Criação de nova vara e “perpetuatio jurisdictionis” - 1
A 1ª Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se pleiteia o reconhecimento da competência de vara federal com jurisdição sobre o Município de Unaí/MG para processar e julgar crimes dolosos contra a vida de auditores-fiscais do trabalho. A impetração alega a nulidade de acórdão do STJ, proferido em reclamação, que cassara decisão do juízo federal em Belo Horizonte/MG, o qual declinara de sua competência, ante a criação da mencionada vara federal em Unaí/MG, local em que ocorreram os homicídios. Sustenta, ainda, cerceamento de defesa em face de ausência de intimação da parte interessada para se manifestar sobre a referida reclamação. Além disso, aduz que a decisão do STJ teria afrontado orientação desta Corte sobre a matéria (HC 89849/MG, DJU de 16.2.2007). O Ministro Marco Aurélio, relator, concedeu a ordem para fixar a competência da vara federal no Município de Unaí/MG, a fim de que esta realize o júri. Inicialmente, afirmou que a reclamação poderia implicar o afastamento de situação constituída que seria favorável aos pacientes. Ponderou que se mostraria irrefutável o direito do cidadão de ter ciência de quando o processo fosse colocado em pauta, porque lhe assistiria o direito de, por seu defensor, assomar à tribuna para fazer sustentação oral, além de distribuir memoriais aos integrantes do órgão julgador. Entretanto, entendeu possível a aplicação do § 2º do art. 249 do CPC (“Quando puder decidir do mérito a favor da parte a quem aproveite a declaração da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato, ou suprir-lhe a falta”). Aduziu que o Plenário, ao assentar a perpetuação da jurisdição (RHC 83181/RJ, DJU de 22.10.2004), levara em conta o que disposto no art. 87 do CPC (“Determina-se a competência no momento em que a ação é proposta. São irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem o órgão judiciário ou alterarem a competência em razão da matéria ou da hierarquia”).
HC 117871/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 1º.10.2013. (HC-117871)
HC 117832/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 1º.10.2013. (HC-117832)
Criação de nova vara e “perpetuatio jurisdictionis” - 2
O Ministro Marco Aurélio salientou, ainda, que o Plenário não emitira entendimento sob a óptica da prática de crime doloso contra a vida. Consignou que estaria implícito no preceito constitucional (CF, art. 5º, XXXVIII) o julgamento do acusado pelos próprios pares. Rememorou que no julgamento do HC 89849/MG, a Turma assentara que a incidência da perpetuatio jurisdictionis nos crimes dolosos contra a vida somente se justificaria na fase anterior ao julgamento pelo júri. Sublinhou que, no caso, houvera a instrução processual no juízo federal de Belo Horizonte/MG e este viera a declinar da competência ante a criação da vara federal no Município de Unaí/MG, local em que ocorreram os homicídios e onde o paciente teria domicílio, segundo a denúncia. Enfatizou que não bastasse a regra linear do art. 70 do CPP (“A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução”), ter-se-ia a peculiaridade de tratar-se de crime doloso contra a vida submetido ao tribunal do júri. Assim, a interpretação sistemática do arcabouço jurídico constitucional seria conducente a assentar-se a competência do júri da vara federal criada no Município de Unaí/MG.
HC 117871/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 1º.10.2013. (HC-117871)
HC 117832/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 1º.10.2013. (HC-117832)
Criação de nova vara e “perpetuatio jurisdictionis” - 3
Em divergência, a Ministra Rosa Weber denegou a ordem. Entendeu não haver descumprimento pelo STJ de decisão do STF. Asseverou que a norma do art. 87 do CPC, consagradora da perpetuatio jurisdictionis como regra geral, só teria aplicação até o momento do libelo que antecederia o júri. Aduziu que não haveria preclusão do tema, porque, não existindo mais o libelo, houvera, no momento oportuno, a arguição da incompetência superveniente da vara federal em Belo Horizonte/MG. Ressaltou a perplexidade de se ter três acusados já julgados pela aludida vara federal em Belo Horizonte/MG. Afirmou que a matéria seria de competência relativa, de competência territorial. Reputou que a competência da Justiça Federal decorrera do envolvimento de servidores federais no exercício de suas funções. Frisou que, no entanto, não haveria vara federal do tribunal do júri em Belo Horizonte ou em Unaí. Afiançou que o direito do cidadão de ser julgado pelos seus pares significaria que os jurados seriam cidadãos leigos. Por fim, rejeitou a tese da nulidade por ausência de intimação. Recordou jurisprudência do STF no sentido de que a falta de intimação de interessados para julgamento de reclamação não geraria nulidade absoluta, porque a participação deles seria facultativa ou espontânea. Após o voto da Ministra Rosa Weber, pediu vista o Ministro Dias Toffoli.
HC 117871/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 1º.10.2013. (HC-117871)
HC 117832/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 1º.10.2013. (HC-117832)
Decisão veiculada no Informativo 722 do STF - 2013
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