Acórdão: Agravo de Instrumento n. 2003.010891-2, de Balneário Camboriú.
Relator: Des. Trindade dos Santos.
Data da decisão: 13.11.2003.
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. Execução de obrigação de fazer. Exceção de pré-executividade. Acolhimento. Menores relativamente incapazes integrando o pólo passivo da ação. Nulidade da citação inicial reconhecida. Solução.
I - Constando do mandado citatório o nome do menor relativamente incapaz acionado, bem como o de seu representante legal, este também executado, a assinatura de ambos perfectibiliza a citação inicial do menor. Desnecessário, em tal hipótese, é que o representante legal do menor lance, no mandado, duas assinaturas, uma referente à sua citação pessoal e outra correspondente à assistência legal do relativamente incapaz citando.
II - A validade da citação inicial de menor relativamente incapaz exige a efetiva citação do menor e também a de seu representante legal. A citação apenas do representante legal, torna nula a citação do menor. Entretanto, se o menor relativamente incapaz vem a juízo apenas para argüir a nulidade havida, reconhecida esta não há necessidade da renovação do ato. Nesse caso, a citação da menor considerar-se-á feita na data em que foi ela intimada do reconhecimento judicial da nulidade invocada.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de agravo de instrumento n. 2003.010891-2, da comarca de Balneário Camboriú (1a Vara Cível), em que são agravantes Vanderlei Benhur Berndsen e Uogenito Berndsen, sendo agravados Rosane Cristina Ramon, João Olindino Koeddermann Filho, João Olindino Koeddermann e Juliana Pavan:
ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Comercial, por votação unânime, prover o recurso.
Custas de lei.
RELATÓRIO:
Vanderlei Benhur Berndsen e Uogenito Berndsen, irresignados com decisão que, nos autos da ação de execução da obrigação de fazer por eles proposta contra Rosane Cristina Ramon, João Olindino Koeddermann Filho, João Olindino Koeddermann, Juliana Pavan e Leonel Arcângelo Pavan acolheu a exceção de pré-executividade ofertada peleos executados João Olindino Koeddermann Filho e Juliana Pavan, reconhecendo a nulidade da citação dos mesmos, ao argumento de serem eles menores de idade à época da realização daquele ato processual e, o não preenchimento dos requisitos legais da citação, determinando a renovação do ato citatório, vez que ambos atingiram a maioridade civil com a entrada em vigência do Código Civil de 2002, interpuseram agravo de instrumento.
Para tanto, sustentaram os recorrentes que a certidão lavrada à fl. 40 dos autos (fls 50 - TJSC) pelo Sr. Oficial de Justiça que procedeu à citação dos requeridos, confirmou a realização do ato citatório de Rosane Cristina Ramon, João Olindino Koeddermann Filho, João Olindino Koeddermann, Juliana Pavan, esta na pessoa de seu representante legal, Leonel Arcângelo Pavan, que também restou cientificado da ação na qual é réu.
Expuseram os agravantes que no mandado de citação constam as assinaturas tanto de João Olindino Koeddermann, como de João Olindino Koedermann Filho, o que demonstra que a citação ocorreu de forma regular, não podendo se falar que faltou a ciência do representente legal do menor.
Ademais, argumentaram os inconformados, que ao vertente caso deve ser aplicado o disposto no artigo 214, § 2º do Código de Processo Civil, reconhecendo-se como citados os requeridos a partir da intimação da decisão, ante o fato de terem comparecido aos autos apenas para argüir nulidade da citação e esta tendo sido decretada. Assim, desnecessária se torna a realização de nova citação dos requeridos menores de idade à época do ato viciado.
Pugnaram, então, pelo provimento do recurso, para que sejam declaradas válidas as citações executadas.
Intimados, os agravados não ofereceram resposta.
A douta Procuradoria Geral de Justiça eximiu-se de se manifestar nos autos, em razão de haverem os menores residentes do pólo passivo da demanda atingido a maioridade civil.
VOTO:
Ab initio, mister se fazer tecer comentários acerca da exceção de pré-executividade, meio de defesa oposto pelos executados João Koddermann Filho e Juliana Pavan, que aduziram a nulidade da citação realizada nos autos da ação da obrigação de fazer no qual são executados pelos ora agravantes.
Registre-se que, independentemente do aforamento de embargos à execução, sendo a nulidade da execucional pela ineficácia da citação dos executados, matéria esta apreciável de ofício, cabível é a dedução pelo executado da competente exceção de pré-executividade.
A possibilidade da utilização de tal exceção, em se tratando de matéria conhecível de ofício ou de ordem pública, tem se tornado indiscutível.
Parte ela - a exceção em pauta - do pressuposto basilar de que não se pode iniciar ou prosseguir com uma execução que não preenche todos os requisitos legais exigíveis, o que, aliás, é óbvio.
Revela-se ela, assim, como um instrumento adequado para a correta e integral aplicação do citado pressuposto.
Sustenta Luiz Peixoto de Siqueira Filho ser a exceção em referência:
"... a arguição de nulidade feita pelo devedor, terceiro interessado, ou credor, independente de forma, em qualquer tempo ou grau de jurisdição, referente aos requisitos da execução, que suspende o curso do processo até o seu julgamento, mediante procedimento próprio, e que visa a desconstituição da relação jurídica processual executiva e conseqüente aos atos de constrição judicial" (Exceção de pré-executividade, 2ª ed., Rio de Janeiro : Lumen Juris, 1998, pág. 92).
Também a propósito, totalmente afinado com esse entendimento, diz o aplaudido Humberto Theodoro Júnior:
"A nulidade é vício fundamental e, assim priva o processo de toda e qualquer eficácia. Sua declaração no curso da execução, não exige forma ou procedimento especial. A todo o momento o juiz poderá declarar a nulidade do feito tanto a requerimento da parte como ex officio. Não é preciso, portanto, que o devedor utilize dos embargos à execução. Poderá argüir a nulidade em simples petição, nos próprios autos da execução" (Processo de Execução, pág. 157).
Acerca da questão, já foi decidido:
"É cediço, tanto em doutrina como em jurisprudência, que a nulidade da execução, por até proclamável de ofício, pode ser perfeitamente argüida a qualquer tempo, não reclamando, por isso, que o juiz esteja seguro pela penhora ou que haja, necessariamente, a apresentação de embargos" (TACiv.SP, , 4ª Câm., AI n. 350.619, rel. Juiz José Bedran).
Por isso, tratando-se de matéria de ordem pública, as que afetam o desenvolvimento válido e regular do processo, quando falho tiver se mostrado o controle judicial a respeito, podem ela sser alvo de exceção de pré-executividade, com esta impondo-se sempre recepcionada, a fim de que sobre ela se instaure a indispensável discussão.
Muito embora essa defesa direta, nas ações de execução, deva ser admitida sem qualquer restrição, nos casos em que estejam presentes matérias de ordem pública, ou seja, daquelas que podem ser reconhecidas de ofício pelo julgador, independentemente de embargos, não pode e nem deve ser ela aceita de forma ampla, de molde a se tornar substitutivo dos embargos do devedor.
Como bem acentuou o colendo Superior Tribunal de Justiça:
"O sistema processual que rege a execução por quantia certa, salvo as exceções legais, exige a segurança do juízo como pressuposto para o oferecimento dos embargos do devedor. Somente em casos excepcionais, sobre os quais a doutrina e a jurisprudência vêm se debruçando, se admite a discussão desse pressuposto, pena de subversão do sistema que disciplina os embargos do devedor e a própria execução" (RSTJ 31/348).
Assim, a possibilidade da exceção de pré-executividade, na forma pela qual foi ela concebida, está subordinada essencialmente ao não preenchimento, pela execução, dos seus pressupostos legais.
E, na situação estampada nos autos em pauta, como ressalta inquestionável, presente nulidade ensejadora da nulidade de dois dos executados, cabível tornava-se a exceção de pré-executividade.
In casu, os executados, ora agravados, João Koddermann Filho e Juliana Pavan opuseram a exceção de pré-executividade alegando vício no ato citatório de ambos.
Segundo consta da vergastada decisão, a citação de João Kodermann Filho estaria eivada de nulidade decorrente do fato de seu representante legal João Kodermann, que também figura no pólo passivo da ação execucional, não ter lançado ciência da citação do menor no competente mandado.
Em relação a Juliana Pavan, o mandado não preenche o requisito essencial do lançamento da ciência de recebimento por parte da executado, sendo que somente o seu representante legal, Leonel Arcêngelo Pavan, também parte executada na ação, tomou conhecimento do feito de execução.
Têm-se dos autos que a decisão censurada acolheu a exceção de pré-executividade, declarando nula a citação realizada quanto aos executados João Kodermann Filho e Juliana Pavan e determinando a citação pessoal de ambos, vez que atingiram a maioridade civil com a entrada em vigência do novo Código Civil.
No que tange à citação de João Kodermann Filho, nulidade alguma viciou o ato citatório! Ora, resta evidenciado do recurso que tanto o menor relativamente incapaz como seu representante legal restaram cientificados acerca da ação de execução de obrigação de fazer em trâmite.
Consta do mandado de citação (fls. 39/ fls. 49 - TJ/SC) as assinaturas de ambos os executados, conforme bem demonstram os agravantes em sua peça recursal.
Inconcebível seria impor-se que o representante legal de João Koddermann Filho, que também figura no pólo passivo da ação, lançasse por duas vezes sua ciência no mandado citatório.
Ora, uma vez lançado o ciente da ação, este servirá como sua citação bem como na qualidade de representante legal de um dos menores, no caso o seu filho João Koddermann Filho.
Portanto, eficaz se mostrou a citação de João Koddermann Filho, devendo surtir seus efeitos legais.
Entretanto, de forma contrária ocorre em relação a citação de Juliana Pavan, menor relativamente capaz à época da propositura da ação.
Denota-se dos autos que a menor estaria representada legalmente por seu genitor, Leonel Arcângelo Pavan, que também reside no pólo passivo da demanda executiva.
Assim, consoante determina a norma processual, a menor relativamente incapaz deveria lançar seu ciente no mandado de citação juntamente com de seu representante legal para que iniciassem os efeitos de tal ato processual.
Porém, no mandado de citação realizado, bem como na certidão lavrada pelo Sr. Oficial de Justiça, tão-somente o representante legal da agravada Juliana Pavan restou citado acerca da ação de execução da obrigação de fazer promovida pelos ora agravantes.
Impossível seria conceber que a parte executada, mesmo que menor de idade e relativamente incapaz, tomou conhecimento da ação ajuizada visando a satisfação da obrigação de fazer.
Assim sendo, temos para nós que nula foi a citação realizada em relação a Juliana Pavan.
Neste ínterim, abre-se um parênteses para serem tecidos comentários acerca do Código Civil que entrou em vigor em janeiro p.p., especialmente no que se refere a alteração da maioridade civil e, consequentemente, a capacidade para a prática dos atos da vida civil.
O grande cerne do presente recurso está ligado a nulidade da citação, bem como a alteração da idade civil introduzida pela Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002.
Saliente-se o disposto nos artigos 6º e 9º, caput do Código Civil de 1916, vigente à época dos fatos:
"Art. 6º. São incapazes, relativamente a certos atos (art. 147, n. I), ou à maneira de os exercer:
I - Os maiores de dezesseis e os menores de vinte e um anos (arts. 154 a 156).
II - Os pródigos.
III - Os silvícolas.
Art. 9º. Aos vinte e um anos completos acaba a menoridade, ficando habilitado o indivíduo para todos os atos da vida civil."
Ressalte-se, todavia, que o vigente Código Civil, instituído através da Lei n. 10.406 de 10 de janeiro 2002, modificou a idade para que se adquira a capacidade civil plena. Impõem os artigos 4º e 5º, caput da Lei Adjetiva:
"Art. 4º. São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer:
I - os maiores de 16 (dezesseis) e os menores de 18 (dezoito) anos;
II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido;
III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;
IV - os pródigos.
Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.
Art. 5º. A menoridade cessa aos 18 (dezoito) anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil."
Em "Novo Código Civil Comentado" (Ed. Saraiva; São Paulo, 2002. p. 10/13), obra elaborada sob a coordenação de Ricardo Fiuza, Maria Helena Diniz assim expõe com referência aos menores relativamente capazes e a redução da idade civil:
"Incapacidade relativa: A incapacidade relativa diz respeito àqueles que podem praticar por si os atos da vida civil desde que assistidos por quem o direito encarrega desse ofício, em razão de parentesco, de relação de ordem civil ou de designação judicial, sob pena de anulabilidade daquele ato (CC, art. 171, I), dependente da iniciativa do lesado, havendo até hipóteses em que tal ato poderá ser confirmado ou ratificado. Há atos que o relativamente incapaz pode praticar, livremente, sem autorização.
Maiores de dezesseis e menores de dezoito anos: Os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos só poderão praticar atos válidos se assistidos pelo seu representante. Caso contrário serão anuláveis.
(...)
A principal alteração verificada neste dispositivo em relação ao texto original do Projeto n. 634, procedida ainda pelo Senado Federal, consistiu na redução da maioridade civil de 21 para 18 anos. A questão da redução da maioridade civil há muito já não suscitava mais qualquer controvérsia tanto no seio da comunidade jurídica como na sociedade de uma maneira geral. As justificativas apresentadas perante o Senado traduzem bem essa posição, in verbis: "Substancialmente, as modificações propostas pela emenda decorrem da fixação da maioridade civil em dezoito anos". E no particular procede. A tendência prevalecente é no sentido de fixar a maioridade civil em dezoito anos. Assim a estabelece o Código Civil italiano, de 1942 (art. 2º), o português (de 1966), com as alterações de 1977 (art. 130), o francês, com as inovações da Lei 1974 (art. 488). Esta é a consagração, também, da Constituição espanhola de 1978 (art. 12). Acresce que nossa Constituição prestigia essa tendência. Restringe a inimputablidade penal aos menores de dezoito anos, sujeitando-os a legislação especial (art. 228). Considera o alistamento eleitoral e o voto obrigatórios para os maiores dessa idade e facultativos para os maiores de dezesseis anos (art. 14, § 1º, I e II, c). E estipula a idade de vinte e um anos como condição de elegibilidade "para deputado federal, deputado estadual ou distrital, vice-prefeito e juiz de paz", bem assim a de 18 para verador (art. 14, § 3º, VI, c e d), o que corrobora a fixação da maioridade aos dezoito anos. Essa inclinação legislativa repousa, também, na certeza de que os meios de comunicação transmitem, permanentemente e crescentemente, conhecimentos e informações que ampliam o poder de observação das pessoas e de discernimento dos fatos. (...).
(...)
Maioridade: Em relação à menoridade, a incapacidade cessará quando o menor completar dezoito anos, segundo nossa legislação civil. Ao atingir dezoito anos a pessoa tornar-se-á maior, adquirindo a capacidade de fato, podendo, então, exercer pessoalmente os atos da vida civil".
Na mesma esteira dissertam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery:
"3. Ato processual praticado por relativamente incapaz é anulável. CC171 I e CPC 7.º e 8.º. Para a validade do ato os relativamente incapazes deveriam ter sido assistidos por seus pais, curadores ou tutores (CC 1690).
(...)
2. Capacidade de fato ou de exercício. Com a idade de dezoito anos completos a pessoa atinge a maioridade plena, adquirindo capacidade de exercício, isto é, capacidade para praticar todos os atos da vida civil". ("Novo Código Civil e Legislação Extravagante Anotados". Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2002. p. 10/11).
Ensina Vilian Bollmann acerca da questão:
"No que se refere aos relativamente incapazes, a principal modificação é redução da idade para aquisição de capacidade plena de 21 (vinte e um) para 18 (dezoito) anos, acompanhando a tendência internacional quanto a este limite, observada nos Códigos posteriores ao de 1916, tais como Italiano (1942), Português (1966, com alterações em 1977), Francês (alteração em 1974), bem como pela Constituição espanhola de 1978. Essa modificação é representativa, e poderá, no futuro, indicar a redução da maioridade em outros ramos do Direito, como, por exemplo, o Direito Penal, desde que modificada, também, a Constituição da República ". ("Novo Código Civil - Princípios, Inovações na Parte Geral e Direito Intertemporal". Ed. Juarez de Oliveira, São Paulo, 2003. p. 24).
Washington de Barros Monteiro acentua:
"O art. 5º do Código Civil de 2002 enfatiza a cessação da menoridade aos dezoito anos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil. Com essa idade, portanto, apto está o indivíduo a praticar todos os atos da vida civil, sem restrições impostas pela idade, situação que se prolongará por toda a vida, uma vez que inexiste idade que ponha fim à capacidade assim adquirida". ("Curso de Direito Civil - Volume 1 - Parte Geral". Ed. Saraiva, 39ª ed.; São Paulo, 2003. p. 72).
Registra, a propósito, Fábio Ulhoa Coelho:
"A idade é um fator que suprime ou limita a capacidade de todas as pessoas físicas durante algum tempo de suas vidas. Ao contrário dos demais fatores, que dizem respeito forçosamente a uma parcela das pessoas - uma parcela minoritária (...) -, a pouca idade é uma causa de incapacidade que alcança todos os homens e mulheres indistintamente. Considera-se que, até passar certo número de anos na vida de qualquer homem ou mulher, não estão eles suficientemente maduros, do ponto de vista emocional e intelectual, para cuidar diretamente de seus bens e interesses. As pessoas físicas, assim, se dividem em maiores e menores. "Maior", para efeitos civis, é a pessoa física com 18 anos ou mais. A lei civil chama de "menor" o homem ou mulher com menos de 18 anos de idade completos, e os classifica como "impúberes" (até 16 anos) e "púberes" (entre 16 e 18 anos). Os primeiros têm incapacidade absoluta e os últimos, relativa.
Diz a lei que a menoridade cessa aos 18 anos completos (CC, art. 5º). Isso significa que a maioridade tem início à zero hora do primeiro dia seguinte àquele em que a pessoa completou seu décimo oitavo aniversário. Como os anos se contam em anos, no direito civil (CC, art. 132, § 3º), é irrelevante a hora do nascimento da pessoa como marco do início da maioridade. Duas crianças nascidas no mesmo dia, a primeira à 01:00 hora e a segunda, às 23:00 horas, alcançarão a maioridade ao mesmo tempo: à 00:00 hora do dia imediatamente seguinte ao correspondente ao nascimento, dezoito anos após". ("Curso de Direito Civil - Volume 1". Ed. Saraiva, ; São Paulo, 2003. p.163/164).
A grande dúvida a respeito do tema se encontra ligado ao direito intertemporal, ou seja, a partir de que momento a norma referente à maioridade imposta pela novel legislação será aplicada aos casos concretos?
De forma brilhante enuncia Antonio Jeová Santos em sua recente obra "Direito Intertemporal e o novo Código Civil" (Ed. Revista dos Tribunais; São Paulo, 2003. p. 121):
"No atual Código Civil, a plena capacidade de direito ocorre aos 18 anos, ad instar do art. 5.º do CC/2002, textual: "A menoridade cessa aos 18 (dezoito) anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil".
Na vigência do Código Beviláqua, a menoridade cessava aos 21anos de idade. A interrogação é se as pessoas que já tinham 18 anos por ocasião em que o Código Civil de 2002 entrou em vigor já gozaram, de imediato, das benesses e responsabilidades impostas pela maioridade civil. A aplicação da regra é imediata, porque a lei diminuiu a idade para que a pessoa atinja plena capacidade. O efeito imediato da lei acontece de pronto e alcança todos aqueles que contavam 18 anos à época da vigência do Código Civil de 2002. "Entretanto, se a lei nova abrevia o tempo da incapacidade, nem por isto valida os atos praticados por alguém em época em que seria menor segundo a lei então vigente, e maior, se estivesse em vigor o diploma recente. Assim acontece porque toda vez que uma norma antecipa o advento da maioridade, os que já haviam atingido o novo limite consideram-se maiores, porém a partir da data do último diploma. Por exemplo: alcançava-se a capacidade plena aos vinte e cinco anos; nova lei reduziu o tempo a vinte e um; os que tinham chegado aos vinte e um e ainda não aos vinte e cinco, são considerados maiores, não a partir do dia em que completaram vinte e um, e, sim, daquele em que entrou em vigor a última regra positiva" (Carlos Maximiliano, Direito intertemporal, p. 68).
Todos aqueles que contavam menos de 21 anos, mas já contavam 18 anos no dia em que o Código Civil de 2002 entrou em vigor, automaticamente se tornaram capazes para todos os atos da vida civil, sem que seja lícita inferir desta conclusão que a lei teve função retroativa. O que houve foi a aplicação imediata da lei nova".
Ultrapassadas as considerações atinentes ao atual Código Civil (Lei n. 10.406/2002), mister se faz salientar o disposto no Código de Processo Civil em seus artigos 7º e 8º:
"Art. 7º. Toda pessoa que se acha no exercício dos seus direitos tem capacidade para estar em juízo.
Art. 8º. Os incapazes serão representados ou assistidos por seus pais, tutores ou curadores, na forma da lei civil".
Portanto, somente com a entrada em vigor do novo Código Civil a agravada Juliana Pavan adquiriu a plena capacidade, sendo que reconhece-se que a citação realizada a menor relativamente incapaz à época padece de vício, que acarretou sua nulidade.
Entretanto, com razão estão os agravados no que tange a alegação da aplicabilidade do artigo 214, § 2º do Código Processo Civil.
Impõe a supracitada norma:
"Art. 214. Para a validade do processo é indispensável a citação inicial do réu.
(...)
§ 2º. Comparecendo o réu apenas para argüir a nulidade e sendo esta decretada, considerar-se-á feita a citação na data em que ele ou seu advogado for intimado da decisão".
Acerca da questão, lecionam Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery:
"Declaração de nulidade do ato. Se a parte comparece para apontar a nulidade dos atos de comunicação (intimações, citações etc.) e o juiz reconhece a falha de sua realização e a declara, considerar-se-á feita a comunicação na data da intimação da decisão que anulou o ato, interpretando-se, para o caso das intimações, o CPC 213 (sic) § 2º analogicamente (RT 506/167). Há jurisprudência no sentido de se considerar feita a comunicação do ato na oportunidade em que a parte compareceu para alegá-la, quando o argüente for o destinatário da comunicação maculada (RT 557/157)".
"Devolução do Prazo. Comparecendo o réu para alegar nulidade da citação, reconhecida esta reabre-se o prazo para apresentação de defesa (JC 13/205)". ("Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor". Ed. Revista dos Tribunais, 3ª ed.; São Paulo, 1997. p. 499)
Consta da célebre obra de Theotônio Negrão:
"Acatando o juiz argüição da parte de nulidade de citação pela ausência de prazo de defesa, dito prazo inicia-se a partir da intimação do advogado do decreto de nulidade (art. 214 § 2º do CPC), independentemente de ter havido nova e desnecessária citação" (STJ - 4ª Turma, REsp 61.430-9 -AL, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 22.8.95, não conheceram, v.u., DJU 11.9.95, p. 28.833). Mas: "Se a argüição for rejeitada, não se reabre o prazo para resposta" (RSTJ 95/243)". ("Código de Processo Civil e legislação processual em vigor". Ed. Saraiva, 31ª ed.; São Paulo, 2000. p. 268/269).
Em outras ocasiões, já gizou esse Tribunal de Justiça:
"APELAÇÃO CÍVEL - COBRANÇA - CITAÇÃO - NULIDADE - RECONHECIMENTO - EXEGESE DO ART. 214, § 2º, DO CPC - INTIMAÇÃO PARA REABERTURA DO PRAZO DE CONTESTAÇÃO - INOCORRÊNCIA - RECURSO PROVIDO.
O prazo para resposta, na hipótese do § 2º do art. 214 do CPC, flui do dia útil seguinte à intimação da decisão que reconhece a nulidade do ato citatório.
O envio de intimação pelo correio, com aviso de recebimento, a local diverso daquele declinado na procuração, deixando o seu destinatário de tomar ciência do ato praticado, obsta qualquer conseqüência processual, pela não perfectibilização da comunicação promovida". (Apelação cível n. 98.014829-4, de Orleans, rel. Des. Wilson Augusto do Nascimento).
"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - IRREGULARIDADE DA INTIMAÇÃO DA SENTENÇA - PRAZO PARA RECORRER COMPUTADO A PARTIR DA DATA DA DECISÃO QUE RECONHECEU A AUSÊNCIA DA CIENTIFICAÇÃO DO LITISCONSORTE NECESSÁRIO - ACOLHIMENTO DOS EMBARGOS
"Se a parte comparece para apontar a nulidade dos atos de comunicação (intimações, citações etc.) e o juiz reconhece a falha de sua realização e a declara, considerar-se-á feita a comunicação na data da intimação da decisão que anulou o ato, interpretando-se, para o caso das intimações, o CPC 213 § 2° analogicamente (RT 506/167)" (Nelson Nery Júnior. Código de Processo Civil Comentado. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 686)". (Embargos de Declaração em Apelação Cível em Mandado de Segurança n. .2001.021809-7, da Capital, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros).
No caso em análise, a executada Juliana Pavan compareceu ao processo somente para argüir a nulidade que restou reconhecida.
Assim, têm-se que no presente caso é de se aplicar o disposto no artigo 214, § 2º do Código Instrumental Civil, todavia, iniciando a fluência do prazo constante do mandado citatório para a resposta dessa executada tão-somente após o trânsito em julgado da presente decisão.
DECISÃO:
Ampara-se o recurso de agravo de instrumento interposto para, nos termos do voto do relator, reconhecer-se a validade da citação de João Koddermann Filho, aplicando-se o disposto no artigo 214, § 2º do Código de Processo Civil em relação a citação de Juliana Pavan.
Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Exmos. Srs. Des. Fernando Carioni e Gastaldi Buzzi.
Pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, lavrou parecer o Exmo. Sr. Dr. Mário Gemin.
Florianópolis, 13 de novembro de 2003.
Trindade dos Santos
PRESIDENTE E
RELATOR
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