REsp 1.828.993-RS, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 12/08/2020, DJe 20/08/2020. Tema 1024.
DIREITO ADMINISTRATIVO
Composição da tripulação das Ambulâncias de Suporte Básico - Tipo B e das Unidades de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU. Presença de profissional de enfermagem. Desnecessidade. Lei n. 7.498/1986. Portarias n. 2.048/2002 e 1.010/2012 do Ministério da Saúde. Tema 1024.
A composição da tripulação das Ambulâncias de Suporte Básico - Tipo B e das Unidades de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU sem a presença de profissional de enfermagem não ofende, mas sim concretiza, o que dispõem os artigos 11, 12, 13 e 15 da Lei n. 7.498/1986, que regulamenta o exercício da enfermagem.
Inicialmente, importante esclarecer que a Unidade de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) e a ambulância Tipo B são veículos equivalentes, conforme previsto no art. 13, § 1º, da Portaria n. 356, de 8 de abril de 2013, do Ministério da Saúde.
Quando recebido o chamado de auxílio, a decisão sobre qual tipo de transporte que será enviado caberá ao médico responsável, depois de avaliado o caso pela Central de Regulação Médica de Urgência, o que dependerá da gravidade do caso concreto, bem como de sua urgência e do tipo de atendimento necessário (se traumático ou clínico).
A decisão do médico pela Ambulância do Tipo B ou pela Unidade de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) só deverá acontecer, portanto, quando o veículo for destinado ao transporte inter-hospitalar de pacientes com risco de vida conhecido e ao atendimento pré-hospitalar de pacientes com risco de vida desconhecido, não classificado com potencial de necessitar de intervenção médica no local e/ou durante transporte até o serviço de destino.
Por tal razão, este tipo de ambulância é tripulada por no mínimo 2 (dois) profissionais, sendo um o motorista e um técnico ou auxiliar de enfermagem. Ou seja, não se impõe a presença de enfermeiro nessa modalidade de veículo, o que não impede que o médico decida pelo envio de um enfermeiro, a depender do caso concreto, justamente por se tratar de uma tripulação mínima, conforme normatização vigente.
Com relação aos atendimentos a pacientes graves, com risco de morte, ou que demandem cuidados de enfermagem de maior complexidade técnica – que exijam conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas –, há previsão normativa de envio de ambulância tipo D ou Unidade de Suporte Avançado de Vida Terrestre, cuja equipe é de no mínimo 3 (três) profissionais, sendo um condutor do veículo, um enfermeiro e um médico.
As Portarias n. 2.048/2002 e n. 1.010/2012, que criaram as regras descritas, não ofendem as previsões da Lei n. 7.498/1986, mas sim pelo contrário, as detalham e concretizam no plano infralegal.
O art. 11 da Lei n.º 7.498/1986 determina que ao enfermeiro cabem os cuidados diretos de enfermagem a pacientes graves com risco de vida e de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas. Como visto, a Ambulância do Tipo B ou a Unidade de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) atende pacientes que não estão em estado grave, não possuem risco de morte, em casos de menor complexidade técnica. Nesses casos, é suficiente a presença de um técnico ou auxiliar de enfermagem, os quais, segundo os arts. 12 e 13 do referido diploma legal, podem exercer ações assistenciais de enfermagem que não sejam as privativas do enfermeiro. Também há pleno atendimento à prescrição do art. 15, uma vez que, as atividades são desempenhadas sob orientação e supervisão de enfermeiro, presente na Central de Regulação Médica de Urgência, não sendo imprescindível a sua presença física no veículo.
A exigência de enfermeiro nas Ambulâncias de Suporte Básico - Tipo B e nas Unidades de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU, em vez de trazer benefícios, findaria por prejudicar o sistema de saúde, pois esses veículos - que compõem 80% da frota do SAMU, segundo informações prestadas como amicus curiae pelo Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde – CONASEMS - não poderiam circular sem a contratação de milhares de enfermeiros em todos os rincões do país, o que não é factível nas condições orçamentárias atuais, em clara ofensa ao princípio da reserva do possível.
REsp 1.848.993-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 26/08/2020, DJe 09/09/2020 (Tema 1049)
DIREITO TRIBUTÁRIO, DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO EMPRESARIAL
Execução fiscal. Sucessão empresarial por incorporação. Ocorrência antes do lançamento. Ausência de comunicação ao fisco. Redirecionamento. Possibilidade. Substituição da Certidão de Dívida Ativa - CDA. Desnecessidade. Tema 1049.
A execução fiscal pode ser redirecionada em desfavor da empresa sucessora para cobrança de crédito tributário relativo a fato gerador ocorrido posteriormente à incorporação empresarial e ainda lançado em nome da sucedida, sem a necessidade de modificação da Certidão de Dívida Ativa, quando verificado que esse negócio jurídico não foi informado oportunamente ao fisco.
De acordo com o que dispõem os arts. 1.118 do Código Civil e 219, II, da Lei n. 6.404/1976, a incorporação empresarial é causa de extinção da pessoa jurídica incorporada. Todavia, a produção de seus efeitos, na esfera tributária, há de se compatibilizar com a norma geral de natureza de lei complementar (art. 146, III, "a", da Constituição Federal) contida no art. 123 do Código Tributário Nacional - CTN, segundo o qual "salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes".
Assim, para que a extinção da pessoa jurídica resultante de incorporação surta seus efeitos também no âmbito tributário, faz-se necessário que essa operação seja oportunamente comunicada ao fisco, pois somente a partir da ciência da realização desse negócio inter partes é que a Administração Tributária saberá oficialmente da modificação do sujeito passivo e poderá realizar os novos lançamentos em nome da empresa incorporadora (art. 121 do CTN) e cobrar dela, sucessora, os créditos já constituídos (art. 132 do CTN).
Em outras palavras, se a incorporação não foi oportunamente informada, é de se considerar válido o lançamento realizado contra a contribuinte original que veio a ser incorporada, não havendo a necessidade de modificação desse ato administrativo para fazer constar o nome da empresa incorporadora, sob pena de permitir que esta última se beneficie de sua própria omissão.
O simples registro na Junta Comercial não alcança essa finalidade em relação à administração tributária, visto que não há na Lei n. 8.934/1994 previsão expressa de que esta (a administração tributária) seja pessoalmente cientificada desses assentamentos. Por outro prisma, não se mostra razoável exigir dos fiscos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios a prévia consulta do registro dos atos constitutivos das empresas contribuintes sempre que realizarem um lançamento.
Constata-se, portanto, que a comunicação da incorporação empresarial não representa apenas mero cumprimento de obrigação acessória: configura, além disso, pressuposto específico para que a extinção da pessoa jurídica incorporada passe a ter eficácia perante o fisco.
A propósito, não se desconhece a orientação jurisprudencial de que não é possível o redirecionamento de execução fiscal em desfavor dos sucessores para a cobrança de crédito lançado em nome de pessoa já falecida. Essa diretriz, todavia, não se aplica à hipótese. Isso porque, enquanto o evento morte da pessoa natural cuida de fato jurídico que opera seus efeitos desde logo, independentemente da vontade de seus sucessores, a extinção da pessoa jurídica por incorporação resulta de negócio jurídico, de sorte que, em respeito à disposição contida no art. 123 do CTN, seus efeitos quanto à modificação da sujeição passiva somente vincularão o fisco depois que este for pessoalmente cientificado da operação.
Por outro lado, se ocorrer a comunicação da sucessão empresarial ao fisco antes do surgimento do fato gerador, é de se reconhecer a nulidade do lançamento equivocadamente realizado em nome da pessoa incorporada e, por conseguinte, a impossibilidade de modificação do sujeito passivo diretamente no âmbito da execução fiscal, sendo vedada a substituição da CDA para esse propósito, consoante posição já sedimentada na Súmula 392 do STJ ("A Fazenda Pública pode substituir a certidão de dívida ativa (CDA) até a prolação da sentença de embargos, quando se tratar de correção de erro material ou formal, vedada a modificação do sujeito passivo da execução.")
Diante dessas ponderações, em sendo verificada a ausência da referida comunicação ao fisco e, por conseguinte, reconhecida a validade do crédito lançado em nome da empresa incorporada, cabe analisar a necessidade de alteração da Certidão de Dívida Ativa (CDA) para viabilizar redirecionamento da execução fiscal em desfavor da empresa incorporadora.
Conforme já explanado, é com a efetiva comunicação do negócio jurídico que o fisco toma conhecimento do novo sujeito passivo a ser considerado no lançamento, razão pela qual esse momento deve ser entendido, para fins de responsabilização da empresa sucessora, como a data do ato da incorporação de que trata o caput do art. 132 do CTN.
E por se tratar de imposição automática – expressamente determinada na lei – do dever de pagar os créditos tributários validamente lançados em nome da sucedida, a sucessora pode ser acionada independentemente de qualquer outra diligência por parte da Fazenda credora, visto que a sua responsabilidade não está relacionada com o surgimento da obrigação tributária (art. 121 do CTN), mas com o seu inadimplemento (art. 132 do CTN).
Para esses casos, então, não há necessidade de substituição ou emenda da CDA, de modo que é inaplicável o entendimento consolidado na Súmula 392 do STJ, sendo o caso de apenas permitir o imediato redirecionamento.
EREsp 1.411.420-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Corte Especial, por maioria, julgado em 03/06/2020, DJe 27/08/2020
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
Locação comercial. Ação revisional. Reajuste do valor do aluguel. Cálculo sobre benfeitorias e acessões realizadas pelo locatário. Possibilidade.
Em ação revisional de contrato de locação comercial, o reajuste do aluguel deve refletir o valor patrimonial do imóvel locado, inclusive considerando em seu cálculo benfeitorias e acessões realizadas pelo locatário com autorização do locador.
Quanto à controvérsia, existem duas soluções divergentes nesta Corte para esta crise de direito material: i) de um lado, os acórdãos paradigmas da Terceira Seção, Quinta e Sexta Turmas julgaram pela licitude de inclusão do valor da benfeitoria ou acessão no cálculo do aluguel do imóvel objeto de locação comercial, na ação revisional e renovatória; ii) de outro lado, o acórdão embargado, da Quarta Turma, decidiu pela impossibilidade de considerar a benfeitoria ou acessão no referido cálculo, apenas na ação revisional.
Analisando o tema, o acórdão embargado inovou a ordem jurídica ao registrar que a ação revisional limita-se ao imóvel com suas características originárias à época da contratação. Em verdade, o art. 19 da Lei n. 8.245/1991 dispõe que locador ou locatário poderão pedir revisão judicial do aluguel, a fim de ajustá-lo ao preço de mercado.
A interpretação desse dispositivo não se limita aos elementos externos do contrato, tais como o desenvolvimento da região em que se localiza o imóvel ou os fatos da natureza que venham a atingir a localidade com maior frequência. Para a preservação do equilíbrio contratual por intervenção judicial, é imprescindível levar em conta todas as circunstâncias capazes de afetar o preço de mercado imobiliário, inclusive, socorrendo-se de auxílio pericial quando necessário.
É importante ressaltar que a ação revisional é resguardada para as hipóteses em que não há acordo entre locador e locatário sobre o valor do aluguel. Isso quer dizer que por exercício da autonomia privada das partes contratantes, nada impede que: i) os gastos relativos à acessão sejam descontados do valor do aluguel por determinado tempo; ii) a acessão seja realizada por investimento exclusivo de uma das partes com a correspondente indenização ao final do contrato, seja pelo locador, seja pelo locatário; iii) a acessão seja custeada por apenas uma parte, renunciando-se à indenização correspondente ao investimento. Aliás, não é outro o sentido da Súmula 335 do STJ, ou seja, no campo das relações privadas, locador e locatário estão autorizados a negociar livremente sobre o bem-da-vida. A ausência de consenso, entretanto, requer a intervenção judicial justamente por meio da ação revisional.
Dito isso, ao contrário do decidido no acórdão embargado, existe razão para majoração do aluguel decorrente da valorização do imóvel implementada por nova edificação. Deve ser ressaltado que o ajustamento do aluguel ao preço de mercado está diretamente relacionado às acessões operadas na vigência do contrato.
Se o investimento para a edificação no imóvel ocorreu por conta do locatário, com o consentimento do locador, significa dizer que por sua livre manifestação de vontade aceitou realizar as obras no terreno alheio.
A hipótese de que apenas quando o investimento é realizado por conta e risco do locador estaria autorizada a majoração do aluguel, em verdade, limita sobremaneira as relações privadas de locação e acaba por deslocar a lógica que subjaz esses contratos no que diz respeito à vinculação do valor do imóvel ao correspondente preço do aluguel.
Note-se que a acessão incorpora-se ao imóvel, cuja propriedade sempre pertenceu ao locador. Os investimentos necessários à acessão podem correr por conta do locador ou do locatário, justamente para preservar a boa-fé nas relações contratuais. Caso o locatário assuma o investimento isso não o torna isento, automaticamente, do correspondente incremento no valor de mercado do imóvel.
EREsp 1.335.535-RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 26/09/2018, DJe 03/09/2020
DIREITO AMBIENTAL, DIREITO CONSTITUCIONAL
Recursos hídricos. Condomínio residencial. Poço artesiano. Federalismo hídrico-ambiental. Regime jurídico das águas subterrâneas. Outorga e autorização ambiental. Necessidade.
É vedada a captação de água subterrânea para uso de núcleos residenciais, sem que haja prévia outorga e autorização ambiental do Poder Público.
A disciplina normativa, pela União, das águas subterrâneas – reputadas ora federais, ora estaduais –, é justificada por constituírem recurso natural, público, limitado, não visível a olho nu (ao contrário das águas de superfície), e indispensável à concretização dos direitos fundamentais à vida, à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Na disciplina dos recursos hídricos, dois diplomas federais são de observância obrigatória para Estados, Distrito Federal e Municípios: a Lei n. 9.433/1997 (Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos) e a Lei n. 11.445/2007 (Lei do Saneamento Básico). A primeira condiciona a extração de água subterrânea – quer para "consumo final", quer como "insumo de processo produtivo" – à prévia e válida outorga pelo Poder Público, o que se explica pela notória escassez desse precioso bem, literalmente vital, de enorme e crescente valor econômico, mormente diante das mudanças climáticas (art. 12, II). Já o art. 45, § 2º, da Lei n. 11.445/2007 prevê categoricamente que "a instalação hidráulica predial ligada à rede pública de abastecimento de água não poderá ser também alimentada por outras fontes".
Assim, patente a existência de disciplina normativa expressa, categórica e inafastável de lei geral federal, que veda captação de água subterrânea para uso de núcleos residenciais, sem que haja prévia outorga e autorização ambiental do Poder Público. As normas locais devem seguir as premissas básicas definidas pela legislação federal. Estatuto editado por Estado, Distrito Federal ou Município que contrarie as diretrizes gerais fixadas nacionalmente padece da mácula de inconstitucionalidade e ilegalidade, por afrontar a distribuição de competência feita pelo constituinte de 1988: "Compete privativamente à União legislar sobre ... águas" (art. 22, IV, da Constituição Federal).
AgRg na ExSusp 209-DF, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 12/08/2020, DJe 17/08/2020
DIREITO PROCESSUAL PENAL
Exceção de suspeição. Julgador do colegiado que apreciou recurso especial. Julgamento posterior de outro apelo raro advindo de revisão criminal ajuizada na origem. Ausência de malferimento às regras de imparcialidade.
Não há impedimento ou suspeição de integrantes de Colegiado do STJ que apreciaram recurso especial e, posteriormente, venham a participar do julgamento de outro apelo raro oriundo de revisão criminal ajuizada na origem.
Cinge-se a controvérsia a definir se há impedimento ou suspeição no fato de ter sido distribuído um recurso especial a integrante da Quinta Turma e esse Colegiado venha a ser o competente para apreciar outro recurso especial, desta vez interposto contra acórdão oriundo de revisão criminal originada de ação penal a que dizia respeito o primeiro apelo raro.
O art. 252, III, do Código de Processo Penal estabelece: "Art. 252. O juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que: [...] III - tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão".
Assim, veda-se a participação do juiz quando já tiver julgado o processo em outra instância. É o caso, por exemplo, do magistrado que profere a sentença e é promovido ao cargo de desembargador. Nesse caso não poderá participar do julgamento de eventual recurso de apelação, pois estaria, contra o texto legal, apreciando o processo em instâncias diversas. Por outro lado, não ocorre o impedimento quando o julgamento se realiza na mesma instância. Aliás, cuida-se de regra que, nos termos do regimento interno, inclusive gera a prevenção do órgão julgador.
De igual modo, o art. 625 do Código de Processo Penal também não se aplica, já que de revisão criminal não se cuida. Este dispositivo apenas determina que o relator da revisão criminal "não tenha pronunciado decisão em qualquer fase do processo". Além dessa regra se dirigir precipuamente aos Tribunais de segundo grau, não impede a participação deste desembargador no julgamento, apenas o afasta da condição de relator. Ademais, trata exclusivamente da distribuição de revisão criminal, feito que não tramita nesta Corte. Aqui, o que há é um recurso especial, cuja distribuição se deu de forma aleatória.
REsp 1.864.227-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 18/08/2020, DJe 25/08/2020
DIREITO TRIBUTÁRIO, DIREITO EMPRESARIAL
Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF). Imposto devido em razão de pagamento à pessoa jurídica sediada no exterior. Momento da consumação do fato gerador. Registro contábil do débito, sob a rubrica de contas a pagar. Disponibilidade econômica ou jurídica referida no art. 43 do CTN. Não configuração. Valores exigíveis pela parte credora estrangeira. Necessidade. IRRF devido quando do vencimento da dívida (ou de seu pagamento, caso este ocorra primeiro).
O momento do fato gerador do Imposto de Renda Retido na Fonte - IRRF a ser recolhido pela sociedade empresária brasileira, em razão de pagamento feito a pessoa jurídica domiciliada no exterior, se dá no vencimento ou pagamento da dívida, o que ocorrer primeiro.
Cinge-se a controvérsia a definir o momento do fato gerador do IRRF a ser recolhido pela sociedade empresária brasileira, em razão de pagamento feito a pessoa jurídica domiciliada no exterior - se na data do registro contábil da dívida em contas a pagar ou se apenas com a remessa do dinheiro ao exterior (ou vencimento do débito, o que ocorrer primeiro).
Segundo o art. 43 do CTN, o fato gerador do tributo é a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica da renda. A respeito da diferenciação entre as duas expressões, a doutrina destaca que "disponibilidade econômica é o recebimento efetivo da renda, ou seja, do valor que é acrescentado ao patrimônio do qual o contribuinte é titular (...). De outro lado, a disponibilidade jurídica decorre do crédito de valores dos quais o contribuinte possa dispor como titular através de um título jurídico, embora estes valores não estejam efetivamente incorporados ao seu patrimônio."
A escrituração contábil do débito futuro, nos registros da pessoa jurídica devedora, não equivale à disponibilidade econômica, pois o dinheiro ainda não está, neste momento, sob a posse direta da pessoa jurídica credora. Tampouco pode ser entendida como disponibilidade jurídica, tendo em vista que, com o lançamento contábil, anterior ao vencimento da dívida, nenhum direito ou título surge para a sociedade empresária credora, pois nem lhe é possível exigir o pagamento do montante, na forma do art. 315 do CC/2002.
O art. 685 do Decreto n. 3.000/1999 determinava a incidência do IRRF sobre os rendimentos pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos ao exterior. A escrituração contábil do débito não corresponde a qualquer dos núcleos verbais referentes à disponibilização econômica (pagamento, entrega, emprego, remessa) ou jurídica (crédito) do dinheiro à sociedade empresária estrangeira. Portanto, não se pode considerá-la como o momento da ocorrência do fato gerador do IRRF, o que somente acontece com o vencimento ou o pagamento antecipado da dívida.
Na data do vencimento, a obrigação de pagar quantia certa se torna exigível, conforme o sobredito art. 315 do CC/2002, e a sociedade credora pode exercer com plenitude todos os direitos referentes ao seu crédito, inclusive o de persegui-lo judicialmente, o que evidencia tratar-se da disponibilidade jurídica a que se refere o art. 43 do CTN. Com o pagamento, por sua vez, o dinheiro passa a estar sob a posse e controle imediatos da pessoa jurídica estrangeira, plenamente integrado ao seu patrimônio, o que se enquadra no conceito de disponibilidade econômica.
Assim, acontecendo qualquer destes dois marcos - vencimento ou pagamento, o que ocorrer primeiro -, considera-se realizado o fato gerador do IRRF, tendo em vista estarem satisfeitos os critérios material e temporal de sua incidência.
Ressalte-se que esta solução foi adotada até pelo Fisco Federal, na solução da consulta COSIT n. 153/2017, aprovada em 02/03/2017, que reconhece expressamente que o mero registro contábil do crédito, como simples provisionamento ou reconhecimento antecipado de despesa, em obediência ao regime de competência, não caracteriza fato gerador do IRRF se não houver disponibilidade econômica ou jurídica dos rendimentos, o que somente se verifica quando se tornar exigível a contraprestação (pagamento) pelos serviços contratados.
REsp 1.813.255-SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 03/03/2020, DJe 04/09/2020
DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO CONSTITUCIONAL
Improbidade administrativa. Sentença condenatória transitada em julgado. Suspensão dos direitos políticos. Abrangência de qualquer mandato eletivo ocupado. Restrição ao mandato no qual se praticou a conduta ímproba. Impossibilidade.
A pena de suspensão dos direitos políticos por ato de improbidade administrativa alcança qualquer mandato eletivo que esteja sendo ocupado à época do trânsito em julgado da condenação.
Cinge-se a controvérsia a definir o alcance da pena de perda de suspensão dos direitos políticos decorrente da condenação por ato de improbidade administrativa com trânsito em julgado.
No tribunal de origem, entendeu-se que a decisão que cominou a pena de suspensão dos direitos políticos refere-se ao ato de improbidade administrativa cometido em mandato anterior, razão pela qual não poderia atingir o mandato atual. Assim, somente seria admitida a cassação da perda do cargo eletivo ocupado à época em que o ato ímprobo foi praticado, não podendo atingir o mandato exercido ao tempo do trânsito em julgado da sentença prolatada na ação de improbidade.
Esse entendimento contraria expressamente a Lei n. 8.429/1992, subvertendo sua finalidade de afastar da Administração Pública aqueles que afrontem os princípios constitucionais de probidade, legalidade e moralidade.
No caso, a perda do mandato eletivo de vereador decorre automaticamente da condenação judicial de suspensão dos direitos políticos na ação de improbidade administrativa já transitada em julgado, sendo o ato da Câmara Municipal vinculado e declaratório.
Além disso, considerando que o pleno exercício dos direitos políticos é pressuposto para o exercício da atividade parlamentar, determinada a suspensão de tais direitos, é evidente que essa suspensão alcança qualquer mandato eletivo que esteja sendo ocupado à época do trânsito em julgado da sentença condenatória.
É descabido, portanto, restringir a aludida suspensão ao mandato que serviu de instrumento para a prática da conduta ilícita. Nessa linha já decidiu o Supremo Tribunal Federal (AP 396 QO, Relatora Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 04/10/2013).
REsp 1.567.123-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 14/06/2016, DJe 28/08/2020
DIREITO DO CONSUMIDOR
Responsabilidade Civil. Jogo de azar ilegal. Bingo. Dano moral coletivo. Dano in re ipsa.
A exploração de jogo de azar ilegal configura, em si mesma, dano moral coletivo.
Cuida-se de Ação Civil Pública promovida pelo Ministério Público Federal visando à condenação dos réus na obrigação de não desenvolver atividade de bingo e no pagamento de indenização por dano moral coletivo.
A exploração de casas de bingo (espécie de "jogos de azar") chegou a ser permitida pela Lei n. 9.615/1998 (arts. 59 a 81), mas tais dispositivos legais foram revogados pela Lei n. 9.981/2000, a partir de 31/12/2001, "respeitando-se as autorizações que estiverem em vigor até a data da sua expiração" (art. 2º). Hoje, trata-se de conduta vedada pelo art. 50 da Lei das Contravenções Penais.
Por seu turno, consigna-se o art. 6º do CDC traz como direitos básicos do consumidor: "(...) I – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos" (inciso I) e a "prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados" (inciso VII).
Dessa forma, patente a necessidade de correção de lesão supraindividual às relações de consumo, no que resulta transcender o dano em questão aos interesses individuais dos frequentadores de bingo ilegal. Exploração comercial de atividade ilícita configura, em si mesma, dano moral coletivo.
No Código de Defesa do Consumidor, a responsabilidade civil é objetiva e solidária. O dano moral coletivo não depende de prova da dor, do sofrimento ou do abalo psicológico. Demonstrá-los, embora possível, em tese, na esfera individual, é completamente inviável no campo dos interesses difusos e coletivos, razão pela qual dispensado, principalmente quando incontestável a ilegalidade da atividade econômica ou da prática comercial em questão. Trata-se, portanto, de dano in re ipsa.
REsp 1.854.404-SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 02/06/2020, DJe 21/08/2020
DIREITO DO TRABALHO, DIREITO TRIBUTÁRIO
Suspensão de contrato de trabalho. Art. 476-A da CLT. Lay-off. Ajuda compensatória mensal. Natureza indenizatória. Imposto de renda. Não incidência.
Não incide imposto de renda sobre o valor recebido a título de ajuda compensatória mensal prevista no art. 476-A da CLT (lay-off).
A suspensão do contrato de trabalho regulada pelo art. 476-A da CLT preconiza que o contrato de trabalho do empregado, após celebração de acordo ou de convenção coletiva com o sindicato da categoria, e anuência formal do empregado, fica suspenso pelo período de duração do curso de requalificação de no mínimo 2 (dois) e no máximo, 5 (cinco) meses.
Nessa modalidade, o empregado recebe bolsa de qualificação profissional, custeada pelo FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador, nos termos do art. 2º-A da Lei n. 7.998/1990, durante o curso de aprimoramento profissional, desde que a suspensão tenha duração máxima de cinco meses, após o que o encargo passa a ser de responsabilidade do empregador, conforme o art. 476-A, § 7º, da CLT. Como o contrato de trabalho é suspenso, ficam sobrestadas as obrigações principais do empregado e do empregador: respectivamente, a prestação de serviços e o pagamento de salários. Além disso, ficam paralisados os efeitos do contrato como contagem de tempo de serviço para férias e 13º salário proporcionais, depósito na conta vinculada do FGTS, recolhimento da previdência social e, por conseguinte, o cômputo do período como tempo de serviço para a aposentadoria.
A empresa empregadora, a seu turno, deve oferecer cursos de qualificação profissional, arcando com todas as despesas decorrentes, além de benefícios como vale-refeição, e a denominada "ajuda compensatória mensal", com valor definido na convenção ou acordo coletivo.
No caso, a ajuda compensatória corresponde à diferença devida entre a bolsa recebida para qualificação e o salário líquido percebido, com evidente redução salarial, até porque a bolsa de qualificação não tem natureza de salário, assim como a ajuda compensatória, que indeniza o trabalhador por dispensar a garantia da irredutibilidade.
O art. 43 do CTN descreve o fato gerador do imposto de renda nos seguintes termos: O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica: I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos; II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
Como há suspensão do contrato de trabalho, tal ajuda compensatória não se enquadra no inciso I do art. 43 do CTN. Além disso, ela não configura proventos, entendidos como acréscimos patrimoniais descritos no inciso II do mesmo dispositivo.
Ademais, se a ajuda compensatória é calculada com base no salário líquido evidente que cada substituído receberá menos que efetivamente receberia se estivesse trabalhando, recebendo o salário bruto.
O montante pago a título de ajuda compensatória, portanto, tem natureza jurídica de indenização, destinando-se a reconstituir a perda patrimonial do trabalhador e os próprios prejuízos advindos da suspensão do contrato de trabalho, e não um acréscimo patrimonial tido como fato gerador do imposto, motivo pelo qual não se sujeita à tributação pelo imposto de renda.
REsp 1.792.310-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, por maioria, julgado em 04/02/2020, DJe 04/09/2020
DIREITO PENAL, DIREITO TRIBUTÁRIO, DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO FALIMENTAR
Execução fiscal. Pedido de redirecionamento contra os sócios. Análise pelo juízo. Indícios de crime falimentar. Suficiência.
O redirecionamento da execução fiscal contra os sócios prescinde do trânsito em julgado da sentença penal condenatória em crime falimentar.
Cinge-se a controvérsia a definir se a possibilidade de redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-gerente da pessoa jurídica originalmente executada pela suposta prática de crime falimentar pressupõe o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
A falência, segundo a jurisprudência do STJ, não constitui dissolução irregular. Não obstante, a decretação da falência, isoladamente, não veda peremptoriamente o redirecionamento, pois o pressuposto do redirecionamento é a prática de atos de infração à lei ou ao contrato social. E essa infração à lei pode ocorrer tanto no âmbito da existência de crimes falimentares como de infração à legislação civil ou comercial (art. 4º, § 2º, da LEF) – ou seja, a simples decretação da falência não constitui "atestado" de que inexistiram infrações à lei (civil, comercial, tributária e penal).
O redirecionamento, à luz do recebimento da denúncia pela prática de crimes falimentares, deverá ser feito no Juízo das Execuções Fiscais. O recebimento da denúncia contém juízo inicial de comprovação da materialidade do ilícito e de, no mínimo, indícios de autoria do tipo penal. Assim, se há indícios e/ou provas de prática de ato de infração à lei (penal), a hipótese se subsume ao art. 135 do CTN.
Importante acrescentar que mesmo a eventual absolvição em ação penal não conduz necessariamente à revogação do redirecionamento, pois o ato pode não constituir ilícito penal, e, mesmo assim, continuar a representar infração à lei civil, comercial, administrativa, etc. (independência das esferas civil, lato sensu, e penal).
É por essa razão que caberá ao juiz natural, competente para processar e julgar a execução fiscal, analisar, caso a caso, o conteúdo da denúncia pela prática de crime falimentar e decidir se cabe ou não o redirecionamento. Não é necessário, portanto, aguardar o trânsito em julgado da sentença penal condenatória para que o Juízo da Execução Fiscal analise o pleito de redirecionamento da execução contra o sócio.
REsp 1.644.890-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/08/2020, DJe 26/08/2020
DIREITO CIVIL
Shopping center. Locação de espaço. Execução de contrato. Honorários advocatícios contratuais do locador. Repasse ao locatário. Possibilidade. Atividade empresarial. Autonomia da vontade. Prevalência.
É possível a inclusão de valor relativo a honorários advocatícios contratuais previamente ajustados pelas partes na execução de contrato de locação de espaço em shopping center.
É oportuno esclarecer, de início, que os honorários contratuais (ou convencionais) não se confundem com os sucumbenciais, sendo que os primeiros decorrem da contratação do advogado para atuar na lide e, os segundos, remuneram o causídico que alcançou êxito no processo. O art. 22, caput, da Lei n. 8.906/1994 assegura aos advogados o direito a honorários convencionais e aos de sucumbência.
Em regra, os honorários contratuais são devidos por aquele que contrata o advogado para atuar em seu favor, respondendo cada uma das partes pelos honorários contratuais de seu advogado. A parte vencida, além dos honorários contratuais do seu advogado, também arcará com o pagamento dos honorários sucumbenciais devidos ao patrono da parte vencedora.
No caso, o contrato firmado entre as partes prevê que o locatário deverá pagar os honorários contratuais de seu advogado, assim como os do advogado do locador, o que não configura bis in idem, pois não se trata do pagamento da mesma verba, mas do repasse de custo do locador para o locatário.
Importante registrar que o artigo 54 da Lei n. 8.245/1991 estabelece que: "Nas relações entre lojistas e empreendedores de shopping center, prevalecerão as condições livremente pactuadas nos contratos de locação respectivos e as disposições procedimentais previstas nesta lei".
Ademais, ainda que se considere que o empreendedor do shopping é quem organiza a atividade e muitas vezes os lojistas menores não têm ingerência sobre determinadas cláusulas do ajuste, especialmente as normas gerais que regem as locações do estabelecimento, a assimetria do contrato faz parte da decisão negocial tomada pelo locatário.
A atividade empresarial é caracterizada pelo risco e regulada pela lógica da livre-concorrência, devendo prevalecer nesses ajustes, salvo situação excepcional, a autonomia da vontade e o princípio pacta sunt servanda.
Por sua vez, não há como afastar a incidência de cláusula de contrato de locação de espaço em shopping center com base em alegação genérica de afronta à boa-fé objetiva, devendo ficar demonstrada a situação excepcional que autoriza a intervenção do Poder Judiciário.
Vale destacar, ainda, que a onerosidade excessiva pressupõe a superveniência de uma circunstância extraordinária e imprevista de ordem geral, que torne a prestação excessivamente onerosa para uma das partes.
Assim, como o repasse de custos do locador ao locatário não ultrapassa o que usualmente se espera nos contratos de locação de espaço em shopping center e não há outras circunstâncias excepcionais que autorizem a intromissão do Judiciário no negócio firmado, deve ser permitida a inclusão dos honorários na execução.
REsp 1.738.651-MS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/08/2020, DJe 28/08/2020
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
Internet. Dever de guarda de registros de aplicação. Acesso a perfil em rede social. Números de IPs e dados cadastrais de usuários. Fornecimento. Possibilidade jurídica do pedido.
É juridicamente possível obrigar os provedores de aplicação ao fornecimento de IPs e de dados cadastrais de usuários que acessaram perfil de rede social em um determinado período de tempo.
O propósito consiste em determinar a possibilidade jurídica de obrigação ao fornecimento de IPs e dados cadastrais solicitados, referentes aos usuários que acessaram dado perfil de rede social num período de tempo determinado.
Para tanto, é necessário considerar o que se encontra disposto no Marco Civil da Internet – MCI (Lei n. 12.965/2014) sobre o tema. Tal legislação define como provedor de aplicação de internet todo aquele que oferece um conjunto de funcionalidades que podem ser acessadas por meio de um terminal conectado à internet. Tais fornecedores estão obrigados a manterem consigo, por um determinado período, um conjunto de informações, normalmente denominadas de obrigações de guarda de registro.
No Marco Civil da Internet, há duas categorias de dados que devem ser obrigatoriamente armazenados: os registros de conexão e os registros de acesso à aplicação. A previsão legal para guarda desses dados objetiva facilitar a identificação de usuários da internet pelas autoridades competentes e mediante ordem judicial, porque a responsabilização dos usuários é um dos princípios do uso da internet no Brasil, conforme o art. 3º, VI, da mencionada lei.
Os registros de conexão são definidos como "o conjunto de informações referentes à data e hora de início e término de uma conexão à internet, sua duração e o endereço IP utilizado pelo terminal para o envio e recebimento de pacotes de dados".
Por sua vez, os provedores de aplicação constituídos "na forma de pessoa jurídica e que exerçam essa atividade de forma organizada, profissionalmente e com fins econômicos", tem a obrigação de armazenar, por seis meses o "conjunto de informações referentes à data e hora de uso de uma determinada aplicação de internet a partir de um determinado endereço IP", conforme o art. 5º, VIII, do Marco Civil da Internet.
Quanto ao tema, é de amplo conhecimento que esta Corte Superior firmou entendimento de que as prestadoras de serviço de internet, como as demais empresas, estariam sujeitas a um dever legal de escrituração e registro de suas atividades durante o prazo prescricional de eventual ação de reparação civil, dever que tem origem no art. 10 do Código Comercial de 1850, e atualmente encontra-se previsto no art. 1.194 do Código Civil.
Conjugando esse dever de escrituração e registro com a vedação constitucional ao anonimato, nos termos do art. 5º, IV, da CF/1988, os provedores de acesso à internet devem armazenar dados suficientes para a identificação do usuário.
Assim, diante da obrigação legal de guarda de registros de acesso a aplicações de internet e o dever de escrituração reconhecido por este STJ, não há como afastar a possibilidade jurídica de obrigar os provedores de aplicação ao fornecimento da informação em discussão – quais usuários acessaram um perfil na rede social num período – por se tratar de mero desdobramento dessas obrigações.
REsp 1.759.652-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/06/2020, DJe 18/08/2020
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
Ação de reconhecimento e dissolução de união estável post mortem. Necessidade de inclusão de herdeiros colaterais no polo passivo. Litisconsórcio necessário.
Na ausência de herdeiros necessários, é indispensável a inclusão dos herdeiros colaterais no polo passivo de demanda de reconhecimento e dissolução de união estável post mortem.
A questão processual discutida é relativa à necessidade de inclusão dos herdeiros colaterais de falecido em ação de reconhecimento e dissolução de união estável post mortem movida por seu alegado ex-companheiro e a possibilidade de concessão a ele da totalidade dos bens da falecida.
Inicialmente, registra-se que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar os Recursos Extraordinários n. 646.721/RS e 878.694/MG, ambos com repercussão geral, fixou a tese de que "é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do art. 1.829 do CC/2002".
A Terceira Turma do STJ, no julgamento do Recurso Especial n. 1.357.117/MG, após afirmar ser inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, entendeu que os parentes colaterais, tais como irmãos, tios e sobrinhos, são herdeiros de quarta e última classe na ordem de vocação hereditária, herdando apenas na ausência de descendentes, ascendentes e cônjuge ou companheiro, em virtude da ordem legal de vocação hereditária.
Dessa forma, não resta qualquer dúvida de que, na falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge ou companheiro
sobrevivente, ressalvada eventual disposição de última vontade.
Entretanto, a questão processual posta, como já aludido, situa-se em torno da necessidade de inclusão, no polo passivo da demanda de reconhecimento e dissolução de união estável, dos parentes colaterais da falecida como seus possíveis herdeiros para a hipótese de não reconhecimento da união estável alegada.
Assim, caracterizado o litisconsórcio necessário, indispensável a inclusão no polo passivo da demanda de reconhecimento e dissolução de união estável dos possíveis herdeiros do de cujus em face de seu evidente interesse jurídico no desenlace da lide. Pois, na hipótese de não reconhecimento da união estável, os parentes colaterais serão os herdeiros legítimos do de cujus (art. 1829, IV, c/c o art. 1.839 do CC/2002).
REsp 1.779.751-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 16/06/2020, DJe 19/06/2020
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
Alienação fiduciária em garantia. Busca e apreensão. Extinção da relação contratual. Ausência de requerimento expresso. Julgamento extra petita. Ocorrência.
Há julgamento extra petita na hipótese em que, julgado procedente o pedido de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente, o juiz, sem o requerimento expresso do autor, extingue o contrato firmado entre o devedor fiduciante e o credor fiduciário.
Esta Corte Superior já se pronunciou no sentido de que, "na ação de busca e apreensão amparada no Decreto-Lei n. 911/1969, o provimento jurisdicional pleiteado tem natureza executiva, fundado em título a que a lei atribui força comprobatória do direito do autor" (REsp 1.591.851/SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, julgado em 09/08/2016, DJe 19/08/2016).
O credor não pretende, por meio da busca e apreensão, a resolução do contrato, persegue apenas o direito de ver cumprida a obrigação por parte do devedor. Assim, conforme a doutrina "sentença na ação de busca e apreensão não visa à desconstituição do contrato, mas apenas à sua execução, com a consolidação da propriedade e posse plena nas mãos do proprietário fiduciário".
Ao julgar procedente o pedido apresentado na ação de busca e apreensão, o magistrado apenas consolida a propriedade do bem com vistas a garantir que o credor se utilize dos meios legais (alienação do bem) para obter os valores a que faz jus decorrente do contrato (art. 2º, § 3º, do Decreto-Lei n. 911/1969). Nesses termos, a reversão da propriedade plena (consolidação) em favor do credor fiduciário constitui apenas uma etapa da execução do contrato, não pondo fim a ele.
Conforme o princípio da congruência ou da adstrição, o juiz deve decidir a lide dentro dos limites formulados pelas partes, não podendo proferir sentença de forma extra, ultra ou citra petita. Em conformidade com o art. 322, § 2º, do CPC/2015, a interpretação do pedido considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé.
No caso, o autor não postulou a resolução do contrato de alienação fiduciária na petição inicial, sendo tal fato expressamente reconhecido pelas instâncias ordinárias, caracterizando, assim, o julgamento extra petita. Portanto, à míngua de requerimento da parte nesse sentido, não poderia o julgador declarar a extinção do vínculo contratual.
REsp 1.758.951-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 04/08/2020, DJe 20/08/2020
DIREITO CIVIL, DIREITO BANCÁRIO
Fundo Garantidor de Créditos (FGC). Liquidação de instituição financeira. Existência de depósitos em nome da associação de concessionárias de veículos. Valores vinculados ao Fundo instituído pelas concessionárias. Aplicação do teto do FGC à quota-parte de cada concessionária. Não cabimento. Teto incidente sobre todo o montante depositado. Art. 2º, § 3º , inciso III, da Resolução n. 2.211/1995 - CMN. Inaplicabilidade.
O teto cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC) se aplica ao montante total do fundo instituído por concessionárias, não à quota-parte devida a cada associado.
Cinge-se a controvérsia acerca da aplicação do teto cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC) na hipótese em que se busca cobertura para valores vinculados a um fundo instituído por concessionárias de veículos e administrado pela associação representativa dessas concessionárias.
Nos termos do art. 2º, § 3º, inciso III, da Resolução n. 2.211/1995 - CMN: "os créditos em nome de mandatário, representante legal ou gestor de negócios devem ser computados como pertencentes ao representado ou ao dono do negócio, desde que tal condição esteja documentada na instituição".
No caso, contudo, embora os valores depositados na conta corrente não integrassem o patrimônio da associação, eles também não integravam o patrimônio individual dos associados, mas o patrimônio do fundo. Desse modo, a associação não agiu diretamente como mandatária ou representante dos associados, mas como administradora do fundo instituído pelas concessionárias associadas.
Assim, não se aplica a referida norma do art. 2º, § 3º, do Anexo II, da Resolução n. 2.211/1995 - CMN, pois se estenderia a cobertura para uma hipótese não abarcada pela norma. A associação deve ser considerada uma única investidora, para fins de cobertura, fazendo jus somente ao teto então vigente.
Esta Corte Superior já enfrentou a controvérsia acerca da aplicação do teto de cobertura do FGC na hipótese de fundos de previdência, tendo também concluído que o teto de cobertura se aplica para o montante do fundo, não à parcela devida para cada beneficiário do fundo de previdência (REsp 1.453.957/SP, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe 26/06/2015).
O Fundo exerce uma função social de proteção do pequeno investidor, que tem condições limitadas de avaliação de risco, estimulando, assim, a participação do cidadão comum no mercado financeiro. Verifica-se, pois, que a pretendida garantia de valores de vulto, aplicados por investidores qualificados, como é o caso de uma instituição de previdência complementar, não se insere nos objetivos da garantia ordinária do FGC, podendo prejudicar a finalidade para a qual foi criado o Fundo, criando risco moral, na medida em que incentivaria o investimento em instituições financeiras de conduta arrojada e arriscada, em detrimento de bancos que efetuam aplicações mais responsáveis e, por esse motivo, em geral, menos lucrativas" (REsp 1.454.238/SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti).
REsp 1.568.938-RS, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, por maioria, julgado em 25/08/2020, DJe 03/09/2020
DIREITO DO CONSUMIDOR
Venda de produto que posteriormente apresenta defeito. Assistência técnica. Encaminhamento. Responsabilidade solidária do comerciante. Independente do prazo de 72 horas. Observância do prazo decadencial. Art. 26 do CDC.
O comerciante tem a obrigação de intermediar a reparação ou a substituição de produtos nele adquiridos e que apresentem defeitos de fabricação (vício oculto de inadequação), com a coleta em suas lojas e remessa ao fabricante e posterior devolução.
Esta Corte possui firme posicionamento no sentido da responsabilidade solidária de toda a cadeia de fornecimento pela garantia de qualidade e adequação do produto perante o consumidor. Assim, é necessário se perquirir se essa solidariedade de que trata o art. 18 do CDC impõe ao comerciante a obrigação de coletar e reparar os produtos nele adquiridos e que apresentem defeitos de fabricação (vício oculto de inadequação).
Sobre esse tema, não se desconhece o entendimento que vinha sendo adotado por esta Corte no sentido de que existindo assistência técnica especializada e disponível na localidade de estabelecimento do comerciante (leia-se, no mesmo município), não é razoável a imposição ao comerciante da obrigação de intermediar o relacionamento entre seu cliente e o serviço disponibilizado. Mesmo porque essa exigência apenas dilataria o prazo para efetiva solução e acrescentaria custos ao consumidor, sem agregar-lhe qualquer benefício (REsp n 1.411.136/RS, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 10/3/2015). Contudo, esse posicionamento deve ser revisto.
Importante apontar que a conduta liberal do comerciante em efetuar a troca das mercadorias que apresentarem defeitos dentro do prazo de 72 horas de sua compra (conduta essa que se mostra coerente com o ordenamento consumerista e com o princípio da boa-fé), não elide sua responsabilidade em receber os produtos adquiridos com vício de inadequação pelos consumidores, sejam eles duráveis ou não duráveis, dentro dos respectivos prazos decadenciais para reclamação, com fundamento nos arts. 18 e 26, ambos do CDC.
Sobre o tema, ensina a doutrina que o consumidor poderá optar por levar o aparelho à loja, à assistência técnica ou diretamente ao fabricante (os fornecedores do caput do art. 18), sendo que qualquer deles terá até 30 dias para efetuar o conserto.
Percebe-se que todos os integrantes da cadeia de fornecimento respondem solidariamente pelos produtos defeituosos, lembrando que, nos termos do art. 3º do CDC, fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Vale registrar, conforme consta da petição inicial da presente ação civil pública, que o que se pretende na demanda, na verdade, é que o comerciante seja compelido a intermediar a reparação ou a substituição do equipamento, e não que ela, por seus próprios meios, o repare ou o substitua.
Não deve prosperar o argumento de que a intermediação dos produtos submetidos a reparo, com a coleta em suas lojas e remessa ao fabricante e posterior devolução, corresponde a medida mais gravosa ao fornecedor, se comparada a possibilidade de o consumidor encaminhar o produto diretamente ao fabricante, nas hipóteses em que assim a loja orientar. Do mesmo modo que o comerciante recebeu o produto do fabricante para o comercializar no mercado, em sobrevindo defeito nele, o comerciante deve devolve-lo ao respectivo produtor, para a sanação do vício oculto.
Impedir que o consumidor retorne ao vendedor para que ele encaminhe o produto defeituoso para o fabricante reparar o defeito representa imposição de dificuldades ao exercício de seu direito de possuir um bem que sirva aos fins a que se destina.
Ademais, é até intuitivo que o comerciante tenha muito mais acesso ao fabricante do bem viciado por ela comercializado do que o consumidor, sendo que, em assim se decidindo, até os custos (de tempo e de transporte) inerentes à busca da solução do defeito serão menores para o comerciante do que para o consumidor.
Desse modo, por estar incluído na cadeia de fornecimento do produto, quem o comercializa, ainda que não seja seu fabricante, fica responsável, perante o consumidor, por receber o item que apresentar defeito e o encaminha-lo à assistência técnica, independente do prazo de 72 horas da compra, sempre observado o prazo decadencial do art. 26 do CDC.
REsp 1.786.158-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por maioria, julgado em 25/08/2020, DJe 01/09/2020
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Técnica de julgamento ampliado. Art. 942 do CPC. Apelação provida por unanimidade. Embargos de declaração rejeitados por maioria. Voto vencido que altera o resultado inicial da apelação. Efeito integrativo do recurso. Formação de maioria qualificada. Necessidade.
A técnica de julgamento ampliado do art. 942 do CPC aplica-se aos aclaratórios opostos ao acórdão de apelação quando o voto vencido nascido apenas nos embargos for suficiente para alterar o resultado inicial do julgamento, independentemente do desfecho não unânime dos declaratórios (se rejeitados ou se acolhidos, com ou sem efeito modificativo).
Inicialmente, salienta-se que o extinto recurso de embargos infringentes (previsto nos arts. 530 e seguintes do CPC/1973) e a técnica de julgamento prevista no art. 942 do CPC/2015 assemelham-se no ponto em que possuem como escopo precípuo o aperfeiçoamento da prestação jurisdicional, com a formação de uma maioria qualificada - de forma a melhor debater a matéria que, a priori, tenha sido decidida de forma não unânime nos tribunais -, com a ressalva das diferenças ontológicas que sobre eles recaem.
A alteração legislativa perpetrada transmudou o extinto recurso, que tinha como pressuposto a reforma da sentença de mérito, em técnica processual, que, por sua vez, consoante o disposto no caput, pressupõe tão somente o julgamento não unânime da apelação e a possibilidade de inversão do resultado inicial, independentemente de ter sido reformada ou não a sentença.
Enfatiza-se, também, que essa técnica processual não caracteriza novo julgamento, mas sim continuidade daquele no qual não houve unanimidade, sendo que a aplicação desse regramento é um poder-dever do órgão julgador oriundo do voto vencido. Dessume-se, ainda, da leitura do caput do citado dispositivo legal, que a aplicação desse regramento dá-se quando a divergência instaurada no voto vencido for suficiente a alterar o resultado inicial do julgamento.
Por outro lado, convém registrar que, se o julgamento recair sobre ação rescisória ou agravo de instrumento, a ampliação do quórum de julgamento prevista no caput do art. 942 do CPC/2015 impor-se-á apenas se a maioria formada a princípio tiver o condão de, respectivamente, rescindir a sentença ou reformar a decisão interlocutória de mérito, segundo o disposto no § 3º, o que constitui exceção à regra.
Quanto à aplicação dessa técnica processual especificamente nos embargos de declaração, registra-se, ab initio, a jurisprudência pacífica deste Tribunal, no sentido de que os aclaratórios são cabíveis com o intuito de esclarecer suposta obscuridade, contradição, omissão ou erro material porventura existentes na decisão embargada (nos termos do art. 1.022 do CPC/2015), somente podendo ser-lhes atribuído efeito modificativo, se decorrente do reconhecimento, pelo julgador, de algum dos vícios elencados na lei, por não ser este o escopo precípuo do recurso.
Outrossim, impende anotar que os aclaratórios são dotados de efeito integrativo, o qual visa complementar a decisão embargada, a ela se aderindo a fundamentação constante do julgamento dos embargos, constituindo um julgado uno.
Acerca dessa característica peculiar dos embargos, destaca-se o entendimento já proferido no voto dos EREsp 1.290.283/GO, seguido pela maioria dos membros da Segunda Seção (DJe 22/5/2018), no qual ficou consignado serem "cabíveis embargos infringentes quando a divergência qualificada desponta nos embargos de declaração opostos ao acórdão unânime da apelação que reformou a sentença".
Não obstante aquela questão debatida seja atinente ao cabimento dos extintos embargos infringentes, a lógica jurídica lá utilizada amolda-se, também, à hipótese em análise, que trata da técnica de julgamento ampliado. Isso porque, como visto inicialmente, ambos os institutos processuais possuem, igualmente, o propósito de formação, após a prolação de voto dissidente, de uma maioria qualificada, além de remanescer inalterado o caráter integrativo dos embargos.
Desse modo, amparado em tais premissas e mantendo a mesma linha de raciocínio, conclui-se que a técnica de julgamento ampliado, positivada no art. 942 do códex processual em vigor, deve ser observada nos embargos de declaração não unânimes decorrentes de acórdão de apelação, quando a divergência for suficiente à alteração do resultado inicial, pois o julgamento dos embargos constitui extensão da própria apelação, mostrando-se irrelevante o resultado majoritário dos embargos (se de rejeição ou se de acolhimento, com ou sem efeito modificativo).
RMS 60.343-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/08/2020, DJe 26/08/2020
DIREITO REGISTRAL, DIREITO URBANÍSTICO
Loteamento. Aquisição de todos os lotes. Sub-rogação nos direitos do loteador. Cancelamento do procedimento de pedido de registro. Sociedade empresária adquirente. Legitimidade. Desenvolvimento urbano. Ausência de prejuízo.
Empresa incorporadora e administradora de negócios imobiliários que adquire todos os lotes do loteamento e se sub-roga nos direitos do loteador possui legitimidade para requerer o cancelamento do procedimento do registro do loteamento, vedada a pretensão nos casos de comprovado inconveniente para o desenvolvimento urbano ou quando realizado algum melhoramento na área loteada e adjacências.
O pedido de cancelamento do procedimento de registro do loteamento pode ser requerido pelo loteador, ou quem por ele se sub-rogou, vedada a pretensão nos casos de comprovado inconveniente para o desenvolvimento urbano ou quando realizado algum melhoramento na área loteada e adjacências.
O art. 22 da Lei n. 6.766/1979 estabelece que desde a data de registro do loteamento, passam a integrar o domínio do Município as vias e praças, os espaços livres e as áreas destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, constantes do projeto e do memorial descritivo.
No caso, contudo, não houve o registro do loteamento, que se encontra na fase de aprovação dos projetos perante a municipalidade, razão pela qual não se operou a tradição, a transmissão da propriedade. Na fase em que se encontra o procedimento administrativo, é aplicável o art. 17 da referida legislação, pelo qual a destinação dos espaços públicos descritos no projeto do loteamento poderá ser alterada em caso de cancelamento do registro do loteamento.
Ademais, não houve nenhum tipo de obra ou melhoramento no imóvel objeto do loteamento ou nos seus arredores, tampouco ação do Poder do Público, ou seja, o terreno encontra-se da mesma forma tal como na época do início do procedimento, razão pela qual a municipalidade não teria motivo para obstar o pedido de cancelamento.
Destaca-se que cancelar o procedimento do pedido de registro de loteamento é diferente de pedir o cancelamento do registro do loteamento, hipótese em que a tradição para a Municipalidade já se operou; naquela outra não.
Sendo assim, a empresa incorporadora e administradora de negócios imobiliários, que adquiriu todos os lotes do loteamento e se sub-rogou nos direitos do loteador, possui legitimidade para requerer o cancelamento do procedimento do registro do loteamento.
REsp 1.587.477-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 10/03/2020, DJe 27/08/2020
DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Adoção de menor pleiteada pela avó. Vedação prevista no § 1º do artigo 42 do ECA. Mitigação. Possibilidade.
É possível a mitigação da norma geral impeditiva contida no § 1º do artigo 42 do ECA, de modo a se autorizar a adoção avoenga em situações excepcionais.
A controvérsia principal dos autos reside em definir se é possível a adoção avoenga à luz do quadro fático delineado pelas instâncias ordinárias, malgrado o disposto no § 1º do artigo 42 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.
Como é de sabença, o artigo 5º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (Decreto-Lei n. 4.657/42) preceitua que, "na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum". Tal comando foi parcialmente reproduzido no artigo 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069/90).
Sob tal perspectiva, sobressai a norma inserta no art. 227 da Constituição da República de 1988, que consagrou a doutrina da proteção integral e prioritária das crianças e dos adolescentes. O princípio da proteção integral, segundo abalizada doutrina, significa que "as pessoas em desenvolvimento, isto é, crianças e adolescentes, devem receber total amparo e proteção das normas jurídicas, da doutrina, jurisprudência, enfim de todo o sistema jurídico".
Em cumprimento ao comando constitucional, sobreveio a Lei 8.069/90, que adotou a doutrina da proteção integral e prioritária como vetor hermenêutico para aplicação de suas normas jurídicas, a qual, sabidamente, guarda relação com o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.
No caso vertente, cumpre, de início, observar que o § 1º do artigo 42 do ECA estabeleceu, como regra, a impossibilidade da adoção dos netos pelos avós (a chamada adoção avoenga).
Sem descurar do relevante escopo social da norma proibitiva da adoção de descendente por ascendente, constata-se a existência de precedentes da Terceira Turma que mitigam sua incidência em hipóteses excepcionais envolvendo crianças e adolescentes, e desde que verificado, concretamente, que o deferimento da adoção consubstancia a medida que mais atende ao princípio do melhor interesse do menor, sobressaindo reais vantagens para o adotando.
Com efeito, por ocasião do julgamento do Recurso Especial 1.448.969/SC, a Terceira Turma, com base nos princípios da dignidade humana e do melhor interesse do menor, considerou legal a adoção de neto por avós que, desde o nascimento, exerciam a parentalidade socioafetiva e haviam adotado a mãe biológica aos oitos anos de idade e grávida do adotando. Em 27/02/2018, tal exegese foi confirmada pelos integrantes da Terceira Turma, em caso similar.
Ademais, vislumbra-se que a unanimidade dos integrantes da Terceira Turma não controvertem sobre a possibilidade de mitigação da norma geral impeditiva contida no § 1º do artigo 42 do ECA – de modo a se autorizar a adoção avoenga – em situações excepcionais em que: (i) o pretenso adotando seja menor de idade; (ii) os avós (pretensos adotantes) exerçam, com exclusividade, as funções de mãe e pai do neto desde o seu nascimento; (iii) a parentalidade socioafetiva tenha sido devidamente atestada por estudo psicossocial; (iv) o adotando reconheça os adotantes como seus genitores e seu pai (ou sua mãe) como irmão; (v) inexista conflito familiar a respeito da adoção; (vi) não se constate perigo de confusão mental e emocional a ser gerada no adotando; (vii) não se funde a pretensão de adoção em motivos ilegítimos, a exemplo da predominância de interesses econômicos; e (viii) a adoção apresente reais vantagens para o adotando.
Tal exegese deve ser encampada por esta Quarta Turma, por se mostrar consentânea com o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, fim social objetivado pela Constituição da República de 1988 e pela Lei n. 8.069/90, conferindo-se, assim, a devida e integral proteção aos direitos e interesses das pessoas em desenvolvimento, cuja vulnerabilidade e fragilidade justificam o tratamento especial destinado a colocá-las a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência ou opressão.
REsp 1.267.282-SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por maioria, julgado em 23/06/2020, DJe 18/08/2020
DIREITO EMPRESARIAL, DIREITO FALIMENTAR
Concordata. Descumprimento das obrigações da concordatária. Falência decretada com base no Decreto-Lei n. 7.661/1945. Pedido de recuperação judicial. Inviabilidade.
A concordatária que descumpriu as obrigações assumidas na concordata e teve sua falência decretada não tem direito à conversão em recuperação judicial.
O artigo 48 da Lei n. 11.101/2005 prevê expressamente que o devedor falido não pode requerer recuperação judicial, e que, "se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes". O art. 192 da referida lei, de outro lado, orienta que a lei nova não se aplica aos processos de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência.
A interpretação dos referidos textos evidencia que a recuperação judicial não pode ser deferida ao falido, independentemente da legislação de regência, pela previsão expressa, no caso da quebra decretada na vigência da atual legislação, e por sua inaplicabilidade às falências regidas pelo Decreto-Lei n. 7.661/1945.
Ademais, a exceção prevista no § 2º do art. 192 da Lei n. 11.101/2005 possibilita o pedido de recuperação judicial apenas ao concordatário "que não houver descumprido obrigação no âmbito da concordata", o que não ocorreu no caso.
Assim, não tem direito ao pedido de recuperação judicial a concordatária descumpridora das obrigações assumidas na concordata e que resultaram na decretação de sua falência, que deve prevalecer.
HC 588.445-SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 25/08/2020, DJe 31/08/2020
DIREITO CONSTITUCIONAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL
Apartamento não habitado. Local de armazenamento de armas e drogas. Busca e apreensão. Ausência de prévia autorização judicial. Legalidade. Fundadas suspeitas de flagrante de crime permanente. Proteção constitucional. Inviolabilidade de domicílio. Não cabimento.
Não há nulidade na busca e apreensão efetuada por policiais, sem prévio mandado judicial, em apartamento que não revela sinais de habitação, nem mesmo de forma transitória ou eventual, se a aparente ausência de residentes no local se alia à fundada suspeita de que o imóvel é utilizado para a prática de crime permanente.
O Supremo Tribunal Federal definiu, em repercussão geral, que o ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial apenas se revela legítimo - a qualquer hora do dia, inclusive durante o período noturno - quando amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem estar ocorrendo, no interior da casa, situação de flagrante delito (RE 603.616/RO, Rel. Ministro Gilmar Mendes DJe 8/10/2010).
Nessa linha de raciocínio, o ingresso em moradia alheia depende, para sua validade e sua regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio.
Ademais, a proteção constitucional, no tocante à casa, independentemente de seu formato e localização, de se tratar de bem móvel ou imóvel, pressupõe que o indivíduo a utilize para fins de habitação, moradia, ainda que de forma transitória, pois tutela-se o bem jurídico da intimidade da vida privada.
O crime de tráfico de drogas, na modalidade guardar ou ter em depósito possui natureza permanente. Tal fato torna legítima a entrada de policiais em domicílio para fazer cessar a prática do delito, independentemente de mandado judicial, desde que existam elementos suficientes de probabilidade delitiva capazes de demonstrar a ocorrência de situação flagrancial.
No caso, após denúncia anônima detalhada de armazenamento de drogas e de armas, seguida de informações dos vizinhos de que não haveria residente no imóvel, de vistoria externa na qual não foram identificados indícios de ocupação, mas foi visualizada parte do material ilícito, policiais adentraram o local e encontraram grande quantidade de drogas.
Assim, sem desconsiderar a proteção constitucional de que goza a propriedade privada, ainda que desabitada, não se verifica nulidade na busca e apreensão efetuada por policiais, sem prévio mandado judicial, em apartamento que não revela sinais de habitação, nem mesmo de forma transitória ou eventual.
HC 522.651-SP, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 04/08/2020, DJe 19/08/2020
DIREITO PENAL
Execução penal. Progressão de regime especial. Mulher gestante, mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência. Requisito contido no inciso V do § 3º do art. 112 da LEP. Organização criminosa. Existência de complemento normativo na Lei n. 12.850/2013. Extensão para todas as espécies de sociedades criminosas. Impossibilidade. Vedação à interpretação extensiva in malan partem de normas penais.
O requisito "não ter integrado organização criminosa" incluso no inciso V do § 3º do art. 112 da LEP, para progressão de regime da mulher gestante, mãe ou responsável por criança ou pessoa com deficiência, deve ser interpretado de acordo com a definição de organização criminosa da Lei n. 12.850/2013.
A Lei n. 13.769/2018 incluíu o § 3º no art. 112 da Lei de Execuções Penais - LEP, prevendo progressão de regime especial. A norma exigiu a presença de cinco requisitos cumulativos para a concessão do benefício executório, dentre eles, o de "não ter integrado organização criminosa". O argumento de que o termo organização criminosa não se refere ao crime previsto na Lei n 12.850/2013, tratando-se, na verdade, de uma expressão genérica, a qual abrange todas as espécies de sociedades criminosas, não se coaduna com a correta exegese da norma. Com efeito, a referida regra tem conteúdo material (norma híbrida), porquanto trata de progressão de regime prisional, relacionado com o jus libertatis, o que impõe, ao intérprete, a submissão a todo o conjunto de princípios inerentes às normas penais.
O inciso V do § 3º do art. 112, da LEP, é um exemplo de norma penal em branco com complemento normativo, pois o próprio Legislador, respeitando o princípio da taxatividade (decorrente do princípio da estrita legalidade), desincumbiu-se do ônus de apresentar, expressamente, a definição de organização criminosa ao editar a Lei n. 12.850/2013 (art. 1º e § 1º).
Não é legítimo que o julgador, em explícita violação ao princípio da taxatividade da lei penal, interprete extensivamente o significado de organização criminosa a fim de abranger todas as formas de societas sceleris. Tal proibição fica ainda mais evidente quando se trata de definir requisito que restringe direito executório implementado por lei cuja finalidade é aumentar o âmbito de proteção às crianças ou pessoas com deficiência, reconhecidamente em situação de vulnerabilidade em razão de suas genitoras ou responsáveis encontrarem-se reclusas em estabelecimentos prisionais. A teleologia da norma e a existência de complemento normativo impõem exegese restritiva e não extensiva.
O Legislador, quando teve o intuito de referir-se a hipóteses de sociedades criminosas, o fez expressamente, conforme previsão contida no art. 52, § 1º, inciso I, § 3º, § 4º, inciso II, e § 5º, da Lei n. 7.210/1984, que distinguem organização criminosa de associação criminosa e milícia privada.
ProAfR no REsp 1.865.223-SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 18/08/2020, DJe 26/08/2020
A Primeira Seção acolheu a proposta de afetação do recurso especial ao rito dos recursos repetitivos, a fim de uniformizar o entendimento a respeito da seguinte controvérsia: (im)possibilidade de majoração, em grau recursal, da verba honorária fixada em primeira instância contra o INSS quando o recurso da entidade previdenciária for provido em parte, apenas em relação aos consectários da condenação.
ProAfR no REsp 1.846.649-MA, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por maioria, julgado em 25/08/2020, DJe 08/09/2020 (Tema 1061)
DIREITO DO CONSUMIDOR, DIREITO PROCESSUAL CIVIL
A Segunda Seção acolheu a proposta de afetação do recurso especial ao rito dos recursos repetitivos, a fim de uniformizar o entendimento a respeito das seguintes controvérsias: 1.1) Independentemente da inversão do ônus da prova - que deve ser decretada apenas nas hipóteses autorizadas pelo art. 6°, VIII, do CDC, segundo avaliação do magistrado no caso concreto -, cabe à instituição financeira/ré, enquanto fato impeditivo e modificativo do direito do consumidor/autor (CPC, art. 373, II), o ônus de provar que houve a contratação do empréstimo consignado, mediante a juntada do contrato ou de outro documento capaz de revelar a manifestação de vontade do consumidor no sentido de firmar o negócio jurídico; 1.2) o consumidor/autor, quando alegar que não recebeu o valor do empréstimo, tem o dever de colaborar com a Justiça (CPC, art. 6°) e fazer a juntada do seu extrato bancário, embora este não deva ser considerado, pelo juiz, como documento essencial para a propositura da ação; 1.3) Nas hipóteses em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante do contrato juntado ao processo, cabe à instituição financeira/ré o ônus de prova essa autenticidade (CPC, art. 429 II), por meio de perícia grafotécnica ou mediante os meios de prova legais ou moralmente legítimos (CPC, art. 369).
ProAfR no REsp 1.859.933-SC, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 25/08/2020, DJe 04/09/2020 (Tema 1060)
DIREITO PENAL
A Terceira Seção acolheu a proposta de afetação do recurso especial ao rito dos recursos repetitivos a fim de uniformizar o entendimento a respeito da seguinte controvérsia: "caracterização do crime de desobediência quando a ordem de parada a veículo for emitida por policial no exercício de atividade ostensiva de segurança pública"
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi criado pela Constituição Federal de 1988 com a finalidade de preservar a uniformidade da interpretação das leis federais em todo o território brasileiro. Endereço: SAFS - Quadra 06 - Lote 01 - Trecho III. CEP 70095-900 | Brasília/DF. Telefone: (61) 3319-8000 | Fax: (61) 3319-8700. Home page: www.stj.jus.br
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STJ - Superior Tribunal de Justiça. Informativo 678 do STJ - 2020 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 set 2020, 15:59. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Informativos dos Tribunais/55289/informativo-678-do-stj-2020. Acesso em: 23 nov 2024.
Por: STJ - Superior Tribunal de Justiça BRASIL
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