O termo inicial do prazo decadencial para a impetração de mandado de segurança no qual se discuta regra editalícia que tenha fundamentado eliminação em concurso público é a data em que o candidato toma ciência do ato administrativo que determina sua exclusão do certame, e não a da publicação do edital. Precedente citado: EREsp 1.266.278-MS, Corte Especial, DJe 10/5/2013. REsp 1.124.254-PI, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 1º/7/2014.
Compete ao STJ julgar pedido de Intervenção Federal baseado no descumprimento de ordem de reintegração de posse de imóvel rural ocupado pelo MST expedida por Juiz Estadual e fundada exclusivamente na aplicação da legislação infraconstitucional civil possessória. De acordo com o inciso I do art. 312 do RISTJ – dispositivo calcado no art. 19, I, da Lei 8.038/1990 –, cabe ao STJ processar e decidir sobre Intervenção Federal, “quando se tratar de prover a execução de ordem ou decisão judicial, com ressalva, conforme a matéria, da competência do Supremo Tribunal federal ou do Tribunal Superior Eleitoral (Constituição art. 34, VI e 36, II)”. Dessa forma, cumpre inicialmente verificar se é ao STJ que cabe, “conforme a matéria”, processar o pedido de Intervenção Federal – já que ao STF caberá apreciar a Intervenção Federal quando em destaque sentença ou acórdão da Justiça do Trabalho (STF, IF 230-3-DF, Tribunal Pleno, DJ 1º/7/1996) ou de sua própria decisão ou em matéria estritamente constitucional (art. 19, I, Lei 8.038/1990). Conforme o STF, caberá ao STJ o exame da Intervenção Federal quando “envolvida matéria legal” ou quando “a decisão exequenda, concessiva de medida liminar em ação de reintegração de posse do imóvel, somente enfrenta questões federais infraconstitucionais, [...]. O julgamento de eventual recurso para o Tribunal de Justiça ensejaria, em tese, recurso para o Superior Tribunal de Justiça (art. 105, III da Constituição Federal). E não recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal (art. 105, III)” (STF, IF-QO 107-DF, Tribunal Pleno, DJ 4/9/1992). Desse modo, combinados os arts. 34, VI, e 36, II, da CF, o STF assentou que caberá ao STJ o exame da Intervenção Federal nos casos em que a matéria é infraconstitucional e o possível recurso deva ser encaminhado ao STJ. Na situação em análise, a lide envolve tema de direito civil privado, mas também de direito público, quiçá constitucional. Nada obstante, a solução dada pela decisão resume-se de maneira exclusiva à aplicação da legislação infraconstitucional. Assim, como a ordem, em tese, transgredida não afronta diretiva administrativa de origem ou natureza constitucional, a competência para apreciação da requisição de Intervenção Federal é do STJ. IF 111-PR, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado em 1º/7/2014.
Pode ser indeferido pedido de intervenção federal fundado no descumprimento de ordem judicial que tenha requisitado força policial para promover reintegração de posse em imóvel rural produtivo ocupado pelo MST caso, passados vários anos desde que prolatada a decisão transgredida, verifique-se que a remoção das diversas famílias que vivem no local irá, dada a inexistência de lugar para acomodar de imediato as pessoas de forma digna, causar estado de conflito social contrastante com a própria justificação institucional da medida de intervenção. Tecnicamente a recusa em fornecer força policial para a desocupação ordenada pelo Poder Judiciário caracteriza a situação prevista no art. 36, II, da CF, pois há desobediência à ordem “judiciária”, o que justificaria a intervenção (art. 34, VI) para “prover a execução da ordem ou decisão judicial”. Entretanto, a situação em análise – que envolve pedido de remoção, após corridos vários anos, de diversas famílias sem destino ou local de acomodação digna – revela quadro de inviável atuação judicial, assim como não recomenda a intervenção federal para compelir a autoridade administrativa a praticar ato do qual vai resultar conflito social muito maior que o suposto prejuízo do particular. Mesmo presente a finalidade de garantia da autoridade da decisão judicial, a intervenção federal postulada perde a intensidade de sua razão constitucional ao gerar ambiente de insegurança e intranquilidade em contraste com os fins da atividade jurisdicional, que se caracteriza pela formulação de juízos voltados à paz social e à proteção de direitos. Com efeito, pelo princípio da proporcionalidade, não deve o Poder Judiciário promover medidas que causem coerção ou sofrimento maior que sua justificação institucional e, assim, a recusa pelo Estado não é ilícita. Cabe registrar que se cuida de caso de afetação por interesse público que se submete ao regime próprio dessa modalidade jurisprudencial de perda e aquisição da propriedade, que se resolverá em reparação a ser buscada via ação de indenização (desapropriação indireta) promovida pelo interessado. Portanto, revela-se defensável o afastamento da necessidade de intervenção federal contra o Estado e, ao contrário, parece manifestar-se evidente a hipótese de perda da propriedade por ato lícito da administração, não remanescendo outra alternativa que respeitar a ocupação dos ora possuidores como corolário dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, de construção de sociedade livre, justa e solidária com direito à reforma agrária e acesso à terra e com erradicação da pobreza, marginalização e desigualdade social. IF 111-PR, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado em 1º/7/2014 (vide Informativo n. 401).
Em relação ao acidente ocorrido no Município de Miraí-MG, em janeiro de 2007, quando a empresa de Mineração Rio Pomba Cataguases Ltda., durante o desenvolvimento de sua atividade empresarial, deixou vazar cerca de 2 bilhões de litros de resíduos de lama tóxica (bauxita), material que atingiu quilômetros de extensão e se espalhou por cidades dos Estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, deixando inúmeras famílias desabrigadas e sem seus bens (móveis e imóveis): a) a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para afastar a sua obrigação de indenizar; b) em decorrência do acidente, a empresa deve recompor os danos materiais e morais causados; e c) na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito caso a caso e com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico dos autores, e, ainda, ao porte da empresa recorrida, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de modo a que, de um lado, não haja enriquecimento sem causa de quem recebe a indenização e, de outro lado, haja efetiva compensação pelos danos morais experimentados por aquele que fora lesado. Com efeito, em relação aos danos ambientais, incide a teoria do risco integral, advindo daí o caráter objetivo da responsabilidade, com expressa previsão constitucional (art. 225, § 3º, da CF) e legal (art.14, § 1º, da Lei 6.938/1981), sendo, por conseguinte, descabida a alegação de excludentes de responsabilidade, bastando, para tanto, a ocorrência de resultado prejudicial ao homem e ao ambiente advinda de uma ação ou omissão do responsável (EDcl no REsp 1.346.430-PR, Quarta Turma, DJe 14/2/2013). Ressalte-se que a Lei 6.938/1981, em seu art. 4°, VII, dispõe que, dentre os objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente, está “a imposição ao poluidor e ao predador da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados”. Mas, para caracterização da obrigação de indenizar, é preciso, além da ilicitude da conduta, que exsurja do dano ao bem jurídico tutelado o efetivo prejuízo de cunho patrimonial ou moral, não sendo suficiente tão somente a prática de um fato contra legem ou contra jus, ou que contrarie o padrão jurídico das condutas. Assim, a ocorrência do dano moral não reside exatamente na simples ocorrência do ilícito em si, de sorte que nem todo ato desconforme com o ordenamento jurídico enseja indenização por dano moral. O importante é que o ato ilícito seja capaz de irradiar-se para a esfera da dignidade da pessoa, ofendendo-a de forma relativamente significante, sendo certo que determinadas ofensas geram dano moral in re ipsa. Na hipótese em foco, de acordo com prova delineada pelas instâncias ordinárias, constatou-se a existência de uma relação de causa e efeito, verdadeira ligação entre o rompimento da barragem com o vazamento de 2 bilhões de litros de dejetos de bauxita e o resultado danoso, caracterizando, assim, dano material e moral. REsp 1.374.284-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 27/8/2014.
Compete à Justiça Comum Estadual – e não à Justiça Eleitoral – processar e julgar injúria cometida no âmbito doméstico, desvinculada, direta ou indiretamente, de propaganda eleitoral, ainda que motivada por divergências políticas às vésperas de eleição. De fato, o crime previsto no art. 326 do Código Eleitoral possui nítida simetria com o crime de injúria previsto no art. 140 do CP, mas com este não se confunde, distinguindo-se, sobretudo, pelo acréscimo de elementares objetivas à figura típica, que acabou por resultar em relevante restrição à sua aplicação, refletindo, também por isso, na maior especialização do objeto jurídico tutelado. Para que se visualize a distinção entre ambos os delitos, convém que se reproduzam os textos legais: “Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:[...]” e “Art. 326. Injuriar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, ofendendo-lhe a dignidade ou o decôro:[...]”. Como se vê, a injúria eleitoral somente se perfectibiliza quando a ofensa ao decoro ou à dignidade ocorrer na propaganda eleitoral ou com fins de propaganda. Ou seja, a caracterização do crime de injúria previsto na legislação eleitoral exige, como elementar do tipo, que a ofensa seja perpetrada na propaganda eleitoral ou vise fins de propaganda (TSE, HC 187.635-MG, DJe de 16/2/2011), sob pena de incorrer-se no crime de injúria comum. Ademais, há de se ressaltar que, na injúria comum, tutela-se a honra subjetiva, sob o viés da dignidade ou decoro individual, e, na injúria eleitoral, protegem-se esses atributos ante o interesse social, que se extrai do direito subjetivo dos eleitores à lisura da competição eleitoral ou do “inafastável aprimoramento do Estado Democrático de Direito e o direito dos cidadãos de serem informados sobre os perfis dos candidatos, atendendo-se à política da transparência” (STF, Inq 1.884-RS, Tribunal Pleno, DJ 27/8/2004). CC 134.005-PR. Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 11/6/2014.
A legitimidade passiva em mandado de segurança impetrado contra o indeferimento, por autoridade fiscal integrante de estrutura administrativa estadual, de ingresso no Simples Nacional, em razão da existência de débitos do impetrante com a Fazenda Estadual sem exigibilidade suspensa, é da autoridade estadual – e não do Delegado da Receita Federal. O art. 16, § 6º, da LC 123/2006 dispõe que “O indeferimento da opção pelo Simples Nacional será formalizado mediante ato da Administração Tributária segundo regulamentação do Comitê Gestor”. O Comitê Gestor do Simples Nacional (CGSN), composto por representantes de todos os entes federados (art. 2º da LC 116/2003), por meio da Resolução 4, de 30 de maio de 2007, estabeleceu que o termo de indeferimento será expedido pela Administração Tributária do ente federado que indeferiu o ingresso no Simples Nacional, inclusive na hipótese da existência de débitos tributários (art. 8º, caput, da Resolução CGSN 4), regulamentação mantida no art. 14 da Resolução CGSN 94, de 29 de novembro de 2011. Constata-se, portanto, que o ato de indeferimento de ingresso no Simples Nacional pela existência de débitos com os fiscos federal, estaduais, municipais ou distrital é de responsabilidade da Administração Tributária do respectivo ente federado. Por conseguinte, incide o art. 41, § 5º, I, da LC 123/2006, que exclui “os mandados de segurança nos quais se impugnem atos de autoridade coatora pertencente a Estado, Distrito Federal ou Município” da regra contida no caput, segundo a qual os processos relativos a impostos e contribuições abrangidos pelo Simples Nacional serão ajuizados em face da União. REsp 1.319.118-RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 13/6/2014.
O parcelamento autorizado pela Lei 11.941/2009 implica que os débitos de origem previdenciária cobrados pela PGFN sejam consolidados com a redução da totalidade do valor relativo a honorários de sucumbência. Os benefícios fiscais previstos nos incisos do art. 1º, § 3º, da Lei 11.941/2009, quando mencionam a redução do “encargo legal”, estão se referindo ao encargo legal previsto no art. 1º do Decreto-Lei 1.025/1969. O referido encargo legal tem por objetivo atender a despesas referentes à arrecadação de verbas tributárias não pagas pelo contribuinte, abrangendo, inclusive, a verba sucumbencial. Com o regime da Lei 11.457/2007, houve a unificação de tratamento no que se refere aos débitos de contribuições previdenciárias e aos demais débitos tributários, tornando-se atribuição da Secretaria da Receita Federal do Brasil (além das competências atribuídas pela legislação vigente à Secretaria da Receita Federal) “planejar, executar, acompanhar e avaliar as atividades relativas a tributação, fiscalização, arrecadação, cobrança e recolhimento das contribuições sociais previstas nas alíneas ‘a’, ‘b’ e ‘c’ do parágrafo único do art. 11 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, e das contribuições instituídas a título de substituição” (art. 2º). Dessa forma, os chamados “honorários previdenciários” foram substituídos pelo encargo legal. Além disso, a Lei 11.941/2009 incluiu o art. 37-A na Lei 10.522/2002, o qual dispõe que “os créditos das autarquias e fundações públicas federais, de qualquer natureza, não pagos nos prazos previstos na legislação, serão acrescidos de juros e multa de mora, calculados nos termos e na forma da legislação aplicável aos tributos federais”, sendo que “os créditos inscritos em Dívida Ativa serão acrescidos de encargo legal, substitutivo da condenação do devedor em honorários advocatícios, calculado nos termos e na forma da legislação aplicável à Dívida Ativa da União” (§ 1º). A interpretação teleológica e sistemática da legislação, sobretudo da Lei 11.941/2009, impõe a conclusão de que a não inclusão dos chamados honorários previdenciários no valor consolidado nas hipóteses em que a lei exclui o encargo legal atende à finalidade buscada pelo legislador – incentivar a adesão ao programa de parcelamento fiscal. Não se trata de interpretação extensiva da legislação tributária, tampouco ampliação da lei que concede o parcelamento, mas do enquadramento adequado das verbas em confronto – encargo legal e honorários advocatícios. REsp 1.430.320-AL, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 21/8/2014.
Prescreve em cinco anos, nos termos do art. 1° do Decreto 20.910/1932, – e não em três anos como previsto no art. 206, § 3º, V, do CC – a pretensão da ANS de promover execução fiscal para reaver de operadora de plano de saúde os valores despendidos por instituição pública ou privada, conveniada ou contratada pelo SUS, pelos atendimentos efetuados em favor dos contratantes de plano de saúde e respectivos dependentes, quando os serviços prestados estejam previstos em contrato firmado entre a operadora de plano de saúde e seus filiados. Com efeito, o art. 32 da Lei 9.656/1998 estabelece que serão ressarcidos pelas operadoras de plano de saúde os valores despendidos por instituições públicas ou privadas, conveniadas ou contratadas pelo SUS, em razão da prestação de serviços de saúde previstos em contrato firmado entre a operadora de plano de saúde e seus filiados e respectivos dependentes. Já o § 5° do referido dispositivo legal preceitua que os valores devidos e não recolhidos pelas operadoras de plano de saúde devem ser inscritos na dívida ativa da ANS, a qual detém competência para cobrar judicialmente o débito. Desse modo, inscritos em dívida ativa, os valores não se qualificam mais como espécie de indenização civil, como se extrai do art. 39, § 2º, da Lei 4.320/1964. Esclareça-se que, embora o STJ tenha pacificado o entendimento de que a Lei 9.873/1999 só se aplica aos prazos de prescrição referentes à pretensão decorrente do exercício da ação punitiva da Administração Pública, há muito tempo esse Tribunal Superior firmou o entendimento de que a pretensão executória de créditos não tributários observa o prazo quinquenal do Decreto 20.910/1932 (REsp 1.284.645-RS, Segunda Turma, DJe 10/2/2012; e AgRg no REsp 941.671-RS, Primeira Turma, DJe 2/2/2010). Além do mais, a relação jurídica que há entre a ANS e as operadoras de planos de saúde é regida pelo Direito Administrativo, por isso inaplicável o prazo prescricional previsto no Código Civil. REsp 1.435.077-RS, Min. Rel. Humberto Martins, julgado em 19/8/2014.
É lícita a exigência de parecer favorável de Conselho Municipal de Saúde para o credenciamento de laboratório de propriedade particular no SUS. Cabe anotar que o SUS se expressa por meio de uma complexa organização estatal e social, na qual colaboram pessoas jurídicas de direito público e privadas. Entretanto, embora a integração de prestadores privados no SUS seja desejável e permitida mediante credenciamento, para tanto é necessário o atendimento de normas gerais de direito público, conforme previsto no art. 24, parágrafo único, da Lei 8.080/1990. Posto isso, cumpre salientar que, para garantir o seu próprio funcionamento concatenado, o sistema, desde os seus primórdios, possui uma lógica de permeabilidade para a participação social, que se expressa por meio de conselhos (art. 198, III, da CF e art. 7º, VIII, da Lei 8.080/1990). A Lei 8.143/1990, por sua vez, que regulamenta a participação da comunidade na gestão do SUS, prevê a atuação dos Conselhos de Saúde em cada esfera de governo, em especial no que se refere à formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde. Nesse contexto, observa-se que a exigência de parecer favorável de Conselho Municipal de Saúde, além de ser impessoal, tem embasamento na legislação pertinente e vigente. RMS 45.638-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 5/8/2014.
Deve ser afastada a impenhorabilidade do único imóvel pertencente à família na hipótese em que os devedores, com o objetivo de proteger o seu patrimônio, doem em fraude à execução o bem a seu filho menor impúbere após serem intimados para o cumprimento espontâneo da sentença exequenda. De início, cabe ressaltar que o STJ tem restringido a proteção ao bem de família com o objetivo de prevenir fraudes, evitando prestigiar a má-fé do devedor. Nesse sentido: “o bem que retorna ao patrimônio do devedor, por força de reconhecimento de fraude à execução, não goza da proteção da impenhorabilidade disposta na Lei nº 8.009/90” (AgRg no REsp 1.085.381-SP, Sexta Turma, DJe de 30/3/2009); “é possível, com fundamento em abuso de direito, afastar a proteção conferida pela Lei 8.009/90” (REsp 1.299.580-RJ, Terceira Turma, DJe de 25/10/2012). Nessa conjuntura, a doação feita a menor impúbere, nas circunstâncias ora em análise, além de configurar tentativa de fraude à execução, caracteriza abuso de direito apto a afastar a proteção dada pela Lei 8.009/1990. Com efeito, nenhuma norma, em nosso sistema jurídico, pode ser interpretada de modo apartado aos cânones da boa-fé. No que tange à aplicação das disposições jurídicas da Lei 8.009/1990, há uma ponderação de valores que se exige do Juiz, em cada situação particular: de um lado, o direito ao mínimo existencial do devedor ou sua família; de outro, o direito à tutela executiva do credor; ambos, frise-se, direitos fundamentais das partes. Trata-se de sopesar a impenhorabilidade do bem de família e a ocorrência de fraude de execução. Assim, é preciso considerar que, em regra, o devedor que aliena, gratuita ou onerosamente, o único imóvel, onde reside a família, está, ao mesmo tempo, dispondo da proteção da Lei 8.009/1990, na medida em que seu comportamento evidencia que o bem não lhe serve mais à moradia ou subsistência. Do contrário, estar-se-ia a admitir o venire contra factum proprium. REsp 1.364.509-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 10/6/2014.
Para garantir o pagamento de pensão mensal vitalícia decorrente de acidente de trabalho, admite-se a inclusão do nome do trabalhador acidentado na folha de pagamento de devedora idônea e detentora de considerável fortuna, dispensando-se a constituição de capital. Conforme a Súmula 313 do STJ, “Em ação de indenização, procedente o pedido, é necessária a constituição de capital ou caução fidejussória para a garantia de pagamento da pensão, independentemente da situação financeira do demandado”. De fato, a referida súmula, editada antes da entrada em vigor da Lei 11.232/2005 – que incluiu o art. 475-Q ao CPC –, continua sendo aplicada pelo STJ, evidenciando que a constituição de capital não deixou de ser obrigatória. Entretanto, é oportuno registrar que a jurisprudência passou a interpretar essa necessidade de constituição de capital de forma mais consentânea ao novo texto legal. Afinal, nos termos do art. 475-Q, § 2º, do CPC, “O juiz poderá substituir a constituição do capital pela inclusão do beneficiário da prestação em folha de pagamento de entidade de direito público ou de empresa de direito privado de notória capacidade econômica, ou, a requerimento do devedor, por fiança bancária ou garantia real, em valor a ser arbitrado de imediato pelo juiz”. Desse modo, a inclusão do beneficiário na folha de pagamentos mostra-se uma alternativa de garantia viável à constituição de capital, desde que, a critério do juiz, fique demonstrada a solvabilidade da empresa devedora. Assim, demonstrado que a empresa devedora é idônea e detentora de considerável fortuna, mostra-se razoável a substituição da constituição de capital pela inclusão do nome do trabalhador na folha de pagamentos da empresa. REsp 1.292.240-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 10/6/2014.
A viúva que vinha recebendo a totalidade da pensão por morte de seu marido não deve pagar ao filho posteriormente reconhecido em ação de investigação de paternidade a quota das parcelas auferidas antes da habilitação deste na autarquia previdenciária, ainda que a viúva, antes de iniciar o recebimento do benefício, já tivesse conhecimento da existência da ação de investigação de paternidade. De fato, a sentença declaratória de paternidade possui efeitos ex tunc, retroagindo à data de nascimento do investigante. Entretanto, tais efeitos não possuem caráter absoluto, encontrando um limite intransponível: o respeito às situações jurídicas definitivamente constituídas. A controvérsia envolve o princípio da irrepetibilidade das verbas previdenciárias pagas a maior, amplamente consagrado pela jurisprudência do STJ. Considerando que os valores recebidos a título de benefício previdenciário não se prestam, por natureza, a enriquecimento – e, menos ainda, ilícito –, mas sim à subsistência do segurado e de sua família, sendo manifesta a sua natureza alimentar, a jurisprudência somente excepciona sua irrepetibilidade quando o recebimento decorrer de má-fé. Ao tomar conhecimento da ação de investigação de paternidade, a viúva apenas obtém a notícia da possibilidade de haver outro beneficiário do direito previdenciário. Trata-se de mera possibilidade e nada mais do que isso, porquanto incerto o resultado da demanda, que poderia ser pela improcedência. Assim, não é razoável exigir da beneficiária, já devidamente habilitada nos termos da lei, que abrisse mão de sua pensão apenas por existir uma ação em curso que pudesse vir a reconhecer a existência de outro beneficiário. A configuração da má-fé requer a intenção maliciosa de causar lesão ou prejuízo a terceiro, o que não ocorre no caso. Note-se que o interessado poderia pleitear medida judicial no bojo da ação de investigação de paternidade para que lhe fosse assegurada a reserva de parte da pensão. Se assim não o fez, não se pode exigir de terceira pessoa (a viúva), que não era parte naquela ação investigativa, a adoção de providência voltada a assegurar efeito semelhante. Assim, a possibilidade de pagamento retroativo ao filho reconhecido judicialmente posteriormente ao óbito do instituidor do benefício não autoriza, por si só, que se exija de outros beneficiários anteriormente habilitados a devolução das verbas previdenciárias recebidas de boa-fé. REsp 990.549-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. para acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado em 5/6/2014.
Uma vez deferida a produção de prova pericial pelo magistrado – exame de DNA sobre os restos mortais daquele apontado como o suposto pai do autor da ação –, caso o laudo tenha sido inconclusivo, ante a inaptidão dos elementos materiais periciados, não pode o juiz indeferir o refazimento da perícia requerida por ambas as partes, quando posteriormente houver sido disponibilizado os requisitos necessários à realização da prova técnica – materiais biológicos dos descendentes ou colaterais do suposto pai –, em conformidade ao consignado pelo perito por ocasião da lavratura do primeiro laudo pericial. De fato, o resultado inconclusivo do laudo, ante a extensa degradação do material biológico em exame, com a ressalva de que o exame poderia ser realizável a partir de materiais coletados junto a descendentes ou colaterais do falecido, cria expectativa e confiança no jurisdicionado de que outro exame de DNA será realizado, em razão da segurança jurídica e da devida prestação jurisdicional. Isso porque o processo civil moderno vem reconhecendo, dentro da cláusula geral do devido processo legal, diversos outros princípios que o regem, como a boa-fé processual, efetividade, o contraditório, cooperação e a confiança, normativos que devem alcançar não só as partes, mas também a atuação do magistrado que deverá fazer parte do diálogo processual. Desse modo, deve o magistrado se manter coerente com sua conduta processual até o momento do requerimento, por ambas as partes, de nova perícia, pois, ao deferir a produção do primeiro exame de DNA, o magistrado acaba por reconhecer a pertinência da prova técnica, principalmente pela sua aptidão na formação do seu convencimento e na obtenção da solução mais justa. Ademais, pode-se falar na ocorrência de preclusão para o julgador que deferiu a realização do exame de DNA, porque conferiu aos demandantes, em razão de sua conduta, um direito à produção daquela prova em específico, garantido constitucionalmente (art. 5°, LV, da CF) e que não pode simplesmente ser desconsiderado. Portanto, uma vez deferida a produção da prova genética e sendo viável a obtenção de seu resultado por diversas formas, mais razoável seria que o magistrado deferisse a sua feitura sobre alguma outra vertente de reconstrução do DNA, e não simplesmente suprimi-la das partes pelo resultado inconclusivo da primeira tentativa, até porque “na fase atual da evolução do Direito de Família, não se justifica desprezar a produção da prova genética pelo DNA, que a ciência tem proclamado idônea e eficaz” (REsp 192.681-PR, Quarta Turma, DJ 24/03/2003). REsp 1.229.905-MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 5/8/2014.
Quando não houver, na sentença condenatória, definição do termo inicial para a contabilização dos juros moratórios decorrentes do inadimplemento de obrigação contratual, dever-se-á adotar na liquidação, como marco inicial, a citação válida do réu no processo de conhecimento. Preliminarmente, cumpre destacar que, apesar da omissão, os juros moratórios devem ser incluídos na liquidação, nos termos da Súmula 254 do STF. Nesse contexto, aplica-se o entendimento do STJ segundo o qual, na responsabilidade contratual, os juros moratórios devem ser aplicados a partir da citação inicial do réu, nos termos do art. 405 do CC (AgRg no REsp 142.807-DF, Quarta Turma, DJe 2/6/2014; e EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1.023.728-RS, Segunda Turma, DJe 17/5/2011). REsp 1.374.735-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 5/8/2014.
Suscitada a legítima defesa como única tese defensiva perante o Conselho de Sentença, caso mais de três jurados respondam afirmativamente ao terceiro quesito – “O jurado absolve o acusado?” –, o Juiz Presidente do Tribunal do Júri deve encerrar o julgamento e concluir pela absolvição do réu, não podendo submeter à votação quesito sobre eventual excesso doloso alegado pela acusação. Na atual sistemática do Tribunal do Júri, o CPP não prevê quesito específico sobre a legítima defesa. Após a Lei 11.689/2008, foram unificadas teses defensivas em um único quesito obrigatório (art. 483, inciso III, do CPP). Ao concentrar diversas teses absolutórias nesta questão – “O jurado absolve o acusado?” –, o legislador buscou impedir que os jurados fossem indagados sobre aspectos técnicos. Nessa perspectiva, declarada a absolvição pelo Conselho de Sentença, prosseguir no julgamento para verificar se houve excesso doloso constituiu constrangimento manifestamente ilegal ao direito ambulatorial do acusado. Caracteriza, ademais, ofensa à garantia da plenitude de defesa, pois o novo sistema permite justamente que o jurado possa absolver o réu baseado unicamente em sua livre convicção e de forma independente das teses defensivas. HC 190.264-PB, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 26/8/2014.
Compete à Justiça Militar processar e julgar estelionato cometido por militar mediante a emissão, em favor de entidade filantrópica, de cheque sem provisão de fundos com o fim de burlar obrigação de doar cestas básicas assumida por ocasião do recebimento de pena alternativa imposta em substituição a condenação proferida pela Justiça Militar. Ainda que, na hipótese, o delito não tenha sido praticado em serviço militar ou nos limites da administração militar, deve-se observar que o acusado procedeu em razão de sua função, pois, enquanto militar, cumpria as condições de pena alternativa imposta em substituição a condenação proferida pela Justiça Militar. Assim, as circunstâncias do caso se subsumem à hipótese descrita no art. 9º, II, "c", do CPM. De fato, é evidente que a conduta de tentar burlar a execução criminal militar, a despeito de também ter atingido interesse particular civil na situação em análise, revela inequívoca afronta e conspurcação da autoridade da sentença penal condenatória proferida pela Justiça Penal Militar, a qual, por isso, possui interesse direto e imediato de processar e julgar o crime subsequente. REsp 1.300.270-SC, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 19/8/2014.
O arbitramento judicial dos honorários advocatícios ao defensor dativo nomeado para oficiar em processos criminais deve observar os valores mínimos estabelecidos na tabela da OAB, considerados o grau de zelo do profissional e a dificuldade da causa como parâmetros norteadores do quantum. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.350.442-ES, Quinta Turma, DJe 1/2/2013; AgRg no REsp 999.078-AL, Sexta Turma, DJe 14/10/2013; e AgRg no REsp 1.370.209-ES, Segunda Turma, DJe 14/6/2013. REsp 1.377.798-ES, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 19/8/2014.
É nula a decisão que, sem fundamentação, determine o acesso a dados bancários, telefônicos e de empresas de transporte aéreo, ainda que as diligências tenham sido solicitadas com o objetivo de verificar o regular cumprimento de pena restritiva de direitos. De fato, é garantido ao cidadão o direito à intimidade e à vida privada, com a inviolabilidade do sigilo de seus dados, inclusive bancários e fiscal (art. 5º, X e XII, da CF; arts. 1º e 5º da Lei 9.296/1996; art. 1º, § 4º, e art. 2º da LC 105/2001; e art. 3º da Lei 9.472/1997). Embora não sejam absolutas as restrições de acesso à privacidade e aos dados pessoais do cidadão, é imprescindível que qualquer decisão judicial explicite os seus motivos (art. 93, IX, da CF), ainda que considerado o interesse público no acompanhamento da execução penal. REsp 1.133.877-PR, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 19/8/2014.
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STJ - Superior Tribunal de Justiça. Informativo 545 do STJ - 2014 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 14 set 2014, 06:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/informativos dos tribunais/40917/informativo-545-do-stj-2014. Acesso em: 23 nov 2024.
Por: STJ - Superior Tribunal de Justiça BRASIL
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