A segunda parte da sessão desta quinta-feira (17) do Plenário do Supremo Tribunal Federal foi dedicada às exposições dos representantes de entidades interessadas na questão jurídica em discussão nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 43, 44 e 54 admitidas pelo relator, ministro Marco Aurélio, na condição de amici curiae. Todas defenderam que o STF declare a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP) e afaste a possibilidade de início do cumprimento da pena após a condenação em segunda instância. O julgamento será retomado na próxima quarta-feira (23), a partir das 9h30.
Para o representante do Instituto de Garantias Penais (IGP), Antônio Carlos de Almeida Castro, a regra do CPP está em harmonia com o artigo 5º, inciso LVII, da Constituição, que trata do princípio da presunção de inocência. “O texto é absolutamente inquestionável e não possibilita interpretação diversa”, disse.
Segundo o defensor público da União, Gabriel Faria Oliveira, e os representantes da Defensoria Pública do Estado de São Paulo e do Rio de Janeiro, Rafael Muneratti e Pedro Carrielo, a jurisprudência que possibilita o início da execução provisória da pena após antes do esgotamento de todos os recursos representa um endurecimento penal que, ao se dirigir simbolicamente aos ricos da sociedade, atinge, inevitavelmente, a população carente. “Deve-se dar máxima otimização ao princípio constitucional da presunção de inocência no sentido de garantir também às pessoas pobres o direito fundamental de serem processados sem estarem presos preventivamente”, afirmou.
Para o advogado Lênio Streck, que falou em nome da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim), a norma do artigo 283 do CPP “diz o que diz e deve ser lida de forma literal”. O dispositivo, afirmou, é norma constitucional espelhada, pois reproduz o que previsto no artigo 5º da Constituição da República. E, por se tratar de cláusula pétrea (que não pode ser suprimida por emendas constitucionais), não pode ser inconstitucional.
Em nome do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), Maurício Stegemann Dieter sustentou que o princípio da presunção de inocência é regra que não pode ser relativizada por se tratar de direito fundamental. Na sequência, a advogada Silvia Souza, representante da Conectas Direitos Humanos, destacou que o entendimento contrário à constitucionalidade do artigo 283 do CPP atinge o princípio da vedação ao retrocesso. Ela defendeu o reconhecimento da presunção de inocência como garantia de qualquer cidadão e afirmou que a restrição de direitos atinge, principalmente, a população pobre, preta e periférica.
O Instituto Ibero Americano de Direito Público (IADP) foi representado pelo advogado Frederico Guilherme Dias Sanches, que assinalou que o julgamento não se refere a pessoas, mas à discussão sobre a constitucionalidade de um dispositivo do CPP. Para ele, a Constituição Federal será desrespeitada caso as ações sejam julgadas improcedentes, pois não é possível tornar inconstitucional cláusula pétrea.
Pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), o advogado Hugo Leonardo salientou o papel do STF na sociedade e ressaltou que a Corte deve cumprir o que está escrito na Constituição, independentemente do clamor das ruas. Ele também citou ordenamentos de outros países sobre o princípio da presunção de inocência e à necessidade de qualificação da condenação penal para o início do cumprimento de pena e lembrou o que dispõem dois documentos internacionais – a Declaração Nacional dos Direitos Humanos e o Pacto San José da Costa Rica – assinados pelo Brasil e que contemplam o que está na Constituição.
A Associação dos Advogados de São Paulo também expôs seus argumentos na sessão. Segundo o advogado Leonardo Sica, o julgamento diz respeito à integridade da Constituição Federal e à restauração do sistema de credibilidade da justiça. Ele afirmou que o Brasil tem imitado “o que há de pior” no sistema jurídico de outros países, ao importar ideias estrangeiras sem as adaptações necessárias e levar pessoas para a prisão sem o direito ao contraditório. Por fim, citou entendimentos controversos adotados pela Justiça brasileira, como o fato de a pena alternativa não ter execução automática, mas a de prisão sim.
EC, SP//CF