Brasília, 28 de novembro a 2 de dezembro de 2005 Nº 411
Data (páginas internas): 7 de dezembro de 2005
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.
Sumário
Plenário
Processo Disciplinar: Parlamentar e Devido Processo Legal - 3
ADI: Resolução e Hipótese de Seqüestro de Verbas
Crime Hediondo e Substituição de Pena Privativa de Liberdade por Restritiva de Direitos - 1
Crime Hediondo e Substituição de Pena Privativa de Liberdade por Restritiva de Direitos - 2
Processamento de Precatório Complementar em SP - 2
Porte Ilegal de Arma e Ausência de Munição - 2
Rcl: Alteração do Edital de Venda do BEC
Defensoria Pública: Organização nos Estados-Membros e Lei Complementar
1ª Turma
Suspensão Condicional do Processo e Nulidade Relativa
Prisão Preventiva e Fundamentação
Reformatio in Pejus e Erro Material
2ª Turma
Princípio da Não-Culpabilidade e Maus Antecedentes - 2
Receptação Culposa e Competência da Justiça Militar
IPI e Bem Importado por Pessoa Física - 2
ITR e Anterioridade Tributária
Competência Privativa da União e Seguro
Clipping do DJ
Transcrições
TCU: Tomada de Contas Especial e Sociedade de Economia Mista (MS 25092/DF)
Plenário
Processo Disciplinar: Parlamentar e Devido Processo Legal - 3
Concluído julgamento de pedido de liminar em mandado de segurança impetrado por Deputado Federal contra ato praticado pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados, na Representação 38/05, do PTB - Partido Trabalhista Brasileiro, pela Comissão de Constituição e Justiça e de Redação da Câmara dos Deputados, no recurso 229/05, e pela Mesa Diretora e Presidência da Câmara dos Deputados, em que se imputa ao impetrante a prática de quebra do decoro parlamentar — v. Informativo 410. O Tribunal, por maioria, concedeu, em parte, a liminar, para determinar a supressão, dos autos do processo, junto à Câmara dos Deputados, do depoimento da testemunha da acusação ouvida depois das testemunhas da defesa, bem como de todas as referências a ele contidas no relatório, ou parecer, a ser submetido ao Plenário da Câmara dos Deputados, nos termos do voto do Min. Cezar Peluso. Vencidos, quanto à extensão da concessão da liminar, os Ministros Marco Aurélio, Eros Grau, Celso de Mello, Sepúlveda Pertence e Nelson Jobim, presidente, que a deferiam para suspender o procedimento, ficando assegurada a reinquirição das testemunhas de defesa, e, após, o prosseguimento normal do feito.
MS 25647 MC/DF, rel. Min. Carlos Britto, 30.11.2005. (MS-25647)
ADI: Resolução e Hipótese de Seqüestro de Verbas
Por vislumbrar aparente ofensa ao § 3º do art. 100 da CF, o Tribunal deferiu liminar em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Governador do Distrito Federal para suspender, com efeitos ex nunc, a eficácia do art. 7º da Resolução Administrativa 36/2002, do TRT da 10ª Região, que, dispondo sobre a satisfação dos débitos de pequeno valor decorrentes das condenações impostas à Fazenda Pública, estabelece que a Fazenda do Distrito Federal, suas Autarquias e Fundações Públicas ficam obrigadas a efetuar o pagamento da dívida no prazo de 60 dias, sob pena de seqüestro. Entendeu-se, na linha do que decidido no julgamento da ADI 3057/RN (DJU de 19.3.2004), que a norma em questão invade campo que a Constituição reservou à lei em sentido estrito.
ADI 3344 MC/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 30.11.2005. (ADI-3344)
Crime Hediondo e Substituição de Pena Privativa de Liberdade por Restritiva de Direitos - 1
O Tribunal iniciou julgamento de habeas corpus em que se discute a possibilidade de substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos na hipótese de condenação por crime hediondo. Alega-se, na espécie, ocorrência de direito público subjetivo da paciente — condenada à pena de 3 anos de reclusão, em regime integralmente fechado, pela prática do crime do art. 12 da Lei 6.368/76 — à substituição requerida, uma vez que preenche os requisitos do art. 44 do CP, nos termos da alteração trazida pela Lei 9.714/98, bem como ausência de fundamentação do acórdão proferido pela Corte de origem, que entendera a substituição incompatível e inaplicável ao crime de tráfico de entorpecentes, em face da vedação imposta pela Lei 8.072/90 (art. 2º, § 1º).
HC 85894/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 30.11.2005. (HC-85894)
Crime Hediondo e Substituição de Pena Privativa de Liberdade por Restritiva de Direitos - 2
O Min. Gilmar Mendes, relator, concedeu o writ para que, afastada a proibição, em tese, de substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direito, o Tribunal a quo decida fundamentadamente acerca do preenchimento dos requisitos do art. 44 do CP, em concreto, para a substituição pleiteada. Reportando-se aos fundamentos de seu voto no julgamento do HC 82959/SP, no sentido de que o modelo adotado na Lei 8.072/90 não observa o princípio da individualização da pena, já que não considera as particularidades de cada pessoa, sua capacidade de reintegração social e os esforços empreendidos com fins a sua ressocialização, e, salientando que a vedação da mencionada lei não passa pelo juízo de proporcionalidade, concluiu que, afastada essa vedação, não há óbice à substituição em exame, nos crimes hediondos, desde que preenchidos os requisitos legais. Citou, ainda, a decisão proferida no HC 84928/MG (DJU de 11.11.2005), no qual assentado que, somente depois de fixada a espécie da pena (privativa de liberdade ou restritiva de direito) é que é possível cogitar do regime de seu cumprimento. Acompanharam o voto do relator os Ministros Eros Grau, Cezar Peluso e Marco Aurélio. Em divergência, o Min. Joaquim Barbosa, acompanhado pelos Ministros Carlos Velloso e Celso de Mello, denegou a ordem, invocando o entendimento perfilhado no julgamento do HC 83627/SP (DJU 27.2.2004) pela impossibilidade da substituição da pena, tendo em conta o disposto na Lei 8.072/90. Em seguida, o Tribunal, por maioria, acolhendo proposta do Min. Marco Aurélio, concedeu a liminar para que a paciente aguarde o julgamento em liberdade. Vencidos, no ponto, os Ministros Carlos Britto, Carlos Velloso e Celso de Mello que a indeferiam. O julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Carlos Britto.
HC 85894/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 30.11.2005. (HC-85894)
Processamento de Precatório Complementar em SP - 2
Concluído julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Governador do Estado de São Paulo contra o inciso V do artigo 336 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do referido Estado-membro, o qual, dispondo sobre o processamento de precatórios, estabelece que “para pagamentos complementares serão utilizados os mesmos precatórios satisfeitos parcialmente, até o seu integral cumprimento”. Sustentava-se, na espécie, ofensa ao art. 100 e parágrafos, bem como aos artigos 166 e 167, todos da CF/88 — v. Informativo 327. Na linha da orientação firmada pela Corte no julgamento da ADI 1098/SP (RTJ 161/796), o Tribunal, por maioria, julgou procedente, em parte, o pedido formulado, para emprestar ao dispositivo impugnado interpretação conforme à Constituição, sem redução de texto, de modo que os pagamentos complementares ali citados refiram-se apenas àqueles decorrentes de correção de erros materiais e inexatidões aritméticas contidos no precatório original, ou da substituição de índice já extinto. Vencido o Min. Marco Aurélio que julgava improcedente o pleito.
ADI 2924/SP, rel. Min. Carlos Velloso, 30.11.2005. (ADI-2924)
Porte Ilegal de Arma e Ausência de Munição - 2
O Tribunal retomou julgamento de habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática do crime previsto no art. 10 da Lei 9.437/97 (porte ilegal de arma), no qual se pretende a nulidade da sentença, sob alegação de atipicidade da conduta, em razão de a arma portada estar desmuniciada — v. Informativo 404. O Min. Carlos Velloso, em voto-vista, seguiu a divergência iniciada pelo Min. Sepúlveda Pertence, que concedeu a ordem, reiterando os fundamentos expendidos em seu voto no julgamento do RHC 81057/SP (DJU de 29.4.2005), no sentido de ser atípica a conduta, já que, à luz dos princípios da lesividade e da ofensividade, a arma sem munição, ou sem possibilidade de pronto municiamento, é instrumento inidôneo para efetuar disparo, sendo, portanto, incapaz de gerar lesão efetiva ou potencial à incolumidade pública. Após os votos dos Ministros Eros Grau, Joaquim Barbosa e Cezar Peluso, que também acompanhavam a divergência, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Gilmar Mendes.
HC 85240/SP, rel. Min. Carlos Britto, 30.11.2005. (HC-85240)
Rcl: Alteração do Edital de Venda do BEC
O Tribunal iniciou julgamento de agravo regimental interposto pela União Federal e o Banco Central do Brasil - BACEN contra decisão concessiva de liminar em reclamação na qual se impugna, sob alegação de ofensa à autoridade da decisão do Supremo na ADI 3578/DF (acórdão pendente de publicação), ato do Diretor do Banco Central do Brasil, consubstanciado no “Comunicado Relevante nº 04/2005/BC”, que alterou o item 6.7.1.1 do Edital de Venda do Banco do Estado do Ceará S/A - BEC, estabelecendo exclusividade, em favor deste, na prestação de serviços bancários referentes ao pagamento de fornecedores, remuneração dos servidores públicos estaduais e a administração e custódia dos títulos públicos federais adquiridos pelo mencionado Estado-membro para eventual recompra das operações de crédito securitizadas. O Min. Marco Aurélio, relator, conheceu do recurso e negou-lhe provimento, por entender que a alteração promovida pelo Comunicado, apesar de não conter a referência à Conta Única, mantém a previsão do depósito, no BEC, de numerário público, contrariando o que disposto no julgamento da aludida ação direta. Em divergência, o Min. Carlos Velloso, conheceu do recurso e deu-lhe provimento. Aludindo ao decidira no RE 444056/MG (pendente de publicação), asseverou que os valores destinados aos serviços contemplados no item 6.7.1.1 do Edital não constituem as disponibilidades de caixa de que trata o art. 164, § 3º, da CF, mas depósitos que, tendo por finalidade a satisfação da folha de pagamento e de outras despesas estatais, não estão à disposição do Estado-membro. Após, o julgamento foi adiado em face do pedido de vista do Min. Eros Grau.
Rcl 3872 AgR/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 1º.12.2005. (Rcl-3872)
Defensoria Pública: Organização nos Estados-Membros e Lei Complementar
O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pela Associação Nacional dos Defensores Públicos - ANADEP para declarar a inconstitucionalidade da Lei Complementar paraibana 48/2003, que, alterando a Lei Complementar 39/2002, disciplina a organização da Defensoria Pública do Estado da Paraíba. Entendeu-se que a norma em questão, ao dispor de forma contrária à prevista na Lei Complementar Federal 80/94, que versa sobre as normas gerais para a organização, nos Estados-membros, da respectiva Defensoria Pública, inclusive as definidoras de critérios de nomeação para os cargos de Defensor Público Geral e de Corregedor-Geral, ofende o art. 134, § 1º, da CF, que estabelece que lei complementar organizará a Defensoria Pública da União e do DF e dos Territórios e prescreverá normas gerais para sua organização nos Estados-membros.
ADI 2903/PB, rel. Min. Celso de Mello, 1º.12.2005. (ADI-2903)
Primeira Turma
Suspensão Condicional do Processo e Nulidade Relativa
A ausência de manifestação do Ministério Público sobre a suspensão condicional do processo (Lei 9.099/95, art. 89) acarreta nulidade relativa. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus, mas concedeu a ordem, de ofício, para que o STJ complemente a prestação jurisdicional referente ao exame das demais causas de pedir. No caso concreto, pleiteava-se, preliminarmente, a declaração de nulidade do processo, para que fosse observado o disposto no art. 89 da Lei 9.099/95 [“Nos crimes em que a pena mínima cominada for inferior a um ano, abrangidas, ou não, por esta lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que o condenado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (artigo 77 do Código Penal)”] e, de modo sucessivo, a nulidade do acórdão, a fim de que o tribunal de justiça estadual avaliasse a prova documental, sendo que, na impossibilidade de acolhimento dos pedidos anteriores, pretendia-se a nulidade do acórdão proferido, por atipicidade. Entendendo tratar-se de omissão de formalidade ligada à denúncia, asseverou-se que tal nulidade relativa considera-se sanada se não argüida em tempo oportuno (CPP, artigos 571 e 572).
HC 86039/AM, rel. Min. Marco Aurélio, 29.11.2005. (HC-86039)
Prisão Preventiva e Fundamentação
Em face do empate na votação, a Turma deferiu habeas corpus para determinar, com extensão aos co-réus, a expedição de alvará de soltura em favor de advogado acusado de integrar organização criminosa dedicada à extração ilegal de diamantes e à negociação posterior em área de reserva indígena da etnia Cinta Larga/RO. Na espécie, a prisão preventiva fora decretada com base nas garantias da ordem pública e da aplicação da lei penal, bem como na conveniência da instrução processual. Entendeu-se que o decreto não contém dados concretos capazes de respaldá-lo. Asseverou-se que a alusão à gravidade dos fatos, à existência de crimes e aos indícios de participação em organização criminosa não seriam suficientes a legitimar a custódia. Salientou-se, ainda, a insubsistência do motivo referente ao suposto risco de vida de testemunha, uma vez que o Ministério Público desistira de sua oitiva. Ademais, acrescentou-se que o paciente está preso há quase um ano, sem que concluída a instrução criminal. Vencidos os Ministros Eros Grau e Carlos Britto que indeferiam o writ, ao fundamento de que o excesso de prazo estaria justificado pela complexidade do caso.
HC 84934/RO, rel. Min. Marco Aurélio, 29.11.2005. (HC-84934)
Reformatio in Pejus e Erro Material
Há violação ao princípio da reformatio in pejus quando o tribunal estadual, ao julgar apelação interposta exclusivamente pela defesa, aumenta pena estabelecida na sentença, sob fundamento de tratar-se de erro material, corrigível de ofício. Com base nesse entendimento, a Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado que, por erro aritmético, tivera a sua pena definitiva fixada a menor, cujo erro material fora corrigido, em apelação exclusiva da defesa. Ressaltando que o processo penal é estruturado por princípios diversos do processo civil, no qual é permitida a correção de erro material a qualquer tempo, inclusive de ofício, entendeu-se que o tribunal local não poderia, no caso, sob argumento de corrigir erro material aritmético, ter agravado a reprimenda imposta ao paciente. No ponto, asseverou-se viger no sistema que informa o processo penal a regra da chamada personalidade dos recursos, em que a situação do réu recorrente não pode ser piorada, se não interposto recurso da parte contrária, em face da prevalência dos interesses públicos envolvidos, em especial, o ius libertatis, do qual o processo é concebido e disciplinado como instrumento de tutela. HC deferido para restabelecer a condenação imposta ao paciente, consoante dispunha a sentença proferida pelo Juízo da 25ª Vara Criminal da Comarca de São Paulo.
HC 83545/SP, rel. Min. Cezar Peluso, 29.11.2005. (HC-83545)
Segunda Turma
Princípio da Não-Culpabilidade e Maus Antecedentes - 2
Concluído julgamento de habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que indeferira igual medida ao fundamento de que o paciente, condenado por porte ilegal de arma (Lei 9.437/97, art. 10, §§ 2º e 4º) à pena de 3 anos de reclusão e 15 dias-multa, em regime semi-aberto, não preenche os requisitos subjetivos exigidos pelo art. 44, III, do CP, na redação dada pela Lei 9.714/98, para a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, haja vista a sua folha de antecedentes penais — v. Informativo 390. Alegava-se, na espécie, constrangimento ilegal consistente na fixação de regime inicial mais gravoso, bem como na negativa de substituição da pena aplicada. A Turma, por maioria, indeferiu o writ por reconhecer que, no caso, inquéritos e ações penais em curso podem ser considerados maus antecedentes, para todos os efeitos legais. Vencido o Min. Gilmar Mendes, relator, que, tendo em conta que a fixação da pena e do regime do ora paciente se lastreara única e exclusivamente na existência de dois inquéritos policiais e uma ação penal, concedia o habeas corpus.
HC 84088/MS, rel. orig. Min. Gilmar Mendes, rel. p/ o acórdão Min. Joaquim Barbosa, 29.11.2005. (HC-84088)
Receptação Culposa e Competência da Justiça Militar
Com base no art. 9º, III, a, do Código Penal Militar (“Art. 9º. Consideram-se crimes militares, em tempo de paz: ... III – os crimes praticados por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra as instituições militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inciso I, como os do inciso II, nos seguintes casos: a) contra o patrimônio sob a administração militar, ou contra a ordem administrativa militar”), a Turma indeferiu habeas corpus impetrado em favor de denunciado pela suposta prática do crime de receptação culposa (CPM, art. 255), consistente na aquisição de cabos e fios elétricos pertencentes a estabelecimento militar da União. Entendeu-se que, não obstante o delito haver sido praticado por civil, a Justiça Militar da União seria a competente para o processamento do feito, tendo em conta tratar-se de crime militar impróprio, uma vez que somente está tipificado no CPM e que o bem encontrava-se sob administração militar. Ressaltou-se, também, não influir na definição da competência o fato de o paciente ter agido com dolo ou culpa e não haver de se cogitar da competência da Justiça Penal Estadual para tal hipótese. Precedentes citados: RHC 69129/MS (DJU de 15.5.92) e HC 80163/MG (DJU de 1º.12.2000).
HC 86430/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 29.11.2005. (HC-86430)
IPI e Bem Importado por Pessoa Física - 2
A Turma concluiu julgamento de dois agravos regimentais em recursos extraordinários interpostos pela União contra decisão monocrática do Min. Carlos Velloso, relator, que, tendo em conta o princípio da não-cumulatividade (CF, art. 153, § 3º, II), concluíra pela não incidência do IPI na aquisição de veículo importado, destinado a uso próprio, por pessoa física não comerciante ou empresária — v. Informativo 388. Manteve-se a decisão impugnada. Ressaltando não existir disposição igual no tocante ao IPI, aludiu-se, entretanto, a precedentes firmados pelo STF no sentido da inexigibilidade de ICMS quando se tratar de bem importado por pessoa física, antes do advento da EC 33/2001, a qual viabilizara tal cobrança. Assim, concluiu-se que o princípio da não-cumulatividade deve ser observado.
RE 255682 AgR/RS e RE 272230 AgR/ SP, rel. Min. Carlos Velloso, 29.11.2005. (RE-255682) (RE-272230)
ITR e Anterioridade Tributária
A Turma manteve acórdão do TRF da 4ª Região que entendera que a cobrança de ITR, com base na MP 399/93, convertida na Lei 8.847/94, referente a fato gerador ocorrido no exercício de 1994, viola o princípio da anterioridade tributária (CF, art. 150, III, b). Tratava-se, na espécie, de recurso extraordinário interposto pela União em que se alegava a possibilidade da citada exação, uma vez que a Lei 8.847/94, ao instituir anexo contendo as tabelas de alíquotas do ITR, apenas complementara a MP 399/93, a qual fora editada no exercício financeiro anterior. Considerando que houvera instituição de imposto e não sua majoração e que a configuração do ITR se aperfeiçoara com a publicação do anexo na aludida Lei 8.847/94, a título de “retificação”, concluiu-se que a exigência do tributo sob esta nova modalidade, antes de 1º de janeiro de 1995, por força do art. 150, III, b, da CF, ofende o princípio da anterioridade tributária. Ressaltou-se que o anexo à MP 399/93 seria essencial à caracterização e quantificação da cobrança e que o referido princípio constitucional é garantia fundamental do contribuinte, não podendo ser suprimido nem mesmo por Emenda Constitucional.
RE 448558/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 29.11.2005. (RE-448558)
Competência Privativa da União e Seguro
Tendo em conta a previsão constitucional acerca da competência privativa da União para legislar sobre seguros (CF, art. 22, VII), a Turma reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, considerando tratar-se de assunto de interesse local, declarara a legalidade de leis do Município de São Paulo que determinam a obrigatoriedade, no âmbito do Município, da cobrança de seguro contra furto e roubo de automóveis para estabelecimentos de shopping centers, lojas de departamentos, supermercados e empresas que operem e disponham de área ou local destinado a estacionamentos cujo número de vagas seja superior a 50 veículos. Entendeu-se que o recorrido criara nova modalidade de seguro obrigatório, além das previstas pelo art. 20 do Decreto-lei 73/66, que dispõe sobre o sistema nacional de seguros privados. Salientando que o legislador constituinte nessa matéria não conferira competência comum ou concorrente aos demais entes federativos, asseverou-se que a competência constitucional dos municípios não alcança, a pretexto de legislar sobre interesse local, o estabelecimento de normas que a própria Constituição, na repartição de competências, atribuíra à União ou aos Estados-membros.
RE 313060/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 29.11.2005. (RE-313060)
Sessões Ordinárias Extraordinárias Julgamentos
Pleno 30.11.2005 1º.12.2005 13
1ª Turma 29.11.2005 —— 49
2ª Turma 29.11.2005 —— 545
C l i p p i n g d o DJ
2 de dezembro de 2005
ADI N. 2.819-RJ
RELATOR: MIN. EROS GRAU
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 3.687/02 DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. OBRIGATORIEDADE DE DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÕES IDENTIFICANDO OS VEÍCULOS APREENDIDOS PELAS POLÍCIAS MILITAR E CIVIL. VÍCIO DE INICIATIVA. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. 1. O Pleno desta Corte pacificou jurisprudência no sentido de que os Estados-membros devem obediência às regras de iniciativa legislativa reservada, fixadas constitucionalmente. 2. A gestão da segurança pública, como parte integrante da Administração Pública, é atribuição privativa do Governador de Estado. 3. O artigo 1º da Lei n. 3.687/02 do Estado do Rio de Janeiro possuir caráter informativo. 4. Pedido de declaração de inconstitucionalidade acolhido em parte.
* noticiado no Informativo 382
ADI N. 3.254-ES
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 7.755, DE 14.05.04, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. TRÂNSITO. INVASÃO DA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DA UNIÃO PREVISTA NO ART. 22, XI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INICIATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. USURPAÇÃO. ARTS. 61, § 1º, II, E E 84, VI, DA CARTA MAGNA. 1. É pacífico nesta Corte o entendimento de que o trânsito é matéria cuja competência legislativa é atribuída, privativamente, à União, conforme reza o art. 22, XI, da Constituição Federal. Precedentes: ADI 2.064, rel. Min. Maurício Corrêa e ADI 2.137-MC, rel. Min. Sepúlveda Pertence. 2. O controle da baixa de registro e do desmonte e comercialização de veículos irrecuperáveis é tema indissociavelmente ligado ao trânsito e a sua segurança, pois tem por finalidade evitar que unidades automotivas vendidas como sucata - como as sinistradas com laudo de perda total - sejam reformadas e temerariamente reintroduzidas no mercado de veículos em circulação. 3. É indispensável a iniciativa do Chefe do Poder Executivo (mediante projeto de lei ou mesmo, após a EC 32/01, por meio de decreto) na elaboração de normas que de alguma forma remodelem as atribuições de órgão pertencente à estrutura administrativa de determinada unidade da Federação. 4. Ação direta cujo pedido se julga procedente.
* noticiado no Informativo 409
Acórdãos Publicados: 218
Transcrições
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do Informativo STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
TCU: Tomada de Contas Especial e Sociedade de Economia Mista (Transcrições)
(v. Informativo 408)
MS 25092/DF*
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE CONTAS. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA: FISCALIZAÇÃO PELO TRIBUNAL DE CONTAS. ADVOGADO EMPREGADO DA EMPRESA QUE DEIXA DE APRESENTAR APELAÇÃO EM QUESTÃO RUMOROSA.
I. – Ao Tribunal de Contas da União compete julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo poder público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário (CF, art. 71, II; Lei 8.443, de 1992, art. 1º, I).
II. – As empresas públicas e as sociedades de economia mista, integrantes da administração indireta, estão sujeitas à fiscalização do Tribunal de Contas, não obstante os seus servidores estarem sujeitos ao regime celetista.
III. – Numa ação promovida contra a CHESF, o responsável pelo seu acompanhamento em juízo deixa de apelar. O argumento de que a não-interposição do recurso ocorreu em virtude de não ter havido adequada comunicação da publicação da sentença constitui matéria de fato dependente de dilação probatória, o que não é possível no processo do mandado de segurança, que pressupõe fatos incontroversos.
IV. – Mandado de segurança indeferido.
Relatório: Trata-se de mandado de segurança impetrado por ANTÔNIO JOSÉ DE FARIAS SIMÕES, advogado da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco - CHESF, contra ato do TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO, consubstanciado no Acórdão 413/2002-TCU-Plenário (fls. 269-293), proferido nos autos do Processo TC-022.319/1992-1, relativo à Tomada de Contas Especial da CHESF, que aplicou multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) ao impetrante em razão da não-interposição de apelação contra sentença proferida em ação ordinária de cumprimento de contrato, que tornou inquestionável o vínculo contratual entre a empresa Hidroservice e a CHESF.
Inicialmente, informa o impetrante que, do referido acórdão, interpôs recurso de reconsideração, que foi desprovido (Acórdão 207/2004-TCU-Plenário — fls. 329-340). Inconformado, opôs embargos de declaração, que foram rejeitados (Acórdão 622/2004-TCU-Plenário — fls. 355-359).
Sustenta, mais, em síntese, o seguinte:
a) incompetência do Tribunal de Contas da União para julgar e punir o impetrante, porquanto, por ser a CHESF uma sociedade de economia mista, não lhe é aplicável o processo de tomada de contas especial, conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do MS 23.875/DF. Ademais, ressalta que, no exercício de suas atividades, não exerce qualquer função de diretoria ou execução administrativa, não ordena despesa e não utiliza, gerencia, arrecada, guarda ou administra bens, dinheiros ou valores públicos;
b) ausência de violação à norma legal ou regulamentar de natureza operacional por parte do impetrante, a quem, na qualidade de Consultor Jurídico da CHESF, incumbia tão-somente fixar a estratégia e a orientação geral quanto aos processos de grande significado. Nesse contexto, ressalta que, de acordo com o manual de organização da empresa, a competência para orientar e elaborar a defesa da CHESF em juízo era do Departamento Jurídico - DJU;
c) existência de causa eficiente a justificar a não-interposição do recurso de apelação, consubstanciada “no fato de não ter havido a adequada comunicação da publicação da sentença que julgou os Embargos de Declaração na ação principal de CUMPRIMENTO DE CONTRATO movida pela HIDROSERVICE contra a CHESF” (fl. 21). Dessa forma, “se ignorava informação que era da responsabilidade de colheita da Divisão de Procuradoria Jurídica – DAPG, Órgão vinculado ao Departamento Jurídico – DJU, que subsidiava tanto a CJU, como o próprio DJU” (fl. 21), não poderia o impetrante ter praticado o ato que lhe é imputado;
d) ocorrência do periculum in mora’ dado que “a insubmissão do Impetrante ao adimplemento da multa acarretará a inscrição do valor respectivo na dívida ativa da União, com a imediata deflagração do processo de execução” (fl. 22).
Ao final, requer o impetrante seja concedida medida liminar para suspender os efeitos do ato impugnado. No mérito, requer a concessão da segurança, para “anular o ato coator e, conseqüentemente, ordenar à Autoridade impetrada a baixa do procedimento em questão, com a exclusão do nome do Impetrante do rol de devedores” (fl. 23).
Deixei para apreciar o pedido da liminar com as informações do órgão apontado coator (fl. 473).
Requisitadas informações (fl. 473), o Presidente do Tribunal de Contas da União as prestou (fls. 478-553), sustentando, em síntese, o seguinte:
a) necessidade de integração à lide das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, na qualidade de litisconsortes passivos necessários unitários, pois negar a competência do TCU é negar a do Congresso Nacional para o exercício do controle externo, por meio de auditorias e inspeções a serem realizadas pela Corte de Contas por solicitação das Casas Legislativas ou de suas comissões;
b) ausência de posição consolidada do Supremo Tribunal Federal quanto à ilegitimidade do TCU para fiscalizar sociedades de economia mista, dado que, não obstante a existência de decisões nesse sentido, “o Ministério Público Federal, nos autos dos Mandados de Segurança n. 24.439, 24.471, 24.782 e 24.891, pendentes de julgamento e que tratam da mesma tese aqui discutida, manifestou-se pela denegação da segurança e pela revisão do anterior entendimento do Supremo Tribunal Federal” (fl. 492). Além disso, “a nova composição dos membros da Suprema Corte, modificada em quase 50%, ensejará a análise da matéria de forma inédita para muitos e, portanto, talvez desvinculada e distanciada do entendimento que norteou as decisões do STF nos MS 23.627 e 23.875” (fl. 492);
c) essencialidade do TCU no controle externo das sociedades de economia mista, mormente porque a maioria do capital social em nome da União confere à empresa caráter eminentemente público, embora com estrutura privada, e impõe uma forma de fiscalização adequada à garantia do patrimônio público. Nesse contexto, ressalta que o controle exercido pelo TCU assume papel preponderante, na medida em que evita desvio e desperdício dos poucos e insuficientes recursos públicos;
d) competência do TCU para aplicar sanções ao impetrante, eis que a aplicação de sanções não é medida restrita ao exercício da competência de julgamento de contas, sendo também cabível no exercício da competência de fiscalização;
e) não-cabimento do pedido de liminar, porquanto não configurado, no caso, a presença do fumus boni juris.
Finalmente, requer a autoridade impetrada a citação das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, na qualidade de litisconsortes passivos necessários unitários, bem como o indeferimento da liminar pleiteada.
Em 18.11.2004, indeferi o pedido de integração à lide das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e deferi a medida liminar pleiteada (fls. 558-561).
A Procuradoria Geral da República, em parecer lavrado pelo então Procurador-Geral da República, Prof. Claudio Fonteles, opina pela revogação da medida liminar e, no mérito, pela denegação da ordem (fls. 570-585).
Autos conclusos em 15.12.2004. À pauta em 02.3.2005.
É o relatório.
Voto: No julgamento do MS 23.627/DF, de que fui relator originário, o Supremo Tribunal Federal decidiu, ficando eu vencido, que não é aplicável às sociedades de economia mista o processo de Tomada de Contas Especial (Lei 8.443/92).
Nesse julgamento — MS 23.627/DF —, fiquei vencido, já que a maioria dos eminentes Colegas seguiu o voto do Ministro Ilmar Galvão, que foi designado Relator para o acórdão, acórdão que, até esta data — o julgamento foi realizado no ano de 2001 —, não foi publicado.
Posteriormente, no julgamento do MS 23.875/DF, de que fui relator originário, o Supremo Tribunal Federal decidiu da mesma forma, ficando eu novamente vencido. O eminente Ministro Nelson Jobim foi designado Relator para o acórdão, portando este a seguinte ementa:
“CONSTITUCIONAL. ATO DO TCU QUE DETERMINA TOMADA DE CONTAS ESPECIAL DE EMPREGADO DO BANCO DO BRASIL – DISTRIBUIDORA DE TÍTULOS E VALORES MOBILIÁRIOS S.A., SUBSIDIÁRIA DO BANCO DO BRASIL, PARA APURAÇÃO DE ‘PREJUÍZO CAUSADO EM DECORRÊNCIA DE OPERAÇÕES REALIZADAS NO MERCADO FUTURO DE ÍNDICES BOVESPA’. ALEGADA INCOMPATIBILIDADE DESSE PROCEDIMENTO COM O REGIME JURÍDICO DA CLT, REGIME AO QUAL ESTÃO SUBMETIDOS OS EMPREGADOS DO BANCO. O PREJUÍZO AO ERÁRIO SERIA INDIRETO, ATINGINDO PRIMEIRO OS ACIONISTAS. O TCU NÃO TEM COMPETÊNCIA PARA JULGAR AS CONTAS DOS ADMINISTRADORES DE ENTIDADES DE DIREITO PRIVADO. A PARTICIPAÇÃO MAJORITÁRIA DO ESTADO NA COMPOSIÇÃO DO CAPITAL NÃO TRANSMUDA SEUS BENS EM PÚBLICOS. OS BENS E VALORES QUESTIONADOS NÃO SÃO OS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, MAS OS GERIDOS CONSIDERANDO-SE A ATIVIDADE BANCÁRIA POR DEPÓSITOS DE TERCEIROS E ADMINISTRADOS PELO BANCO COMERCIALMENTE. ATIVIDADE TIPICAMENTE PRIVADA, DESENVOLVIDA POR ENTIDADE CUJO CONTROLE ACIONÁRIO É DA UNIÃO. AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE AO IMPETRADO PARA EXIGIR INSTAURAÇÃO DE TOMADA DE CONTAS ESPECIAL AO IMPETRANTE.
MANDADO DE SEGURANÇA DEFERIDO.” (“DJ” de 30.4.2004)
A segurança jurídica recomenda observância do entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal, pelo seu Plenário. Permito-me, entretanto, Sr. Presidente, reiterar o entendimento que manifestei no julgamento dos mencionados Mandados de Segurança 23.627/DF e 23.875/DF.
Destaco do voto que proferi no MS 23.627/DF, ao qual me reportei no julgamento do MS 23.875/DF:
“(...)
A Constituição da República, art. 71, II, estabelece competir ao Tribunal de Contas julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo poder público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público.
Expressamente, pois, a Constituição submete à fiscalização do Tribunal de Contas da União as contas dos administradores de entidades que integram a administração indireta. Como é sabido, as empresas públicas e as sociedades de economia mista integram a administração indireta.
A Lei nº 8.443, de 1992 — Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União — repete, no seu artigo 1º, I, a disposição inscrita no art. 71, II, C.F.
Posta a questão nestes termos, pretender eximir-se a sociedade de economia mista da fiscalização do TCU, ao argumento de que os seus servidores estão submetidos ao regime celetista, é pretender interpretar a Constituição no rumo da lei ordinária. É mesmo um truísmo a afirmativa de que a lei deve ser interpretada, sempre e sempre, no rumo da Constituição.
Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, cuidando do tema, já no sistema instaurado pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998, leciona, comentando o art. 173 da C.F., que ‘esse dispositivo não pode ser interpretado isoladamente. Insere-se no capítulo pertinente aos princípios da atividade econômica e visa garantir a efetividade do princípio da livre iniciativa, conferido no art. 1º da própria Constituição Federal. É uma garantia em favor da sociedade, constituindo sofisma pretender erigi-lo numa prerrogativa dos dirigentes de estatais de usar e abusar dos recursos públicos, como se dirigissem uma empresa privada. Mesmo com o advento da Reforma Administrativa, consagrada pela Emenda Const. nº 19, essas entidades ficam jungidas ao controle dos Tribunais de Contas, porque previsto no art. 71 da Constituição Federal.’ (Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, ‘Tomada de Contas Especial’, Brasília Jurídica, 2ª ed., 1998, pág. 132).
De outro lado, o argumento do impetrante, de que, tratando-se de sociedade de economia mista, da qual o Estado participa, como acionista, não seria possível distinguir se a lesão teria sido causada ao patrimônio privado ou ao patrimônio público, pelo que poder-se-ia afirmar que ‘dano ao Banco do Brasil não significa dano ao Erário’, não tem procedência. Ora, uma sociedade de economia mista se constitui de capitais do Estado e capitais privados, certo que os capitais do Estado, assim capitais públicos, constituem maioria. Assim, a lesão ao patrimônio de uma sociedade de economia mista atinge, sem dúvida, o capital público — o Erário, portanto — além de atingir, também, o capital privado. Um dano, pois, ao patrimônio do Banco do Brasil significa dano ao Erário. O fato de significar, também, dano ao capital privado, minoria na sociedade de economia mista, não desqualifica o dano ao capital público, assim dano ao Erário.
O mesmo pode ser dito relativamente ao argumento de que estaria o Banco, uma sociedade de economia mista, apenas sujeita à lei das sociedades anônimas, em termos de controle. Acrescente-se, na linha da lição da professora Maria Sylvia Zanella di Pietro, que as entidades da administração indireta — empresas públicas e sociedades de economia mista — ‘nunca se sujeitam inteiramente ao direito privado. O seu regime é híbrido, porque, sob muitos aspectos, elas se submetem ao direito público, tendo em vista especialmente a necessidade de fazer prevalecer a vontade do ente estatal que as criou para atingir determinado fim de interesse público.’ (‘Direito Administrativo’, Ed. Atlas, 10ª edição). Celso Antônio Bandeira de Mello, dissertando sobre a peculiaridade de regime das estatais, leciona que as empresas públicas e as sociedades de economia mista, sejam exploradoras de atividade econômica ou sejam prestadoras de serviço público, estão sujeitas à fiscalização dos Tribunais de Contas, tendo em vista o disposto no art. 71, II, III e IV (Celso Antônio Bandeira de Mello, ‘Curso de Direito Administrativo’, Malheiros Ed., 13ª edição, 2001, págs. 161-162).
Do exposto, indefiro o writ e casso a medida liminar concedida.
(...).”
Acrescentei:
“Sr. Presidente, o Banco do Brasil goza de boa saúde econômica e, sobretudo, de boa reputação sob o ponto de vista da moralidade. É uma instituição séria, da confiança dos brasileiros. Por isso, este não é um caso ideal para apreciação da questão da tomada de contas. Desejo, por isso mesmo, alertar aos meus eminentes pares para o seguinte: do precedente do Banco do Brasil, da decisão que aqui parece que vai ser tomada, vão aproveitar-se centenas de sociedades de economia mista, empresas estatais que não gozam da mesma saúde econômica e moral do Banco do Brasil.
Esclareço mais: a tomada de contas se faz diante de denúncias de irregularidades, de apropriação de dinheiros públicos, ou diante da verificação, por agentes do Tribunal de Contas, da existência de irregularidades ou de desvio de dinheiros públicos, assim de um dano ao Erário. Não devemos liberar da fiscalização do Tribunal de Contas, incumbido pela Constituição de fiscalizar a boa aplicação desses dinheiros e dos bens públicos, centenas de empresas estatais, integrantes da administração indireta, que se espalham por esses brasis. E não serão somente as federais que vão se aproveitar da decisão. Serão, também, as estaduais e as municipais. E nós sabemos que muitas dessas entidades não cuidam bem do dinheiro e dos bens públicos.
Não há falar em fiscalização do acionista minoritário. O poder público é sempre acionista majoritário, tratando-se de sociedade de economia mista. Tratando-se de empresa pública, o poder público detém a totalidade do capital.
Sr. Presidente, penso que é do meu dever, relator que sou da segurança, alertar os meus eminentes pares para a importância da decisão que será tomada.
Muito obrigado.”
A segurança, portanto, sob tal aspecto, é de ser indeferida.
Há uma outra questão. É que o impetrante “é empregado da COMPANHIA HIDRO ELÉTRICA DO SÃO FRANCISCO – CHESF” (fl. 02), regido pela CLT, ocupando vaga de Advogado. Exercia, na época dos fatos a função de Chefe da Divisão Jurídica daquela Empresa, quando foi convidado a ocupar o cargo de Consultor Jurídico. Esclarece, na inicial:
“(...)
Pois bem, sucedeu que, ao assumir a CONSULTORIA JURÍDICA da CHESF, o Impetrante recebeu entre outras incumbências, a de acompanhar rumoroso processo movido pela HIDROSERVICE contra a CHESF, tendo como objeto pretensões vinculadas à fiscalização de obras da empresa em andamento.
Diz-se rumoroso processo, porque a HIDROSERVICE, primeiramente, lograra liminar, initio litis, em ação cautelar promovida perante a 2ª Vara Cível da Comarca da Capital do Estado de Pernambuco, ordenando a suspensão de certame licitatório aberto pela CHESF para a execução dos serviços de controle de qualidade das obras da Usina de Xingó, localizadas nos Estados de Sergipe e Alagoas, e a mesma liminar determinando a manutenção da HIDROSERVICE à frente dessa fiscalização, sob o fundamento de que tais serviços constituíam uma extensão de outros idênticos contratados anteriormente com aquela empresa de engenharia, concernentes à fiscalização das obras da Usina de Itaparica, em que pese, esta obra não somente distinta, como localizada em outro sítio hidrológico, no Estado de Pernambuco (doc. 09).
Devido a essas desinteligências, sobreveio o vencimento de várias faturas correspondentes aos serviços entregues à HIDROSERVICE por força da mencionada liminar, cujo inadimplemento ensejou novos procedimentos judiciais intentados pela HIDROSERVICE visando o recebimento dessas faturas, ocasionando diversos bloqueios de contas bancárias da CHESF (v. doc. 09).
No curso desse conflito, exsurgiu forte animosidade entre a empresa e o E. Tribunal de Justiça de Pernambuco, em razão dos sistemáticos bloqueios de contas bancárias, levando a CHESF, a fim de fazer cessar esse clima de animosidade, a celebrar acordo com a HIDROSERVIÇE, em sede de cautelar, no sentido de liberar os pagamentos retidos, enquanto aquele E. Tribunal liberava os bloqueios de contas referidos.
Em paralelo a essas demarches, a HIDROSERVICE promovera a ação principal correspondente, AÇÃO ORDINÁRIA DE CUMPRIMENTO DE CONTRATO, na qual lograra sentença favorável no sentido de prosseguir na execução dos serviços que lhes foram liminarmente assegurados e contra essa sentença a CHESF opôs EMBARGOS DE DECLARAÇÃO (doc. 10), porém, restando, por longo tempo, pendentes de julgamento.
De sorte que, ao tomar posse na Consultoria Jurídica - CJU, o Impetrante já encontrou aquele acordo firmado, enquanto, os aludidos Embargos de Declaração na ação principal continuavam à espera de julgamento.
Finalmente, aqueles Embargos Declaratórios foram julgados, mas, devido a falhas no acompanhamento da publicação da sentença pela Procuradoria Jurídica, acabou transcorrendo in albis o prazo de apelação, ensejando a Execução.
(...).” (Fls. 03-04)
É dizer, a CHESF não apelou da sentença, advindo, daí, certamente, prejuízo para a empresa.
O impetrante, conforme vimos, tinha a incumbência de acompanhar, em nome da CHESF, o “rumoroso processo movido pela HIDROSERVICE contra CHESF” (Inicial, fl. 03).
No julgamento do MS 24.073/DF, por mim relatado, decidiu o Supremo Tribunal Federal:
“EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE CONTAS. TOMADA DE CONTAS: ADVOGADO. PROCURADOR: PARECER. C.F., art. 70, parág. único, art. 71, II, art. 133. Lei nº 8.906, de 1994, art. 2º, § 3º, art. 7º, art. 32, art. 34, IX.
I. – Advogado de empresa estatal que, chamado a opinar, oferece parecer sugerindo contratação direta, sem licitação, mediante interpretação da lei das licitações. Pretensão do Tribunal de Contas da União em responsabilizar o advogado solidariamente com o administrador que decidiu pela contratação direta: impossibilidade, dado que o parecer não é ato administrativo, sendo, quando muito, ato de administração consultiva, que visa a informar, elucidar, sugerir providências administrativas a serem estabelecidas nos atos de administração ativa. Celso Antônio Bandeira de Mello, ‘Curso de Direito Administrativo’, Malheiros Ed., 13ª ed., p. 377.
II. – O advogado somente será civilmente responsável pelos danos causados a seus clientes ou a terceiros, se decorrentes de erro grave, inescusável, ou de ato ou omissão praticado com culpa, em sentido largo: Cód. Civil, art. 159; Lei 8.906/94, art. 32.
III. – Mandado de Segurança deferido.” (“DJ” 31.10.2003)
Ali, entretanto, cuidamos de parecer oferecido pelo advogado da empresa sugerido determinada contratação, sem licitação, mediante interpretação da lei das licitações.
Aqui, estamos diante de um fato: a não-interposição de apelação, numa causa submetida à Justiça.
A não-interposição de apelação representaria uma estratégia de defesa? Argumenta o impetrante não ter havido adequada comunicação da publicação da sentença que julgara os embargos de declaração na ação principal.
Tem-se, no caso, está-se ver, fatos controvertidos, que desautorizam a impetração, certo que o processo de segurança não admite dilação probatória.
Do exposto, indefiro o writ.
* acórdão pendente de publicação
O Supremo Tribunal Federal é o órgão de cúpula do Poder Judiciário, e a ele compete, precipuamente, a guarda da Constituição, conforme definido no art. 102 da Constituição da República. É composto por onze Ministros, todos brasileiros natos (art. 12, § 3º, inc. IV, da CF/1988), escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada (art. 101 da CF/1988), e nomeados pelo Presidente da República, após aprovação da escolha pela maioria absoluta do Senado Federal (art. 101, parágrafo único, da CF/1988). Entre suas principais atribuições está a de julgar a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, a arguição de descumprimento de preceito fundamental decorrente da própria Constituição e a extradição solicitada por Estado estrangeiro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STF - Supremo Tribunal Federal. Informativo 411 do STF - 2006 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 set 2008, 23:21. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/informativos dos tribunais/12398/informativo-411-do-stf-2006. Acesso em: 27 nov 2024.
Por: STF - Supremo Tribunal Federal Brasil
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