Candidato em concurso público com surdez unilateral não tem direito a participar do certame na qualidade de deficiente auditivo. Isso porque o Decreto 5.296/2004 alterou a redação do art. 4º, II, do Decreto 3.298/1999 – que dispõe sobre a Política Nacional para Integração de Pessoa Portadora de Deficiência - e excluiu da qualificação “deficiência auditiva” os portadores de surdez unilateral. Vale ressaltar que a jurisprudência do STF confirmou a validade da referida alteração normativa. Precedente citado do STF: MS 29.910 AgR, Segunda Turma, DJe 1º/8/2011. MS 18.966-DF, Rel. Min. Castro Meira, Rel. para acórdão Min. Humberto Martins, julgado em 2/10/2013.
Não é possível aplicar o prazo decadencial decenal previsto no art. 103 da Lei 8.213/1991 aos casos de desaposentação. Com efeito, o referido dispositivo legal dispõe ser de dez anos o prazo para a revisão de ato de concessão ou de indeferimento de benefício, não sendo aplicável ao caso de desaposentação, que indica o exercício do direito de renúncia ao benefício em manutenção a fim de desconstituir o ato original e, por conseguinte, obter uma nova aposentadoria, incrementada com as contribuições vertidas pelo segurado após o primeiro jubilamento. Nesse contexto, vale lembrar que a instituição desse prazo decadencial no direito previdenciário foi uma inovação que limitou a revisão dos critérios adotados para o cálculo da renda mensal inicial, que, até então, poderia acontecer a qualquer tempo. A interpretação a ser dada ao instituto da decadência previsto no art. 103 da Lei 8.213/1991 deve ser restritiva, haja vista que as hipóteses de decadência decorrem de lei ou de ato convencional, inexistentes para a hipótese ora tratada. REsp 1.348.301-SC, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 27/11/2013.
O saldo de depósito em fundo de previdência privada complementar na modalidade Plano Gerador de Benefícios Livres (PGBL) é impenhorável, a menos que sua natureza previdenciária seja desvirtuada pelo participante. O regime de previdência privada complementar é, nos termos do art. 1º da LC 109/2001, “baseado na constituição de reservas que garantam o benefício, nos termos do caput do art. 202 da Constituição Federal”, que, por sua vez, está inserido na seção que dispõe sobre a Previdência Social. Na aplicação em PGBL, o participante realiza depósitos periódicos, os quais são aplicados e transformam-se em uma reserva financeira, que poderá ser por ele antecipadamente resgatada ou recebida em data definida, seja em uma única parcela, seja por meio de depósitos mensais. Em qualquer hipótese, não se pode perder de vista que, em geral, o participante adere a esse tipo de contrato com o intuito de resguardar o próprio futuro ou de seus beneficiários, garantindo o recebimento de certa quantia, que julga suficiente para a manutenção futura do atual padrão de vida. A faculdade de “resgate da totalidade das contribuições vertidas ao plano pelo participante” (art. 14, III, da LC 109/2001) não tem o condão de afastar, de forma absoluta, a natureza essencialmente previdenciária e, portanto, alimentar, do saldo existente naquele fundo. Veja-se que a mesma razão que protege os proventos advindos da aposentadoria privada deve valer para a reserva financeira que visa justamente a assegurá-los, sob pena de se tornar inócua a própria garantia da impenhorabilidade daqueles proventos. Outrossim, se é da essência do regime de previdência complementar a inscrição em um plano de benefícios de caráter previdenciário, não é lógico afirmar que os valores depositados pelo participante possam, originalmente, ter natureza alimentar e, com o decorrer do tempo, justamente porque não foram utilizados para a manutenção do empregado e de sua família no período em que auferidos, passem a se constituir em investimento ou poupança. EREsp 1.121.719-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/2/2014.
O crime de sonegação fiscal absorve o de falsidade ideológica e o de uso de documento falso praticados posteriormente àquele unicamente para assegurar a evasão fiscal. Após evolução jurisprudencial, o STJ passou a considerar aplicável o princípio da consunção ou da absorção quando os crimes de uso de documento falso e falsidade ideológica – crimes meio – tiverem sido praticados para facilitar ou encobrir a falsa declaração, com vistas à efetivação do pretendido crime de sonegação fiscal – crime fim –, localizando-se na mesma linha de desdobramento causal de lesão ao bem jurídico, integrando, assim, o iter criminis do delito fim. Cabe ressalvar que, ainda que os crimes de uso de documento falso e falsidade ideológica sejam cometidos com o intuito de sonegar o tributo, a aplicação do princípio da consunção somente tem lugar nas hipóteses em que os crimes meio não extrapolem os limites da incidência do crime fim. Aplica-se, assim, mutatis mutandis, o comando da Súmula 17 do STJ (Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido). Precedentes citados: AgRg no REsp 1.366.714-MG, Quinta Turma, DJe 5/11/2013; AgRg no REsp 1.241.771-SC, Sexta Turma, DJe 3/10/2013. EREsp 1.154.361-MG, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 26/2/2014.
Não é possível condicionar a concessão de imunidade tributária prevista para as instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos à apresentação de certificado de entidade de assistência social na hipótese em que prova pericial tenha demonstrado o preenchimento dos requisitos para a incidência da norma imunizante. De fato, o art. 150, VI, c, da CF/1988 prevê a concessão de imunidade tributária às instituições de educação sem fins lucrativos, delegando à lei infraconstitucional os requisitos para a incidência da norma imunizante. Nesse contexto, o art. 14 do CTN elencou os pressupostos para qualificar uma instituição de ensino como entidade desprovida de finalidade lucrativa, dispondo que essas entidades não podem distribuir qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas a qualquer título, devem aplicar integralmente no país os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais e devem manter escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão. Assim, condicionar a concessão de imunidade tributária à apresentação do certificado de entidade de assistência social, na hipótese em que perícia técnica tenha demonstrado o preenchimento dos requisitos legais, implica acréscimo desarrazoado e ilegal de pressupostos não previstos em lei para tanto, ainda mais quando o próprio texto constitucional prevê como condicionante para a concessão do referido benefício apenas a inexistência de finalidade lucrativa por parte da instituição. AgRg no AREsp 187.172-DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 18/2/2014.
Não é possível o ajuizamento de ação de improbidade administrativa exclusivamente em face de particular, sem a concomitante presença de agente público no polo passivo da demanda. De início, ressalta-se que os particulares estão sujeitos aos ditames da Lei 8.429/1992 (LIA), não sendo, portanto, o conceito de sujeito ativo do ato de improbidade restrito aos agentes públicos. Entretanto, analisando-se o art. 3º da LIA, observa-se que o particular será incurso nas sanções decorrentes do ato ímprobo nas seguintes circunstâncias: a) induzir, ou seja, incutir no agente público o estado mental tendente à prática do ilícito; b) concorrer juntamente com o agente público para a prática do ato; e c) quando se beneficiar, direta ou indiretamente do ato ilícito praticado pelo agente público. Diante disso, é inviável o manejo da ação civil de improbidade exclusivamente contra o particular. Precedentes citados: REsp 896.044-PA, Segunda Turma, DJe 19/4/2011; REsp 1.181.300-PA, Segunda Turma, DJe 24/9/2010. REsp 1.171.017-PA, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 25/2/2014.
Não enseja o sobrestamento do recurso especial a pendência de julgamento no STF sobre a modulação dos efeitos de decisão proferida em ação direta de inconstitucionalidade. Isso porque o sobrestamento somente é cabível no caso de juízo de admissibilidade de recurso extraordinário interposto nesta Corte Superior. AgRg no AREsp 18.272-SP, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 4/2/2014.
Nas condenações impostas à Fazenda Pública, cabe o afastamento, pelo STJ, para os cálculos da correção monetária, da aplicação dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, mesmo que a decisão do STF que declarou a inconstitucionalidade parcial por arrastamento do art. 5º da Lei 11.960/2009, seguida pelo STJ em julgamento de recurso repetitivo, ainda não tenha sido publicada. Já tendo o STF reconhecido a inconstitucionalidade do art. 5º da Lei 11.960/2009, não cabe novo reconhecimento da inconstitucionalidade por esta Corte, cuja decisão, portanto, não afronta o art. 97 da CF. Além disso, nos termos em que foi editada a Súmula Vinculante 10 do STF, a violação à cláusula de reserva de plenário só ocorreria se a decisão, embora sem explicitar, afastasse a incidência da norma ordinária pertinente à lide, para decidi-la sob critérios diversos alegadamente extraídos da CF. Ressalte-se, ainda, que a jurisprudência do STJ assenta-se no sentido de que é desnecessário que o recurso especial representativo de matéria repetitiva tenha transitado em julgado para fins de aplicação do art. 543-C do CPC Ademais, a correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício, bastando que a matéria tenha sido debatida na Corte de origem, não cabendo falar em reformatio in pejus. AgRg no AREsp 18.272-SP, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 4/2/2014.
No julgamento de apelação, a utilização de novos fundamentos legais pelo tribunal para manter a sentença recorrida não viola o art. 515 do CPC. Isso porque o magistrado não está vinculado ao fundamento legal invocado pelas partes ou mesmo adotado pela instância a quo, podendo qualificar juridicamente os fatos trazidos ao seu conhecimento, conforme o brocardo jurídico mihi factum, dabo tibi jus (dá-me o fato, que te darei o direito) e o princípio jura novit curia (o juiz conhece o direito). Precedentes citados: AgRg no Ag 1.238.833-RS, Primeira Turma, DJe 7/10/2011 e REsp 1.136.107-ES, Segunda Turma, DJe 30/8/2010. REsp 1.352.497-DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 4/2/2014.
O magistrado pode negar a realização de perícia requerida pela parte sem que isso importe, necessariamente, cerceamento de defesa. De fato, o magistrado não está obrigado a realizar todas as perícias requeridas pelas partes. Ao revés, dentro do livre convencimento motivado, pode dispensar exames que repute desnecessários ou protelatórios. Precedente citado: AgRg no AREsp 336.893-SC, Primeira Turma, DJe 25/9/2013. REsp 1.352.497-DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 4/2/2014.
Não há garantia da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de permissão de serviço de transporte público realizado sem prévia licitação. Precedentes citados: AgRg nos EDcl no REsp 799.250-MG, Segunda Turma, DJe 4/2/2010, e AgRg no Ag 800.898-MG, Segunda Turma, DJe 2/6/2008. REsp 1.352.497-DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 4/2/2014.
Na fase de investigação social em concurso público, o fato de haver instauração de inquérito policial ou propositura de ação penal contra candidato, por si só, não pode implicar a sua eliminação. A eliminação nessas circunstâncias, sem o necessário trânsito em julgado da condenação, viola o princípio constitucional da presunção de inocência. Precedentes citados do STF: ARE 754.528 AgR, Primeira Turma, DJe 28/8/2013; e AI 769.433 AgR, Segunda Turma, DJe 4/2/2010; precedentes citados do STJ: REsp 1.302.206-MG, Segunda Turma, DJe 4/10/2013; EDcl no AgRg no REsp 1.099.909-RS, Quinta Turma, DJe 13/3/2013 e AgRg no RMS 28.825-AC, Sexta Turma, DJe 21/3/2012. AgRg no RMS 39.580-PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 11/2/2014.
Em desapropriação para fins de reforma agrária, é possível a incidência de juros e de correção monetária, com a inclusão dos expurgos inflacionários, no cálculo de complementação de título da dívida agrária (TDA). Precedente citado: REsp 1.321.842-PE, Segunda Turma, DJe 24/10/2013. AgRg no REsp 1.293.895-MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 11/2/2014.
Não é ilegal a nova incidência de IPI no momento da saída de produto de procedência estrangeira do estabelecimento do importador, após a incidência anterior do tributo no desembaraço aduaneiro. Seja pela combinação dos arts. 46, II e 51, parágrafo único, do CTN - que compõem o fato gerador do referido imposto -, seja pela combinação dos arts. 51, II, do CTN, 4º, I, da Lei 4.502/1964, 79 da MP 2.158-35/2001 e 13 da Lei 11.281/2006 - que definem a sujeição passiva -, os produtos importados estão sujeitos a uma nova incidência do IPI quando de sua saída do estabelecimento importador na operação de revenda. Essa interpretação não ocasiona a ocorrência de bis in idem, dupla tributação ou bitributação, pois a lei elenca dois fatos geradores distintos: o desembaraço aduaneiro proveniente da operação de compra do produto industrializado do exterior e a saída do produto industrializado do estabelecimento importador equiparado a estabelecimento produtor, isto é, a primeira tributação recai sobre o preço da compra, na qual já está embutida a margem de lucro da empresa estrangeira, e a segunda tributação recai sobre o preço da venda, na qual já está embutida a margem de lucro da empresa brasileira importadora. Além disso, a nova incidência do IPI não onera a cadeia além do razoável, pois o importador, na primeira operação, apenas acumula a condição de contribuinte de fato e de direito em razão da territorialidade, já que o estabelecimento industrial produtor estrangeiro não pode ser eleito pela lei nacional brasileira como contribuinte de direito do IPI - os limites da soberania tributária o impedem -, e a empresa importadora nacional brasileira acumula o crédito do imposto a ser pago na saída do produto como contribuinte de direito - não-cumulatividade -, mantendo-se a tributação apenas sobre o valor agregado. Precedentes citados: REsp 1.386.686-SC, Segunda Turma, DJe 24/10/2013 e REsp 1.385.952-SC, Segunda Turma, DJe 11/9/2013. REsp 1.429.656-PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, julgado em 11/2/2014.
É admitida a realização de exame psicotécnico em concursos públicos se forem atendidos os seguintes requisitos: previsão em lei, previsão no edital com a devida publicidade dos critérios objetivos fixados e possibilidade de recurso. Precedentes citados do STF: MS 30.822-DF, Segunda Turma, DJe 26/6/2012; e AgRg no RE 612.821-DF, Segunda Turma, DJe 1º/6/2011. RMS 43.416-AC, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 18/2/2014.
O direito de preferência em razão da idade no pagamento de precatórios, previsto no art. 100, § 2º, da CF, não pode ser estendido aos sucessores do titular originário do precatório, ainda que também sejam idosos. De fato, os dispositivos constitucionais introduzidos pela EC 62/2009 mencionam que o direito de preferência será outorgado aos titulares que tenham 60 anos de idade ou mais na data de expedição do precatório (art. 100, § 2º, da CF) e aos titulares originais de precatórios que tenham completado 60 anos de idade até a data da referida emenda (art. 97, § 18, do ADCT). Além disso, esse direito de preferência é personalíssimo, conforme previsto no art. 10, § 2º, da Resolução 115/2010 do CNJ. RMS 44.836-MG, Rel. Ministro Humberto Martins, julgado em 20/2/2014.
Prescreve em 1 ano a pretensão de sociedade seguradora em face de ressegurador baseada em contrato de resseguro. O CC prevê que, para qualquer pretensão decorrente do contrato de seguro privado, o prazo de prescrição é de 1 ano. No STJ, há muito já se firmou jurisprudência quanto à prescrição ânua da pretensão do segurado contra a seguradora. Nisso se inclui o seguro do segurador, isto é, o resseguro. A qualificação jurídica do resseguro como um contrato de seguro decorre do fato de o ressegurador obrigar-se, mediante o pagamento de um prêmio, a proteger o patrimônio da “cedente” do risco consistente na responsabilidade desta perante seu segurado, presentes, portanto, as características principais da relação securitária: interesse, risco, importância segurada e prêmio. Embora a LC 126/2007 aparentemente confunda o contrato de resseguro com a figura da cessão disciplinada no CC, é evidente que, à diferença da cessão de posição jurídica, no contrato de resseguro a assim chamada “cedente”, ou seja, a sociedade seguradora ressegurada, em regra, não se retira, mas antes permanece na relação jurídica, não havendo sub-rogação pelo cessionário nas obrigações da cedente. Nesse sentido, a maior parte da doutrina sustenta que o contrato de resseguro insere-se, de modo geral, no tipo securitário. Desde o Decreto-Lei 73/1966, o resseguro, o cosseguro e a retrocessão já eram partes integrantes da operação de seguro. Em reforço a isso, o art. 5º da LC 126/2007 manda aplicar “aos resseguradores locais, observadas as peculiaridades técnicas, contratuais, operacionais e de risco da atividade e as disposições do órgão regulador de seguros: (I) o Decreto-Lei 73, de 21 de novembro de 1966, e as demais leis aplicáveis às sociedades seguradoras, inclusive as que se referem à intervenção e liquidação de empresas, mandato e responsabilidade de administradores; e (II) as regras estabelecidas para as sociedades seguradoras”. É de se concluir que, apesar de formalmente acessório e autônomo, o resseguro é um verdadeiro contrato de seguro atípico. REsp 1.170.057-MG, Rel. Min. Villas Bôas Cueva, julgado em 17/12/2013.
O processo deve ser extinto com resolução de mérito – e não sem resolução de mérito, por falta de interesse processual - caso o autor de ação de reintegração de posse não comprove ter possuído a área em litígio. De fato, a condição da ação denominada interesse processual, ou interesse de agir, surge da necessidade de se obter, por meio de um provimento jurisdicional, a proteção a determinado interesse substancial. Situa-se, portanto, na necessidade do processo e na adequação do remédio processual eleito para o fim pretendido. Dessa forma, se houver alegação de posse anterior e de esbulho, acompanhadas de suas delimitações temporais, a ação de reintegração de posse torna-se a via adequada e necessária para a retomada do imóvel, não havendo falar, portanto, em ausência de interesse de agir. Situação diversa ocorre se intentada a ação de reintegração de posse por quem declaradamente nunca exerceu a posse sobre o bem pretendido. Nessa hipótese, será manifestamente incabível a possessória que tem como pressuposto básico a alegação de posse anterior. Conclui-se, portanto, que o fato de o autor, na fase instrutória, não se desincumbir do ônus de provar a posse alegada - fato constitutivo do seu direito - só pode levar à extinção do processo com resolução de mérito. Há de se ressaltar, a propósito, que o elenco do art. 927 do CPC, em seus quatro incisos, demarca o objeto da prova a ser feita de plano a fim de obter o provimento liminar, dentre eles a comprovação da posse. Nada impede, contudo, que, sendo insuficiente a prova trazida com a inicial, ela seja feita ao longo do processo, em audiência de justificação prévia de que trata o art. 928 do CPC, ou, posteriormente, na fase instrutória própria, de modo a alcançar o juízo de procedência da ação. Colaciona-se, em reforço, julgado da Terceira Turma que, julgando a causa sob o prisma da teoria da asserção, concluiu que "se o juiz realizar cognição profunda sobre as alegações contidas na petição, após esgotados os meios probatórios, terá, na verdade, proferido juízo sobre o mérito da questão". (REsp 1.125.128/RJ, DJe 18/9/2012). REsp 930.336-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 6/2/2014.
As medidas protetivas de urgência da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) podem ser aplicadas em ação cautelar cível satisfativa, independentemente da existência de inquérito policial ou processo criminal contra o suposto agressor. O primeiro dado a ser considerado para compreensão da exata posição assumida pela Lei Maria da Penha no ordenamento jurídico pátrio é observar que o mencionado diploma veio com o objetivo de ampliar os mecanismos jurídicos e estatais de proteção da mulher. Por outra ótica de análise acerca da incidência dessa lei, mostra-se sintomático o fato de que a Convenção de Belém do Pará – no que foi seguida pela norma doméstica de 2006 – preocupou-se sobremaneira com a especial proteção da mulher submetida a violência, mas não somente pelo viés da punição penal do agressor, mas também pelo ângulo da prevenção por instrumentos de qualquer natureza, civil ou administrativa. Ora, parece claro que o intento de prevenção da violência doméstica contra a mulher pode ser perseguido com medidas judiciais de natureza não criminal, mesmo porque a resposta penal estatal só é desencadeada depois que, concretamente, o ilícito penal é cometido, muitas vezes com consequências irreversíveis, como no caso de homicídio ou de lesões corporais graves ou gravíssimas. Na verdade, a Lei Maria da Penha, ao definir violência doméstica contra a mulher e suas diversas formas, enumera, exemplificativamente, espécies de danos que nem sempre se acomodam na categoria de bem jurídico tutelável pelo direito penal, como o sofrimento psicológico, o dano moral, a diminuição da autoestima, a manipulação, a vigilância constante, a retenção de objetos pessoais, entre outras formas de violência. Ademais, fica clara a inexistência de exclusividade de aplicação penal da Lei Maria da Penha quando a própria lei busca a incidência de outros diplomas para a realização de seus propósitos, como no art. 22, § 4º, a autorização de aplicação do art. 461, §§ 5º e 6º, do CPC; ou no art. 13, ao afirmar que "ao processo, ao julgamento e à execução das causas cíveis e criminais [...] aplicar-se-ão as normas dos Códigos de Processo Penal e Processo Civil e da legislação específica relativa à criança, ao adolescente e ao idoso que não conflitem com o estabelecido nesta Lei". Analisada de outra forma a controvérsia, se é certo que a Lei Maria da Penha permite a incidência do art. 461, § 5º, do CPC para a concretização das medidas protetivas nela previstas, não é menos verdade que, como pacificamente reconhecido pela doutrina, o mencionado dispositivo do diploma processual não estabelece rol exauriente de medidas de apoio, o que permite, de forma recíproca e observados os específicos requisitos, a aplicação das medidas previstas na Lei Maria da Penha no âmbito do processo civil. REsp 1.419.421-GO, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 11/2/2014.
Não cabe a denunciação da lide prevista no art. 70, III, do CPC quando demandar a análise de fato diverso dos envolvidos na ação principal. Conforme entendimento doutrinário e da jurisprudência do STJ, não é admissível a denunciação da lide embasada no art. 70, III, do CPC quando introduzir fundamento novo à causa, estranho ao processo principal, apto a provocar uma lide paralela, a exigir ampla dilação probatória, o que tumultuaria a lide originária, indo de encontro aos princípios da celeridade e economia processuais, que essa modalidade de intervenção de terceiros busca atender. Precedentes citados: EREsp 681.881/SP, Corte Especial, DJe 7/11/2011; AgRg no REsp 1.330.926/MA, Quarta Turma, DJe 21/11/2013; AgRg no Ag 1.213.458/MG, Segunda Turma, DJe 30/9/2010; REsp, 1.164.229/RJ, Terceira Turma, DJe 1º/9/2010. REsp 701.868-PR, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 11/2/2014.
A faturizadora tem direito de regresso contra a faturizada que, por contrato de factoring vinculado a nota promissória, tenha cedido duplicatas sem causa subjacente. Por um lado, a doutrina é praticamente unânime no sentido de que a faturizadora não tem direito de regresso contra a faturizada com base no inadimplemento dos títulos transferidos, haja vista que esse risco é da essência do contrato de factoring e por ele a faturizada paga preço até mais elevado do que pagaria, por exemplo, em um contrato de desconto bancário, no qual a instituição financeira não garante a solvência dos títulos descontados. Por outro lado, essa circunstância, não tem o alcance de afastar toda e qualquer responsabilidade da cedente em relação à existência do crédito, haja vista que tal garantia é própria da cessão de crédito comum – pro soluto. É por isso que a doutrina, de forma uníssona, afirma que no contrato de factoring e na cessão de crédito ordinária a faturizada/cedente não garante a solvência do crédito, mas a sua existência sim. Cuida-se, na verdade, de expressa disposição legal, nos termos do que dispõem os arts. 295 e 296 do CC. Nesse passo, o direito de regresso da faturizadora contra a faturizada deve ser garantido quando estiver em questão não um mero inadimplemento, mas a própria existência do crédito. Não reconhecer tal responsabilidade quando o cedente vende crédito inexistente ou ilegítimo representa compactuar com a fraude e a má-fé. É bem verdade que há precedentes do STJ que não permitiram o regresso da faturizadora, em situações que, aparentemente, diziam respeito a duplicatas frias. Em todas essas hipóteses, porém, inexiste nota promissória emitida como garantia do negócio jurídico relacionado ao factoring, o que diferencia os julgados do caso em exame. Por sua vez, em reforço à tese ora adotada, há outros precedentes que permitiram, inclusive, o pedido de falência com base em nota promissória recebida como garantia de duplicatas apontadas como frias endossadas a sociedades de factoring. REsp 1.289.995-PE, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 20/2/2014.
Ainda que a união estável esteja formalizada por meio de escritura pública, é válida a fiança prestada por um dos conviventes sem a autorização do outro. Isso porque o entendimento de que a “fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia” (Súmula 332 do STJ), conquanto seja aplicável ao casamento, não tem aplicabilidade em relação à união estável. De fato, o casamento representa, por um lado, uma entidade familiar protegida pela CF e, por outro lado, um ato jurídico formal e solene do qual decorre uma relação jurídica com efeitos tipificados pelo ordenamento jurídico. A união estável, por sua vez, embora também represente uma entidade familiar amparada pela CF – uma vez que não há, sob o atual regime constitucional, famílias estigmatizadas como de "segunda classe" –, difere-se do casamento no tocante à concepção deste como um ato jurídico formal e solene. Aliás, nunca se afirmou a completa e inexorável coincidência entre os institutos da união estável e do casamento, mas apenas a inexistência de predileção constitucional ou de superioridade familiar do casamento em relação a outra espécie de entidade familiar. Sendo assim, apenas o casamento (e não a união estável) representa ato jurídico cartorário e solene que gera presunção de publicidade do estado civil dos contratantes, atributo que parece ser a forma de assegurar a terceiros interessados ciência quanto a regime de bens, estatuto pessoa, patrimônio sucessório, etc. Nesse contexto, como a outorga uxória para a prestação de fiança demanda absoluta certeza por parte dos interessados quanto à disciplina dos bens vigente, e como essa segurança só é obtida por meio de ato solene e público (como no caso do casamento), deve-se concluir que o entendimento presente na Súmula 332 do STJ – segundo a qual a “fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia” –, conquanto seja aplicável ao casamento, não tem aplicabilidade em relação à união estável. Além disso, essa conclusão não é afastada diante da celebração de escritura pública entre os consortes, haja vista que a escritura pública serve apenas como prova relativa de uma união fática, que não se sabe ao certo quando começa nem quando termina, não sendo ela própria o ato constitutivo da união estável. Ademais, por não alterar o estado civil dos conviventes, para que dela o contratante tivesse conhecimento, ele teria que percorrer todos os cartórios de notas do Brasil, o que seria inviável e inexigível. REsp 1.299.866-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25/2/2014.
No procedimento do tribunal do júri, o juiz pode, na fase do art. 415 do CPP, efetivar a absolvição imprópria do acusado inimputável, na hipótese em que, além da tese de inimputabilidade, a defesa apenas sustente por meio de alegações genéricas que não há nos autos comprovação da culpabilidade e do dolo do réu, sem qualquer exposição dos fundamentos que sustentariam esta tese. De fato, no que diz respeito à pretensão de submissão do réu a julgamento pelo Tribunal do Júri, é imperioso consignar que no procedimento dos delitos dolosos contra a vida, se a inimputabilidade não é a única tese sustentada pela defesa, que apresenta outros fundamentos aptos a afastar a responsabilização penal do acusado, deve o magistrado pronunciá-lo, pois pode ser inocentado sem que lhe seja imposta medida de segurança. Esse entendimento, aliás, levou o legislador ordinário a incluir, na reforma pontual realizada no CPP com o advento da Lei 11.689/2008, o parágrafo único no art. 415, estabelecendo que o juiz poderá absolver desde logo o acusado pela prática de crime doloso contra a vida se restar demonstrada a sua inimputabilidade, salvo se esta não for a única tese defensiva. Nesse contexto, a simples menção genérica de que não haveria nos autos comprovação da culpabilidade e do dolo do réu, sem qualquer exposição dos fundamentos que sustentariam a tese defensiva, não é apta a caracterizar ofensa ao referido entendimento jurisprudencial e à citada inovação legislativa. Precedente citado: HC 73.201-DF, Sexta Turma, DJe 17/8/2009. REsp 39.920-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 6/2/2014.
A prescrição da medida de segurança imposta em sentença absolutória imprópria é regulada pela pena máxima abstratamente prevista para o delito. O CP não cuida expressamente da prescrição de medida de segurança, mas essa é considerada uma espécie do gênero sanção penal. Assim considerada, sujeita-se às regras previstas no CP relativas aos prazos prescricionais e às diversas causas interruptivas da prescrição. O STF já se manifestou nesse sentido ao entender que incide o instituto da prescrição na medida de segurança, estipulando que “é espécie do gênero sanção penal e se sujeita, por isso mesmo, à regra contida no artigo 109 do Código Penal” (RHC 86.888-SP, Primeira Turma, DJ de 2/12/2005). Esta Corte Superior, por sua vez, já enfrentou a questão, também considerando a medida de segurança como espécie de sanção penal e, portanto, igualmente sujeita à prescrição e suas regras, assentando, ainda, que o lapso temporal necessário à verificação da referida causa de extinção da punibilidade deve ser encontrado tendo como referência a pena máxima abstratamente prevista para o delito. REsp 39.920-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 6/2/2014.
O fato de estrangeiro estar em situação irregular no país, por si só, não é motivo suficiente para inviabilizar os benefícios da execução penal. Isso porque a condição humana da pessoa estrangeira submetida a pena no Brasil é protegida constitucionalmente e no âmbito dos direitos humanos. Com efeito, esses são aplicáveis não só às relações internacionais, mas a todo o ordenamento jurídico interno, principalmente às normas de direito penal e processual penal, por incorporarem princípios que definem os direitos e garantias fundamentais. HC 274.249-SP, Rel. Min. Marilza Maynard (Desembargadora convocada do TJ-SE), julgado em 4/2/2014.
É irrelevante a existência de decreto de expulsão em desfavor do estrangeiro na análise de pedido de progressão de regime de cumprimento da pena. Isso porque o art. 67 da Lei 6.815/1980 determina que, conforme o interesse nacional, a expulsão poderá ocorrer antes ou depois do cumprimento da sentença. Precedentes citados: AgRg no HC 260.768-SP, Sexta Turma, DJe 5/4/2013, e HC 186.490-RJ, Sexta Turma, DJe 13/2/2012. HC 274.249-SP, Rel. Min. Marilza Maynard (Desembargadora convocada do TJ-SE), julgado em 4/2/2014.
Os dados obtidos pela Receita Federal com fundamento no art. 6º da LC 105/2001, mediante requisição direta às instituições bancárias no âmbito de processo administrativo fiscal sem prévia autorização judicial, não podem ser utilizados no processo penal, sobretudo para dar base à ação penal. Há de se ressaltar que não está em debate a questão referente à possibilidade do fornecimento de informações bancárias, para fins de constituição de créditos tributários, pelas instituições financeiras ao Fisco sem autorização judicial – tema cuja repercussão geral foi reconhecida no RE 601.314-SP, pendente de apreciação. Discute-se se essas informações podem servir de base à ação penal. Nesse contexto, reafirma-se, conforme já decidido pela Sexta Turma do STJ, que as informações obtidas pelo Fisco, quando enviadas ao MP para fins penais, configuram inadmissível quebra de sigilo bancário sem prévia autorização judicial. Não cabe à Receita Federal, órgão interessado no processo administrativo e sem competência constitucional específica, requisitar diretamente às instituições bancárias a quebra do sigilo bancário. Pleito nesse sentido deve ser necessariamente submetido à avaliação do magistrado competente, a quem cabe motivar concretamente sua decisão, em observância aos arts. 5º, XII e 93, IX, da CF. Precedentes citados: HC 237.057-RJ, Sexta Turma, DJe 27/2/2013; REsp 1.201.442-RJ, Sexta Turma, DJe 22/8/2013; AgRg no REsp 1.402.649-BA, Sexta Turma, DJe 18/11/2013. RHC 41.532-PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 11/02/2014.
Para a concessão de livramento condicional, a avaliação da satisfatoriedade do comportamento do executado não pode ser limitada a um período absoluto e curto de tempo. Embora não se possa inviabilizar a concessão do livramento condicional apenas porque durante a execução penal o condenado cometeu uma falta grave, o comportamento de um recluso do sistema penitenciário há de ser aferido em sua inteireza, por todo o período em que esteve cumprindo sua pena. Cingir o “comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena”, conforme demanda o art. 83, III, do CP, apenas a um curto período de tempo que anteceda a análise do pedido implica dispensar o magistrado – especialmente o que está em permanente contato com a realidade dos presídios – de usar seu tirocínio, sua experiência e as informações de que dispõe nos autos para avaliar o merecimento do benefício pretendido pelo interno. O poder discricionário do juízo da execução penal não pode ser restringido a ponto de transformar a avaliação subjetiva em um simples cálculo aritmético. REsp 1.325.182-DF, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgamento em 20/2/2014.
Na dosimetria da pena, os fatos posteriores ao crime em julgamento não podem ser utilizados como fundamento para valorar negativamente a culpabilidade, a personalidade e a conduta social do réu. Precedentes citados: HC 268.762-SC, Quinta Turma, DJe 29/10/2013 e HC 210.787-RJ, Quinta Turma, DJe 16/9/2013. HC 189.385-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/2/2014.
No julgamento dos crimes previstos na Lei 11.343/2006, é legítimo que o interrogatório do réu seja realizado antes da oitiva das testemunhas. Isso porque o regramento específico estabelecido no art. 57 da Lei 11.343/2006 prevalece sobre a regra geral do CPP. Precedentes citados do STJ: RHC 40.837-MG, Quinta Turma, DJe 11/12/2013 e HC 165.034-MG, Quinta Turma, DJe 9/10/2012. Precedente citado do STF: RHC 116.713-MG, Segunda Turma, DJe 24/6/2013. HC 245.752-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/2/2014.
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STJ - Superior Tribunal de Justiça. Informativo 535 do STJ - 2014 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 mar 2014, 10:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/informativos dos tribunais/38675/informativo-535-do-stj-2014. Acesso em: 23 nov 2024.
Por: STJ - Superior Tribunal de Justiça BRASIL
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