Brasília, 27 a 31 de março de 2017 - Nº 859.
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Repercussão Geral
Contribuição social e ganhos habituais
Contribuição social do empregador rural sobre a receita da comercialização da produção
Responsabilidade subsidiária da Administração e encargos trabalhistas não adimplidos - 4
Direito sucessório e distinção entre cônjuge e companheiro - 2
1ª Turma
Abono de permanência e posse no TST
Recebimento da denúncia: fraude à licitação e peculato
Extradição e perda de nacionalidade brasileira
2ª Turma
Cumulação de proventos, pensões e cargos públicos inacumuláveis em atividade
Tráfico de drogas e fixação de regime inicial
Transcrições
Senador da República - Imunidade parlamentar material - Exclusão da tipicidade penal
(Pet 6.333/DF)
Inovações Legislativas
Outras Informações
PLENÁRIO
DIREITO TRIBUTÁRIO - CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS
Contribuição social e ganhos habituais
A contribuição social a cargo do empregador incide sobre ganhos habituais do empregado, quer anteriores ou posteriores à Emenda Constitucional 20/1998.
Com essa orientação, o Plenário negou provimento a recurso extraordinário em que se discutia o alcance da expressão “folha de salários” para fins de incidência da contribuição social.
De início, o Plenário observou que o conflito de interesses analisado envolvia período anterior e posterior à Emenda Constitucional 20/1998, que modificou o art. 195 da Constituição Federal (CF) e passou a prever que a contribuição incide sobre “folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, a pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício”.
Registrou que, no caso, a última cláusula não tem pertinência, pois o pedido se referia a valores pagos aos segurados empregados.
Asseverou que, antes mesmo da Emenda Constitucional 20/1998, o art. 201, § 4º, da CF previa que “os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e consequente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei”. Esse dispositivo não está ligado apenas à contribuição do empregado, haja vista a inexistência de qualquer cláusula que assim o restrinja, ou seja, encerra alusão à contribuição previdenciária.
Tendo isso em conta, o Colegiado concluiu que cabe proceder à interpretação sistemática dos diversos preceitos da CF. Dessa forma, se, de um lado, o art. 195, I, da CF disciplinava, antes da Emenda Constitucional 20/1998, que o cálculo da contribuição era devido pelos empregadores a partir da folha de salários; de outro, estes últimos, os salários, vieram a ser revelados, quanto ao alcance, pelo citado § 4º (atual § 11) do art. 201 da CF. Pelo disposto, remeteu-se à remuneração percebida pelo empregado, ou seja, às parcelas diversas satisfeitas pelo tomador dos serviços, exigindo-se, apenas, a habitualidade.
RE 565160/SC, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 29.3.2017. (RE-565160)
DIREITO TRIBUTÁRIO - LIMITAÇÃO AO PODER DE TRIBUTAR
Contribuição social do empregador rural sobre a receita da comercialização da produção
É constitucional formal e materialmente a contribuição social do empregador rural pessoa física, instituída pela Lei 10.256/2001, incidente sobre a receita bruta obtida com a comercialização de sua produção.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, deu provimento a recurso extraordinário em que se discutia a constitucionalidade do art. 25 da Lei 8.212/1991, com a redação dada pelo art. 1º da Lei 10.256/2001, que reintroduziu, após a Emenda Constitucional 20/1998, a contribuição a ser recolhida pelo empregador rural pessoa física sobre a receita bruta proveniente da comercialização de sua produção, mantendo a alíquota e a base de cálculo instituídas por leis ordinárias declaradas inconstitucionais em controle difuso pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O Colegiado observou que a Lei 9.528/1997 incluiu no “caput” do art. 25 da Lei 8.212/1991 a contribuição do empregador rural pessoa física, cuja base de cálculo é a receita bruta proveniente da comercialização da produção. Como a receita bruta não figurava no elenco do art. 195, I, da Constituição Federal (CF) como uma base de cálculo possível para a incidência de contribuições sociais, o STF, em dois precedentes, concluiu pela inconstitucionalidade do emprego dessa base de cálculo, a qual somente poderia ser instituída por lei complementar, nos termos do art. 195, § 4º, da CF.
Entretanto, com a Emenda Constitucional 20/1998, que incluiu a receita ao lado do faturamento como uma materialidade passível de ser tributada para fins de financiamento da seguridade social (CF, art. 195, I), passou a ser possível a instituição de contribuição patronal do empregador rural pessoa física com base na receita bruta proveniente da comercialização da produção. Assim, a Lei 10.256/2001 reincluiu a figura do empregador rural pessoa física na disciplina já existente e em vigor para o segurado especial — produtor rural que não tem empregados.
A Corte ressaltou que a norma impugnada, ao incluir um novo sujeito passivo no dispositivo de uma lei que já existia e já definia claramente os elementos do fato gerador, a base de cálculo e a alíquota, violou o princípio da legalidade.
Ademais, ao dar tratamento diferenciado para o produtor rural, o empregador rural pessoa física e o empregador urbano pessoa física, a lei em questão não ofendeu o princípio da isonomia, pois, se assim fosse, em nenhuma hipótese seria possível desonerar a folha de salários como política tributária.
Vencidos os ministros Edson Fachin (relator), Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Celso de Mello, que negavam provimento ao recurso.
Pontuavam que o art. 1º da Lei 10.256/2001, ao recolocar o empregador rural pessoa física na condição de contribuinte do tributo, sem dispor expressamente sobre os demais elementos da regra-matriz de incidência tributária, de modo a aproveitar do binômio base de cálculo/fato gerador e da alíquota já prevista para a figura do segurado especial, teria vulnerado a CF.
Não seria possível conceber técnica legislativa que permitisse o aproveitamento das alíquotas e bases de cálculo de contribuição social com inconstitucionalidade reconhecida pelo STF.
Consignavam que a Emenda Constitucional 20/1998 em nada teria alterado essa conclusão, pois inviável reputar a validade de uma norma legal anteriormente considerada inconstitucional, em decorrência de uma alteração formal da CF.
Além disso, haveria inconstitucionalidade material da norma impugnada também por patente violação ao princípio da isonomia, em virtude de injustificado tratamento diferenciado conferido aos empregadores pessoa física, a depender da ambiência do labor, se urbano ou rural.
Frisavam que também procederia a afirmação de que o empregador rural pessoa física seria duplamente tributado, em razão da incidência simultânea de contribuições sociais, o que atrairia a vedação ao “bis in idem”.
RE 718874/RS, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 29 e 30.3.2017. (RE-718874)
1ª Parte :
2ª Parte :
3ª Parte :
DIREITO ADMINISTRATIVO - SERVIDORES PÚBLICOS
Responsabilidade subsidiária da Administração e encargos trabalhistas não adimplidos - 4
O Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, conheceu em parte e, na parte conhecida, deu provimento a recurso extraordinário em que discutida a responsabilidade subsidiária da Administração Pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviço. Na origem, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve a responsabilidade subsidiária de entidade da Administração Pública tomadora de serviços terceirizados pelo pagamento de verbas trabalhistas não adimplidas pela empresa contratante. Isso ocorreu em razão da existência de culpa “in vigilando” do órgão público, caracterizada pela falta de acompanhamento e fiscalização da execução de contrato de prestação de serviços, em conformidade com a nova redação dos itens IV e V do Enunciado 331 da Súmula do TST (1). A recorrente alegava, em suma, que o acórdão recorrido, ao condenar subsidiariamente o ente público, com base no art. 37, § 6º, da Constituição Federal (CF), teria desobedecido ao conteúdo da decisão proferida no julgamento da ADC 16/DF (DJE de 9.9.2011) e, consequentemente, ao disposto no art. 102, § 2º, da CF. Afirmava, ainda, que o acórdão recorrido teria declarado a inconstitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/1993, embora a norma tenha sido declarada constitucional no julgamento da ADC 16/DF. Sustentava violação dos arts. 5º, II, e 37, “caput”, da CF, por ter o TST inserido no item IV do Enunciado 331 da sua Súmula obrigação frontalmente contrária ao previsto no art. 71, § 1º, da Lei de Licitações. Defendia, por fim, que a culpa “in vigilando” deveria ser provada pela parte interessada, e não ser presumida — v. Informativos 852,853 e 854.
Prevaleceu o voto do ministro Luiz Fux, que foi acompanhado pelos ministros Marco Aurélio, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia (Presidente) e Alexandre de Moraes. Entendeu que uma interpretação conforme do art. 71 da Lei 8.666/1993, com o reconhecimento da responsabilidade subsidiária da Administração Pública, infirma a decisão tomada no julgamento da ADC 16/DF (DJE de 9.9.2011), nulificando, por conseguinte, a coisa julgada formada sobre a declaração de constitucionalidade do dispositivo legal. Observou que, com o advento da Lei 9.032/1995, o legislador buscou excluir a responsabilidade subsidiária da Administração, exatamente para evitar o descumprimento do disposto no art. 71 da Lei 8.666/1993, declarado constitucional pela Corte. Anotou que a imputação da culpa “in vigilando” ou “in elegendo” à Administração Pública, por suposta deficiência na fiscalização da fiel observância das normas trabalhistas pela empresa contratada, somente pode acontecer nos casos em que se tenha a efetiva comprovação da ausência de fiscalização. Nesse ponto, asseverou que a alegada ausência de comprovação em juízo da efetiva fiscalização do contrato não substitui a necessidade de prova taxativa do nexo de causalidade entre a conduta da Administração e o dano sofrido. Ao final, pontuou que a Lei 9.032/1995 (art. 4º), que alterou o disposto no § 2º do art. 71 da Lei 8.666/1993, restringiu a solidariedade entre contratante e contratado apenas quanto aos encargos previdenciários resultantes da execução do contrato, nos termos do art. 31 da Lei 8.212/1991.
O ministro Alexandre de Moraes considerou inexistente a possibilidade de a Administração Pública vir a responder por verbas trabalhistas de terceiros a partir de mera presunção, hipótese admitida apenas quando houver prova inequívoca de falha na fiscalização do contrato. Ponderou que o § 6º do art. 37 da CF prevê a responsabilidade civil objetiva do Estado como exceção. Em seu entendimento, elastecer a responsabilidade do poder público em contratos de terceirização parece ser um convite para que se faça o mesmo em outras dinâmicas de colaboração com a iniciativa privada, como as concessões de serviços públicos. Asseverou que a consolidação da responsabilidade do Estado por débitos trabalhistas de terceiros, alavancada pela premissa de inversão do ônus da prova em favor do trabalhador, acabaria por apresentar risco de desestimulo à colaboração da iniciativa privada com a Administração Pública, estratégia essencial para a modernização do Estado.
Vencida a ministra Rosa Weber (relatora), acompanhada pelos ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello, que negavam provimento ao recurso. Concluíam: a) pela impossibilidade de transferência automática para a Administração Pública da responsabilidade subsidiária pelo descumprimento das obrigações trabalhistas pela empresa terceirizada; b) pela viabilidade de responsabilização do ente público em caso de culpa comprovada em fiscalizar o cumprimento dessas obrigações; e c) competir à Administração Pública comprovar que fiscalizou adequadamente o cumprimento das obrigações trabalhistas pelo contratado.
Em seguida, o Tribunal deliberou fixar a tese da repercussão geral em assentada posterior.
1. Enunciado 331 da Súmula do TST: “IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial; e V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei 8.666, de 21.6.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.”
RE 760931/DF, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgamento em 30.3.2017. (RE-760931)
DIREITO CIVIL - SUCESSÃO
Direito sucessório e distinção entre cônjuge e companheiro - 2
O Plenário retomou o julgamento de recurso extraordinário em que se discute a validade de dispositivos do Código Civil (CC) que atribuem direitos sucessórios distintos ao cônjuge e ao companheiro — v. Informativo 837.
No caso, a recorrente vivia em união estável, em regime de comunhão parcial de bens, há cerca de nove anos, até seu companheiro falecer, sem deixar testamento. O falecido não tinha descendentes nem ascendentes, mas apenas três irmãos. Diante desse contexto, o tribunal de origem, com fundamento no art. 1.790, III, do CC/2002 (1), limitou o direito sucessório da recorrente a um terço dos bens adquiridos onerosamente durante a união estável, excluídos os bens particulares do falecido, os quais seriam recebidos integralmente pelos irmãos. Porém, se fosse casada com o falecido, a recorrente teria direito à totalidade da herança.
O ministro Dias Toffoli, em voto-vista, negou provimento ao recurso. Pontuou que a norma civil apontada como inconstitucional não hierarquizou o casamento em relação à união estável, mas acentuou serem formas diversas de entidades familiares. Ressaltou que, nos termos do art. 226, § 3º, da Constituição Federal (CF) (2), o casamento não é união estável, o que autoriza, portanto, serem seus respectivos regimes jurídicos distintos.
Nesse sentido, ponderou que há de ser respeitada a opção dos indivíduos que decidem submeter-se a um ou a outro regime. Há que se garantir os direitos fundamentais à liberdade dos integrantes da entidade de formar sua família por meio do casamento ou da livre convivência, bem como o respeito à autonomia de vontade para que os efeitos jurídicos de sua escolha sejam efetivamente cumpridos.
Salientou que a restrição imposta pelo CC/2002 ao direito sucessório da união estável, quando comparado com o regime sucessório que vigorava anteriormente, disposto no art. 2º da Lei 8.971/1994 (3) e no art. 7º da Lei 9.278/1996 (4), é legítima — assim como tantas outras restrições a direitos civis que foram estabelecidas pelo novo CC e que foram realizadas sob o permissivo constitucional —, na medida em que o legislador optou, fundamentadamente, por garantir ao companheiro herdeiro, na hipótese de concorrer com os colaterais, o recebimento de um terço da herança.
Por fim, consignou que, havendo no futuro efetivas e reais razões fáticas e políticas para a alteração dessa norma, o espaço democrático para esses debates há de ser respeitado, qual seja, o Congresso Nacional, onde deverão ser discutidas as alternativas para a modificação da norma e seus impactos no ordenamento social.
Em seguida, o ministro Marco Aurélio pediu vista dos autos.
1. “Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho; II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles; III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;”
2. “Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º O casamento é civil e gratuita a celebração. § 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”
3. “Art. 2º As pessoas referidas no artigo anterior participarão da sucessão do(a) companheiro(a) nas seguintes condições: I – o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito enquanto não constituir nova união, ao usufruto de quarta parte dos bens do de cujos, se houver filhos ou comuns; II – o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito, enquanto não constituir nova união, ao usufruto da metade dos bens do de cujos, se não houver filhos, embora sobrevivam ascendentes; III – na falta de descendentes e de ascendentes, o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito à totalidade da herança. IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.”
4. “Art. 7° Dissolvida a união estável por rescisão, a assistência material prevista nesta Lei será prestada por um dos conviventes ao que dela necessitar, a título de alimentos. Parágrafo único. Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família.”
RE 878694/MG, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 30.3.2017. (RE-878694)
1ª Parte :
2ª Parte :
3ª Parte :
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PRIMEIRA TURMA
DIREITO ADMINISTRATIVO - SERVIDORES PÚBLICOS
Abono de permanência e posse no TST
A Primeira Turma, em julgamento conjunto, concedeu a ordem em mandados de segurança impetrados contra decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), na qual foram definidas as balizas para o pagamento de abono de permanência no âmbito do Judiciário federal.
No ato impugnado, determinou-se que os tribunais federais observassem o requisito do tempo mínimo de cinco anos no cargo, de carreira ou isolado, para o implemento do benefício, nos termos do art. 40, § 19, da Constituição Federal (CF).
No caso, a impetrante tomou posse como ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST) após o exercício da função de juíza de Tribunal Regional do Trabalho (TRT) até 2014, onde recebia, além do subsídio correspondente, o valor de 11% relativo ao abono de permanência. Sustentava que deveria continuar a percebê-lo, na condição de ocupante de cargo no Judiciário.
A Turma asseverou que a decisão do TCU teve efeito concreto, não foi um pronunciamento genérico, tampouco uma simples recomendação.
O Colegiado entendeu que o TCU conferiu interpretação restritiva ao § 19 do art. 40 da CF, confundindo o direito à aposentadoria no novo cargo com o direito ao abono.
Por fim, ponderou que, se a impetrante viesse a se desligar do cargo de ministra, ainda assim permaneceria com o direito a aposentar-se como juíza.
MS 33424/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 28.3.2017. (MS-33424)
MS 33456/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 28.3.2017. (MS-33456)
DIREITO PROCESSUAL PENAL - AÇÃO PENAL
Recebimento da denúncia: fraude à licitação e peculato
A Primeira Turma, por maioria, recebeu denúncia oferecida contra deputado federal pelos crimes de dispensa indevida de licitação e modificação ilegal de contrato administrativo, previstos nos arts. 89 (1) e 92 (2) da Lei 8.666/1993 (Lei das Licitações). Em seguida, o órgão fracionário, por maioria, acolheu a denúncia quanto ao delito de peculato, na modalidade desvio, previsto no art. 312, § 1º (3), do Código Penal (CP).
No caso, segundo a inicial acusatória, o parlamentar, então secretário de Estado, junto com outros acusados, teria — ao deflagrar processo administrativo que deu origem à contratação direta de determinada construtora — concorrido para a dispensa de licitação relativa à reforma de ginásio municipal, sob a justificativa de suposta situação de emergência.
Além disso, o acusado teria participado da celebração de termo aditivo para reforma e ampliação das instalações do ginásio, cujo valor em percentual estaria acima do permitido, bem como da elaboração de parecer jurídico que teria embasado a referida modificação contratual, o que afrontaria o art. 65, § 1º (4) da Lei de Licitações.
A denúncia narra, ainda, que o deputado teria autorizado o pagamento antecipado, sem antes ter observado a efetiva realização das obras, concorrendo assim diretamente para o desvio dos recursos públicos destinados à reforma do ginásio.
Preliminarmente, a Turma afastou a alegação de “bis in idem”. Afirmou que as condutas de dispensar licitação fora das hipóteses legais e de deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa constituem crime único.
No que se refere à dispensa de licitação, assentou, indiciariamente, que não ficou demonstrada situação de emergência ou de urgência.
Rejeitou a assertiva de que o tipo do art. 89 da Lei de Licitações seria inconstitucional. Consignou que o controle de constitucionalidade de tipos penais sob o parâmetro da ofensa ao princípio da proporcionalidade na fixação do “quantum” abstrato da pena deve ser excepcional e comedido e, no caso, não ficou demonstrado.
Quanto ao delito do art. 92 da Lei 8.666/1993, ressaltou que o quadro indiciário aponta que o aditivo contratual extrapolou as meras alterações qualitativas no contrato. Dessa forma, ficou descaracterizado o objeto do contrato. Ademais, os limites legais de alteração aparentemente foram descumpridos, em afronta ao § 1º do art. 65 da Lei 8.666/1993, o qual estabelece escala máxima de 50% para os acréscimos contratuais.
O fato de a dispensa de licitação e de o aditamento do contrato terem sido precedidos de parecer jurídico não é bastante para afastar o dolo, caso outros elementos externos indiciem a possibilidade de desvio de finalidade, ou de conluio entre o gestor e o responsável pelo parecer.
A Turma destacou a presença dos requisitos do art. 41 do CPP para o recebimento da denúncia, até mesmo para o suposto crime de peculato. Sublinhou que há, no inquérito, elementos que indicam a necessidade da abertura da ação penal também em relação ao suposto desvio de verbas públicas.
Vencida, em parte, a ministra Rosa Weber (relatora), que não recebia a denúncia quanto ao delito de peculato. Pontuava a violação do princípio do contraditório porque a defesa não teve acesso aos dados pertinentes à quebra do sigilo bancário da empresa lesada pela subtração dos recursos.
1. Lei 8.666/1993, art. 89: “Art.89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade: Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.”.
2. Lei 8.666/1993, art. 92: “Art. 92. Admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer modificação ou vantagem, inclusive prorrogação contratual, em favor do adjudicatário, durante a execução dos contratos celebrados com o Poder Público, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação ou nos respectivos instrumentos contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem cronológica de sua exigibilidade, observado o disposto no art. 121 desta Lei: Pena - detenção, de dois a quatro anos, e multa”.
3. Código Penal, art. 312, § 1º: “Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio: Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa. § 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário”.
4. Lei 8.666/1993, art. 65, § 1º: “Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos: (...) § 1º O contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o limite de 50% (cinqüenta por cento) para os seus acréscimos”.
Inq 3621/MA, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, 28.3.2017. (Inq-3621)
DIREITO CONSTITUCIONAL - EXTRADIÇÃO
Extradição e perda de nacionalidade brasileira
A Primeira Turma, por maioria, julgou procedente pedido formulado em extradição ajuizada pelo Governo dos Estados Unidos da América para assentar a possibilidade de entrega da extraditanda, brasileira nata naturalizada americana, acusada da suposta prática de homicídio doloso contra seu marido naquele país.
Inicialmente, a Turma relembrou que a perda da nacionalidade brasileira da extraditanda, decretada pelo Ministério da Justiça, teria sido validada no julgamento do Mandado de Segurança 33864/DF (DJE de 9.12.2016).
Asseverou que, na ocasião, a Turma, por maioria, firmou entendimento no sentido de que a Constituição Federal (CF), ao tratar da perda da nacionalidade brasileira, estabeleceu duas hipóteses: a) o cancelamento judicial da naturalização, em virtude da prática de ato nocivo ao interesse nacional, o que somente alcança brasileiros naturalizados (art. 12, § 4º, I); e b) a aquisição voluntária de outra nacionalidade secundária, o que alcança, indistintamente, brasileiros natos e naturalizados. Nesta última hipótese — a de aquisição de outra nacionalidade —, não se perde a nacionalidade brasileira em duas situações que constituem exceção à regra: a) tratar-se não de aquisição de outra nacionalidade, mas do mero reconhecimento de outra nacionalidade originária, considerada a natureza declaratória deste reconhecimento (art. 12, § 4º, II, “a”); e b) ter sido a outra nacionalidade imposta pelo Estado estrangeiro como condição de permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis (art. 12, § 4º, II, “b”). Entretanto, a situação da então impetrante não se enquadra em nenhuma dessas exceções, porque ela já detinha, desde muito antes de 1999, quando requereu a naturalização, o denominado “green card”, cuja natureza jurídica é a de visto de permanência e que confere, nos Estados Unidos da América, os direitos que alega ter pretendido adquirir com a naturalização: a permanência em solo norte-americano e a possibilidade de trabalhar naquele país. Em razão disso, desnecessária a obtenção da nacionalidade norte-americana para os fins que constitucionalmente revelam exceção à regra da perda da nacionalidade brasileira (CF, art. 12, II, § 4º, “a” e “b”). Ao contrário, a extraditanda pretendeu integrar-se àquela comunidade nacional, o que justamente constitui a razão central do critério adotado pelo constituinte originário para a perda da nacionalidade brasileira, critério este não excepcionado pela Emenda Constitucional 3/1994, que introduziu as exceções previstas nas alíneas “a” e “b” do § 4º do inciso II do art. 12 da CF.
Em seguida, a Turma considerou preenchidos todos os requisitos previstos na Lei 6.815/1980 e no Tratado de Extradição firmado entre o Brasil e os Estados Unidos. Também não vislumbrou nenhum dos óbices fixados no art. 77 da Lei 6.815/1980 ao deferimento do pedido: a) a extraditanda não é nacional brasileira; b) sua extradição foi requerida por Estado que mantém Tratado de Extradição com o Brasil; c) a pena máxima prevista para os crimes comuns — pelo qual responde — é superior a um ano de privação de liberdade (art. III do Tratado de Extradição); d) a prisão foi decretada por juízo regularmente instituído; e) o Brasil não é competente para o julgamento do crime; e f) o crime não tem conotação política.
No que concerne à alegação de não ter sido apresentada tradução juramentada em língua portuguesa dos documentos que instruem o pedido, o Colegiado entendeu que a expressão “tradução oficial”, utilizada pelo art. 80 do Estatuto do Estrangeiro, refere-se à tradução cuja autenticidade é certificada pelas autoridades do Estado requerente e cujo encaminhamento se dá por órgãos oficiais, o que confere a mencionada autenticidade, nos termos do art. IX do Tratado e da jurisprudência desta Corte (Ext 1100/República do Chile, DJE de 3.10.2008; Ext 1171/República da Argentina, DJE de 25.6.2010).
Observou que, no caso, a tradução foi certificada pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos da América, e os documentos encaminhados a esta Corte pelo Ministério da Justiça e pela via diplomática, não havendo falar-se em defeito de tradução.
Por fim, a Turma salientou não ser possível prosperar a cooperação quando houver o risco de imposição ao extraditando de penas não admitidas no ordenamento jurídico brasileiro. Assim, pode o Estado que coopera em matéria penal exigir o compromisso formal de que tais penas não serão eventualmente aplicadas ao extraditando entregue ao Estado requerente.
Dessa forma, deferiu o pedido de extradição e condicionou a entrega ao Estado requerente ao compromisso formal de: a) não aplicar penas interditadas pelo direito brasileiro, em especial a de morte ou prisão perpétua (CF, art. 5º, XLVII, “a” e “b”); b) observar o tempo máximo de cumprimento de pena previsto no ordenamento jurídico brasileiro de trinta anos (CP, art. 75); e c) detrair da pena o tempo que a extraditanda permaneceu presa para fins de extradição no Brasil.
Vencido o ministro Marco Aurélio, que indeferia o pedido, ao fundamento de persistir a condição de brasileira nata da extraditanda.
Ext 1462/DF, rel. Min. Roberto Barroso, 28.3.2017. (Ext-1462)
SEGUNDA TURMA
DIREITO ADMINISTRATIVO - SERVIDORES PÚBLICOS
Cumulação de proventos, pensões e cargos públicos inacumuláveis em atividade
A Primeira Turma concedeu mandado de segurança impetrado contra ato do Tribunal de Contas da União (TCU), que determinou à impetrada optar por uma das duas pensões que recebe em decorrência de aposentadorias de seu falecido esposo — servidor público civil aposentado pelo SNI e militar reformado do Exército —, ao fundamento de que a cumulação seria ilegal.
Inicialmente, afastou a preliminar de decadência. O acordão impugnado foi publicado em 3.3.2004, ao passo que o “mandamus” somente foi protocolado em 13.10.2004, mais de 120 dias após a ciência do ato impugnado, o que resultaria na perda do direito de ajuizar a ação mandamental.
O Colegiado, entretanto, asseverou que o fato de a impetrante haver sido favorecida por decisão liminar deferida em 10.11.2004 — portanto, há mais de doze anos — justifica avançar na análise da impetração.
Ressaltou a necessidade de encontrar solução alternativa que leve em consideração a eficiência processual e a primazia da decisão de mérito, normas fundamentais já incorporadas na estrutura do novo CPC (1 e 2).
Ademais, citou precedentes da Corte no sentido da superação de óbices processuais, quando necessária para adentrar no exame das questões de mérito. Apontou, ainda, precedente no sentido da obrigatoriedade da observância do princípio da segurança jurídica, diante da concessão de medidas liminares em processos cujos méritos são definitivamente julgados depois de passados muitos anos.
No mérito, a Turma anotou que o art. 11 (3) da Emenda Constitucional 20/1998 vedou expressamente a concessão de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência dos servidores civis previsto no art. 40 da Constituição Federal (CF). Registrou, no entanto, não haver qualquer referência à concessão de proventos militares, os quais são tratados nos arts. 42 e 142 do texto constitucional.
Ressaltou que, por cumular a percepção de pensão civil com pensão militar, a impetrante está enquadrada em situação não alcançada pela proibição da referida emenda. Por fim, o Colegiado apontou precedentes nesse sentido (4).
1 . CPC/2015: “Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.”
2 . CPC/2015: “Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.”
3 . EC 20/1998: “Art. 11 A vedação prevista no art. 37, § 10, da Constituição Federal, não se aplica aos membros de poder e aos inativos, servidores e militares, que, até a publicação desta Emenda, tenham ingressado novamente no serviço público por concurso público de provas ou de provas e títulos, e pelas demais formas previstas na Constituição Federal, sendo-lhes proibida a percepção de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência a que se refere o art. 40 da Constituição Federal, aplicando-se-lhes, em qualquer hipótese, o limite de que trata o § 11 deste mesmo artigo.”
4 . AI 375011/RS (DJU de 28.10.2004); RE 298694/SP (DJU de 23.4.2004); MS 22357/DF (DJU de 5.11.2004); MS 25192/DF (DJU de 6.5.2005); MS 24958/DF (DJU de 1º.4.2005); AI 801096 AgR-EDv/DF (DJE de 30.6.2015).
MS 25097/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 28.3.2017. (MS-25097)
DIREITO PENAL - CUMPRIMENTO DA PENA
Tráfico de drogas e fixação de regime inicial
A Segunda Turma, por maioria, concedeu a ordem em “habeas corpus” no qual se pretendia a alteração do regime prisional imposto ao paciente condenado pela prática do crime de tráfico de drogas — disposto no art. 33 da Lei 11.343/2006 (1) — a pena em regime inicial fechado, por força de decisão exarada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
No caso, o STJ deu parcial provimento a recurso especial interposto pelo Ministério Público para determinar o regime prisional fechado para o cumprimento inicial da pena.
A Turma asseverou que o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 anos e não exceda a 8 anos, tem o direito de cumprir a pena corporal em regime semiaberto, segundo o art. 33, § 2º, “b”, do CP (2), caso as circunstâncias judiciais do art. 59 (3) do mesmo diploma lhe sejam favoráveis.
Ademais, pontuou não haver fundamentação idônea necessária para a imposição de regime de cumprimento de pena mais gravoso – Enunciados 718 (4) e 719 (5) da Súmula do Supremo Tribunal Federal.
Por fim, salientou que não cabe ao STJ revolver fatos e provas para, analisando a quantidade e a qualidade de droga, impor ao réu regime prisional mais gravoso.
Vencido o ministro Edson Fachin, que indeferia a ordem. Para ele, a fixação de regime mais gravoso pelo STJ estaria devidamente justificada, pois, no julgamento da apelação, a pena-base ficou acima do mínimo legal, por ter sido considerada como desfavorável a circunstância do art. 42 da Lei 11.343/2006 (6).
1. Lei 11.343/2006: “Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.”
2. CP/1940: “Art. 33 – A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de detenção, em regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. (...) § 2º – As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: (...) b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto;”
3. CP/1940: “Art. 59 – O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: I – as penas aplicáveis dentre as cominadas; II – a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; III – o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade; IV – a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível.”
4. Enunciado 718 da Súmula do STF: “A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada.”
5. Enunciado 719 da Súmula do STF: “A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea.”
6. Lei 11.343/2006: “Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente.”
HC 140441/MG, rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 28.3.2017. (HC-140441)
Sessões |
Ordinárias |
Extraordinárias |
Julgamentos |
Julgamentos por meio eletrônico* |
Pleno |
29.03.2017 |
30.03.2017 |
5 |
71 |
1ª Turma |
28.03.2017 |
— |
5 |
129 |
2ª Turma |
28.03.2017 |
— |
4 |
115 |
* Emenda Regimental 51/2016-STF. Sessão virtual de 24 a 30 de março de 2017.
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Senador da República - Imunidade parlamentar material - Exclusão da tipicidade penal (Transcrições)
Pet 6.333/DF*
Relator: Ministro Celso de Mello
EMENTA: QUEIXA-CRIME. MANIFESTAÇÃO DE PARLAMENTAR (SENADOR DA REPÚBLICA) VEICULADA, NO CASO, EM REUNIÃO REALIZADA EM ÓRGÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL (SPU). IMUNIDADE PARLAMENTAR MATERIAL (CF, ART. 53, “CAPUT”). ALCANCE DESSA GARANTIA CONSTITUCIONAL. TUTELA QUE A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA ESTENDE A OPINIÕES, PALAVRAS E PRONUNCIAMENTOS DO CONGRESSISTA, INDEPENDENTEMENTE DO “LOCUS” (ÂMBITO ESPACIAL) EM QUE PROFERIDOS, DESDE QUE TAIS MANIFESTAÇÕES GUARDEM PERTINÊNCIA COM O EXERCÍCIO DO MANDATO REPRESENTATIVO. O “TELOS” DA GARANTIA CONSTITUCIONAL DA IMUNIDADE PARLAMENTAR, QUE SE QUALIFICA COMO CAUSA DESCARACTERIZADORA DA PRÓPRIA TIPICIDADE PENAL DA CONDUTA DO CONGRESSISTA EM TEMA DE DELITOS CONTRA A HONRA. DOUTRINA. PRECEDENTES. INADMISSIBILIDADE, NO CASO, DA PRETENDIDA PERSECUÇÃO PENAL POR CRIMES CONTRA A HONRA, EM FACE DA INVIOLABILIDADE CONSTITUCIONAL QUE AMPARA OS MEMBROS DO CONGRESSO NACIONAL. PARECER DO PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA, COMO “CUSTOS LEGIS”, PELA EXTINÇÃO DA “PERSECUTIO CRIMINIS”. JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL CONSOLIDADA QUANTO À MATÉRIA VERSADA NA PEÇA ACUSATÓRIA. POSSIBILIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE O RELATOR DA CAUSA DECIDIR, MONOCRATICAMENTE, A CONTROVÉRSIA JURÍDICA. COMPETÊNCIA MONOCRÁTICA QUE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL DELEGOU, VALIDAMENTE, EM SEDE REGIMENTAL (RISTF, ART. 21, § 1º). INOCORRÊNCIA DE TRANSGRESSÃO AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. PLENA LEGITIMIDADE JURÍDICA DESSA DELEGAÇÃO REGIMENTAL. EXTINÇÃO DO PROCEDIMENTO PENAL.
– A garantia constitucional da imunidade parlamentar em sentido material (CF, art. 53, “caput”) – que representa instrumento vital destinado a viabilizar o exercício independente do mandato representativo – protege o membro do Congresso Nacional, tornando-o inviolável, civil e penalmente, por quaisquer “de suas opiniões, palavras e votos”. Doutrina. Precedentes.
– Tutela que se estende a opiniões, palavras e pronunciamentos independentemente do “locus” (âmbito espacial) em que proferidos, desde que tais manifestações guardem pertinência com o exercício do mandato legislativo.
– A cláusula da inviolabilidade parlamentar qualifica-se como causa de exclusão constitucional da tipicidade penal da conduta do congressista em tema de delitos contra a honra, afastando, por isso mesmo, a própria natureza delituosa do comportamento em que tenha incidido. Doutrina. Precedentes.
– Reconhecimento, no caso, da incidência da garantia da imunidade parlamentar material em favor do congressista acusado de delitos contra a honra. Consequente extinção, na espécie, da “persecutio criminis”. Arquivamento dos autos.
DECISÃO: Trata-se de ação penal de iniciativa privada ajuizada por Valéria Veloso Caetano Soares, servidora pública federal, contra o Senador da República Hélio José da Silva Lima, imputando-lhe a suposta prática de crimes contra a honra da ora querelante, tendo em vista manifestação de referido parlamentar veiculada em reunião na Superintendência de Patrimônio da União no Distrito Federal.
O Ministério Público Federal, em pronunciamento da lavra do eminente Senhor Procurador-Geral da República, manifestou-se, em sua condição de “custos legis”, pela extinção do procedimento penal, com o consequente arquivamento dos autos, fazendo-o em parecer assim ementado (documento eletrônico 32):
“PENAL. PROCESSO PENAL. QUEIXA-CRIME. CRIMES CONTRA A HONRA. CALÚNIA, DIFAMAÇÃO E INJÚRIA (ARTS. 138, 139 E 140 DO CÓDIGO PENAL).
Imunidade parlamentar material. Supostas ofensas – relacionadas ao exercício do mandato – que se encontram protegidas pela inviolabilidade prevista no art. 53, 'caput', da Constituição da República. Parecer pela rejeição da queixa-crime.” (grifei)
Sendo esse o contexto, passo a apreciar a presente controvérsia jurídico-penal. E, ao fazê-lo, entendo incidir, na espécie, na linha do douto pronunciamento do eminente Procurador-Geral da República, a garantia constitucional da imunidade parlamentar em sentido material, por tratar-se de manifestação de membro do Congresso Nacional veiculada, “propter officium”, em reunião realizada em órgão da administração pública federal (SPU).
Assinale-se que, em tal situação, atua em favor do congressista em questão, que é Senador da República, a prerrogativa da imunidade parlamentar, que descaracteriza a própria tipicidade penal dos crimes contra a honra.
Com efeito, a cláusula da inviolabilidade parlamentar qualifica-se como causa de exclusão constitucional da tipicidade penal da conduta do congressista em tema de delitos contra a honra, afastando, por isso mesmo, a própria natureza delituosa do comportamento em que tenha incidido.
Como se sabe, a norma inscrita no art. 53, “caput”, da Constituição da República, na redação dada pela EC nº 35/2001, exclui, na hipótese nela referida, a própria natureza delituosa do fato que, de outro modo, tratando-se do cidadão comum, qualificar-se-ia como crime contra a honra, consoante acentua o magistério da doutrina (JOSÉ AFONSO DA SILVA, “Curso de Direito Constitucional Positivo”, p. 532, item n. 15, 20ª ed., 2002, Malheiros; CELSO RIBEIRO BASTOS, “Comentários à Constituição do Brasil”, vol. 4, tomo I/187, 1995, Saraiva; LUIZ FLÁVIO GOMES, “Imunidades Parlamentares: Nova Disciplina Jurídica da Inviolabilidade Penal, das Imunidades e das Prerrogativas Parlamentares (EC 35/01)”, “in” “Juizados Criminais Federais, Seus Reflexos nos Juizados Estaduais e Outros Estudos”, p. 94-97, item n. 4.9, 2002, RT; UADI LAMMÊGO BULOS, “Constituição Federal Anotada”, p. 705-707, 4ª ed., 2002, Saraiva, v.g.).
Impende referir, no ponto, o correto magistério de MICHEL TEMER (“Elementos de Direito Constitucional”, p. 131, item n. 5, 22ª ed., 2007, Malheiros):
“A inviolabilidade diz respeito à emissão de opiniões, palavras e votos.
Opiniões e palavras que, ditas por qualquer pessoa, podem caracterizar atitude delituosa, mas que assim não se configuram quando pronunciadas por parlamentar. Sempre, porém, quando tal pronunciamento se der no exercício do mandato. Quer dizer: o parlamentar, diante do Direito, pode agir como cidadão comum ou como titular de mandato. Agindo na primeira qualidade não é coberto pela inviolabilidade. A inviolabilidade está ligada à idéia de exercício de mandato. Opiniões, palavras e votos proferidos sem nenhuma relação com o desempenho do mandato representativo não são alcançados pela inviolabilidade.” (grifei)
Registre-se, por necessário, que a inviolabilidade emergente dessa regra constitucional não sofre condicionamentos normativos que a subordinem a critérios de espacialidade. É irrelevante, por isso mesmo, para efeito de legítima invocação da imunidade parlamentar material, que o ato por ela amparado tenha ocorrido, ou não, na sede, ou em instalações, ou perante órgãos do Congresso Nacional.
Cabe rememorar, por oportuno, que o exercício da atividade parlamentar não se exaure no âmbito espacial do Congresso Nacional, vale dizer, no recinto das Casas Legislativas que o compõem, a significar, portanto, que a prática de atos, pelo congressista, em função do seu mandato parlamentar (“ratione officii”), ainda que territorialmente efetivada em âmbito extraparlamentar, está igualmente protegida pela garantia fundada na norma constitucional em questão:
“O Supremo Tribunal Federal tem acentuado que a prerrogativa constitucional da imunidade parlamentar em sentido material protege o congressista em todas as suas manifestações que guardem relação com o exercício do mandato, ainda que produzidas fora do recinto da própria Casa Legislativa (RTJ 131/1039 – RTJ 135/509 – RT 648/318) ou, com maior razão, quando exteriorizadas no âmbito do Congresso Nacional (RTJ 133/90). (…).”
(RTJ 155/396-397, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
“MEMBRO DO CONGRESSO NACIONAL. ENTREVISTA JORNALÍSTICA CONCEDIDA A EMISSORA DE RÁDIO. AFIRMAÇÕES REPUTADAS MORALMENTE OFENSIVAS. PRETENDIDA RESPONSABILIZAÇÃO PENAL DA CONGRESSISTA POR SUPOSTA PRÁTICA DE CRIME CONTRA A HONRA. IMPOSSIBILIDADE. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DISPENSADA AO INTEGRANTE DO PODER LEGISLATIVO. IMUNIDADE PARLAMENTAR MATERIAL (CF, ART. 53, ‘CAPUT’). ALCANCE DESSA GARANTIA CONSTITUCIONAL. TUTELA QUE SE ESTENDE ÀS OPINIÕES, PALAVRAS E PRONUNCIAMENTOS, INDEPENDENTEMENTE DO ‘LOCUS’ (ÂMBITO ESPACIAL) EM QUE PROFERIDOS, ABRANGENDO AS ENTREVISTAS JORNALÍSTICAS, AINDA QUE CONCEDIDAS FORA DAS DEPENDÊNCIAS DO PARLAMENTO, DESDE QUE TAIS MANIFESTAÇÕES GUARDEM PERTINÊNCIA COM O EXERCÍCIO DO MANDATO REPRESENTATIVO. O ‘TELOS’ DA GARANTIA CONSTITUCIONAL DA IMUNIDADE PARLAMENTAR. DOUTRINA. PRECEDENTES. INADMISSIBILIDADE, NO CASO, DA PRETENDIDA PERSECUÇÃO PENAL POR DELITOS CONTRA A HONRA EM FACE DA INVIOLABILIDADE CONSTITUCIONAL QUE AMPARA OS MEMBROS DO CONGRESSO NACIONAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO PENAL.”
(Inq 2.330/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
É importante acentuar que os lindes em que se contém a incidência do instituto da imunidade parlamentar material devem ser interpretados em consonância com a exigência de preservação da independência do congressista no exercício do mandato parlamentar.
Assentadas tais premissas, observo que o exame dos elementos constantes destes autos permite-me reconhecer que o comportamento do congressista em questão – cujas declarações consideradas moralmente ofensivas foram por ele exteriorizadas em reunião realizada em órgão da administração pública federal – guarda estreita conexão com o desempenho do mandato legislativo, subsumindo-se, por essa específica razão, ao âmbito de incidência da proteção constitucional fundada na garantia da imunidade parlamentar material.
É que as ofensas supostamente irrogadas por esse Senador da República, embora proferidas fora da tribuna do Congresso Nacional, mas por guardarem nexo com a atividade político-parlamentar por ele exercida, acham-se abrangidas pela cláusula constitucional da imunidade parlamentar em sentido material, o que justifica a aplicação, ao caso, da jurisprudência constitucional desta Suprema Corte:
“QUEIXA-CRIME – JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL CONSOLIDADA QUANTO À MATÉRIA VERSADA NA PEÇA ACUSATÓRIA – POSSIBILIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE O RELATOR DA CAUSA DECIDIR, MONOCRATICAMENTE, A CONTROVÉRSIA JURÍDICA – COMPETÊNCIA MONOCRÁTICA QUE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL DELEGOU, VALIDAMENTE, EM SEDE REGIMENTAL (RISTF, ART. 21, § 1º) – INOCORRÊNCIA DE TRANSGRESSÃO AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE – PLENA LEGITIMIDADE JURÍDICA DESSA DELEGAÇÃO REGIMENTAL – EXTINÇÃO DA ‘PERSECUTIO CRIMINIS’ PELO RECONHECIMENTO, NA ESPÉCIE, DA IMUNIDADE PARLAMENTAR EM SENTIDO MATERIAL – INVIOLABILIDADE COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À RESPONSABILIZAÇÃO PENAL E/OU CIVIL DO CONGRESSISTA – NECESSIDADE, PORÉM, DE QUE OS ‘DELITOS DE OPINIÃO’ TENHAM SIDO COMETIDOS NO EXERCÍCIO DO MANDATO LEGISLATIVO OU EM RAZÃO DELE – SUBSISTÊNCIA DESSE ESPECÍFICO FUNDAMENTO, APTO, POR SI SÓ, PARA TORNAR INVIÁVEL A PERSECUÇÃO PENAL CONTRA MEMBRO DO CONGRESSO NACIONAL – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.
– A garantia constitucional da imunidade parlamentar em sentido material (CF, art. 53, ‘caput’) – que representa um instrumento vital destinado a viabilizar o exercício independente do mandato representativo – somente protege o membro do Congresso Nacional, qualquer que seja o âmbito espacial (‘locus’) em que este exerça a liberdade de opinião (ainda que fora do recinto da própria Casa legislativa), nas hipóteses específicas em que as suas manifestações guardem conexão com o desempenho da função legislativa (prática ‘in officio’) ou tenham sido proferidas em razão dela (prática ‘propter officium’). Doutrina. Precedentes.
– A prerrogativa indisponível da imunidade material – que constitui garantia inerente ao desempenho da função parlamentar (não traduzindo, por isso mesmo, qualquer privilégio de ordem pessoal) – estende-se a palavras e a manifestações do congressista que guardem pertinência com o exercício do mandato legislativo.
– A cláusula de inviolabilidade constitucional, que impede a responsabilização penal e/ou civil do membro do Congresso Nacional por suas palavras, opiniões e votos, também abrange, sob seu manto protetor, (1) as entrevistas jornalísticas, (2) a transmissão, para a imprensa, do conteúdo de pronunciamentos ou de relatórios produzidos nas Casas Legislativas e (3) as declarações feitas aos meios de comunicação social, eis que tais manifestações – desde que vinculadas ao desempenho do mandato – qualificam-se como natural projeção do exercício das atividades parlamentares. Doutrina. Precedentes.
– Reconhecimento da incidência, no caso, da garantia de imunidade parlamentar material em favor do congressista acusado de delito contra a honra.”
(Inq 2.874-AgR/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Vale referir, por relevante, quanto a esse ponto, expressivo fragmento do parecer da lavra do eminente Procurador-Geral da República, Dr. RODRIGO JANOT MONTEIRO DE BARROS, que bem examinou essa específica questão (documento eletrônico 32):
“O Senador Hélio José da Silva Lima encontra-se, no caso dos autos, sob a proteção da imunidade material prevista no art. 53, ‘caput’, da Constituição da República, uma vez que as supostas ofensas foram proferidas em nítido contexto de exercício da atividade parlamentar e em razão de divergências políticas, estando, portanto, relacionadas ao exercício de seu mandato parlamentar.
A querelante, ao indicar o contexto em que se deram as assertivas, descreve na exordial: ‘...durante o ato no qual tomaria posse indicado pelo Senador Hélio José...'.
Infere-se, ainda, das palavras do querelado no mencionado ato de posse, colacionadas aos autos pela querelante, sua presença, no ato, na condição de parlamentar:
‘Eu tive que acabar de incomodar o ministro Gedel reunido com o Presidente Temer, pra poder fazer esse ato aqui, por causa de uma palhaçada de uma servidora pública que é a Valéria, tá certo? Por causa de uma palhaçada dela e dos comparsas dela...’.
É cediço que a imunidade parlamentar prevista no art. 53, ‘caput’, da CR/1988 também abrange ideias veiculadas fora da tribuna da Casa Legislativa, quando demonstrado o nexo de causalidade com o exercício da função parlamentar.
No caso em tela, apesar de a narrativa contida na queixa- -crime indicar que o querelado, durante o seu discurso, usou palavras ofensivas à vítima, constata-se que agiu ligado ao exercício de suas atividades políticas, que desempenha investido de seu mandato parlamentar e, portanto, sob o manto da imunidade constitucional, em consonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.” (grifei)
Impõe-se registrar, por oportuno, que o exercício do mandato – seja na esfera parlamentar, seja no âmbito extraparlamentar (como sucede na espécie) – atua como verdadeiro suposto constitucional, apto a legitimar a invocação dessa especial prerrogativa jurídica, destinada a proteger, por suas “opiniões, palavras e votos”, o membro do Poder Legislativo, independentemente do “locus” em que proferidas as expressões eventualmente contumeliosas.
Sabemos todos que a garantia constitucional da imunidade parlamentar em sentido material representa importante prerrogativa de ordem institucional. A Carta da República, no entanto, somente legitima a sua invocação quando o membro do Congresso Nacional, no exercício do mandato – ou em razão deste –, proferir palavras ou expender opiniões que possam assumir qualificação jurídico-penal no plano dos denominados “delitos de opinião”.
É por essa razão que a jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal tem destacado o caráter essencial do exercício do mandato parlamentar, para efeito de legitimar-se a invocação da prerrogativa institucional assegurada em favor dos membros do Poder Legislativo, sempre enfatizando, nas várias decisões proferidas – quer antes, quer depois da promulgação da EC nº 35/2001 –, que a proteção resultante da garantia da imunidade em sentido material somente alcança o parlamentar nas hipóteses em que as palavras e opiniões tenham sido por ele expendidas no exercício do mandato ou em razão deste (RTJ 191/448, Rel. Min. NELSON JOBIM, Pleno).
Vê-se, desse modo, que cessará essa especial tutela de caráter político-jurídico sempre que deixar de existir entre as declarações moralmente ofensivas, de um lado, e a prática inerente ao ofício legislativo, de outro, o necessário nexo de causalidade (RTJ 104/441, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO – RTJ 112/481, Rel. Min. SOARES MUÑOZ – RTJ 129/970, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – RTJ 135/509, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RTJ 141/406, Rel. Min. CÉLIO BORJA – RTJ 155/396-397, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RTJ 166/844, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – RTJ 167/180, Rel. Min. FRANCISCO REZEK – RTJ 169/969, Rel. Min. CELSO DE MELLO – Inq 810-QO/DF, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA), ressalvadas, no entanto, as declarações contumeliosas que houverem sido proferidas no recinto da Casa legislativa, notadamente da tribuna parlamentar, hipótese em que será absoluta a inviolabilidade constitucional, pois, em tal situação, “não cabe indagar sobre o conteúdo das ofensas ou a conexão com o mandato (…)”:
“O art. 53 da Constituição Federal, com a redação da Emenda nº 35, não reeditou a ressalva quanto aos crimes contra a honra, prevista no art. 32 da Emenda Constitucional nº 1, de 1969. Assim, é de se distinguirem as situações em que as supostas ofensas são proferidas dentro e fora do Parlamento. Somente nessas últimas ofensas irrogadas fora do Parlamento é de se perquirir da chamada ‘conexão com o exercício do mandato ou com a condição parlamentar’ (INQ 390 e 1.710). Para os pronunciamentos feitos no interior das Casas Legislativas, não cabe indagar sobre o conteúdo das ofensas ou a conexão com o mandato, dado que acobertadas com o manto da inviolabilidade. Em tal seara, caberá à própria Casa a que pertencer o parlamentar coibir eventuais excessos no desempenho dessa prerrogativa.
No caso, o discurso se deu no plenário da Assembleia Legislativa, estando, portanto, abarcado pela inviolabilidade. Por outro lado, as entrevistas concedidas à imprensa pelo acusado restringiram-se a resumir e comentar a citada manifestação da tribuna, consistindo, por isso, em mera extensão da imunidade material.
Denúncia rejeitada.”
(RTJ 194/56, Red. p/ o acórdão Min. AYRES BRITTO, Pleno – grifei)
Essa diretriz jurisprudencial mostra-se fiel à “mens constitutionis”, que reconhece, a propósito do tema, que o instituto da imunidade parlamentar em sentido material existe para viabilizar o exercício independente do mandato representativo, revelando-se, por isso mesmo, garantia inerente ao parlamentar que se encontre no pleno desempenho da atividade legislativa, como sucede com o congressista em questão (PONTES DE MIRANDA, “Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda nº 1 de 1969”, tomo III/10 e 43, 2ª ed., 1970, RT; JOÃO BARBALHO, “Constituição Federal Brasileira”, p. 64, edição fac-similar, 1992, Senado Federal; PINTO FERREIRA, “Comentários à Constituição Brasileira”, vol. 2/625, 1990, Saraiva; JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, “Comentários à Constituição de 1988”, vol. V/2.624-2.625, item n. 204, 1991, Forense Universitária; PEDRO ALEIXO, “Imunidades Parlamentares”, p. 59-65, 1961, Belo Horizonte; CELSO RIBEIRO BASTOS, “Comentários à Constituição do Brasil”, vol. 4, tomo I/187, 1995, Saraiva; RENÉ ARIEL DOTTI, “Curso de Direito Penal – Parte Geral”, p. 398, item n. 25, 2001, Forense, v.g.).
Acentue-se que a teleologia inerente à cláusula de inviolabilidade prevista no art. 53, “caput”, da Constituição da República revela a preocupação do constituinte em dispensar efetiva proteção ao parlamentar, em ordem a permitir-lhe, no desempenho das múltiplas funções que compõem o ofício legislativo, o amplo exercício da liberdade de expressão, qualquer que seja o âmbito espacial em que concretamente se manifeste (RTJ 133/90), ainda que fora do recinto da própria Casa legislativa (RTJ 131/1039 – RTJ 135/509-510 – RT 648/318), desde que as declarações emanadas do membro do Poder Legislativo – quando pronunciadas fora do Parlamento (RTJ 194/56, Pleno) – guardem conexão com o desempenho do mandato (prática “in officio”) ou tenham sido proferidas em razão dele (prática “propter officium”), conforme esta Suprema Corte tem assinalado em diversas decisões (RTJ 155/396-397, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno, v.g.).
Saliente-se, por relevante, no que concerne aos aspectos que venho de referir, que o entendimento exposto na presente decisão tem sido observado em julgamentos proferidos no âmbito desta Suprema Corte (Inq 2.330/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO – Inq 2.878/MG, Rel. Min. CELSO DE MELLO – Inq 3.817/DF, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – Pet 5.055/DF, Rel. Min. DIAS TOFFOLI – Pet 5.193/MG, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, v.g.):
“AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. CRIMES CONTRA A HONRA. INDIVISIBILIDADE DA AÇÃO PENAL. NÃO INCIDÊNCIA NA HIPÓTESE. VÍNCULO ENTRE AS SUPOSTAS OFENSAS PROFERIDAS E A FUNÇÃO PARLAMENTAR EXERCIDA. IMUNIDADE PARLAMENTAR. EXCLUDENTE DE TIPICIDADE. IMPROCEDÊNCIA DA ACUSAÇÃO.
1. O afastamento da imunidade material prevista no art. 53, ‘caput’, da Constituição da República só se mostra cabível quando claramente ausente vínculo entre o conteúdo do ato praticado e a função pública parlamentar exercida ou quando as ofensas proferidas exorbitem manifestamente os limites da crítica política. Precedentes.
2. Configurada, no caso, hipótese de manifestação protegida por imunidade material, há ausência de tipicidade da conduta, o que leva à improcedência da acusação, a teor do art. 6º da Lei nº 8.038/1990.
3. Acusação improcedente.”
(Inq 3.677/RJ, Red. p/ o acórdão Min. TEORI ZAVASCKI – grifei)
Registro, finalmente, por necessário, que o Supremo Tribunal Federal, em seu regimento, delegou expressa competência ao Relator da causa para, em sede de julgamento monocrático, negar seguimento a pedido, desde que o tema nele versado seja “contrário à jurisprudência dominante ou a Súmula do Tribunal” (RISTF, art. 21, § 1º).
Ao assim proceder, fazendo-o mediante interna delegação de atribuições jurisdicionais, esta Suprema Corte, atenta às exigências de celeridade e de racionalização do processo decisório, limitou-se a reafirmar princípio consagrado em nosso ordenamento positivo (CPC, art. 932, VIII, c/c o RISTF, art. 21, § 1º), que autoriza o Relator da causa a decidir, monocraticamente, o litígio, sempre que este referir-se a tema já definido em jurisprudência dominante no Supremo Tribunal Federal.
Nem se alegue que essa orientação implicaria transgressão ao princípio da colegialidade, eis que o postulado em questão sempre restará preservado ante a possibilidade de submissão da decisão singular ao controle recursal dos órgãos colegiados no âmbito do Supremo Tribunal Federal (Lei nº 8.038/90, art. 39), consoante esta Corte tem reiteradamente proclamado (RTJ 181/1133-1134, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – AI 159.892-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).
A legitimidade jurídica desse entendimento decorre da circunstância de o Relator da causa, no desempenho de seus poderes processuais, dispor de plena competência para exercer, monocraticamente, o controle de ações, pedidos ou recursos dirigidos ao Supremo Tribunal Federal, justificando-se, em consequência, os atos decisórios que, nessa condição, venha a praticar (RTJ 139/53 – RTJ 168/174-175 – RTJ 173/948, v.g.), valendo assinalar, quanto ao aspecto ora ressaltado, que este Tribunal, em decisões colegiadas (HC 96.821/SP, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI – HC 104.241-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), reafirmou a possibilidade processual do julgamento monocrático, desde que observados os requisitos estabelecidos no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF, art. 21, § 1º).
Cumpre ressaltar, neste ponto, que eminentes Ministros desta Suprema Corte, ao apreciarem, monocraticamente, ações penais privadas, a estas negaram seguimento, determinando o arquivamento dos respectivos autos (Inq 2.843/GO, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA – Inq 2.844/DF, Rel. Min. AYRES BRITTO – Inq 3.777/MG, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, v.g.).
Tendo em vista essa delegação regimental de competência ao Relator da causa, impõe-se reconhecer que a presente decisão ajusta-se, inteiramente, à jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal firmou na matéria em análise, a justificar, desse modo, a plena legitimidade da resolução monocrática do litígio penal ora em julgamento.
Concluindo: a análise dos elementos constantes destes autos permite-me reconhecer que o comportamento do ora querelado – que é Senador da República – subsume-se, inteiramente, ao âmbito da proteção constitucional fundada na garantia da imunidade parlamentar material, em ordem a excluir, na espécie, a responsabilidade penal do congressista em referência, eis que incidente, no caso, a cláusula de inviolabilidade inscrita no art. 53, “caput”, da Constituição da República, considerada a circunstância de a manifestação impugnada nesta causa haver sido proferida no legítimo exercício do mandato legislativo.
Tal circunstância inviabiliza a presente queixa-crime, razão pela qual, com apoio na jurisprudência prevalecente nesta Corte, e acolhendo, ainda, o douto parecer do eminente Procurador-Geral da República, julgo extinto este processo de índole penal.
Arquivem-se estes autos.
Publique-se.
Brasília, 03 de abril de 2017.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
*decisão publicada no DJe em 6.4.2017
27 a 31 de março de 2017
Lei nº 13.421, de 27.3.2017 - Dispõe sobre a criação da Semana Nacional pela Não Violência contra a Mulher e dá outras providências. Publicada no DOU, Seção 1, Edição nº 60, p. 1 em 28.3.2017.
Lei nº 13.424, de 28.3.2017 - Altera as Leis nos 5.785, de 23 de junho de 1972, 9.612, de 19 de fevereiro de 1998, 4.117, de 27 de agosto de 1962, 6.615, de 16 de dezembro de 1978, para dispor sobre o processo de renovação do prazo das concessões e permissões dos serviços de radiodifusão, e dá outras providências. Publicada no DOU, Seção 1, Edição nº 61, p. 1 em 29.3.2017.
Lei nº 13.425, de 30.3.2017 - Estabelece diretrizes gerais sobre medidas de prevenção e combate a incêndio e a desastres em estabelecimentos, edificações e áreas de reunião de público; altera as Leis nos 8.078, de 11 de setembro de 1990, e 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil; e dá outras providências. Publicada no DOU, Seção 1, Edição nº 63, p. 1 em 31.3.2017.
Lei nº 13.426, de 30.3.2017 - Dispõe sobre a política de controle da natalidade de cães e gatos e dá outras providências. Publicada no DOU, Seção 1, Edição nº 63, p. 3 em 31.3.2017.
Lei nº 13.427, de 30.3.2017 - Altera o art. 7º da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que "dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências", para inserir, entre os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), o princípio da organização de atendimento público específico e especializado para mulheres e vítimas de violência doméstica em geral. Publicada no DOU, Seção 1, Edição nº 63, p. 3 em 28.3.2017.
Lei nº 13.428, de 30.3.2017 - Altera a Lei nº 13.254, de 13 de janeiro de 2016, que "Dispõe sobre o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT) de recursos, bens ou direitos de origem lícita, não declarados ou declarados incorretamente, remetidos, mantidos no exterior ou repatriados por residentes ou domiciliados no País". Publicada no DOU, Seção 1, Edição nº 63, p. 3 em 31.3.2017.
Lei nº 13.429, de 31.3.2017 - Altera dispositivos da Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, que dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas e dá outras providências; e dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros. Publicada no DOU, Seção 1, Edição Extra nº 63, p. 1 em 31.3.2017.
Medida Provisória nº 772, de 29.3.2017 - Altera a Lei nº 7.889, de 23 de novembro de 1989, que dispõe sobre a inspeção sanitária e industrial dos produtos de origem animal. Publicada no DOU, Seção 1, Edição nº 62, p. 3 em 30.3.2017.
Medida Provisória nº 774, de 30.3.2017 - Dispõe sobre a contribuição previdenciária sobre a receita bruta. Publicada no DOU, Seção 1, Edição Extra nº 62, p. 1 em 30.3.2017.
27 a 31 de março de 2017
Decreto nº 9.013, de 29.3.2017 - Regulamenta a Lei nº 1.283, de 18 de dezembro de 1950, e a Lei nº 7.889, de 23 de novembro de 1989, que dispõem sobre a inspeção industrial e sanitária de produtos de origem animal. Publicado no DOU, Seção 1, Edição nº 62, p. 3 em 30.3.2017.
Secretaria de Documentação – SDO
Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados – CJCD
O Supremo Tribunal Federal é o órgão de cúpula do Poder Judiciário, e a ele compete, precipuamente, a guarda da Constituição, conforme definido no art. 102 da Constituição da República. É composto por onze Ministros, todos brasileiros natos (art. 12, § 3º, inc. IV, da CF/1988), escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada (art. 101 da CF/1988), e nomeados pelo Presidente da República, após aprovação da escolha pela maioria absoluta do Senado Federal (art. 101, parágrafo único, da CF/1988). Entre suas principais atribuições está a de julgar a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, a arguição de descumprimento de preceito fundamental decorrente da própria Constituição e a extradição solicitada por Estado estrangeiro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STF - Supremo Tribunal Federal. Informativo 859 do STF - 2017 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 abr 2017, 08:07. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Informativos dos Tribunais/49960/informativo-859-do-stf-2017. Acesso em: 23 nov 2024.
Por: STF - Supremo Tribunal Federal Brasil
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