EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA ____ ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE GOIÂNIA-GO.
FULANAO DE TAL, brasileira, solteira, jornalista, portadora do R.G. sob n° , devidamente inscrita no CPF sob o n° residente e domiciliada na Rua, n° , apto., Setor , CEP. n°, Goiânia-GO, através de seus procuradores subscritos, vêm, respeitosamente à presença de Vossa Excelência, propor a presente:
AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO C/C REVISÃO CONTRATUAL C/C EXIBIÇÃO DE CONTRATO COM PEDIDO LIMINAR DE TUTELA ANTECIPATÓRIA
em face do BANCO SAFRA S/A, sociedade anônima fechada, devidamente inscrito no CNPJ/MF sob o n° 58.106.789/0001-28, com sede comercial na Av. Paulista, n° 2.150, Bairro Cerqueira, São Paulo-SP, CEP. 01.310-300, onde deverá ser citado, na pessoa de seu representante legal, pelos fatos e fundamentos a seguir expostos:
I- DOS FATOS:
A Requerente firmou com o Banco Safra um contrato de financiamento, garantido por alienação fiduciária, em 18/12/2006, para a aquisição de um FORD FIESTA HATCH NEWEDG 2004/2005 AZUL, PLACA ... E CHASSI N° ..., sendo o valor total financiado de R$ 18.000,00 (dezoito mil reais).
Tal financiamento deveria ser pago em 48 parcelas fixas e mensais de R$ 565,62 (quinhentos e sessenta e cinco reais e sessenta e dois centavos) sendo estas, pagas através de boletos bancários, redundando no valor total de R$ 27.149,76 (vinte e sete mil, cento e quarenta e nove reais e setenta e seis centavos).
Desde a assinatura do contrato, decorreu algum tempo sem qualquer problema, até que, a partir do início do mês de janeiro de 2009, teve a Requerente em sua vida financeira, terrível reversão, ante a perda de seu emprego.
A Requerente, até o presente momento já pagou ao Banco requerido o valor de R$ 14.706,12(quatorze mil, setecentos e seis reais e doze centavos), sendo este relativo a 26 (vinte e seis) parcelas do contrato entabulado.
Segundo consta dos boletos fornecidos pelo Requerido, a Requerente ainda deve do tal financiamento R$ 12.443,64 (doze mil, quatrocentos e quarenta e três reais e sessenta e quatro centavos) haja vista, o lançamento unilateral dos juros mensais no patamar exorbitante ao mês, incidindo sobre os valores indevidamente lançados.
Conforme se depreende, os juros cobrados pela instituição, são muito superiores ao permitido por Lei, bem como a forma de contagem dos mesmos.
A Requerente aderiu a um contrato de financiamento denominado contrato de adesão, cujas cláusulas não lhe foram devidamente informadas, diga-se de passagem, cláusulas ilegais e arbitrárias, que elevaram o montante da dívida contraída a valor além do permissivo legal, sendo portanto, o presente contrato elaborado em desconformidade com a legislação vigente que regula a matéria em questão.
Ressalta-se que a Requerente nunca recebeu cópia do citado contrato de financiamento, sendo que sem esta cópia a Requerente restou impossibilitada de verificar o inteiro teor das cláusulas contratuais e, conseqüentemente, de aferir a lisura e a veracidade do levantamento do saldo devedor, bem como a certeza do quantum que lhe está sendo cobrado.
Mais, considerando que, com certeza, o Requerido está imputando fatores e parcelas ilegais na apuração de seu saldo devedor, a Requerente necessita do contrato supra mencionado, a fim de verificar a real extensão da obrigação assumida mutuamente e legalmente admitidas para este tipo de avença, tudo para poder apurar o que é devido e/ou indevido nas exigências da demandada.
Diante de tais arbitrariedades, ao analisar a evolução do respectivo financiamento, defronta-se com os seguintes aspectos, assim escalonados:
a) capitalização mensal de juros;
b) correção monetária cumulada com comissão de permanência;
c) juros moratórios e remuneratórios acima do limite legal;
d) multa exorbitante.
Tais ilegalidades são conseqüências exclusivas da conduta pérfida e abusiva do Requerido, conforme se constata, nos valores acima relatados.
Constatamos ainda outra irregularidade, quanto à sistemática utilizada pelo Requerido para amortizar o saldo devedor, certo que, em sua atualização, em vez de diminuir a dívida financiada, acaba por aumentá-la em patamares insuportáveis.
As taxas de seguros e demais encargos cobrados pela instituição financeira estão acima das taxas de mercado e ao limite permitido pelo Código de Defesa do Consumidor, tornando os índices aplicados pelo Requerido demasiadamente oneroso para a Requerente.
Como se pode observar Nobre Julgador, o Requerido incluiu novos juros sobre os juros indevidamente aplicados, haja vista que a dívida lançada no extrato é abusiva e ilegal conforme a prova pré-constituída (laudo contábil em anexo).
Assim, a Requerente está sendo obrigado a pagar juros acima do permitido por Lei, criada pelos juros e taxas abusivas cobradas pela instituição financeira, contrariando o ordenamento jurídico vigente
Efetuado Laudo Pericial por Perito Contábil constatou a Requerente que os valores devidos, se revisionados consoante os parâmetros legais, perfazem a quantia de R$ 3.473,88(três mil, quatrocentos e setenta e três reais e oitenta e oito centavos) que, se divididos pelas 22 (vinte e duas) parcelas restantes, apura-se um valor de R$ 157,90 (cento e cinquenta e sete reais e noventa centavos).
Logo, nada mais resta a postulante, senão recorrer ao Poder Judiciário para consignar em pagamento as prestações obrigacionais de forma revisionada, consoante os critérios apresentados nos autos desta Ação, respaldada em parâmetros legais, objetivando a quitação do débito e conseqüente decreto de extinção do vínculo obrigacional entre as partes.
II- DO DIREITO:
1- Dos preceitos autorizadores da revisão judicial do contrato ora em exame:
Na hipótese vertente há plena incidência da regra estatuída no artigo 122 do Novo Código Civil brasileiro:
"São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes".
Manifestando-se uma unilateralidade no estabelecimento dos percentuais de reajuste, não é desarrazoada a pretensão de ver incidir a norma do art. 489 do Código Civil:
"Nulo é o contrato ... quando se deixa ao arbítrio de uma das partes a fixação do preço".
Logo, por tratar-se de ato ilícito, existem cláusulas contratuais nulas de pleno direito e, outras, anuláveis.
Do cotejo das quaestio facti com as alegações jurídicas ora expendidas é que irá transparecer a ilegalidade, objeto de irresignação da postulante.
2-Da adesividade contratual e seus efeitos jurídicos:
A doutrina e a jurisprudência, em uníssono, atribuem aos negócios celebrados entre a Requerente e o Requerido o caráter de contrato de adesão por excelência.
Trata-se de contrato impresso pelo Requerido, de adesão, de formas prontas e de elaboração unilateral.
Dispõe o artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) que, in verbis:
“Art.54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.”
Nos contratos de adesão, a supressão da autonomia da vontade é inconteste, não permitindo que a Requerente conste as cláusulas arbitrarias e abusivas constantes no contrato.
Assim o sustenta de forma brilhante o Magistrado Arnaldo Rizzardo, em sua obra Contratos de Crédito Bancário, Ed. RT, 2a edição, pág. 18, que tão bem interpretou a posição desfavorável em que se encontram aqueles que, como a Requerente, celebraram contratos de adesão junto ao banco, in verbis:
“Os instrumentos são impressos e uniformes para todos os clientes, deixando apenas alguns claros para o preenchimento, destinados ao nome, à fixação do prazo, do valor mutuado, dos juros, das comissões e penalidades.
Assim, tais contratos contém mesmo inúmeras cláusulas redigidas prévia e antecipadamente, com nenhuma percepção e entendimento delas por parte do aderente. Efetivamente é do conhecimento geral das pessoas de qualidade média os contratos bancários não representam natureza sinalagmático, porquanto não há válida manifestação ou livre consentimento por parte do aderente com relação ao suposto conteúdo jurídico, pretensamente, convencionado com o credor.
Em verdade, não se reserva espaço ao aderente para sequer manifestar a vontade. O banco se arvora o direito de espoliar o devedor. Se não adimplir a obrigação, dentro dos padrões impostos, será esmagado economicamente.
Não se cuida de dificuldades surgidas no curso de um contrato de empréstimo bancário, muito menos de modificações operadas pela desatada inflação, velha e revelha, antiquíssima, mas do desrespeito e da infidelidade do credor,já no momento mesmo da celebração do contrato, ávido pela exploração consciente da desgraça alheia, rompendo-se, no seu nascedouro, a noção de boa-fé e dos bons costumes.
Necessidade falta de conhecimento, indiferença, ingenuidade, tudo concorre para tornar mais fraca a posição do cliente. Em face dele, a empresa, autora do padrão de todos os seus contratos, tem a superioridade resultante destas deficiências, da posição do cliente, bem como a s vantagens da sua qualidade de ente organizado e, em muitos casos poderosos, em contraste com a dispersão em muitos casos, debilidade social e econômica dos consumidores.”
Portanto, não restam dúvidas acerca da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor aos chamados contratos bancários e Instituições Financeiras.
Assim, são os contratos bancários, ajustes com fórmulas prontas, como é o caso dos autos, ajustes estes que não admitem discussão de suas cláusulas pela Requerente.
Não se pode deixar que em nome do princípio da obrigatoriedade contratual, uma das partes extraia-se para si vantagens indevidas em detrimento do outro, sendo tal procedimento vedado, pelo ordenamento jurídico pátrio.
O contrato tem função social, sendo veículo de circulação de riqueza, centro da vida de negócios e propulsor da expansão capitalista.
Sobre o tema, é magistral a lição da Eminente Prof.ª, Dra. Cláudia de Lima Marques, ao tratar da nova concepção social do contrato no CDC (Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 4º. Ed, Ed. Revista dos Tribunais, p.175):
“A nova concepção do contrato é uma concepção social deste instrumento jurídico, para o qual não só o momento da manifestação da vontade (consenso) importa, mas onde também e principalmente os efeitos do contrato na sociedade serão levados em conta e onde a condição social e econômica das pessoas nele envolvidas ganha em importância.
Á procura do equilíbrio contratual, na sociedade de consumo moderno, o direito destacará o papel da lei como limitadora e como verdadeira legitimadora de autonomia da vontade. A lei passará a proteger determinados interesses sociais, valorizando a confiança depositada no vínculo, as expectativas e a boa-fé das partes contratantes.
Conceitos tradicionais com os do negócio jurídico e da autonomia da vontade permanecerão, mas o espaço reservado para que os particulares auto-regulem suas relações será reduzido por normas imperativas, como as do próprio Código de Defesa do Consumidor. É uma nova concepção de contrato no Estado Social, em que a vontade perde condição de elemento nuclear, surgindo em seu lugar elemento estranho às partes, mas básico para a sociedade com um todo: o interesse social.”
Arremata a culta Professora que:
“O contrato seria, então, um instrumento que o Direito oferece para possibilitar a auto-regulamentação dos interesses dos particulares. A vontade é pressuposto e fonte geradora das relações jurídicas. A ordem jurídica é que, em última análise, reconhece a autonomia privada, é ela, pois, quem pode impor limites a esta autonomia.”
Embora a necessidade de dinheiro ou financiamento não seja um serviço público, como são a água, a luz e o transporte, por exemplo, não pode abstrair que tal necessidade é vital ou de sobrevivência, especialmente para um país que vive em crise econômica, com seríssimos problemas de distribuição de renda.
Talvez os bancos nem sejam essenciais, mas certamente são inevitáveis como uma espécie de mal necessário do qual ninguém pode se livrar.
Seja como for, diante das regras do Código de Defesa do Consumidor, assume especial relevância o princípio do equilíbrio contratual.
Sobre tal princípio, a autora já referida assim disserta: “institui o CDC normas imperativas, as quais proíbem a utilização de qualquer cláusula abusiva, definidas como as que asseguram vantagens unilaterais ou exageradas para o fornecedor de bens e serviços, ou que incompatíveis com a boa-fé e a eqüidade (veja o art. 51, IV, do CDC).”
Prosseguindo, “O Poder Judiciário declarará a absoluta nulidade destas cláusulas, a pedido do consumidor, de suas entidades de proteção, do Ministério Público e mesmo incidentalmente, ex oficio. A vontade das partes manifestadas livremente no contrato não é mais o fator decisivo para o Direito, pois as normas do Código instituem novos valores superiores com o equilíbrio e boa-fé nas relações de consumo”.
Portanto, a revisão é possível não só quanto à formação do contrato, mas também no que atina com a abusividade e a onerosidade excessiva do pacto.
Seguindo esta orientação a Requerente opta por revisionar judicialmente o aludido contrato, através desta via, a fim de obter a modificação de cláusulas flagrantemente iníquas, que veremos adiante quais são:
Cumpre ressaltar que as cláusulas contratuais a serem revisadas constam do preâmbulo do instrumento contratual, mais precisamente o sistema de amortização aplicado pela Tabela Price, ou qualquer outra que ofenda o Código de Defesa do Consumidor e demais princípios do direito contratual.
A cláusula que emprega a comissão de permanência como forma de remuneração de capital, a cotejo, da Súmula 30 do STJ devendo prevalecer apenas a correção monetária ou encargos moratórios.
Sobressai também do contrato, que sobre o valor do principal incidirão apenas os encargos do financiamento, ou seja, apenas juros remuneratórios, inexistindo indexador de correção monetária.
Em conformidade com o inciso X, art. 51 do CDC, veda o fornecedor, direta ou indiretamente, impor variações de preço de modo unilateral, bem como, cláusulas que impliquem em desvantagens excessivas ao consumidor.
Exceto raríssimos casos contidos em diplomas extravagantes, a capitalização de juros mensalmente é prática ilegal, mesmo pactuada pelas partes, porquanto atenta contra o preconizado no art. 4 do Decreto n º 22.626/33, em nenhuma hipótese revogado pela lei n º 4.595/64.
O procedimento processual perfilhado encontra-se pacificado pelo Tribunal de Justiça de Goiás, franqueando ao consumidor discutir as cláusulas contratuais tidas por iníquas, sem incorrer em mora.
Não se trata simplesmente de tentativa pueril para minorar um débito assumido, e sim, o exercício de um direito constitucional de ação, fundamentada não só pelos princípios tutelares do Código de Defesa do Consumidor, mas, também, pautada em postulados hermenêuticas do direito contratual, tais como lesão enorme e revisão de cláusulas, que possibilitam ao juiz convalescer a procedência dos pedidos por outras vias materiais do direito.
Antes de avançar nos demais tópicos controvertidos vale antecipar que, mantendo-se coerência com orientação consolidada dos eminentes integrantes do Egrégio Tribunal de Justiça, alinhada no sentido de sujeitar a matéria ás diretriz de ordem pública do Código de Defesa do Consumidor pressupostos do qual se origem às conclusões conseguintes.
Sendo certo que a possibilidade de revisão de cláusulas contratuais esta expressamente prevista no inciso V, do Art. 6º da Lei n° 8.078/90, erigida pelo Art. 5º, XXXII da Carta Magna.
Pois bem, evidentemente, que o pacto em tela é passível de revisão, eis que há cláusulas iníquas. Passemos, então, aos tópicos específicos da fundamentação jurídica.
3- Da lesão ao contrato de cunho adesivo:
Os dois grandes princípios embasadores do CDC são os do equilíbrio entre as partes (não-igualdade) e o da boa-fé. Para a manutenção do equilíbrio temos dispositivos que vedam a existência de cláusulas abusivas, por exemplo, o art. 51, IV, que veda a criação de obrigações que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada. A definição de vantagem exagerada esta inserta no § 1º do artigo supramencionado.
A excessiva onerosidade, tratada no inc. III do § 1° do art. 51, , diz respeito a uma verdadeira desproporção momentânea à formação do contrato, como ocorre na clássica figura da lesão, especialmente porque mencionado, no texto do CDC, a consideração às circunstâncias peculiares ao caso. Dentro deste parâmetro, a lesão é uma espécie da qual o gênero são as cláusulas abusivas. Espécie tão complexa que individualmente é capaz de ensejar a revisão dos contratos.
A abusividade de uma cláusula é detectada pela análise do conteúdo contratual, à luz da boa-fé, sob o ponto de vista objetivo.
Vale transcrever os ensinamentos da doutrinadora Cláudia Lima Marques:
"Na visão tradicional, a força obrigatória do contrato teria seu fundamento na vontade das partes...A nova concepção de contrato destaca, ao contrário, o papel da lei. ... Aos juízes é agora permitido um controle do conteúdo do contrato".(...) Assim também a vontade das partes não é mais a única fonte de interpretação que possuem os juízes para interpretar um instrumento contratual. A evolução doutrinária do direito dos contratos já pleiteava uma interpretação teleológica do contrato, um respeito maior pelos interesses sociais envolvidos, pelas expectativas legítimas das partes, especialmente das partes que só tiveram a liberdade de aderir ou não aos termos pré-elaborados.”
A atuação do juiz nesta situação deve seguir o disposto no art. 51, § 2º, do CDC, ou seja, ele deverá procurar utilizar-se de uma interpretação integradora da parte saudável do contrato.
4- O equilíbrio contratual que deverá ser assegurado através do presente pedido de tutela jurisdicional (revisão):
O contrato deve atender a função social para o qual fora criado, conforme brilhantemente dispôs o Exmo. Sr. Min. MARCO AURÉLIO, do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, ao relatar a AOE 13-0-DF, publicada na ADV JUR 1993, p. 290:
"Como julgador, a primeira coisa que faço, ao defrontar-me com uma controvérsia, é idealizar a solução mais justa de acordo com a minha formação humanística, para o caso concreto. Somente após recorro à legislação, à ordem jurídica, objetivando encontrar o indispensável apoio".
Como já asseverado amplamente na exordial, trata-se de contrato de adesão com cláusulas leoninas, onde a usura e anatocismo tomaram frente, afastando a função social do contrato.
Logo, para o restabelecimento do equilíbrio contratual, deve sofrer o pacto a revisão judicial, inclusive, para que se tenha certeza jurídica, quanto às efetivas prestações obrigacionais, se é que existentes e diga-se mais, se é que o suposto débito não é inverso.
5- Dos juros compostos mensais:
O anatocismo é vedado pela nossa legislação e pelos nossos tribunais, bem como pela nossa jurisprudência.
A que pese a discussão da inconstitucionalidade da medida provisória 2.170-36/2001, a mesma dispõe que a referida capitalização de juros deve constar expressamente no contrato financeiro, por configurar mecanismo que onera expressivamente a contraprestação do consumidor, sem que o mesmo tenha conhecimento. A ausência dessa informação, de forma clara e precisa, acarreta inevitável proibição da capitalização em voga, em obediência aos comandos do artigo 6° inciso III, art. 46 e art. 47 do Código de Defesa do Consumidor.
Mas na atualidade, pela Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.316-1 de 19/09/2000, houve o voto do Relator Sr. Ministro Sydney Sanches, suspendendo a eficácia do Artigo 5º, caput e parágrafo único da Medida Provisória nº 2.170-36/2001, de 23 de agosto de 2001, a medida provisória nº 1963, de 30 de março de 2000 data da primitiva publicação do artigo 5º da medida provisória nº 1.963-17/2000, atualmente reeditada sob o nº 2.170-36/2001.
Assim, a tabela Price, por capitalizar os juros, representa fator de desequilíbrio contratual, ocasionando o enriquecimento sem causa do credor, devendo ser afastada por resultar em onerosidade excessiva.
Nesse passo, os juros são muito superiores em relação ao cálculo por juros simples ou lineares, eis que os juros pagos em cada prestação sempre são superiores porque incidem sobre um saldo devedor maior, já que a amortização será menor em favor dos juros e se o saldo devedor não fosse mera conta diferença, se os juros na Price não fossem capitalizados e se a amortização fosse a real, o saldo devedor a cada prestação seria menor, e os juros que seriam calculados em cada parcela sobre o saldo menor – por simples lógica matemática – também seriam menores.
Portanto, necessariamente impõe-se excluir a capitalização dos juros, fazendo-se o cálculo por juros simples, sem a utilização da Tabela Price, por conseguinte, sem o efeito da capitalização que efetivamente elevaria a taxa juros.
O Egrégio Tribunal de Justiça de Goiás assim se posiciona sobre o assunto em análise:
EMENTA: “EMBARGOS A EXECUÇÃO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMOVEL A PRESTAÇÃO. REVISÃO.PROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. INPC. JUROS. TABELA PRICE. APELAÇÃO. PRESCRIÇÃO. CADUCIDADE. DESPROVIMENTO. 1-A PRETENSÃO DE REVISÃO CONTRATUAL,REFERE-SE A AÇÃO PESSOAL QUE PRESCREVE EM VINTE ANOS (ART.177. CAPUT DO ANTIGO CC).O CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL COM GARANTIA HIPOTECARIA NÃO E DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PROPRIAMENTE DITO, IPSO FACTO, O PRAZO PARA RECLAMAÇÃO NÃO CADUCA NA FORMA PRELECIONADA NOS DITAMES DO INCISO II DO ART.26 DO CDC. 2 – A FORÇA VINCULANTE DOS CONTRATOS PACTA SUNT SERVANDA, HÁ QUE OBEDECER AOS PRINCÍPIOS DE ORDEM PÚBLICA, EXIGINDO A INTERVENÇAO DO ESTADO PARA TAL OBSERVÂNCIA, PERMITINDO ASSIM, A REVISAO DE CLÁUSULAS ABUSIVAS, MORMENTE EM SE TRATANDO DE PACTO DE ADESAO.3- A APLICACAO DA TABELA PRICE NÃO PODE PREVALECER COMO FORMA DE CALCULO DA DIVIDA HIPOTECARIA, PORQUANTO CONSTITUI-SE EM METODO PROGRESSIVO E ANTECIPADO QUE ONERA O DEVEDOR E IMPEDE A QUITACAO DAS PRESTACOES PACTUADAS. 4- POR SER O INDICE OFICIAL E MAIS BENEFICIO AO DEVEDOR, DEVE SER APLICADO O INPC COMO INDICE DE CORRECAO MONETÁRIA. 5- A CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS SOMENTE É PERMITIDA NOS CASOS EM QUE HÁ EXPRESSA PREVISÃO LEGAL, HIPÓTESE NÃO CARACTERIZADA NO CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. RECURSO DESPROVIDO.” (ORIGEM 4A CÂMARA CÍVEL, FONTE DJ 14147 DE 11/11/2003, LIVRO 403, RELATOR DES. ARIVALDO DA SILVA CHAVESRECURSO APELAÇÃO CÍVEL - 70512-0/188, COMARCA GOIÂNIA PARTES APELADO: AIME JORGE SAHIUM, APELANTE: BANCO ITAU S/A )
Há ilegalidade contida no cálculo da Tabela Price, justamente porque o crescimento geométrico dos juros configura o anatocismo ou capitalização, que é legalmente proibida em nosso sistema, nos contratos de mútuo, salvo nos casos regulados por lei especial, ex vi da Súmula 93 do STJ e de acordo com a Súmula 121 do STF: “É vedado a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada”, o Art.4º do Decreto 22.626/33 e Resp.180928/SP do STJ, não pode haver capitalização de juros, qualquer que seja a periodicidade.
Os juros de mora têm que ser limitados em 1,00% ao ano de acordo com o artigo 5º do Dec. n° 22.626/33, artigo 8º, parágrafo único, da Lei n° 1.046/50 e artigo 5º, parágrafo único, dos Decs.-Leis 167/67 e 413/69 e acórdãos do STJ, devidos sobre valores inadimplentes.
Com relação a multa é no patamar máximo de 2%, artigo 52, §1º, da Lei 8.078/90 e Súmulas 285 e 297 do STJ, sobre os valores inadimplentes.
6- Da inversão do ônus probante:
Data venia, torna-se necessário a declaração da inversão do ônus da prova, devendo ser atribuída ao banco a incumbência de produzir provas contrárias as alegações iniciais da autora, principalmente com relação aos valores das parcelas representadas pelos boletos anexos advindo dos juros e taxas abusivas.
Isso porque a autora está em condição de vulnerabilidade como consumidora, pois que nos momentos da contratação do empréstimo, não foi assistido por profissional habilitado a orientá-la adequadamente, isto é, analisando as taxas de juros aplicadas ao financiamento, bem como a forma de cálculo dos mesmos.
No momento da contratação houve uma imposição de cláusulas em contratos padronizados, de adesão, redigidas unilateralmente pelo Requerido, tornando-se, os contratantes/réus, submissos, sem poder alterar, ou mesmo opinar sobre as condições impostas coercitivamente.
Estando presente a vulnerabilidade (técnica jurídica ou fática – socioeconômica) como demonstrado retro, não foi a autora tutelada pelos preceitos do C.D.C., ficando “expostos” às práticas previstas nos capítulos V e VI do C.D.C.
Com a inversão do ônus da prova estará o M.M. Juiz garantindo a proteção legal/contratual e o acesso pela Requerente, parte mais fraca na relação obrigacional, ao Poder Judiciário, facilitando o direito de ação conforme preceito contido no art. 6º, VIII do CDC, que se requer seja declarado ab initio em vista da oportunidade da instrução processual que objetivará apurar o equilíbrio contratual e a licitude das cobranças ocorridas por parte do banco.
7- Da consignação em pagamento:
A consignação em pagamento é uma das formas de extinção das obrigações como alude o art. 334 do Novo Código Civil, pois, não só o credor tem o direito de exigir o cumprimento da obrigação, como também o devedor tem direito ao adimplemento.
Ao devedor não interessa, em regra, a incômoda situação de ver-se constituído em mora. Quando alguém assume uma obrigação, tem-se, geralmente, que é de seu interesse cumpri-la, na forma e tempo, quando não obstado pelo credor.
A jurisprudência renomada assentou entendimento de que é possível a cumulação de pedidos, desde que atento ao rito ordinário. Destarte, revela-se prescindível o emprego do rito especial para o procedimento da consignatória, consoante entendimento pacífico do Egrégio Tribunal de Justiça de Goiás.
Tal expediente processual, pacificado pela jurisprudência, permite ao consumidor discutir as cláusulas contratuais abusivas, sem constituir em mora.
O Superior Tribunal de Justiça vem se posicionando favoravelmente, se não vejamos:
“EMENTA CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – ÂMBITO DE DISCUSSÃO – CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. Pacificou-se na jurisprudência da Segunda Seção desta Corte entendimento Segundo o qual, na ação de consignação em pagamento, é possível ampla discussão sobre o débito e o seu valor, inclusive com a interpretação da validade e alcance das cláusulas contratuais”. Recurso especial conhecido e provido. (Resp nº 401.708/ MG (2001/01.55021-3, rel. Min. CASTRO FILHO).
Igualmente, adequando a presente inicial aos termos dos arts. 890 e segs. do Ordenamento Jurídico Processual Civil, uma vez tratar-se de cumulação de pedidos pelo rito ordinário, conforme o art. 292, § 2º do CPC, refutando-se o caráter instrumental do processo.
Se o depósito estiver menor do que o débito proclamado na sentença, oportunidade terá a autora de completar a consignação na fase executória, se a tanto não se opuser algum preceito de direito material.
Note-se por último que, na generalidade das prestações ilíquidas ou incertas, é sempre cabível a cumulação sucessiva de apuração e declaração do quantum debeatur com o pedido conseqüente de autorização para depósito liberatório a posteriori. Nessas ações, que seguem o rito ordinário, e não o da consignação em pagamento, nada impede, também, que a Requerente, desde logo, deposite em juízo o valor em que provisoriamente estima sua dívida, o qual estará sujeito a reajustes da sentença final, mas que poderá muito bem ser aceito pelo demandado, com antecipação para o desate da lide, em modalidade de autocomposição.
Sobre o tema, traz-se à colação precedente em Agravo de Instrumento nº 00.004870-4, da Capital, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, antiga Quarta Câmara Civil, j. 31.05.2001:
“AÇÃO ANULATÓRIA C/C REVISIONAL DE CONTRATOS BANCÁRIOS. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. DEPÓSITO POR CONSIGNAÇÃO INCIDENTE. ADMISSIBILIDADE. ADMITE-SE O DEPÓSITO POR CONSIGNAÇÃO INCIDENTE, EM SEDE DE AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO, DESPREZADO O PROCEDIMENTO ESPECIAL DA AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. O PEDIDO DE DEPÓSITO INCIDENTE TEM CARÁTER ACESSÓRIO E SECUNDÁRIO E SERÁ PELO JULGAMENTO DO PRINCIPAL QUE SE DEFINIRÁ A SORTE E A EFICÁCIA DA CONSIGNAÇÃO (AI nº 96.003846-9, de Balneário Camburiú)”.
O banco agravante afirmou que o agravado pretende impedir que o banco adote as providências legais cabíveis como por exemplo a propositura da ação de busca e apreensão. O manejo de ação com o objetivo de revisar em juízo as cláusulas contratuais e o depósito incidental das parcelas suspendem, ainda que temporariamente, os efeitos da mora do agravado.
Sobre o tema colaciona-se precedentes desta Corte Estadual de Justiça: Agravo de instrumento nº 02.012136-9, da Capital, rel. Des. Fernando Carioni, antiga Terceira Câmara Civil, j. 31.10.2002:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO – BUSCA E APREENSÃO – DEPÓSITO JUDICIAL – ELISÃO DA MORA – MANUTENÇÃO DO DEVEDOR NA POSSE DO BEM. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO – ATENDIMENTO AO DISPOSTO NOS ARTS. 93, IX, DA CF E 165, CAPUT, DO CPC – INOCORRÊNCIA. ALEGAÇÕES NÃO VENTILADAS EM PRIMEIRO GRAU -– SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA – IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE NESTE GRAU DE JURISDIÇÃO. O depósito das prestações do contrato celebrado entre as partes elide a mora, viabilizando a permanência do bem nas mãos do devedor. (...).”
Agravo de Instrumento nº 2002.008266-5, de Lages, rel. Des. Trindade dos Santos, antiga Quarta Câmara Civil, j. 08.08.2002:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO - Revisão contratual - Mútuo bancário - Tutela antecipada - Concessão - Cabimento em ação de cunho declaratório - Consignação incidental - Permissibilidade - Manutenção do bem alienado fiduciariamente com o autor - Vedação do registro do nome do devedor nos cadastros restritivos do crédito - Exibição de extratos e planilhas – Decisão incensurável - Reclamo recursal desatendido. (...) O ingresso de ação revisional de cláusulas contratuais, com o desiderato de rever o devedor cláusulas e acessórios tidos como abusivos, quer na sua imposição, quer na sua quantificação, acarreta a suspensão dos efeitos da mora. Essa suspensão, por sua vez, autoriza a revogação da liminar deferida em precedente ação de busca e apreensão promovida pelo credor, bem como impede a inscrição do nome do mutuário em órgãos de restrição creditícia. (...).”
Agravo de instrumento nº 2002.002043-5, de Criciúma, rel. Des. Cercato Padilha, antiga Quarta Câmara Civil, j. 20.06.2002:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO – BUSCA E APREENSÃO – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – CONCESSÃO DE LIMINAR – ANTERIOR AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL C/C CONSIGNAÇÃO – ELISÃO DA MORA – CASSAÇÃO DA LIMINAR – RECURSO PROVIDO. A deflagração de ação de revisão contratual cumulada com consignação, com o depósito regular das prestações, anteriormente à propositura da ação de busca e apreensão pelo credor, afasta a mora, e, sendo esta pressuposto básico da medida liminar, impede o seu deferimento.”
É possível, em sede de ação declaratória de cláusulas contratuais cumulada com revisão de valores, promover o devedor o depósito por consignação incidente do que entende devido, sempre que se fizer presente a verossimilhança das suas alegações, evitando as conseqüências da mora.
Logo, com o depósito incidental das prestações evitam-se os efeitos da mora. Todavia, não se pode impedir que o agravante promova ações judiciais a teor do disposto no art. 5º, inc. XXXV da Constituição da República que consagra os princípios do acesso à justiça e da inafastabilidade do controle jurisdicional.
No caso concreto o cancelamento ou suspensão de registros em órgãos de proteção ao crédito e a consignação incidental das prestações não produz riscos de dano ao agravante, de modo que a exigência de depósito da quantia devida a título de caução é dispensável.
A propósito do tema colaciona-se precedente em Agravo de instrumento n. 00.005872-6, de Criciúma, rel. Des. Carlos Prudêncio, antiga Primeira Câmara Civil, j. 07.011.2000:
“PROCESSUAL CIVIL. TUTELA ANTECIPADA OBSTATIVA DE INSCRIÇÃO DO NOME DO DEVEDOR NO SERASA/SPC/CADIN.ADMISSIBILIDADE. RESPEITO AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO CONTRADITÓRIO. DEVER DO JUDICIÁRIO DE EXPUNGIR DO ORDENAMENTO EFEITOS DE DIPLOMAS LEGAIS NOTORIAMENTE DITATORIAIS. RECURSO DESPROVIDO. (...) MEDIDA CAUTELAR. CAUÇÃO. FACULDADE DO JULGADOR. A exigência de caução para concessão de medida cautelar encerra uma faculdade do julgador”.
O Requerido insiste na prevalência do princípio do pacta sunt servanda no que tange à interpretação do contrato.
O art. 6º, inc. V, do Código de Defesa do Consumidor estabelece que é direito do consumidor "a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas".
O Código de Defesa do Consumidor permite a modificação ou revisão das cláusulas contratuais onerosas. Observa-se da análise das cláusulas contratuais que há excessiva onerosidade em desfavor do consumidor.
NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA ANDRADE NERY em Código de Processo Civil comentado, 3. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 1352, anotam: “Modificação das cláusulas contratuais. A norma garante o direito de modificação das cláusulas contratuais ou de sua revisão, configurando hipótese de aplicação do princípio da conservação dos contratos de consumo. O direito de modificação das cláusulas existirá quando o contrato estabelecer prestações desproporcionais em detrimento do consumidor. Quando houver onerosidade excessiva por fatos supervenientes à data da celebração do contrato, o consumidor tem o direito de revisão do contrato, que pode ser feita por aditivo contratual, administrativamente ou pela via judicial”. “Manutenção do contrato. O CDC garante ao consumidor a manutenção do contrato, alterando as regras pretorianas e doutrinárias do direito civil tradicional, que prevêem a resolução do contrato quando houver onerosidade excessiva ou prestações desproporcionais”. “Onerosidade excessiva. Para que o consumidor tenha direito à revisão do contrato, basta que haja onerosidade excessiva para ele, em decorrência de fato superveniente. Não há necessidade de que esses fatos sejam extraordinários nem que sejam imprevisíveis. A teoria da imprevisão, com o perfil que a ela é dado pelo CC italiano 1467 e pelo Projeto n. 634-B/75 de CC brasileiro 477, não se aplica às relações de consumo. Pela teoria da imprevisão, somente os fatos extraordinários e imprevisíveis pelas partes por ocasião da formação do contrato é que autorizariam, não sua revisão, mas sua resolução. A norma sob comentário não exige nem a extraordinariedade nem a imprevisibilidade dos fatos supervenientes para conferir, ao consumidor, o direito de revisão efetiva do contrato; não sua resolução”.
NELSON ABRÃO em Direito bancário, 6. ed. rev. atual. ampl., São Paulo: Saraiva, 2000, p. 339, esclarece: “Reputam-se abusivas ou onerosas as cláusulas que impedem uma discussão mais detalhada do seu conteúdo, reforçando seu caráter unilateral, apresentando desvantagem de uma parte, e total privilegiamento d’outra, sendo certo que a reanálise é imprescindível na revisão desta anormalidade, sedimentando uma operação bancária pautada pela justeza de sua função e o bem social que deve, ainda que de maneira indireta, trilhar o empresário do setor.”
Deste modo, conclui-se que em tese é possível a revisão do contrato bem como a modificação das cláusulas contratuais eventualmente abusivas nele contidas. No entanto, o exame do mérito é tema a ser abordado na ação de conhecimento.
Diante da manutenção do bem na posse do requerente em face de discussão judicial das cláusulas do contrato de abertura de crédito – alienação fiduciária deve ser determinada providência acauteladora, no sentido da realização de seguro total sobre o veículo para a prevenção de eventuais prejuízos decorrentes de seu perecimento ou desaparecimento, a teor do disposto nos arts. 1.463 do Código Civil de 2002 e 679 do Código de Processo Civil, por interpretação extensiva, conforme precedente em que o relator é o signatário em Agravo de Instrumento n. 2002.022127-4, de Curitibanos, j. 08.05.2003.
Sobre o tema colacionam-se precedentes desta Corte Estadual de Justiça: Agravo de instrumento n. 02.020213-0, de Blumenau, rel. Des. Eládio Torret Rocha, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 10.04.2003:
“Agravo de instrumento. Ação revisional de contrato. Alienação fiduciária. Antecipação de tutela visando ao depósito das parcelas vencidas e vincendas, manutenção do devedor na posse do bem e vedação do registro do seu nome nos órgãos de restrição ao crédito. Decisão correta. Recurso desprovido. (...)” Trecho do r. acórdão: “No caso enfocado, por outro lado, a verossímil necessidade de o recorrido ser mantido na posse do veículo resta patenteada, uma vez que se deve prevenir eventuais prejuízos decorrentes de seu perecimento. Acertada, ainda, a decisão impondo a contratação de seguro, pelo agravado, para a cobertura de eventuais danos ao automotor.”
Agravo de Instrumento n. 02.020929-0, de Tubarão, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 27.03.2003:
“Leasing. Ação revisional de contrato. Indeferimento de antecipação de tutela para manter o autor na posse do bem arrendado. Depósito em mãos do arrendatário até o trânsito em julgado da sentença. Bem indispensável à atividade produtiva. Entrega da coisa, mediante condição. Pode ser deferida ao fiduciário, na condição de depositário judicial, a posse do bem objeto de alienação fiduciária, quando a apreensão possa impedir a continuidade da sua atividade econômica ou prejudicar a sua atividade produtiva, mediante a condição de contratar seguro facultativo integral para a cobertura de eventuais riscos. Em se tratando de veículos utilizados no transporte de carga, pode ser exigida contratação de seguro facultativo como condição para a entrega da res.” Trecho do r. acórdão: “Diga-se, ainda, que o agravado aforou ação de revisão do contrato pretendendo rever os encargos do contrato com o intuito de expungir a mora. A constituição da devedora como depositária não implica deixar ao desabrigo o direito da arrendante, porquanto aquela terá de zelar pela integridade do bem, sendo de relevo a contratação de seguro para a cobertura de eventuais riscos. Em vista disso, impõe-se a reforma da decisão deferindo-se a antecipação de tutela, nos termos do art. 273 do CPC, para assegurar que o caminhão permaneça na posse do agravante, na qualidade de depositário, na pendência da lide, mediante a condição de contratar seguro facultativo dos veículos, no prazo de dez (10) dias, se não houver seguro contratado.”
8- Tutela jurisdicional antecipada – da premente necessidade de antecipação parcial dos efeitos da tutela jurisdicional:
Quais os efeitos do presente pedido de tutela jurisdicional que pretende a autora seja objeto de antecipação parcial?
São justamente aqueles inerentes à possibilidade da Requerente pagar ao Requerido os valores do tal financiamento, tidos por devidos, e apurados através de laudo contábil extrajudicial.
É sempre bom lembrar a insuperável lição de CALAMANDREI de que todos provimentos jurisdicionais existem como "instrumento do direito material, que por intermédio deles atua".
Nos provimentos cautelares, porém, verifica-se uma instrumentalidade qualificada, ou seja, elevada, por assim dizer, ao quadrado: eles são, de fato, inquestionavelmente, um meio predisposto para a melhor eficácia do provimento definitivo, que a sua vez é um meio para a atuação do direito; isto é, são eles, em relação à finalidade última da função jurisdicional, instrumento do instrumento.
Vale dizer: os provimentos cautelares nunca são um fim em si mesmos, e surgem sempre "da existência de um perigo de dano jurídico, derivado do atraso de um provimento jurisdicional definitivo (periculum in mora)"
A verossimilhança do direito invocado, ou fumus boni juris da Teoria Geral das Cautelares, pode ser encontrada no conjunto das alegações efetuadas pela autora para a revisão do pacto, sobretudo no que pertine à existência de cláusulas abusivas, leoninas e inconstitucionais, e o pagamento de financiamento entabulado sobre as mesmas, compromete as finanças da autora, que ora vê seu salário mensal, não ser mais suficiente para pagar aos bancos, seus credores e ainda permitir a sua mantença, bem como de sua família.
O fumus boni iuris, são afirmações feitas pelas partes que possuam fundamentos jurídicos que levam a acreditar serem verdadeiros e, neste caso, decorre dos argumentos expendidos na inicial em conjugando-os com os fundamentos esposados acima e, em especial, a aplicação dos preceitos contidos no Código de Defesa do Consumidor, de caráter público, possibilidade do hipossufíciente/consumidor discutir revisão do contrato, prevenção de danos, facilitação de defesa e a salutar regra ínsita no art. 83 do CDC e ainda mais o disposto no art. 5º, XXV, da CF/88 – "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito."
A verossimilhança das alegações está comprovada na notoriedade da cobrança de juros compostos e extorsivos; muito acima do patamar previsto em lei, além de multas, utilizados pelo Requerido.
Imperioso ainda, se digne em determinar Vossa Excelência, o impedimento do Requerido em incluir o nome do requerente em cadastros de restrição ao crédito, uma vez que está em discussão a legalidade das cobranças efetuadas e encargos debitados, sob pena de ocasionar, a autora, prejuízo de difícil reparação, restringindo sua vida civil.
9- Da possibilidade jurídica da manutenção de posse do veículo objeto do contrato ora revisionado:
Como já visto, há sério dissenso entre a planilha apresentada pela autora e o Requerido quanto ao valor do contrato.
De modo que pretende a autora seja antecipada parcialmente a tutela jurisdicional para assegurar em suas mãos a posse do veiculo até que se declare já tenha ela quitado integralmente o preço dos mesmos, considerando o FUNDADO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO, consubstanciado na efetiva possibilidade de ver-se a autora privada da posse do bem, bem como em razão da RELEVÂNCIA DO FUNDAMENTO DE DIREITO, ora deduzido, consistente na alegação comprovada por Laudo Pericial de que, observados os limites legais.
Não se pode admitir, diante do pedido incidental de depósito que elide a mora contratual, o desapossamento da parte autora do objeto financiado.
Nesse sentido, confira-se a jurisprudência do Egrégio Tribunal de Goiás:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. TUTELA ANTECIPATÓRIA. CONCESSÃO.REFORMA DO DECISUM.I. Estando em discussão os valores cobrados em razão de contrato de arrendamento mercantil firmado entre as partes, é lícita a permanência do bem na posse do devedor, haja vista os efeitos prejudiciais que seriam acarretados ao mesmo, bem como forte nos preceitos do art.273, do CPC. Procedentes desta Corte. Agravo conhecido e provido.( TJGO, 4 cível, DJ n.13.569 de 29.6.2001, Rel. Dês. Arivaldo da Silva Chaves, Aglns n.23715-4/180). Grifo nosso.
Portanto, resulta como de irreversíveis conseqüências o desapossamento da Requerente relativo ao bem financiado, porquanto adquirindo para fins de labor, cuja ausência levaria a bancarrota o devedor desprovido de outros meios de produção.
Além do mais é sabido que o Requerido lida com dinheiro e, não, com automóveis. Os ajuizamentos de demandas possessórias por parte da ré, conforme é de todo sabido, serve, única e exclusivamente, para pressionar indevidamente o suposto devedor, por que é evidente que o bem propriamente dito não interessa à ré, que está atrás, isto sim, de receber aquilo que ilicitamente faz parte de seus cálculos (OBSERVE-SE QUE A DEMANDA AJUIZADA NÃO REVELA, OBVIAMENTE, SITUAÇÃO DE PURA NEGATIVA DO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS). Cuida-se, isto sim, de procurar proteção jurisdicional à uma situação de estremada injustiça e evidente lesão, que não pode ser omitida da apreciação do Poder Judiciário.
Ao pretender proteção judicial para assegurar-se na posse do bem alienado até o julgamento final da demanda, não deseja a Requerente, nem seria lícito querer que o Requerido ficasse impedido de deduzir em Juízo qualquer pretensão que porventura tenha com referência aos aludidos contratos. A TUTELA ANTECIPADA QUE SE REQUER É APENAS PARA GARANTIR QUE O "STATUS QUO ANTE" SERÁ MANTIDO ATÉ O JULGAMENTO FINAL DA DEMANDA, sob pena de resultado prático de uma eventual sentença de procedência ser inalcançável no futuro.
III- DOS PEDIDOS:
Diante do exposto, requer a Vossa Excelência se digne em:
a) Conceder TUTELA ANTECIPATÓRIA (Art.273, § 7º do CPC), inaudita altera partes, para PROIBIR a inscrição do nome do requerente junto á SERASA, SPC, BACEN e órgãos similares, mediante expedição de ofícios, além de intimar o Requerido, através do mandado citatório, de plano, se abstenha de comunicar a terceiros órgãos cadastrais de inadimplentes, inclusive, Tabelionatos de Títulos, Notas e Protestos, até final provimento jurisdicional, e principalmente, fixando desde já a respectiva multa diária por descumprimento, nos termos do art. 84 do CDC e arts. 461 e 644 do CPC, propiciando o cumprimento da obrigação de fazer;
b) Ordenar ainda, em TUTELA ANTECIPATÓRIA, que a parte Requerente seja mantida na posse do veículo financiado, até final decisão deste Poder Judiciário, levando-se em consideração necessitá-la incólume, tendo-se ainda o pagamento do bem financiado segundo os parâmetros da legislação vigente, da igual forma, por se tratar de bem para o consumo próprio, e sem o qual, a renda da parte requerente estará comprometida, refletindo-se diretamente no contrato em questão;
c) Autorizar o DEPÓSITO INCIDENTAL das quantias legalmente devidas, referente ás parcelas periódicas vencidas, e das demais que se vencerem sucessivamente, no importe de R$ 157,90 (cento e cinquenta e sete reais e noventa centavos) relativo a cada prestação a ser consignada, conforme planilha de cálculo em anexo, a partir da prestação com vencimento a partir de março de 2009, e das demais que se vencerem no curso do litígio, no prazo legal de 05 (cinco) dias contados do deferimento da medida;
Determinar a CITAÇÃO do Requerido, qualificada no preâmbulo desta exordial, para que responda a presente lide, caso queira, sob o rito ordinário, no prazo legal de 15 (quinze) dias, sob pena de serem presumidos como verdadeiros os fatos não impugnados e alegados nesta via judicial, bem como, para proceder ao levantamento do depósito relativo às prestações a serem consignadas/designadas, ou no mesmo prazo, oferecer resposta aos termos da lide, com recusa justificada caso não aceite, sob pena de reputar-se o devedor liberado da obrigação ficando à disposição do credor as quantias consignadas, retendo-se a verba de sucumbência;
e) Julgar totalmente PROCEDENTE o pedido, tornando em definitiva a medida liminar de antecipação de tutela, para o fim de proibir da negativação do nome da parte requerente nos órgãos de proteção ao crédito, mantendo-a na posse do bem financiado, DECLARANDO revisadas as cláusulas do contrato de financiamento a fim de estabelecer que sobre o empréstimo concedido incidam os juros remuneratórios pactuados na forma simples, sem o efeito da capitalização, substituindo a utilização da tabela Price pelo Método Ponderado/ Juros Simples (Método de Gauss), vedando-se expressamente a capitalização de juros, em qualquer periodicidade ex vi do Resp. 180928/SP do STJ e art.6 inciso III e art.46 e 47 do Código de Defesa do Consumidor e a cobrança de comissão de permanência;
f) Determinar que os encargos por inadimplência restrinjam-se, exclusivamente, a comissão de permanência, sem o concurso de nenhum outro encargo moratório (correção monetária, juros moratórios, multa contratual e juros remuneratórios);
g) Julgar procedente o pedido consignatório, declarando a suficiência dos depósitos de acordo com os parâmetros delineados neste petitório inclusive com força de liberação da obrigação, permitindo-se a consignação das prestações vincendas até o trânsito em julgado desta decisão;
h) Ao final, julgar pela integral PROCEDÊNCIA dos pedidos ora formulados, para condenar a requerida nas custas e demais despesas processuais, e ao pagamento da verba honorária a ser fixada á luz do Art.20 § 4º c/c § 3º, ‘a’, ‘b’, ’c’, do CPC, e declarar por sentença a quitação do contrato do financiamento, ordenando ao Banco requerido emitir a carta de liberação do veículo junto ao DETRAN-GO, para que o autor possa “desaliená-lo”, sob pena de sofrer as sanções legais.
Requer, por oportuno, a ampla produção de prova, especialmente, o depoimento pessoal dos representantes legais do Banco requerido sob pena de confesso (CPC, art. 343), juntada de novos documentos, e demais provas em direito admitidas, não obstante já provadas todas as alegações ora aduzidas.
Dá-se a causa o valor legal de R$ 3.473,88 (três mil, quatrocentos e setenta e três reais e oitenta e oito centavos).
Nestes termos,
P. e E. deferimento.
Goiânia-GO, 15 de abril de 2009.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BESSA, Jammes Miller. Ação de consignação em pagamento c/c revisão contratual c/c exibição de contrato com pedido liminar de tutela antecipatória Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 out 2009, 07:47. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Peças Jurídicas/18543/acao-de-consignacao-em-pagamento-c-c-revisao-contratual-c-c-exibicao-de-contrato-com-pedido-liminar-de-tutela-antecipatoria. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Conteúdo Jurídico
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