EMENTA: CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM EVIDENCIADA. ALEGAÇÃO DE QUE A FUNCIONÁRIA DA EMPRESA RÉ NÃO TERIA PODERES PARA FIRMAR CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EM SEU NOME. INSUBISTÊNCIA. APLICAÇÃO DA TEORIA DA APARÊNCIA E DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. AVENTADO CERCEAMENTO DE DEFESA ANTE O JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. PRETENDIDA A REALIZAÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. IRRELEVÂNCIA. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS NOS AUTOS SUFICIENTES À PLENA CONVICÇÃO DO JULGADOR. DENUNCIAÇÃO DA LIDE INDEFERIDA. INEXISTÊNCIA DE PROVA ACERCA DA EXISTÊNCIA DE CONTRATO DE SEGURO. EXEGESE DO ART. 758 DO CÓDIGO CIVIL. PRELIMINARES AFASTADAS. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO FUNERÁRIO. INEXISTÊNCIA DE PROVA ACERCA DO PAGAMENTO (ART. 333, II, DO CPC). INADIMPLEMENTO CONFIGURADO. DEVER SE RESSARCIR COMPROVADO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MANTIDOS EM 15% SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. É curial que a produção de provas (pericial e testemunhal) é dirigida ao juiz da causa e portanto, para a formação de seu convencimento. Logo, se este se sentir habilitado para julgar o processo, calcado nos elementos probantes já existente nos autos, pode, sintonizado com os princípios da persuasão racional e celeridade processual, desconsiderar o pleito de produção de tais provas, sem cometer qualquer ilegalidade ou cerceamento de defesa.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2010.062075-5, da comarca de Indaial (1ª Vara), em que é apelante Indústria e Comércio de Cerâmica Baldo Ltda e apelado Carlos Eduardo Corrêa e CIA LTDA:
ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, afastar as preliminares e, no mérito, negar provimento ao recurso. Custas legais.
RELATÓRIO
Adota-se o relatório da sentença recorrida que é visualizado às fls. 64/65, por revelar com transparência o que existe nestes autos, e a ele acrescenta-se que a MM.ª Juíza de Direito, Doutora Vivian Carla Josefovicz, julgou procedentes os pedidos iniciais para condenar a ré ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigidos monetariamente (INPC) a partir do vencimento (27.6.09 – fl. 8) e com juros de mora (1% ao mês) a contar da citação, além das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação.
Contra esta decisão, a ré interpôs recurso de apelação (fls. 73/82), aventando em preliminar: a) sua ilegitimidade ad causam, pois o contrato de prestação de serviços foi firmado por preposto sem poderes para firmar obrigação em nome da sociedade; b) cerceamento de defesa ante o julgamento antecipado da lide; c) a denunciação da lide da empresa de seguros Mapre Seguros. No mérito, reedita os argumentos expendidos em sua tese de defesa quanto à impropriedade da presente ação, requerendo, ao final, a redução dos honorários advocatícios .
A apelada apresentou contrarrazões (fls. 88/95), pugnando pela manutenção do veredicto.
VOTO
1. A respeito das condições da ação, lecionam Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery que:
Para que o juiz possa aferir a quem cabe a razão no processo, isto é, decidir o mérito, deve examinar questões preliminares que antecedem lógica e cronologicamente a questão principal: o mérito, vale dizer, o pedido, a pretensão, o bem da vida querido pelo autor. O mérito é a última questão que, de ordinário, o juiz deve examinar no processo. Essas questões preliminares dizem respeito ao próprio exercício do direito de ação (condições da ação) e à existência e regularidade da relação jurídico processual (pressupostos processuais). As condições da ação possibilitam ou impedem o exame da questão seguinte(mérito). Presentes todas, o juiz pode analisar o mérito, não sem antes verificar se também se encontram presentes os pressupostos processuais. Ausente uma delas ou mais de uma, ocorre o fenômeno da carência de ação (CPC 301, X), circunstância que torna o juiz impedido de examinar o mérito. A carência de ação tem como conseqüência a extinção do processo sem julgamento do mérito (CPC 267 VI). As condições da ação são três: legitimidade das partes (legitimatio ad causam), interesse processual e possibilidade jurídica do pedido. As condições da ação são matérias de ordem pública a respeito da qual o juiz deve pronunciar-se ex officio, a qualquer tempo e grau de jurisdição, pois a matéria é insuscetível de preclusão (Código de Processo Civil Comentado, 9ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 435/436).
Especificamente acerca da legitimidade das partes, dispõem os citados autores que: "parte, em sentido processual, é aquela que pede (parte ativa) e aquela em face de quem se pede (parte passiva) a tutela jurisdicional. [...] quando existe coexistência entre a legitimidade do direito material que se quer discutir em juízo e a titularidade do direito de ação, diz-se que se trata de legitimação ordinária para a causa, que é a regra geral: aquele que se afirma titular do direito material tem legitimidade para, como parte processual (autor ou réu), discuti-lo em juízo. Há casos excepcionais, entretanto, em que o sistema jurídico autoriza alguém a pleitear, em nome próprio, direito alheio. Quando isso ocorre há legitimação extraordinária, que, no sistema brasileiro, não pode decorrer da vontade das partes, mas somente da lei" (ob. cit. p. 436).
In casu, infere-se do contrato de prestação de serviços funerários acostado à fl. 8 a assinatura de Giselle K. Sabel, funcionária da empresa ré. Logo, em que pese a veemente tese defendida acerca da ausência de poderes da referida empregada para firmar compromisso em nome da empresa, por força da teoria da aparência, bem como da boa-fé objetiva, deve-se adotar como válida a declaração de vontade ali constante.
Nessa medida, afasta-se a preliminar aventada.
2. Inexiste cerceamento de defesa quando o juiz, considerando desnecessária a dilação probatória, julga antecipadamente a lide com base nos elementos até então coligidos. E é o que determina o Código de Processo Civil se a "questão de mérito for unicamente de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência" (art. 330, I). Ademais, ao delimitar as provas necessárias, deverá o Magistrado indeferir "as diligências inúteis ou meramente protelatórias" (CPC, art. 130).
O processo de conhecimento possui o escopo precípuo de convencer o magistrado acerca dos fatos alegados e dos fundamentos jurídicos aplicáveis à situação em exame. Portanto, sendo a finalidade da prova justamente formar o convencimento do juiz, não basta que a parte apenas suscite a ocorrência de cerceamento de defesa ante o julgamento antecipado da lide, é preciso que demonstre a relevância e a pertinência do meio probatório que lhe foi suprimido, além de sua aptidão para alterar o posicionamento adotado.
Esta Corte de Justiça tece entendimento uníssono nesse sentido:
Inexiste cerceamento de defesa quando o juiz, considerando desnecessária a dilação probatória, julga antecipadamente a lide com base nos elementos até então coligidos e as provas requeridas evidentemente não alterariam a solução adotada (AC n.º 2005.024605-8, deste relator).
Desnecessária a produção de outras provas se as existentes nos autos são suficientes ao convencimento do julgador, não caracterizando cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide, quando a questão de mérito for unicamente de direito (AC n.º 2002.011016-2, Des. Wilson Augusto do Nascimento).
Não configura cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide, se a prova postulada não influenciaria no desfecho (AC n.º 36.749, Des. Xavier Vieira).
Estando o juiz suficientemente convencido, através da prova colhida nos autos, sobre a paternidade do alimentando, não existem razões para retardar o curso normal do processo (AC n.º 2002.024367-7, Des. Wilson Augusto do Nascimento).
Não se caracteriza o cerceamento de defesa quando há nos autos elementos bastantes a formar o convencimento do juiz, permitindo-lhe o julgamento antecipado da lide (AC n.º 1998.009749-5, Des. Sérgio Paladino).
A propósito, pelo princípio do livre convencimento motivado e pelas provas até então coligidas, não se pode reprimir o entendimento da sentenciante acerca da quaestio.
Por essas razões, não há que se falar em nulidade do processo por cerceamento de defesa.
3. Pretende a ré, ora apelante, a denunciação da lide à empresa Mapre Seguros. Todavia, inexiste qualquer documento hábil a demonstrar a relação contratual alegada, não se prestando, para tanto, a simples juntada da proposta de seguro em grupo ou mesmo o "manual de assistência a pessoas".
Como bem disciplina o art. 758 do Código Civil: "O contrato de seguro prova-se com a exibição da apólice ou do bilhete do seguro, e, na falta deles, por documento comprobatório do pagamento do respectivo prêmio".
Desta forma, sem maiores digressões sobre o tema, rejeita-se o pedido de denunciação da lide.
4. Disciplina o art. 389 do Código Civil: "Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado".
Logo, à luz do art. 395 do CC, "Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado. Parágrafo único – Se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este poderá enjeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos".
Ensina Silvio de Sálvio Venosa que:
O inadimplemento da obrigação poderá ser absoluto. A obrigação não foi cumprida em tempo, lugar e forma convencionados e não mais poderá sê-lo. O fato de a obrigação poder se cumprida, ainda que a destempo (ou no ligar e pela forma não convencionada) é critério que se aferirá em cada caso concreto. Cabe ao juiz, com a consideração de homem ponderado, colocar-se na posição de credor: se o cumprimento da obrigação ainda é útil para o credor, o devedor estará em mora (há inadimplemento relativo). O critério da utilidade é que fará a distinção (Direito Civil: Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. V.2, 3ª ed.,São Paulo: Editora Atlas, 2003, p. 237).
No caso em apreço, resta incontroverso a prestação de serviços funerários por parte da empresa autora no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em favor da ré, inexistindo qualquer prova a demonstrar o adimplemento da obrigação (art. 333, II, do CPC).
Desta forma, diante da inexistência de qualquer vício capaz de invalidar a relação contratual firmada, deve a ré adimplir os valores contratos, nos exatos termos da sentença.
5. A ilustre sentenciante condenou a ré a pagar honorários advocatícios ao procurador da autora no valor de 15% sobre a condenação.
Ensina Yussef Said Cahali, citando julgado do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, que "a verba advocatícia deve ser dosada com observância do critério fixado pelo art. 20, § 3º, do CPC, considerando que a natureza e importância da causa devem ser sopesadas como o trabalho dos advogados; e o tempo que lhes é exigido para o serviço não diz respeito apenas à duração do processo, mas também ao estudo e preparo das razões apresentadas em ambos os graus de apelação; por isso, não tem, nesse ponto, a relevância que a apelante quer dar, o fato do julgamento antecipado da lide; interessa mais a qualidade do trabalho realizado e o proveito obtido para os constituintes que o número de laudas apresentadas" (in Honorários Advocatícios, RT, 3ª ed., p. 469).
No caso em exame, se por um lado a causa não exigiu do advogado da autora tempo ou trabalho extravagantes, nem estudos que envolvessem questões complexas, ainda assim, tomando-se a cautela para não se atentar contra a dignidade da nobre profissão e em observância ao serviço prestado, destacando-se que a causa encontra-se em segundo grau de jurisdição, entende-se que os parâmetros do § 3º do art. 20 do Código de Processo Civil foram observados, pelo que não há razão para que o quantum seja minorado.
6. Ante o exposto, vota-se no sentido de afastar as preliminares e, no mérito, negar provimento ao recurso.
DECISÃO
Nos termos do voto do relator, à unanimidade, afastaram a preliminar e, no mérito, negar provimento ao recurso.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Fernando Carioni, com voto, e dele participou a Exma. Sra. Des.ª Maria do Rocio Luz Santa Ritta.
Florianópolis, 23 de novembro de 2010.
Marcus Tulio Sartorato
RELATOR
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Por: TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Por: TRF3 - Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Por: TJSC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina Brasil
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