídico e do direito à liberdade no mundo da cana nordestino. Isso porque não nos parece de todo impossível transpor o que se identificou acima como “passagem do mundo pré-jurídico para o jurídico” à crise do sistema de morada na zona da mata canavieira dos anos 1960.
Enquanto vigorava as obrigações primárias do sistema de morada, isto é, enquanto os proprietários, por um lado, forneciam proteção e um pedaço de terra, e os trabalhadores, por outro, o fruto de seu trabalho e o respeito irrestrito às ordens do patrão, a região canavieira nordestina era, na prática, um mundo pré-jurídico, uma sociedade de baixa complexidade baseada em sentimentos, crenças e tradições comuns, que reconhecia, mas não aplicava, o sistema centralizado de regras e castigos oficiais oriundo do ordenamento jurídico brasileiro. A lei dos canaviais era a lei dos senhores de engenho.
Contudo, a partir do momento em que os grandes proprietários decidiram aumentar seus lucros por meio da expansão do cultivo da cana-de-açúcar por sobre as terras antes destinadas aos moradores, ruíram-se os alicerces da lógica de troca e favor que sustentavam as relações sociais no mundo dos canaviais. Essa quebra unilateral das regras do jogo impactará a dinâmica das regras básicas do sistema de morada, desobrigando os moradores a serem leais a seus patrões e a não questionarem sua autoridade.
Diante da incerteza sobre quais seriam as regras a serem seguidas, da inaptidão dos proprietários em adequar as regras existentes à realidade em mutação e da inexistência de uma instância imparcial que pudesse mediar os conflitos entre moradores e proprietários, foi necessário recorrer às regras secundárias de reconhecimento, alteração e julgamento, que pudesse se aceita e compartilhada por todos, proprietários e cortadores.
Adota-se, a partir daí, as premissas de um sistema jurídico constituído de regras primárias e secundárias, em que as obrigações reconhecidas como válidas e obrigatórias serão aquelas oriundas do Estatuto do Trabalhador Rural promulgado pelo Congresso Nacional e, em caso de não cumprimento, a solução não se dará mais no plano individual das trocas e favores, mas através dos acordos coletivos mediados pelas sindicatos rurais e, em última instância, através da provocação do Poder Judiciário.
Apesar de se entender possível utilizar os conceitos de Hart para explicar a relação com o Direito e o Estado que impera nas cidades canavieiras nordestinas, é sempre bom lembrar que essa transposição não pode ser feita de modo automático. Isso porque não acreditamos que houve, na região da cana alagoana, a superação por completo do mundo pré-jurídico pautado pelas obrigações morais e o uso privado da força. As relações de favor e subserviência do sistema de morada persistiram e se reinventaram ao longo das últimas décadas. A dominação econômica migrou dos canaviais para as instituições estatais, concentrando nas mãos dos mesmos coronéis o poder econômico e o político. Não seria errado dizer que a moral coronelista se apropriou dos mecanismos próprios de funcionamento das regras secundárias de reconhecimento, alteração e julgamento. Por trás da aparência de imparcialidade do Estado Democrático de Direito, as leis, os atos administrativos e as decisões judiciais continuam submissas à influência e interesses dos antigos senhores de engenho.
Esta simbiose entre o jurídico e o pré-jurídico também pode ser compreendida como fruto do malformado capitalismo brasileiro, que Francisco de Oliveira[33] equiparou ao ornitorrinco, por seus impasses e combinações esdrúxulas. A resiliência do arcaico, a permanência escamoteada do sistema de morada no mundo da cana, nada mais seria que uma faceta da modernização conservadora brasileira que, a par da crescente urbanização e industrialização das últimas décadas, não superou os vícios estruturais provenientes da antiga sociedade pré-industrial, marcada pelas relações promíscuas entre a esfera pública e a privada e na qual os grandes proprietários de terra continuam no centro do poder político.
A ideia de modernização conservadora foi cunhada por Roberto Schwarz em ensaios escritos nos anos 1960 e 70[34]. Tendo como objeto de estudo a cultura e a literatura brasileira, mais especificadamente a obra de Machado de Assis, Schwarz acaba por refletir sobre o processo de formação do Estado brasileiro. Para ele, a trajetória nacional é marcada, desde o século XIX, por um "pitoresco estrutural", um sistema de funcionamentos anômalos em que “a comédia local das presunções de civilidade e progresso são desqualificadas pelo pé na escravidão e nas relações conexas”[35].
Como a independência nacional não se originou de nenhum processo de convulsão social capaz de promover alterações na estrutura de poder econômico e social do período colonial, a formação do Estado brasileiro se pautou, em grande medida, na manutenção dos benefícios das classes dominantes locais. E para manter seus privilégios, essa elite só poderia adotar indicadores da modernidade, tais quais a submissão de todos perante a Lei, a separação entre o público e o privado e a defesa das liberdades civis, desde um ponto de vista meramente formal, o conhecido “para inglês ver”. Por trás desse álibi das aparências, o que se desnuda é a “elasticidade com que a civilização burguesa se acomoda à barbárie, a qual parecia condenar e que lhe é menos estranha do que parece"[36].
Por essa perspectiva, a superposição entre o jurídico e o pré-jurídico nos municípios da região canavieira alagoana não seria um ponto fora da curva, mas uma característica estrutural própria da conformação anômala do Direito nessas regiões.
Uma possível superação desse impasse, ao menos no plano teórico, partiria de um retorno à obra de Hart. Na sua reflexão sobre o fenômeno do Direito, ele ressalva que, por conta do pluralismo político que caracteriza todo regime democrático e da própria incapacidade humana para antecipar o futuro, não seria possível um sistema jurídico que tudo antevê e regula, determinando com inteira precisão quando um objeto ou fato corresponderia aos conceitos gerais e abstratos das leis. Por conta disso, haveria graus de indeterminação[37], zonas de foco e penumbra, a serem preenchidos por uma “escolha criadora” exercida pelos tribunais “ao interpretarem uma lei concreta que se revelou indeterminada”[38]. Na palavras do autor, “haverá pontos em que o direito existente não consegue ditar qualquer decisão que seja correcta e, para decidir os casos em que tal ocorra, o juiz deve exercer seus poderes de criação do direito”[39], poder esse restrito e limitado a “resolver as questões específicas suscitadas por casos concretos”[40]. Nos parece que essa textura aberta de que fala Hart, ao identificar “áreas de conduta em que muitas coisas devem ser deixadas para serem desenvolvidas pelos tribunais ou pelos funcionários, os quais determinarão o equilíbrio, à luz das circunstâncias, entre interesses conflituantes que variam em peso, de caso para caso”[41], também se aplicaria às decisões e atos administrativos.
Se há uma ressalva à aplicação dos pressupostos de textura aberta e da escolha criadora ao contexto dos municípios da zona canavieira e à administração pública brasileira como um todo é que, aqui, o poder de criação das decisões administrativas, que determinarão “o equilíbrio, à luz das circunstâncias, entre interesses conflituantes” de que fala Hart, estaria condicionado à participação popular como elemento de direção e fiscalização da promoção dos interesses públicos e do direito à liberdade dentro do Estado de Direito Democrático consolidado pela Constituição Federal de 1988.
Isso porque, no atual contexto brasileiro, o melhor interesse público possível, porque oriundo da mais viável composição de interesses numa sociedade capitalista, economicamente desigual e politicamente concentrada como a brasileira, é aquele que tem como norte o que se consolidou na Constituição Federal de 1988.
Ensimesmada, diante de um contexto social complexo e conflitivo, a Administração Pública se torna cada vez menos capaz de decidir por conta própria qual a melhor forma de concretizar os valores constitucionais. É preciso se abrir ao outro, ao povo, à participação popular, para melhor promover o interesse público fruto do consenso provisório e em constante construção dos interesses particulares das classes sociais antagônicas.
Do ponto de vista da relação entre indivíduo e Administração Pública, a participação popular no procedimento de decisões administrativas garantiria uma maior gama de informações e circunstâncias fáticas relevantes capazes de afastar as zonas de penumbra e garantir a melhor concretização dos interesses públicos durante o trabalho de individualização do direito às situações jurídicas individuais, fim último de todo ato administrativo que busque respeitar e efetivar o direito fundamental à liberdade.
Assim como não deve existir o que se poderia chamar de administrador Hulk[42] que, diante da incompletude da lei e da complexidade das situações antagônicas a que é obrigado intervir, desiste da racionalidade e, tal qual a música do Djavan, deixa vir do coração[43] a decisão, mesmo que, para isso, precise esmagar certos direitos individuais. Tampouco seria prudente ter como modelo um administrador Hércules, para se utilizar do método proposto por Ronald Dworkin[44], que buscaria, por meio de uma capacidade quase sobre-humana, avaliar por conta todos as circunstâncias fáticas e jurídicas relacionados ao caso até encontrar a única decisão correta para a situação jurídica individualizada caso.
O papel dado à participação popular na gestão e controle da Administração Pública como pressuposto essencial do pluralismo político característico do Estado de Direito Democrático[45], no qual Administração e cidadão passam a ser vistos como sujeitos iguais de uma relação jurídica e onde a defesa do direito deixa de ser prerrogativa exclusiva do Estado e passa a ser fruto da relação de tensão entre o povo e a Administração[46], exige uma superação da ideia de controle popular dos atos administrativos como ação de natureza posterior e adstrita à verificação de conformidade legal.
Não é só no controle ulterior que residiria a participação popular nos atos administrativos. É preciso ampliar a perspectiva do que esse entende por controle popular da administração, para nela incorporar a ideia de gestão e direção, ao lado da fiscalização e vigilância. Desta forma, o foco de atenção do controle dos atos administrativos não estaria na dicotomia entre vinculação e discricionariedade, mas na qualidade e quantidade de participação popular durante o procedimento administrativo de decisão e criação dos atos administrativos.
As possíveis resistências, no campo teórico e político, a uma Administração paritária aberta à participação popular só podem ser compreendidas dentro de um contexto de “ódio à democracia”, como argutamente apontado em ensaio homônimo de Jacques Ranciére[47]. Esse ódio, ao contrário do que se possa pensar, não é prerrogativa de certa elite econômica ou fruto de determinado contexto geopolítico. Ao contrário, surgiu junto com a própria democracia. Os haters de ontem e hoje não se opunham necessariamente ao fato de que os governantes possam ser eleitos por qualquer membro da sociedade, mas sim pelo simples fato de que, no regime democrático, qualquer um pode, em potencial, ser alçado a governante.
Não é preciso ser filósofo, sábio, possuir sangue real ou ser enviado dos deuses. Não é necessário ser homem, branco, heterossexual, rico, com MBA em gestão pública, diploma em direito, economia ou administração. Não se exige nem a conclusão do ensino médio. Se todo o poder emana do povo, qualquer do povo pode exercê-lo.
Rancière lembra, inclusive, que, nos primórdios da democracia, os governantes eram escolhidos por sorteio. Nada mais condizente com a radicalidade do pressuposto democrático. Afinal, a impessoalidade randômica do sorteio não restringiria o exercício do poder público a classes sociais específicas ou indivíduos com características pré-selecionadas. Pelo contrário, nela o governo pode — e deve — ser exercido por qualquer um, sem exceção.
Propugnar por uma participação popular como requisito procedimental das decisões e atos administrativos não se justifica apenas pelo pressuposto de que, num Estado de Direito Democrático, o Administração Pública pode e deve ser exercida por todos e por qualquer um, mas também pela constatação de que não existe um administrador iluminado, capaz de tudo prever e abarcar, protegendo e promovendo, por conta própria, a exaustiva gama de interesses públicos consolidados na Constituição de 1988.
No campo das decisões administrativas, a melhor luz, para utilizar de outra expressão do próprio Dworkin, não viria da interpretação argumentativa unilateral feita pelo administrador sobre as regras ou princípios que compõem a ordem constitucional, mas sim da participação popular que abre a Administração Pública aos fatos e interesses conflitantes que caracterizam a sociedade de classes capitalista, capazes de melhor identificar o interesse público a ser consensuado e promovido nos atos administrativos.
Num Estado de Direito Democrático, o escrutínio do público sobre as decisões e atos da Administração Pública deve ser o mais amplo e constante possível. O agente público que precisa tomar uma decisão administrativa está em posição limitada, porque incapaz de abarcar todas as nuances fáticas e jurídicas que envolvem a individualização do Direito aos casos concretos.
Do ponto de vista da relação entre indivíduo e Administração Pública, a participação popular no procedimento de decisões administrativas garantiria uma maior gama de informações e circunstâncias fáticas relevantes capazes de afastar as zonas de penumbra e garantir a melhor concretização dos interesses públicos durante o trabalho de individualização do direito às situações jurídicas individuais, fim último de todo ato administrativo que busque respeitar e efetivar o direito fundamental à liberdade.
Se, em sua Theoria das constituições rigidas, de 1934, Oswaldo Aranha Bandeira de Mello defendia o Poder Judiciário como “oráculo da Constituição”[48], não nos parece indevido, na segunda década do século 21, identificar na participação popular o oráculo coletivo da liberdade e interesse público.
Ao fim e ao cabo, garantir a participação popular nas decisões e atos administrativos seria uma resposta contemporânea ao desafio lançado no final dos anos 1920 pela romancista alagoano Graciliano Ramos, quando, na qualidade de prefeito de Palmeira dos Índios, sentenciou que “bem comido, bem bebido, o pobre povo soffredor quer escolas, quer luz, quer estradas, quer hygiene. É exigente e resmugante”[49].
[1] ALAGOAS, Diversificação Produtiva como Alternativa para a área Canavieira de Alagoas. Maceió: SEPLAG, 2017; e Anuário Estatístico do Estado de Alagoas. Ano 24. v. 24. Maceió: SEPLAG, 2018.
[2] Para uma visão mais ampla e profunda sobre esse resgate histórico, recomenda-se o trabalho de Lúcio Verçoza em sua recente obra Os homens-cangurus dos canaviais alagoanos: um estudo sobre trabalho e saúde. Maceió: Edufal, 2018.
[3] GARCIA, Afrânio. Sujeitos e Libertos: sobre a transição para trabalhadores livres do nordeste. Revista Brasileira de Ciências Sociais, n. 7, v.3, p.05-41, 1988, p.9.
[4] GARCIA, idem.
[5] PALMEIRA, Moacir. Casa e trabalho: notas sobre as relações sociais na plantation tradicional. Contraponto, v. 2, n. 2, p. 103-114, nov. 1977, p. 113.
[6] HEREDIA, Beatriz Alasia de. Formas de dominação e espaço social: A modernização da agroindústria canavieira em Alagoas. São Paulo: Marco Zero; Brasília, DF: MCT/CNPq, 1988, p. 118.
[7] GARCIA, 1988, p. 15.
[8] GARCIA, idem.
[9] PALMEIRA, Moacir. Desmobilização e conflito: relações entre trabalhadores e patrões na agroindústria pernambucana. Revista de Cultura e Política, vol. 1, nº 1, pp. 41-55, ago. 1979.
[10] SIGAUD, Lygia. Armadilhas da honra e do perdão: usos sociais do direito na mata pernambucana. Mana. Estudos de Antropologia Social, v. 10, n. 1, p. 131-163, abr. 2004.
[11] SIGAUD, 2004, p. 136.
[12] “Os indivíduos não cobram ou deixam de cobrar os direitos porque os conhecem ou ignoram, porque estes foram ou deixaram de ser violados, porque a Justiça é accessível ou deixa de sê-lo. Todos esses fatores podem ou não favorecer a cobrança de direitos, mas ela é incompreensível se se ignora que a cobrança dos direitos está subordinada a outras normas que regem a vida social, às coerções morais que se abatem sobre todos aqueles envolvidos em relações de troca e aos interesses que lhes estão associados”. SIGAUD, Lygia. Direito e coerção moral no mundo dos engenhos. Estudos Históricos, v. 9, n. 18, p. 361-388, 1996, p. 380.
[13] Na virada dos anos 1980 para os anos 1990, quando nova crise eclodiu na zona canavieira, muitos trabalhadores sentiram que estavam à beira de perder tudo: não havia mais nenhuma proteção, nem da tradição nem do direito. Esta representação contribuiu para que se dispusessem a ocupar os engenhos e a começar a inventar um novo direito: o direito à terra e à reforma agrária. SIGAUD, 2004, p. 156.
[14] LA BOÉTIE, Etienne de. Discurso da servidão voluntária. São Paulo: Brasiliense, 1999, p. 69-108.
[15] BERLIN, Isaiah. “Dois conceitos de liberdade”. In Estudos sobre a humanidade: uma antologia de ensaios. São Paulo: Brasiliense, 1999, p. 226-272.
[16] HART, Hebert L. A. O conceito de direito. 3ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.
[17] HART, 2001, p. 15.
[18] HART, 2001, p. 92.
[19] HART, 2001, p. 97.
[20] HART, 2001, p. 15.
[21] HART, 2001, p. 96.
[22] HART, idem.
[23] HART, 2001, p. 101.
[25] HART, 2001, p. 91.
[26] COELHO, 2011.
[27] HART, 2001, p. 105.
[28] HART, 2001, p. 105-106.
[29] HART, 2001, p. 107.
[30] HART, 2001, p. 103.
[31] HART, 2001, p. 107.
[32] HART, 2001, p. 127.
[33] OLIVEIRA. Francisco de. Crítica à razão dualista/O ornitorrinco. São Paulo, Boitempo, 2003.
[34] SCHWARZ, Roberto. As ideias fora do lugar: ensaios selecionados. São Paulo: Companhia das Letras, Penguin Books, 2014.
[35] SCHWARZ, 2015, p. 131.
[36] SCHWARZ, idem.
[37] HART, 2001, pg. 143.
[38] HART, 2001, pg. 166.
[39] HART, 2001, pg. 336.
[40] HART, 2001, pg. 338.
[41] HART, 2001, pg. 148.
[42] Hulk é um personagem de quadrinhos, livremente inspirado na obra O Estranho Caso de Dr. Jekyll e Sr. Hyde, de Robert Louis Stevenson. Atingido por radiação, o cientista Bruce Barner passa a conviver com um alter ego dotado de força descomunal que se apodera de seu corpo em situações limítrofes de tensão, passando a agir pautado nos mais primitivos instintos de sobrevivência. De poucas palavras, seu vocabulário se restringe ao bordão “Hulk esmaga!”.
[43] Trata-se do último verso da primeira estrofe da música Se..., do álbum Coisa de acender, lançado em 1992: “Você disse que não sabe se não / Mas também não tem certeza que sim / Quer saber? Quando é assim,/ deixa vir do coração”. Essa estrofe, inclusive, parece sintetizar perfeitamente a perplexa situação do povo diante das (in)decisões do Estado brasileiro.
[44] Em suas obras Levando os direitos a sério (1977) e O Império do Direito (1986), o jurista estadunidense Ronald Dworkin apresenta como método de decisão judicial a figura imaginária do juiz Hércules, dotado da resiliência e sabedoria necessárias para esmiuçar e reinterpretar o ordenamento jurídico como um todo à procura da única resposta correta a cada um dos casos em litígio, inclusive os mais difíceis.
[45] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Participação popular na administração pública. R. Dir. Adm, Rio de Janeiro, 191: 26-39, jan.mar. 1993
[46] MACHETE, Pedro. Estado de Direito Democrático e Administração Paritária. Coimbra. Almedina, 2007.
[47] RANCIÈRE, Jacques. Ódio à democracia. Trad. Mariana Echalar. São Paulo: Boitempo, 2014.
[48] BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. A theoria das constituições rigidas. São Paulo: Revista dos Tribunaes, 1934, pg. 130.
[49] RAMOS, Graciliano. Relatórios de Graciliano Ramos publicados no Diário Oficial. Maceió: Imprensa Oficial Graciliano Ramos, 2013, p. 44.
Mestre em Meios e Processos Audiovisuais pela Escola de Comunicação e Artes da USP. Mestrando em Direito Administrativo pela PUC-SP. Advogado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COSTA, THALLES GOMES CAMELLO DA. Estado democrático de direito e participação popular na região canavieira de Alagoas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 jun 2021, 04:20. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56910/estado-democrtico-de-direito-e-participao-popular-na-regio-canavieira-de-alagoas. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: JAQUELINA LEITE DA SILVA MITRE
Por: Elisa Maria Ferreira da Silva
Por: Hannah Sayuri Kamogari Baldan
Por: Arlan Marcos Lima Sousa
Precisa estar logado para fazer comentários.