Superior Tribunal de Justiça - STJ.
RECURSO ESPECIAL Nº 847.597 - SC (2006/0112925-5)
RELATOR: MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS
RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
RECORRIDO: A G E E CÔNJUGE
ADVOGADO: RITA DE CÁSSIA WALTER
INTERES.: M A W (MENOR)
EMENTA
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ECA. ADOÇÃO. INTIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA AUDIÊNCIA. ARTIGO 166 DA LEI Nº 8.069/90. FIM SOCIAL DA LEI. INTERESSE DO MENOR PRESERVADO. DIREITO AO CONVÍVIO FAMILIAR. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. NULIDADE INEXISTENTE.
Não se declara nulidade por falta de audiência do Ministério Público se - a teor do acórdão recorrido - o interesse do menor foi preservado e o fim social do ECA foi atingido.
O artigo 166 da Lei nº 8.069/90 deve ser interpretado à luz do artigo 6º da mesma lei.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Ari Pargendler e Sidnei Beneti votaram com o Sr. Ministro Relator.Ausente, ocasionalmente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi.
Brasília (DF), 06 de março de 2008 (Data do Julgamento).
MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS
Relator
RELATÓRIO
MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS: A.G.E e C.A. E pediram a adoção do menor M.A.V em 08/11/2002. (fls. 02/03)
Alegaram que estavam inscritos no cadastro de adotantes da Comarca de Joinville e preenchiam os requisitos necessários à colocação do menor em família substituta e ao pedido de adoção.
Narraram que a mãe da criança foi ouvida pelo serviço psicológico e pelo juiz (ECA, artigo 166), a fim de verificar sua decisão de entregar o filho para adoção. Pediram o deferimento da adoção, a oitiva do Ministério Público e a concessão liminar da guarda provisória da criança.
O juiz deferiu a guarda provisória da criança, estabeleceu estágio de convivência e determinou a realização de estudo social. (fl. 12)
Os adotantes firmaram o termo de guarda (fl. 15) e o Serviço Social opinou favoravelmente pelo deferimento do pedido de adoção (fls. 16/17).
O Ministério Público Estadual teve vista dos autos e argüiu nulidade dos termos de fls. 10 e 11, porque foram lavrados sem sua presença (fl. 19)
O juiz afastou a nulidade, dizendo que deu ao Ministério Público a oportunidade para atuar no feito. Além disso, não foi maculada a manifestação de vontade dos pais biológicos do adotado. Em assim dizendo, julgou procedente o pedido de adoção. (fls. 20/24)
O representante do Ministério Público, em apelação, argüiu nulidade dos atos judiciais praticados, porque não participou da entrevista psicológica com os pais biológicos da criança.
O Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina negou provimento ao recurso, em acórdão que diz:
"ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ADOÇÃO - OITIVA DOS GENITORES DO ADOTANDO EM JUÍZO - DESISTÊNCIA DO PÁTRIO PODER - PROCEDÊNCIA DO PEDIDO DE ADOÇÃO - INSURGÊNCIA - AUSÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO - ARGÜIÇÃO DE NULIDADE - PREJUÍZOS AO ADOTANDO - INEXISTÊNCIA - ARGÜIÇÃO AFASTADA - ASPECTO TELEOLÓGICO DO ECA - RECURSO IMPROVIDO - SENTENÇA MANTIDA.
Inexistente prova de prejuízo ao menor, inacolhe-se argüição de nulidade do feito, mormente quando atingido o aspecto teleológico do ECA, que é o bem estar do adotando." (fl. 53)
Nesse recurso especial (alíneas "a" e "c"), o Ministério Público do Estado de Santa Catarina queixa-se de ofensa aos Artigos 166, parágrafo único, 202 e 204, do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90).
Sustenta que é obrigatória a intervenção do Ministério Público quando há interesse protegido pela lei, principalmente nas ações de perda ou suspensão do pátrio poder.
Houve contra-razões.
O Ministério Público Federal, em parecer do e. Subprocurador-Geral da República, Dr. Henrique Fagundes, opinou pelo provimento do recurso especial. (fls. 83/87)
VOTO
MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS(Relator): O Ministério Público não participou de audiência onde os pais biológicos de uma criança dada em adoção, concordaram expressamente com a colocação do filho em família substituta. Queixa-se, no recurso especial, de nulidade do ato.
Para o Tribunal a quo não houve nulidade. É que a ausência do Ministério Público não acarretou prejuízo ao menor. Em tais casos, deve-se levar em conta os fins sociais do artigo 6º da Lei nº 8.069/90.
O Ministério Público insiste na argüição de nulidade. Alega que a questão envolve interesse público. A nulidade, por isso, é absoluta e o prejuízo presumido e independente de comprovação.
Acrescenta que a intervenção do Ministério Público visa proteger o adotante, e suas relações familiares com o adotado, contra futuras investidas de pais arrependidos.
No caso, diz o MP, a decretação de nulidade e repetição dos atos na forma regular protegeria o adotado e os adotantes contra eventual arrependimento dos pais biológicos, que não encontrariam fundamento para nulificar o ato.
O dispositivo da Lei nº 8.069/90 prequestionado diz:
"Art. 166. Se os pais forem falecidos, tiverem sido destituídos ou suspensos do pátrio poder, ou houverem aderido expressamente ao pedido de colocação em família substituta, este poderá ser formulado diretamente em cartório, em petição assinada pelos próprios requerentes.
Parágrafo único. Na hipótese de concordância dos pais, eles serão ouvidos pela autoridade judiciária e pelo representante do Ministério Público, tomando-se por termo as declarações."
É, pois, obrigatória a intervenção do Ministério Público nos processos em que haja interesse de incapazes (CPC, artigo 82, I).
Contudo, nem sempre é necessário proclamar a nulidade. Mesmo diante da omissão, se o ato atingir sua finalidade e não causar prejuízo à parte que seria protegida pelo MP, não há razão para anular-se o ato.
O artigo 166 da Lei nº 8.069/90 não pode ser interpretado isoladamente. Em sua exegese é necessário levar em conta o artigo 6º, a dizer que são importantes na interpretação da lei, os fins sociais a que ela se destina e "a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento".
No caso dos autos, o menor, cujos pais manifestaram vontade de entregá-lo para adoção, teve reconhecido o direito de ser colocado no seio de uma família, ainda que substituta, com plenas condições de criá-lo e educá-lo. Livrou-se, assim, de integrar o rol de crianças abandonadas nas ruas.
O serviço de psicologia do Serviço Social Judiciário, emitiu parecer onde afirmou que a mãe do adotando se mostra consciente e segura com relação à decisão de encaminhar seu filho para adoção através do Juizado. (fl. 09)
Nada indica tenha havido complô entre o Juiz e o Serviço Social para macular a vontade expressa dos pais biológicos. O Tribunal a quo não enxergou nulidade do ato processual, nem prejuízo para o menor, pela não-intervenção do MP no ato.
Para a Corte local, o interesse do menor foi preservado. O fim social a que se destina o ECA foi atingido.
A ausência do Ministério Público - disse o acórdão recorrido - não causou qualquer prejuízo ao incapaz, não havendo nulidade a ser declarada. Dizer o contrário, em REsp, seria maltratar a Súmula 7.
O STJ, no julgamento do REsp 26.898/SP, relator Ministro Dias Trindade, proclamou: "Não se declara nulidade, por falta de audiência do MP, se o interesse dos menores se acha preservado, posto que vitoriosos na demanda".
No mesmo sentido: Ag Rg no Ag 423.153/ALDIR PASSARINHO.
Na terminologia da Turma, não conheço do recurso especial.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2006/0112925-5
REsp 847597/SC
Números Origem: 20040158645 38020491120
PAUTA: 08/05/2007
JULGADO: 06/03/2008
SEGREDO DE JUSTIÇA
Relator
Exmo. Sr. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro SIDNEI BENETI
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. JOÃO PEDRO DE SABOIA BANDEIRA DE MELLO FILHO
Secretária
Bela. SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO
AUTUAÇÃO
RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
RECORRIDO: A G E E CÔNJUGE
ADVOGADO: RITA DE CÁSSIA WALTER
INTERES.: M A W (MENOR)
ASSUNTO: Civil - Família - Menor - Adoção
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Ari Pargendler e Sidnei Beneti votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, ocasionalmente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi.
Brasília, 06 de março de 2008
SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO
Secretária
DJ: 01/04/2008
STJ - Superior Tribunal de Justiça BRASIL, o autor
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