Brasília10 a 14 de agosto de 2015 - Nº 794.
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
ECA e competências da Justiça do Trabalho - 1
ECA e competências da Justiça do Trabalho -2
ADI e “vaquejada” - 1
ADI e “vaquejada” - 2
ADI e “vaquejada” - 3
Repercussão Geral
Obras emergenciais em presídios: reserva do possível e separação de poderes - 1
Obras emergenciais em presídios: reserva do possível e separação de poderes -2
Clipping do DJe
Transcrições
Saída temporária e decisão judicial (HC 128.763/RJ)
Outras Informações
ECA e competências da Justiça do Trabalho - 1
O Plenário iniciou julgamento de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada em face do inciso II da Recomendação Conjunta 1/2014 das Corregedorias dos Tribunais de Justiça e do Trabalho, e dos Ministérios Públicos estadual e do Trabalho, todos do Estado de São Paulo; do art. 1º, II, da Recomendação Conjunta 1/2014 dos Ministérios Públicos estadual e do Trabalho, e das Corregedorias do Tribunal de Justiça e do Trabalho, todos do Estado de Mato Grosso; do Ato do Gabinete da Presidência (GP) 19/2013 do TRT da 2ª Região; e, finalmente, do Provimento do Gabinete da Presidência (GP) 7/2014, também do referido TRT, formalizado em conjunto com a respectiva Corregedoria. As normas impugnadas, em suma, atribuem competência à Justiça do Trabalho para processar e apreciar pedidos de autorização visando a participação de crianças e adolescentes em eventos de natureza artística. O Ministro Marco Aurélio (relator) concedeu a cautelar pleiteada, no que foi acompanhado pelo Ministro Edson Fachin, para suspender a eficácia da expressão “inclusive artístico”, constante do inciso II da Recomendação Conjunta 1/14 e do art. 1º, II, da Recomendação Conjunta 1/14, bem como para afastar a atribuição, definida no Ato GP 19/2013 e no Provimento GP/CR 07/2014, quanto à apreciação de pedidos de alvará visando a participação de crianças e adolescentes em representações artísticas e a criação do juizado especial na Justiça do Trabalho, ficando suspensos, por consequência, esses últimos preceitos, assentada a competência da justiça comum para analisar os referidos pedidos. Preliminarmente, o relator julgou cabível a ação direta em comento. Afirmou que, não obstante o título de “recomendação”, mediante os dois primeiros atos, de caráter geral e abstrato, teria sido definida a atribuição de juízes trabalhistas acerca das aludidas autorizações. Visto que oriundas de corregedorias, os juízes haveriam de observá-las. Delimitara-se, portanto, com inegável caráter cogente e vinculativo, a competência da Justiça do Trabalho no tocante à matéria, que vinha sendo apreciada pela justiça estadual, particularmente, pelos Juízos da Infância e da Juventude. Esses atos, assim como aqueles por meio dos quais fora criado e disciplinado o Juízo da Infância e da Juventude no âmbito da Justiça especializada, teriam inovado no ordenamento jurídico, definindo-se atribuição judiciária com fundamento direto nos incisos I e IX do artigo 114 da CF. Cumpriram papel próprio de lei ordinária em sentido material, revelado, assim, o caráter primário e autônomo dos dispositivos atacados, sendo viável a ação direta. No mérito, reputar-se-ia presente a inconstitucionalidade formal e material das normas em questão. No que diz respeito à inconstitucionalidade formal, reputou tratar-se de normas a versar distribuição de competência jurisdicional e criação de juízo auxiliar da infância e da juventude no âmbito da Justiça do Trabalho, que não foram veiculados mediante lei ordinária. Do disposto nos artigos 22, I, 113 e 114, IX, da CF, depreender-se-ia estarem tais medidas sujeitas, inequivocamente, ao princípio da legalidade estrita. Uma vez editados os aludidos atos infralegais para fixar competência jurisdicional e criar órgão judicial, padeceriam de inconstitucionalidade formal.
ADI 5326 MC/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 12.8.2015. (ADI-5326)
ECA e competências da Justiça do Trabalho - 2
Relativamente à inconstitucionalidade material, o relator ressaltou que, concretizando o comando do artigo 227 da CF, o legislador ordinário, ao estabelecer o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), teria previsto a chamada “Justiça da Infância e da Juventude”. Teria estabelecido que o Juiz da Infância e da Juventude seria a autoridade judiciária responsável pelos processos de tutela integral dos menores, o qual, apesar da especialização, pertenceria à justiça comum. Tratar-se-ia de competência fixada em razão da matéria, de caráter absoluto, e estabelecida em proveito da especial tutela requerida pelo grupo de destinatários: crianças e adolescentes. Entre as atribuições definidas, destacar-se-ia a de autorizar a participação de menores em eventos artísticos, cuja possibilidade não fora excluída no ECA. Ao contrário, seria observada como importante aspecto do desenvolvimento dos menores, apenas condicionada, nos termos do art. 149, II, do Estatuto, à autorização judicial a ser implementada pelo Juízo da Infância e da Juventude, mediante a expedição de alvará específico. Os parâmetros a serem observados quando da autorização, na forma do § 1º do referido dispositivo, evidenciariam a inequívoca natureza cível da cognição desempenhada pelo juiz, ausente relação de trabalho a ser julgada. A análise seria acerca das condições da representação artística. O juiz deveria investigar se essas condições atenderiam à exigência de proteção do melhor interesse do menor, contida no art. 227 da CF. O Juízo da Infância e da Juventude seria a autoridade que reuniria os predicados e as capacidades institucionais necessárias para a realização de exame de tamanha relevância e responsabilidade. Assim, o art. 114, I e IX, da CF, na redação dada pela EC 45/2004, que estabelece a competência da Justiça do Trabalho, não alcançaria os casos de pedido de autorização para participação de crianças e adolescentes em eventos artísticos, ante a ausência de conflito atinente a relação de trabalho. Em seguida, pediu vista a Ministra Rosa Weber.
ADI 5326/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 12.8.2015. (ADI-5326)
ADI e “vaquejada” - 1
O Plenário iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada em face da Lei 15.299/2013 do Estado do Ceará, que regulamenta a atividade de “vaquejada”. O Ministro Marco Aurélio (relator) julgou procedente o pedido formulado na inicial. Explicou que a lei estadual citada regulamentara a prática da “vaquejada”, na qual dupla de vaqueiros, montados em cavalos distintos, buscaria derrubar um touro, puxando-o pelo rabo dentro de uma área demarcada. Observou que o requerente teria sustentado a exposição dos animais a maus-tratos e crueldade, enquanto o governador do Estado-Membro teria defendido a constitucionalidade da norma, por versar patrimônio cultural do povo nordestino. Afirmou, portanto, que haveria conflito de normas constitucionais sobre direitos fundamentais — de um lado, o art. 225, § 1º, VII, e, de outro, o art. o 215. Asseverou que o art. 225 consagraria a proteção da fauna e da flora como modo de assegurar o direito ao meio ambiente sadio e equilibrado. Cuidar-se-ia, portanto, de direito fundamental de terceira geração, fundado no valor solidariedade, de caráter coletivo ou difuso, dotado de altíssimo teor de humanismo e universalidade. A manutenção do ecossistema beneficiaria as gerações do presente e do futuro. O indivíduo seria considerado titular do direito e, ao mesmo tempo, destinatário dos deveres de proteção, daí por que encerraria verdadeiro “direito-dever” fundamental. Consignou que o STF, ao constatar o conflito entre normas de direitos fundamentais, ainda que presente a manifestação cultural, conferiria interpretação de forma mais favorável à proteção ao meio ambiente, especialmente quando verificada situação a implicar inequívoca crueldade contra animais. Tudo isso a demonstrar preocupação maior com a manutenção, em prol dos cidadãos de hoje e de amanhã, das condições ecologicamente equilibradas para uma vida mais saudável e segura.
ADI 4983/CE, rel. Min. Marco Aurélio, 12.8.2015. (ADI-4983)
ADI e “vaquejada” - 2
O relator aduziu que o autor teria juntado laudos técnicos que demonstrariam as consequências nocivas à saúde dos bovinos decorrentes da tração forçada no rabo, seguida da derrubada, como fraturas nas patas, ruptura de ligamentos e de vasos sanguíneos, traumatismos e deslocamento da articulação do rabo ou até o arrancamento deste, resultando no comprometimento da medula espinhal e dos nervos espinhais, dores físicas e sofrimento mental. Ante os dados empíricos evidenciados pelas pesquisas, seria indiscutível o tratamento cruel dispensado às espécies animais envolvidas, a implicar descompasso com o que preconizado no art. 225, § 1º, VII, da CF. A par de questões morais relacionadas ao entretenimento à custa do sofrimento dos animais, a crueldade intrínseca à “vaquejada” não permitiria a prevalência do valor cultural como resultado desejado pelo sistema de direitos fundamentais da Constituição. O sentido da expressão “crueldade” constante da parte final do inciso VII do § 1º do art. 225 da CF alcançaria, sem sombra de dúvida, a tortura e os maus-tratos infligidos aos bovinos durante a prática impugnada, de modo a tornar intolerável a conduta humana autorizada pela norma estadual atacada.
ADI 4983/CE, rel. Min. Marco Aurélio, 12.8.2015. (ADI-4983)
ADI e “vaquejada” - 3
O Ministro Edson Fachin divergiu do relator e julgou improcedente o pedido, no que foi acompanhado pelo Ministro Gilmar Mendes. Ressaltou que a situação dos autos precisa ser analisada sob olhar que alcançasse a realidade advinda da população rural. Seria preciso despir-se de eventual visão unilateral de uma sociedade eminentemente urbana. Ademais, a “vaquejada” seria manifestação cultural, como aliás reconhecida na própria petição inicial, e encontraria proteção constitucional expressa no “caput” do art. 215, e no § 1º, da CF. Não haveria, portanto, razão para se proibir o evento e a competição, que reproduziriam e avaliariam tecnicamente a atividade de captura própria de trabalho de vaqueiros e peões, desenvolvida na zona rural do País. Além disso, não haveria na petição inicial demonstração cabal que a eventual crueldade pudesse ser comparada com as constatadas no caso da “farra do boi” ou da “rinha de galos”, precedentes citados pelo relator. O Ministro Gilmar Mendes aludiu que a consequência de uma declaração de inconstitucionalidade, na espécie, seria levar a prática cultural à clandestinidade. Entendeu que a legislação careceria de alguma censura, de modo que sua execução necessitaria de um eventual aperfeiçoamento e medidas que pudessem reduzir as possibilidades de lesão aos animais. Registrou que, embora não se pudesse garantir que não haveria lesão ao animal, diferentemente do que ocorre na “farra do boi” em que se saberia, de início, que o objetivo seria matar o animal, o propósito, nesse caso, seria desportivo em sentido amplo. Em seguida, pediu vista o Ministro Roberto Barroso.
ADI 4983/CE, rel. Min. Marco Aurélio, 12.8.2015. (ADI-4983)
REPERCURSÃO GERAL
Obras emergenciais em presídios: reserva do possível e separação de poderes - 1
É lícito ao Poder Judiciário impor à Administração Pública obrigação de fazer, consistente na promoção de medidas ou na execução de obras emergenciais em estabelecimentos prisionais para dar efetividade ao postulado da dignidade da pessoa humana e assegurar aos detentos o respeito à sua integridade física e moral, nos termos do que preceitua o art. 5º, XLIX, da CF, não sendo oponível à decisão o argumento da reserva do possível nem o princípio da separação dos poderes. Essa a conclusão do Plenário, que proveu recurso extraordinário em que discutida a possibilidade de o Poder Judiciário determinar ao Poder Executivo estadual obrigação de fazer consistente na execução de obras em estabelecimentos prisionais, a fim de garantir a observância dos direitos fundamentais dos presos. O Colegiado assentou tratar-se, na espécie, de estabelecimento prisional cujas condições estruturais seriam efetivamente atentatórias à integridade física e moral dos detentos. Pontuou que a pena deveria ter caráter de ressocialização, e que impor ao condenado condições sub-humanas atentaria contra esse objetivo. Entretanto, o panorama nacional indicaria que o sistema carcerário como um todo estaria em quadro de total falência, tendo em vista a grande precariedade das instalações, bem assim episódios recorrentes de sevícias, torturas, execuções sumárias, revoltas, superlotação, condições precárias de higiene, entre outros problemas crônicos. Esse evidente caos institucional comprometeria a efetividade do sistema como instrumento de reabilitação social. Além disso, a questão afetaria também estabelecimentos destinados à internação de menores. O quadro revelaria desrespeito total ao postulado da dignidade da pessoa humana, em que haveria um processo de “coisificação” de presos, a indicar retrocesso relativamente à lógica jurídica atual. A sujeição de presos a penas a ultrapassar mera privação de liberdade prevista na lei e na sentença seria um ato ilegal do Estado, e retiraria da sanção qualquer potencial de ressocialização. A temática envolveria a violação de normas constitucionais, infraconstitucionais e internacionais. Dessa forma, caberia ao Judiciário intervir para que o conteúdo do sistema constitucional fosse assegurado a qualquer jurisdicionado, de acordo com o postulado da inafastabilidade da jurisdição. Os juízes seriam assegurados do poder geral de cautela mediante o qual lhes seria permitido conceder medidas atípicas, sempre que se mostrassem necessárias para assegurar a efetividade do direito buscado. No caso, os direitos fundamentais em discussão não seriam normas meramente programáticas, sequer se trataria de hipótese em que o Judiciário estaria ingressando indevidamente em campo reservado à Administração. Não haveria falar em indevida implementação de políticas públicas na seara carcerária, à luz da separação dos poderes. Ressalvou que não seria dado ao Judiciário intervir, de ofício, em todas as situações em que direitos fundamentais fossem ameaçados. Outrossim, não caberia ao magistrado agir sem que fosse provocado, transmudando-se em administrador público. O juiz só poderia intervir nas situações em que se evidenciasse um “não fazer” comissivo ou omissivo por parte das autoridades estatais que colocasse em risco, de maneira grave e iminente, os direitos dos jurisdicionados.
RE 592581/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 13.8.2015. (RE-592581)
Obras emergenciais em presídios: reserva do possível e separação de poderes - 2
O Ministro Edson Fachin ponderou que a cláusula da reserva do possível somente seria oponível se objetivamente verificado o justo motivo que tivesse sido suscitado pelo poder público para não realizar o mandamento constitucional. Seria preciso ponderar que o magistrado não deveria substituir o gestor público, mas poderia compeli-lo a cumprir o programa constitucional vinculante, mormente quando se tratasse de preservar a dignidade da pessoa humana. O Ministro Roberto Barroso aduziu que a judicialização não substituiria a política, mas haveria exceções, como no caso, em que se trataria de proteger os direitos de uma minoria sem direitos políticos, sem capacidade de vocalizar as próprias pretensões. Além disso, se cuidaria de um problema historicamente crônico de omissão do Executivo, e se o Estado se arrogasse do poder de privar essas pessoas de liberdade, deveria exercer o dever de proteção dessas pessoas. O Ministro Luiz Fux reforçou a ideia de que a intervenção judicial seria legítima se relacionada a obras de caráter emergencial, para proteger a integridade física e psíquica do preso. A Ministra Cármen Lúcia lembrou que determinadas políticas, como de melhoria do sistema penitenciário, seriam impopulares com o eleitorado, mas isso não justificaria o descumprimento reiterado de um mandamento constitucional. Ademais, não caberia falar em falta de recursos, tendo em vista a criação do Fundo Penitenciário, para suprir essa demanda específica. O Ministro Gilmar Mendes salientou que a questão não envolveria apenas direitos humanos, mas segurança pública. Presídios com condições adequadas permitiriam melhor policiamento, melhor monitoramento e dificultariam o crescimento de organizações criminosas nesses locais. Frisou que a lei contemplaria hipótese de o juiz da execução poder interditar estabelecimento penal que funcionasse em condições inadequadas ou ilegais, bem assim que caberia às corregedorias e ao Ministério Público zelar pelo correto funcionamento desses estabelecimentos. O Ministro Celso de Mello afirmou que a hipótese seria de excesso de execução — em que o Estado imporia ao condenado pena mais gravosa do que a prevista em lei —, portanto de comportamento estatal ao arrepio da lei.
RE 592581/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 13.8.2015. (RE-592581)
Sessões | Ordinárias | Extraordinárias | Julgamentos |
Pleno | 12.8.2015 | 13.8.2015 | 3 |
1ª Turma | — | — | — |
2ª Turma | — | — | — |
C L I P P I N G D O D J E
10 a 14 de agosto de 2015
AG. REG. NOS EMB. DIV. NOS EMB. DECL. NO AG. REG. NO ARE N. 845.201-RS
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – DESCUMPRIMENTO, PELA PARTE EMBARGANTE, DO DEVER PROCESSUAL DE PROCEDER AO CONFRONTO ANALÍTICO DETERMINADO NO ART. 331 DO RISTF – SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – COMPETÊNCIA NORMATIVA PRIMÁRIA (CF/69, ART. 119, § 3º, “c”) – POSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL, SOB A ÉGIDE DA CARTA FEDERAL DE 1969, DE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL DISPOR, EM SEDE REGIMENTAL, SOBRE NORMAS DE DIREITO PROCESSUAL – RECEPÇÃO, PELA CONSTITUIÇÃO DE 1988, DE TAIS PRECEITOS REGIMENTAIS COM FORÇA E EFICÁCIA DE LEI (RTJ 147/1010 – RTJ 151/278) – PLENA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO ART. 331 DO RISTF – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.
– A parte embargante, sob pena de recusa liminar de processamento dos embargos de divergência – ou de não conhecimento destes, quando já admitidos – deve demonstrar, de maneira objetiva, mediante análise comparativa entre o acórdão paradigma e a decisão embargada, a existência do alegado dissídio jurisprudencial, impondo-se-lhe reproduzir, na petição recursal, para efeito de caracterização do conflito interpretativo, os trechos que configurariam a divergência indicada, mencionando, ainda, as circunstâncias que identificariam ou que tornariam assemelhados os casos em confronto. Precedentes.
– O Supremo Tribunal Federal, sob a égide da Carta Política de 1969 (art. 119, § 3º, “c”), dispunha de competência normativa primária para, em sede meramente regimental, formular normas de direito processual concernentes ao processo e ao julgamento dos feitos de sua competência originária ou recursal. Com a superveniência da Constituição de 1988, operou-se a recepção de tais preceitos regimentais, que passaram a ostentar força e eficácia de norma legal (RTJ 147/1010 – RTJ 151/278), revestindo-se, por isso mesmo, de plena legitimidade constitucional a exigência de pertinente confronto analítico entre os acórdãos postos em cotejo (RISTF, art. 331).
REFERENDO EM MED. CAUT. EM ADPF N. 341-DF
RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO
Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO. ADPF. NOVAS REGRAS REFERENTES AO FUNDO DE FINANCIAMENTO AO ESTUDANTE DO ENSINO SUPERIOR - FIES. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO RETROATIVA. LIMINAR REFERENDADA.
1. O art. 3º da Portaria Normativa MEC nº 21/2014 alterou a redação do art. 19 da Portaria Normativa MEC nº 10/2010, passando a exigir média superior a 450 pontos e nota superior a zero nas redações do ENEM, como condição para a obtenção de financiamento de curso superior junto ao Fundo de Financiamento ao Estudante de Ensino Superior - FIES.
2. O art. 12 da Portaria Normativa MEC nº 21/2014 previu que as novas exigência entrariam em vigor apenas em 30.03.2015, muito embora as inscrições para o FIES tenham se iniciado em 23.02.2015, conforme Portaria Normativa nº 2/2015. Previu-se, portanto, uma norma de transição entre o antigo e o novo regime jurídico aplicável ao FIES, possibilitando-se que, durante o prazo da vacatio legis, os estudantes se inscrevessem no sistema com base nas normas antigas.
3. Plausibilidade jurídica da alegação de violação à segurança jurídica configurada pela possibilidade de ter ocorrido aplicação retroativa da norma nova, no que respeita aos estudantes que: (i) já dispunham de contratos celebrados com o FIES e pretendiam renová-los; (ii) requereram e não obtiveram sua inscrição no FIES, durante o prazo da vacatio legis, com base nas regras antigas. Perigo na demora configurado, tendo em vista o transcurso do prazo para renovação dos contratos, bem como em razão do avanço do semestre letivo.
4. Cautelar referendada para determinar a não aplicação da exigência de desempenho mínimo no ENEM em caso de: (i) renovações de contratos de financiamento; (ii) novas inscrições requeridas até 29.03.2015.
5. Indeferimento da cautelar no que respeita aos demais estudantes que requereram seu ingresso no FIES em 2015, após 29.03.2015, aos quais devem ser aplicadas as novas normas.
*noticiado no Informativo 787
EMB. DECL. NA ADI N. 3.106-MG
RELATOR: MIN. LUIZ FUX
EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGOS 79 e 85 DA LEI COMPLEMENTAR N. 64, DE 25 DE MARÇO DE 2002, DO ESTADO DE MINAS GERAIS. REDAÇÃO ALTERADA PELA LEI COMPLEMENTAR N. 70, DE 30 DE JULHO DE 2003. REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA PRIVADA E ASSITÊNCIA SOCIAL DOS SERVIDORES DO ESTADO DE MINAS GERAIS. APOSENTADORIA E BENEFÍCIOS ASSEGURADOS A SERVIDORES NÃO-TITULARES DE CARGO EFETIVO. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 40, §13, E 149, §1º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AÇÃO DIRETA JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE, DECLARANDO-SE INCONSTITUCIONAIS AS EXPRESSÕES “COMPULSORIAMENTE” e “DEFINIDOS NO ART. 79”. INEXISTÊNCIA DE “PERDA DE OBJETO” PELA REVOGAÇÃO DA NORMA OBJETO DE CONTROLE. PRETENSÃO DE MODULAÇÃO DE EFEITOS. PROCEDÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS PARCIALMENTE.
1. A revogação da norma objeto de controle abstrato de constitucionalidade não gera a perda superveniente do interesse de agir, devendo a Ação Direta de Inconstitucionalidade prosseguir para regular as relações jurídicas afetadas pela norma impugnada. Precedentes do STF: ADI nº 3.306, rel. Min. Gilmar Mendes, e ADI nº 3.232, rel. Min. Cezar Pelluso.
2. A modulação temporal das decisões em controle judicial de constitucionalidade decorre diretamente da Carta de 1988 ao consubstanciar instrumento voltado à acomodação otimizada entre o princípio da nulidade das leis inconstitucionais e outros valores constitucionais relevantes, notadamente a segurança jurídica e a proteção da confiança legítima, além de encontrar lastro também no plano infraconstitucional (Lei nº 9.868/99, art. 27). Precedentes do STF: ADI nº 2.240; ADI nº 2.501; ADI nº 2.904; ADI nº 2.907; ADI nº 3.022; ADI nº 3.315; ADI nº 3.316; ADI nº 3.430; ADI nº 3.458; ADI nº 3.489; ADI nº 3.660; ADI nº 3.682; ADI nº 3.689; ADI nº 3.819; ADI nº 4.001; ADI nº 4.009; ADI nº 4.029.
3. In casu, a concessão de efeitos retroativos à decisão do STF implicaria o dever de devolução por parte do Estado de Minas Gerais de contribuições recolhidas por duradouro período de tempo, além de desconsiderar que os serviços médicos, hospitalares, odontológicos, sociais e farmacêuticos foram colocados à disposição dos servidores estaduais para utilização imediata quando necessária.
4. Embargos de declaração acolhidos parcialmente para (i) rejeitar a alegação de contradição do acórdão embargado, uma vez que a revogação parcial do ato normativo impugnado na ação direta não prejudica o pedido original; (ii) conferir efeitos prospectivos (eficácia ex nunc) à declaração de inconstitucionalidade proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento de mérito da presente ação direta, fixando como marco temporal de início da sua vigência a data de conclusão daquele julgamento (14 de abril de 2010) e reconhecendo a impossibilidade de repetição das contribuições recolhidas junto aos servidores públicos do Estado de Minas Gerais até a referida data.
*noticiado no Informativo 786
AG. REG. NA AC N. 2.946-PI
RELATOR: MIN. LUIZ FUX
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO CAUTELAR. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. FINANCEIRO. INSCRIÇÃO DE ESTADO-MEMBRO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. ATOS DECORRENTES DE GESTÕES ANTERIORES. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INTRANSCENDÊNCIA SUBJETIVA DAS SANÇÕES. PRECEDENTES. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO COLEGIADO. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. O princípio da intranscendência subjetiva das sanções, consagrado pela Corte Suprema, inibe a aplicação de severas sanções às administrações por ato de gestão anterior à assunção dos deveres Públicos. Precedentes: ACO 1.848-AgR, rel. Min. Celso Mello, Tribunal Pleno, DJe de 6/11/2014; ACO 1.612-AgR, rel. Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, DJe de 12/02/2015.
2. É que, em casos como o presente, o propósito é de neutralizar a ocorrência de risco que possa comprometer, de modo grave e/ou irreversível, a continuidade da execução de políticas públicas ou a prestação de serviços essenciais à coletividade.
3. A tomada de contas especial é medida de rigor com o ensejo de alcançar-se o reconhecimento definitivo de irregularidades, permitindo-se, só então, a inscrição do ente nos cadastros de restrição ao crédito organizados e mantidos pela União. Precedentes: ACO 1.848-AgR, rel. Min. Celso Mello, Tribunal Pleno, DJe de 6/11/2014; AC 2.032, Rel. Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, DJe de 20/03/2009.
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
*noticiado no Informativo 794
AG. REG. NO RE N 893.234-PR
RELATORA: MIN. ROSA WEBER
EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DEBATE DE ÂMBITO INFRACONSTITUCIONAL. EVENTUAL VIOLAÇÃO REFLEXA DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA NÃO VIABILIZA O MANEJO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ARTIGO 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. RAZÕES DE DECIDIR EXPLICITADAS PELO ÓRGÃO JURISDICIONAL. REELABORAÇÃO DA MOLDURA FÁTICA CONSTANTE DO ACÓRDÃO REGIONAL. IMPOSSIBILIDADE. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 05.3.2015.
1. Inexiste violação do artigo 93, IX, da Lei Maior. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o referido dispositivo constitucional exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões do seu convencimento, dispensando o exame detalhado de cada argumento suscitado pelas partes.
2. O exame da alegada ofensa ao art. 5º, XXXV, XXXVI, e LV, da Constituição Federal, observada a estreita moldura com que devolvida a matéria à apreciação desta Suprema Corte, dependeria de prévia análise da legislação infraconstitucional aplicada à espécie, o que refoge à competência jurisdicional extraordinária, prevista no art. 102 da Magna Carta.
3. Divergir da conclusão da Corte Regional exigiria a reelaboração da moldura fática delineada no acórdão da origem, procedimento vedado em sede extraordinária. Aplicação da Súmula 279/STF: “Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário.”
4. As razões do agravo regimental não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada, mormente no que se refere à ausência de ofensa direta e literal a preceito da Constituição da República.
5. Agravo regimental conhecido e não provido.
EMB. DECL. NOS EMB. DECL. NOS EMB. DECL. NO AG. REG. NA Rcl N 5.698-SP
RELATOR: MIN. LUIZ FUX
EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO. AUSÊNCIA DE QUALQUER DOS VÍCIOS PREVISTOS NO ART. 535 DO CPC. TENTATIVA DE MERA REDISCUSSÃO DO QUE JÁ UNANIMEMENTE DECIDIDO NO ACÓRDÃO EMBARGADO. VÍNCULO DE NATUREZA CELETISTA. CAUSA DE PEDIR FUNDAMENTADA EM CONTRATO DE TRABALHO E NA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. INAPLICABILIDADE, IN CASU, DO QUE DECIDIDO NA ADI 3.395/MC. INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO JURÍDICO-ADMINISTRATIVO. NÃO CONHECIMENTO. APLICAÇÃO DE MULTA. ARTIGO 538, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NÃO CONHECIDOS.
1. O inconformismo que tem como real escopo a pretensão de reformar o decisum não pode prosperar, porquanto inocorrentes as hipóteses de omissão, contradição, obscuridade ou erro material, sendo inviável a revisão da decisão em sede de embargos de declaração, em face dos estreitos limites do art. 535 do CPC.
2. In casu, os embargos de declaração demonstram mera tentativa de rediscussão do que foi decidido pelo acórdão embargado, inobservando o embargante que os restritos limites desse recurso não permitem o rejulgamento da causa.
3. É competente a Justiça do Trabalho para julgar ação que envolva o Poder Público e o trabalhador regido pela Consolidação das Leis do Trabalho. Precedentes: ARE 859.365-AgR, rel. Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, DJe de 13/4/2015; ARE 846.036-AgR, rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe de 14/4/2015; Rcl 16.458-AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe de 9/9/2014; Rcl 16.893-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe de 10/10/2014; Rcl 8.406-AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, DJe de 29/5/2014.
4. A competência da Justiça Comum, em confronto com a da Justiça do Trabalho, em casos em que envolvido o Poder Público, reclama a análise da natureza do vínculo jurídico existente entre o trabalhador – termo aqui tomado em sua acepção ampla - e o órgão patronal: se de natureza jurídico-administrativa o vínculo, a competência fixa-se como da Justiça Comum; se de natureza celetista, a competência é da Justiça Trabalhista.
5. In casu, diante da natureza celetista do vínculo estabelecido entre as partes, é de se assentar a competência da Justiça do Trabalho.
6. Embargos de declaração não conhecidos.
Acórdãos Publicados: 431
T R A N S C R I Ç Õ E S
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Saída temporária e decisão judicial (Transcrições)
(v. Informativo 793)
HC 128.763/RJ*
RELATOR: Ministro Gilmar Mendes
Habeas corpus. Direito Penal. Processo Penal. Execução penal. Saída temporária. Visita periódica à família. 2. Um único ato judicial que analisa o histórico do sentenciado e estabelece um calendário de saídas temporárias, com a expressa ressalva de que as autorizações poderão ser revistas em caso de cometimento de falta, é suficiente para fundamentar a saída mais próxima e as futuras. A decisão única permite participação suficiente do Ministério Público, que poderá falar sobre seu cabimento e, caso alterada a situação fática, pugnar por sua revisão. 3. Ameaça concreta de lesão ao direito do paciente. Dificuldades operacionais na Vara de Execuções Penais do Rio de Janeiro. Muito provavelmente, se cada condenado tiver que solicitar cada saída, muitas serão despachadas apenas após perderem o objeto. 4. Ordem concedida. Expedição do ofício ao Conselho Nacional de Justiça, ao Presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e à Corregedoria-Geral de Justiça do Rio de Janeiro, para que avaliem e tomem providências quanto à situação da execução penal no Estado do Rio de Janeiro. 5. Expedição de ofício ao Superior Tribunal de Justiça e à Procuradoria-Geral de Justiça do Rio de Janeiro, dando notícia do julgamento.
RELATÓRIO: Trata-se de habeas corpus , com pedido de medida liminar, impetrado pela Defensora Pública do Estado do Rio de Janeiro **, em favor de **, contra acórdão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que negou provimento ao Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial 1.444.825/RJ.
O paciente cumpre pena privativa de liberdade em regime semiaberto.
A defesa requereu o benefício de visita periódica à família, nos termos dos arts. 122, inciso I, e 123 da LEP. O requerimento foi deferido. No despacho, o Juiz fixou, desde logo, calendário com as saídas autorizadas (duas mensais, além de aniversário, páscoa, dia das mães e dos pais, natal e ano novo).
Irresignado, o Ministério Público interpôs agravo ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, o qual negou provimento ao recurso.
Em seguida, interpôs recurso especial.
A 3ª Vice-Presidência do TJ/RJ, nos termos do artigo 543-C, § 7º, inciso II, do CPC, determinou a remessa dos autos à Câmara de origem, para reexame da matéria, à luz de acórdão relativo ao recurso-paradigma, e eventual exercício do juízo de retratação ou manutenção do pronunciamento divergente.
O órgão fracionário manteve seu entendimento. Eis o teor:
“AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. HIPÓTESE ESTABELECIDA NO ARTIGO 543-C, PARÁGRAFO 7º, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
Autos encaminhados pela Terceira Vice-Presidência para reexame da questão, à luz de acórdão relativo ao recurso paradigma. Eventual exercício do juízo de retratação ou manutenção do pronunciamento divergente. Visita periódica ao lar. Inconformismo relacionado à forma de fruição do benefício e deferimento automático de saídas temporárias. Acórdão paradigma - REsp n. 1.166.251/RJ - no sentido da impossibilidade de delegação de função jurisdicional ao administrador do presídio. Entendimento desta Câmara Criminal no sentido de que o Juízo executório pode conferir ao apenado saídas temporárias anuais para visitação familiar, de forma automática.
Manutenção do pronunciamento deste Órgão fracionário no julgamento do Agravo de Execução Penal em apreço. Sem desconhecer o teor e os fundamentos da decisão emanada do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso especial representativo da controvérsia, decidiu-se pela confirmação da decisão proferida pelo Juízo executório, que atende aos objetivos da execução penal, expressos no artigo 1º da Lei de Execução Penal.
Juízo de retratação não exercido. Devolução dos autos à 3ª Vice-Presidência, na forma do artigo 4º, parágrafo 2º, inciso III, alínea ‘a’ da Resolução TJ/3ª Vice-Presidência n. 03/2009”.
O Superior Tribunal de Justiça, a seu turno, deu provimento ao recurso especial do Ministério Público para cassar o acórdão recorrido e a decisão que deferiu saídas temporárias automatizadas.
Impugnou-se a decisão por meio de agravo regimental, ao qual foi negado provimento, nos termos do acórdão assim ementado:
“EXECUÇÃO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL OFERTADO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. SAÍDA TEMPORÁRIA. CONCESSÃO AUTOMÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO DESPROVIDO.
1. Ao julgar sob o rito de ‘recurso repetitivo’ (CPC, art. 543-C) o Recurso Especial n. 1.166.251/RJ, decidiu a Terceira Seção desta Corte que ‘deve ser afastada a concessão de saídas automatizadas, para que haja manifestação motivada do Juízo da Execução, com intervenção do Ministério Público, em cada saída temporária’ (Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em 14/03/2012).
2. Agravo regimental desprovido”.
Opostos embargos de declaração, estes foram rejeitados.
No presente habeas corpus, a defesa alegou a ocorrência de violação aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da duração razoável do processo. Sustentou que o pedido do benefício de saída temporária levou quase 2 (dois) meses para ser deferido, razão pela qual se, para cada saída for preciso novo requerimento, o trâmite processual não apenas se prolongará de forma demasiada e desnecessária, como também será suprimido o direito de o apenado visitar sua família na forma estabelecida pela Lei de Execuções Penais. Pleiteou a concessão da ordem para restabelecer a decisão da Vara de Execuções Penais que concedeu ao paciente autorização de saída temporária.
A medida liminar foi indeferida (eDOC 22).
Em parecer da Subprocuradora-Geral da República Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, o Ministério Público opinou pela concessão da ordem (eDOC 23).
É o relatório.
VOTO: Como se sabe, o mandado de segurança desenvolveu-se entre nós, a partir da Constituição de 1934, fortemente inspirado na doutrina brasileira do habeas corpus. Sob a Constituição de 1988 institui-se, ao lado da modalidade individual, o mandado de segurança coletivo - art. 5º, LXX. O STF entendeu que, pela semelhança entre as ações, também são aplicáveis ao mandado de injunção as regras da modalidade coletiva. Faço essas considerações para, uma vez mais, defender que, em casos com a configuração destes autos - identidade de lesão à liberdade de locomoção de significativo número de pessoas - se reconheça a viabilidade de impetração coletiva também em sede de habeas corpus.
Dito isso, passo à análise do processo em julgamento, limitando-me, como requerido na impetração, à hipótese do paciente.
O caso trata da possibilidade de o Juiz de execuções penais deferir a saída temporária em uma única decisão, válida para diversas saídas.
A saída temporária sem vigilância direta é um benefício destinado aos sentenciados que cumprem pena em regime semiaberto, na forma do art. 122 da Lei 7.210/84. Autoriza-se que o preso saia e, se for o caso, pernoite, fora do estabelecimento prisional, para visitar a família, estudar ou participar de outras atividades, com intuito de reintegrá-lo ao convívio social.
Conforme o art. 123 da Lei 7.210/84, a autorização deve ser concedida “por ato motivado”, ouvidas as partes e a administração carcerária.
O Superior Tribunal de Justiça interpretou esse dispositivo em recurso especial representativo da controvérsia, no sentido de que deve haver “manifestação motivada do Juízo da Execução, com intervenção do Ministério Público, em cada saída temporária”- REsp 1.166.251/RJ, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, julgado em 14.3.2012.
Desse julgamento, resultou que o Juiz não pode fixar calendário prévio de saídas temporárias, deixando sua fiscalização ao administrador prisional.
Esse é um dos precedentes que levou à adoção da Súmula 520 daquela Corte:
“O benefício de saída temporária no âmbito da execução penal é ato jurisdicional insuscetível de delegação à autoridade administrativa do estabelecimento prisional”.
A Corte entendeu que, na medida em que o art. 123 da Lei 7.210/84 determina que a autorização deve ser concedida “por ato motivado”, cada saída autorizada deve ser singularmente motivada, com base no histórico do sentenciado até então.
Não vislumbro essa necessidade. Um único ato judicial que analisa o histórico do sentenciado e estabelece um calendário de saídas temporárias, com a expressa ressalva de que as autorizações poderão ser revistas em caso de cometimento de falta pelo sentenciado, é suficiente para fundamentar a saída mais próxima e as futuras.
Por um lado, a decisão avalia a situação contemporânea, deixando claro que a saída mais próxima é recomendável. Por outro, projeta que, se não houver alteração fática, as saídas subsequentes também serão recomendáveis.
A expressa menção às hipóteses de revisão deixa claro às partes que, caso surja incidente, ele será apreciado, podendo levar à revogação da autorização.
Ressalto que, em situações ordinárias, os requisitos das saídas são os mesmos, independentemente da estação do ano em que elas ocorrem. A saída do natal não tem requisitos mais brandos do que a saída da páscoa, por exemplo. Não há razão funcional para afirmar que, uma única decisão que a ambas contemple, é deficiente de motivação.
A decisão única também permite a participação suficiente do Ministério Público, que poderá falar sobre seu cabimento e, caso alterada a situação fática, pugnar por sua revisão.
Pode-se argumentar que a decisão do Superior Tribunal de Justiça não afeta diretamente direito do sentenciado. De fato, se o Juízo das execuções penais determinar saídas temporárias em várias decisões sucessivas, ao invés de em única decisão, a situação do preso será a mesma.
No entanto, a realidade da execução penal demonstra que esse tipo de decisão coloca em risco o direito do sentenciado ao benefício.
A força de trabalho das varas de execuções penais é um recurso escasso, que precisa ter sua eficiência maximizada. Na medida em que as decisões podem ser concentradas sem perda substancial de qualidade, é recomendável que assim se faça.
Se a força de trabalho não for usada com eficiência, é provável que os pedidos de autorização de saída só sejam apreciados após a data da saída pretendida.
Registro que negligenciar a observância da economia processual nas autorizações de saída pode gerar reflexo inclusive na superlotação carcerária.
As vagas no sistema prisional também são um recurso escasso, diretamente administrado pelos Juízes. Extinção de pena, progressão de regime, livramento condicional, são judicialmente concedidos e abrem vagas no sistema.
Ressalto que o projeto de reforma da Lei de Execução Penal, PLS 513/2013, autor Senador Renan Calheiros, relator Senador Eunício Oliveira, prevê a utilização de tecnologia da informação para que os benefícios na execução sejam automatizados. Despacho judicial somente será necessário para negá-los.
Além disso, há precedente da 1ª Turma do STF no sentido da viabilidade da programação de várias saídas em uma única decisão, na medida em que, estando presentes os requisitos da primeira, “as subsequentes mostram-se consectário legal, descabendo a burocratização a ponto de, a cada uma delas (…), ter-se que formalizar novo processo” - HC 98.067, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 6.4.2010.
De tudo concluo que o Juiz de execuções penais pode deferir a saída temporária em uma única decisão, válida para diversas saídas, sem violar o dever de fundamentação ou prerrogativa do Ministério Público. Pelo contrário, a análise individual de cada saída pode colocar em risco o direito do sentenciado ao benefício.
No caso dos autos, o Juiz das execuções penais deferiu autorizações de saída, para visita periódica à família. No despacho, fixou, desde logo, calendário com as saídas autorizadas (duas mensais, além de aniversário, páscoa, dia das mães e dos pais, natal e ano novo).
O Estado do Rio de Janeiro concentra suas execuções penais em uma única Vara, na capital. Essa Vara processa todas as execuções penais, sejam de penas privativas de liberdade, restritivas de direito, ou medidas de segurança, na capital e interior do Estado.
O relatório do mutirão carcerário promovido pelo CNJ no período de 26.10.2011 a 16.12.2011, apontou diversas dificuldades operacionais na serventia, ressaltando a demora no cumprimento dos atos de ofício.
Especificamente quanto à tramitação de expedientes para concessão de benefícios aos apenados, foi consignado o sistêmico atraso, nos seguintes termos:
“Há na VEP/RJ excessiva demora em analisar os direitos possivelmente concedidos por lei aos apenados. A tramitação de remessa à Defensoria Pública, retorno do Ministério Público, cumprimento de diligências requeridas, novo retorno ao Ministério Público, eventual novo retorno à Defensoria e, finalmente, conclusão ao juiz para a decisão faz com que haja o transcurso de vários e vários meses entre o atingimento do lapso (requisito objetivo para o benefício) e sua efetiva concessão”.
Em conclusão, o relatório apontou diversas recomendações, dentre elas a instalação de pelo menos duas novas varas de execuções.
Até o momento, não foram instaladas novas serventias. Aparentemente, os problemas não foram resolvidos de outra forma. O Jornal O Globo, de 10.8.2014, noticia que cinco juízes lotados na Vara de Execuções supervisionam trinta e dois estabelecimentos prisionais e têm acervo de 110.000 (cento e dez mil) processos sob sua responsabilidade. A publicação ressalta o atraso na análise de benefícios dos sentenciados e a redução do número de servidores na lotação.
Para este mês de agosto, o site do TJRJ dá conta da realização de mutirão local, para reavaliação da situação de mais de dez mil presos do regime semiaberto.
E é nesse cenário de insuficiência que a questão deve ser considerada.
A impetrante relata que a Vara profere cerca de 1.000 (mil) decisões de saída temporária por ano, cada uma contemplando 35 (trinta e cinco) saídas. Se um novo pedido fosse necessário para cada saída, seriam necessárias 35.000 (trinta e cinco mil) decisões para obter o mesmo resultado.
Disso resulta que, muito provavelmente, se cada condenado tiver que solicitar cada saída, muitas serão despachadas apenas após perderem o objeto. E, ainda mais grave, é de se esperar que vários requerimentos sequer sejam apresentados, perdendo os condenados benefício que lhes assistiria.
Está presente, portanto, a ameaça concreta de lesão ao direito do paciente.
Ante o exposto, concedo a ordem, para restabelecer a decisão do Juízo das Execuções penais que concedeu autorização de saída temporária para visita periódica à família.
Outrossim, proponho a expedição do ofício ao Presidente do Conselho Nacional de Justiça, ao Presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e ao Corregedor-Geral de Justiça do Rio de Janeiro, para que avaliem e tomem providências quanto à situação da execução penal no Estado do Rio de Janeiro.
Por fim, proponho a expedição de ofício ao Presidente do Superior Tribunal de Justiça e à Procuradoria-Geral de Justiça do Rio de Janeiro, dando notícia do julgamento.
* acórdão pendente de publicação
** nomes suprimidos pelo Informativo
OUTRAS INFORMAÇÕES
10 a 14 de agosto de 2015
Decreto nº 8.499, de 12.8.2015 - Altera o Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999, que aprova o Regulamento da Previdência Social. Publicado no DOU nº 154, Seção 1, p.1, em 13.8.2015.
Secretaria de Documentação – SDO
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O Supremo Tribunal Federal é o órgão de cúpula do Poder Judiciário, e a ele compete, precipuamente, a guarda da Constituição, conforme definido no art. 102 da Constituição da República. É composto por onze Ministros, todos brasileiros natos (art. 12, § 3º, inc. IV, da CF/1988), escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada (art. 101 da CF/1988), e nomeados pelo Presidente da República, após aprovação da escolha pela maioria absoluta do Senado Federal (art. 101, parágrafo único, da CF/1988). Entre suas principais atribuições está a de julgar a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, a arguição de descumprimento de preceito fundamental decorrente da própria Constituição e a extradição solicitada por Estado estrangeiro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STF - Supremo Tribunal Federal. Informativo 794 do STF - 2015 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 ago 2015, 01:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/informativos dos tribunais/45077/informativo-794-do-stf-2015. Acesso em: 27 nov 2024.
Por: STF - Supremo Tribunal Federal Brasil
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