Salvo as exceções previstas em lei, os provedores de aplicações de internet não têm a obrigação de excluir publicações feitas por terceiros em suas páginas, por violação dos termos de uso, ainda que haja requerimento extrajudicial.
Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso do Mercado Livre para afastar uma multa aplicada pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), decorrente de ação ajuizada por um de seus usuários.
Segundo o processo, um anunciante de colchões encaminhou notificações extrajudiciais ao Mercado Livre, nas quais informou sobre a existência de anúncios de vendedores de colchões magnéticos sem certificação do Inmetro – o que, alegou, violaria os termos e as condições gerais de uso do site –, e requereu que fossem excluídos. O provedor não atendeu ao pedido, o que levou ao ajuizamento da ação.
Provedores de aplicações têm responsabilidade subjetiva por conteúdo de terceiros
Segundo a relatora no STJ, ministra Nancy Andrighi, o Marco Civil da Internet (MCI) estabeleceu que os sites intermediadores de comércio eletrônico se enquadram na categoria dos provedores de aplicações, os quais são responsáveis por disponibilizar na rede as informações criadas ou desenvolvidas pelos provedores de informação.
A ministra lembrou que a publicação de anúncios em plataforma de comércio eletrônico é regida pelos seus termos de uso, que são uma modalidade de contrato de adesão, definidos unilateralmente pelo provedor e apresentados indiscriminadamente a todos os usuários.
Os termos de uso são utilizados, explicou, para estabelecer as práticas aceitáveis no uso dos serviços, bem como as condutas vedadas. Nancy Andrighi observou que a maior parte das plataformas se reserva o direito de remover e proibir certos conteúdos, e dispõe de mecanismos que permitem aos usuários denunciarem conteúdos considerados violadores desses termos.
"Não há regulamentação das práticas implementadas pelas plataformas de comércio eletrônico em virtude do descumprimento dos termos de uso. Em consequência, para definir se há ou não o dever de atender à notificação extrajudicial que informa a violação dos termos de uso, é preciso considerar as disposições do MCI aplicáveis aos provedores de aplicações", disse.
A relatora lembrou precedentes nos quais os colegiados de direito privado do tribunal consideraram que é subjetiva a responsabilidade dos provedores de aplicações diante do conteúdo gerado por terceiros.
Necessidade de contraditório antes da exclusão dos conteúdos anunciados
De acordo com a ministra, o artigo 19 do MCI impõe a responsabilidade civil do provedor pelos danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para remover o conteúdo considerado ilícito.
As exceções a essa regra, segundo ela, são os casos em que há violação a direitos de autor ou a direitos conexos (artigo 19, parágrafo 2º), e a divulgação de imagens, vídeos ou outros materiais contendo cenas de nudez ou atos sexuais sem autorização dos participantes (artigo 21).
Nancy Andrighi ressaltou que o STJ já se pronunciou no sentido de que não é possível impor aos sites de intermediação a responsabilidade de realizar a prévia fiscalização sobre a origem de todos os produtos, por não se tratar de atividade intrínseca ao serviço prestado.
No caso, a ministra avaliou que não é possível impor a exclusão dos anúncios solicitada pela autora da ação, pois não há previsão legal para tanto. Na avaliação da relatora, por se tratar de publicações não ofensivas a direito de personalidade da autora, mas alegadamente violadoras dos termos de uso do site, seria necessário oportunizar aos usuários o exercício do contraditório antes de eventual exclusão.