O Supremo Tribunal Federal (STF) deu prosseguimento, nesta quinta-feira (24), ao julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC) 43, 44 e 54, nas quais se discute a possibilidade de início do cumprimento da pena antes de serem esgotadas todas as possibilidades de recurso (trânsito em julgado). Até o momento, quatro ministros – Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Roberto Barroso e Luiz Fux – consideram que a possibilidade é constitucional. Outros três, o ministro Marco Aurélio (relator), a ministra Rosa Weber e o ministro Ricardo Lewandowski, entendem que a medida ofende o princípio constitucional da presunção de inocência. O julgamento prosseguirá no início de novembro.
As ações foram ajuizadas pelo Partido Ecológico Nacional (PEN, atual Patriota), o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) com o objetivo de examinar a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP), que prevê, entre as condições para a prisão, o trânsito em julgado da sentença condenatória.
No final da sessão, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, explicou que, conforme o calendário divulgado em abril deste ano, não haverá sessões na próxima semana. Toffoli ressaltou que o cronograma prevê, a cada mês, uma semana sem que o Plenário se reúna. Em compensação a essas semanas, todos os meses são realizadas duas sessões extraordinárias pela manhã.
Ministra Rosa Weber
Primeira a votar na sessão desta quinta-feira (24), a ministra Rosa Weber seguiu o relator. No seu entendimento, a Constituição define expressamente como prazo para a formação da culpa o trânsito em julgado, e os juízes, na qualidade de intérpretes da Constituição, devem atuar unicamente de acordo com a intenção do constituinte. Segundo a ministra, os conceitos de prisão cautelar e de prisão-pena não se confundem. A primeira tem como objetivo garantir a ordem pública e econômica ou assegurar o cumprimento da pena. A prisão criminal, por sua vez, é imposta pelo Estado como resultado de uma condenação após comprovada a culpa, o que, em seu entendimento, ocorre apenas após o trânsito em julgado. “Goste eu pessoalmente ou não, esta é a escolha político-civilizatória manifestada pelo constituinte, e não a reconhecer importa reescrever a Constituição para que ela espelhe o que gostaríamos que dissesse”, argumentou.
Segundo Rosa Weber, embora a sociedade tenha razão em exigir que o processo penal seja rápido e efetivo, problemas e distorções decorrentes das normas penais, como o tempo entre a abertura do processo e o início do cumprimento da pena, “não devem ser resolvidos pela supressão de garantias, e sim mediante o aperfeiçoamento da legislação”.
Ministro Luiz Fux
Ao votar pela possibilidade de execução provisória da pena, o ministro Luiz Fux afirmou que o princípio da presunção de inocência não tem vinculação com a prisão. Em seu entendimento, a Constituição Federal, no inciso LXI do artigo 5º, pretende apenas garantir que até o trânsito em julgado o réu tenha condição de provar sua inocência. A presunção de não culpabilidade, segundo Fux, é direito fundamental. “No entanto, na medida em que o processo tramita, a presunção vai sendo mitigada. Há uma gradação”, afirmou. O ministro lembrou ainda que as instâncias superiores (STF e STJ) não analisam mais a autoria e a materialidade do crime.
O ministro destacou, por fim, que a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância está contemplada em vários documentos transnacionais aos quais o Brasil se submete.
Ministro Ricardo Lewandowski
O ministro Ricardo Lewandowski considera que o artigo 283 do CPP é plenamente compatível com a Constituição em vigor. Para ele, o inciso LVII do artigo 5º da Constituição Federal não comporta qualquer margem de interpretação e compõe um de seus pilares. O ministro afirmou que, num país em que aproximadamente 17 mil juízes são responsáveis por 100 milhões de ações, não se pode desconsiderar a possibilidade de erros judiciais, o que confere ainda mais relevância ao princípio constitucional da presunção de inocência.
Lewandowski enfatizou que os desdobramentos decorrentes do julgamento do Habeas Corpus 126292, quando o STF passou a permitir a prisão após segunda instância, resultaram num enorme número de prisões decretadas de forma automática. Para ele, esse julgamento configurou um “retrocesso jurisprudencial”, pois a presunção de inocência foi concebida como antídoto contra a volta de regimes ditatoriais. Para o ministro, a Constituição de 1988 não é uma “mera folha de papel” que pode ser rasgada sempre que contrarie as forças políticas do momento.
Leia a íntegra do voto do ministro Ricardo Lewandowski.
PR, SP,VP/CR//CF
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