Acórdão: Apelação Cível n. 2006.008838-7, de Itajaí.
Relator: Des. Joel Figueira Junior.
Data da decisão: 17.07.2007.
Publicação: DJSC Eletrônico n. 287, edição de 11.09.2007, p. 112.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ALIMENTOS. PENSÃO ALIMENTÍCIA. PEDIDO DE REDUÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVA DA IMPOSSIBILIDADE EM ARCAR COM O PAGAMENTO DA IMPORTÂNCIA FIXADA. OBSERVÂNCIA DO BINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 1694, § 1º DO CÓDIGO CIVIL/02. QUANTUM MANTIDO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
Para a fixação da verba alimentar, devem ser observadas não somente as necessidades dos alimentandos, mas também a capacidade de quem irá provê-la. Desta forma, o dever de prestar alimentos está condicionado ao binômio necessidade/possibilidade. Assim, não tendo o réu apresentado provas robustas sobre a sua capacidade financeira de arcar com a verba alimentar, presume-se correto o montante fixado a título de alimentos para a infante.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2006.008838-7, da comarca de Itajaí (Família, Órfãos, Infância e Juventude), em que é apelante H. A. de S., e apelado A. de C. de S.:
ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Sem custas (Lei 1.060/50).
RELATÓRIO
A. de C. de S. ajuizou ação de alimentos contra H. A. de S. pelos fatos e fundamentos jurídicos descritos na exordial (fls. 02/07), alegando, em síntese, que:
A genitora da Autora e o Réu viveram maritalmente durante quatro anos (janeiro de 1998 à 11 de novembro de 2002),e, dessa união, nasceu a Requerente, em 01 de agosto de 1998.
Porém, após a separação do casal o Demandado deixou de contribuir com o seu sustento, ficando tudo a cargo da genitora.
Ao final, requer a procedência do pedido para condenar o Réu a pagar a título de pensão alimentícia valor equivalente a um salário mínimo, bem como arcar com a verba sucumbencial.
À causa foi atribuído o valor de R$ 3.600,00 (três mil e seiscentos reais) e a inicial veio instruída com os documentos de fls. 08/14.
O despacho inaugural (fls. 16) fixou alimentos provisionais em valor equivalente a 60% do salário mínimo e designou audiência de conciliação, instrução e julgamento. Citado (fls. 27), o Réu compareceu à audiência designada, resultando infrutífera a conciliação (fls. 35). Na mesma oportunidade, o Demandado ofereceu resposta em forma de contestação (fls. 37/40), aduzindo, em síntese, que não possui condições de arcar com o valor arbitrado a título de alimentos para a infante. Os alimentos devem ser fixados em montante equivalente a 40% do salário mínimo.
Foi produzida prova oral (fls. 36).
As Partes apresentaram suas alegações finais em forma de memorais (fls. 49/54 e 56/59).
Com vista dos autos o representante do Ministério Público, opinou pela fixação de um salário mínimo a título de alimentos para a filha do casal (fls. 67/69)
Sentenciando (fls. 70/72), o Magistrado "a quo" julgou o pedido procedente a fim de condenar o Réu a pagar um salário mínimo a título de pensão alimentícia para a filha, além da verba sucumbencial.
O Requerido interpôs embargos de declaração (fls. 76/85) que foram parcialmente acolhidos apenas no tocante ao deferimento dos benefícios da assistência judiciária gratuita (fls. 84/85).
Inconformado, o Demandado interpôs o presente recurso (fls. 89/94) objetivando, em síntese a reforma da sentença para que os alimentos sejam arbitrados em valor equivalente a 30% de um salário mínimo.
Devidamente intimada (fls. 97) a parte autora deixou transcorrer in albis o prazo para apresentar contra-razões (fls. 97).
A douta Procuradoria-Geral de Justiça no parecer da lavra do Procurador de Justiça, Tycho Brahe Fernandes, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso.
Presentes os requisitos de admissibilidade do recurso.
É o relatório.
VOTO
O recurso interposto pelo Réu há de ser conhecido e desprovido, pelas razões bem lançadas no parecer do douto Procurador de Justiça, Tycho Brahe Fernandes, o qual acolho como razão de decidir, transcrevendo-o, in verbis:
"(...) Para a correta análise da situação posta nos autos, cumpre verificar se os três pressupostos da obrigação alimentar, quais sejam, 'o parentesco [...]; a necessidade e a incapacidade de se sustentar por si próprio; e a possibilidade de fornecer alimentos de parte do obrigado' (RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n. 10.406, de 10.01.2002, 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, . P. 738), fizeram-se presentes no caso em apreço.
O parentesco entre apelante e apelada é inegável (fls. 10).
A necessidade de percepção da verba pela apelada, criança que conta, atualmente, com 7 (sete) anos e 8 (oito) meses de idade (fls. 10), mas que litiga no presente feito em busca de alimentos há mais de 3 (três) anos (fls. 2), ou seja, quase metade de sua vida, é presumida, vez que é sabido que menores nesta faixa etária acarretam uma série de gastos relativamente altos a serem despendidos pelos pais.
Sabe-se, ainda que mais do que direito a provisão de suas necessidades básicas, tem a apelada direito a alimentos civil, conforme lição de Maria Berenice Dias (in Manual de direito das famílias. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 449/450):
'O alargamento do conceito de alimentos levou a doutrina a distinguir alimentos civis e naturais. Alimentos naturais são os indispensáveis à subsistência, como alimentação, vestuário, saúde, habitação, educação, etc. Alimentos civis são os destinados a manter a qualidade de vida do credor, de modo a preservar o padrão de vida e o status social. Essa distinção, agora trazida à esfera legal, de há muita era sustentada pela doutrina e subsidiava a jurisprudência na fixação dos alimentos de forma diferenciada, em conformidade com a origem da obrigação, ao serem qualificados os alimentos destinados aos filhos, ex-cônjuge ou ex-companheiro. À prole eram deferidos alimentos civis, assegurando compatibilidade com a condição social do alimentante, de modo a conceder aos filhos a mesma qualidade de vida dos pais'(grifei).
No que tange a capacidade econômica-financeira do apelado, aspecto de difícil mensuração no caso em apreço, fez-se presente no momento em que afirma se sustentar exercendo trabalhos eventuais ['vive de bicos' (fls. 91)], de onde certamente extrai sua renda.
Registro ainda que apesar de postular a reforma da decisão para que 'seja diminuído o valor de pensão para 30% (trinta por cento) de um salário mínimo' (fls. 94), admitiu em suas alegações finais, 'Em sede de pedido alternativo, pela redução do valor concedido a título de alimentos provisórios no montante de 60% (sessenta por cento) de um salário mínimo' (fls. 58).
A manutenção de uma criança é algo sério, sendo inadmissível que um pai venha regatear o valor devido da forma que o fez.
Ora, se admite a possibilidade de pagar alimentos para a filha, mesmo que em sede de postulação alternativa, no percentual de '60% (sessenta por cento) de um salário mínimo' (fls. 58), é porque tem condições para tanto.
A diferença entre esse percentual e aquele fixado na sentença não é grande para quem paga os alimentos, mas é significativa para a criança que recebe a verba que é destinada ao seu sustento.
Relevante afirmar que era ônus do apelante a comprovação da sua real capacidade econômica-financeira, tendo ele se omitido completamente em produzir qualquer prova que corroborasse na correta fixação do quantum alimentar.
Acerca do ônus da prova em ações de alimentos expõe Maria Berenice Dias (op. Cit. P. 476):
'Vem se consolidando o entendimento de que, nas demandas alimentares, inverte-se a divisão tarifária do encargos probatórios (CPC 333). Ao autor cabe tão-só comprovar a obrigação do réu de prestar-lhe alimentos. [...] Não há como impor ao alimentado a prova dos ganhos do réu, pessoa com quem não vive e, muitas vezes, nem convive, o que torna quase impossível o acesso sbore seus rendimentos. O autor, caso ainda não atingida a maioridade civil, sequer necessita provar suas necessidades, pois essas são presumidas. Transfere-se ao réu o encargo de demonstrar os fatos modificativos ou impeditivos do direito do autor. Precisa o alimentante provar seus rendimentos, eis não dispor o alimentado de acesso a tais dados, porquanto gozam de sigilo e integram o direito constitucional à privacidade, à inviolabilidade da vida privada (CF 5ºX)' (grifei).
Oportuno, ainda, mencionar decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, no Agravo de Instrumento n. 70010593614, relatado pelo Des. Luiz Felipe Brasil Santos: Em demandas alimentares, é do alimentante o ônus da prova acerca de sua impossibilidade de prestar o valor postulado pela autora [...]. Não há a mínima prova nos autos sobre os ganhos do recorrente, enquanto as necessidades do investigante são presumidas pela menoridade' (grifei).
Verificada, assim, a presença dos pressupostos que autorizam a fixação da obrigação alimentar e presumindo atendido o binômio necessidade/possibilidade, disposto no parágrafo 1º do artigo 1.694 do CPC, quando da fixação do quantum da verba, entendo que o recurso de apelação interposto deve ser improvido, mantendo-se o pensionamento no importe em que fixado. (...)" (fls. 104/105).
DECISÃO
Nos termos do voto do relator, decidiu a Primeira Câmara de Direito Civil, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
Participaram do julgamento, os Excelentíssimos Desembargadores Maria do Rocio Luz Santa Ritta e Henry Petry Júnior.
Pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, lavrou parecer o Excelentíssimo Procurador de Justiça Tycho Brahe Fernandes.
Florianópolis, 17 de julho de 2007.
Maria do Rocio Luz Santa Ritta
PRESIDENTE
Joel Dias Figueira Júnior
RELATOR
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