Há mães que, na separação, com a guarda dos filhos, os tornam órfãos de pais vivos. Impedem acesso, viajam pra longe, denigrem a imagem do pai, o responsabilizam (muitas vezes injustamente) pela separação e por seu sofrimento. No extremo, levantam suspeitas de abuso sexual, por exemplo.
Daí, surgem pais que se leiloam – e barato - ao filho, com liberalidades, presentes e simpatia de ocasião. O não-guardião, muitas vezes, quer posar de mais bacana, simpático e liberal que o guardião. Tem dificuldades de influir nas decisões sobre o filho.
Esse quadro precisa de mudanças? Certamente.
Mas não nos iludamos. Entre lei e realidade há um abismo. Pontes precisam ser construídas.
Em muitos casos - sem esquecer que há mesmo pais não guardiões que são muito irresponsáveis -, a guarda compartilhada poderá somente piorar tudo, dividindo a autoridade parental, sem que haja a referência de raiz de um ou outro comando. Para dar certo, seria necessário a harmonia do ex-casal. Só que, na grande maioria dos casos, o casal pouco se fala, muitas vezes mal se olham. Como debaterá com integridade e serenidade o futuro do filho?
Não nos esqueçamos também dos padrastos e madrastas que surgirão. Não nos esqueçamos que, hoje em dia, é cada vez mais freqüente que mães ou pais separados apresentem novos “padrastos” e “madrastas” a seus filhos, com periodicidade cada vez mais curta. E, necessariamente, padrastos, madrastas, ou simples namorados (as) se tornam elementos referenciais éticos, muitas vezes à margem da diretriz do guardião, e alternativas de comando familiar, frequentemente ingressando também no leilão emocional. Tentam, no ganhar o afeto do filho, segurar o companheiro. No caso Isabela, vimos conseqüências trágicas dessa realidade.
Não nos esqueçamos que, além dos males psico-afetivos que tal situação pode provocar no ser humano em formação, há, no meio do caminho, a pedra da adolescência. Aí, o adolescente sequioso por maior liberdade e aventura poderá manipular todo esse coletivo parental em “benefício próprio”. São freqüentes os casos de drogadição surgida nesse ambiente em que se dá uma diluição da autoridade familiar.
A proposta é bem intencionada, mas na realidade, de tanto atacar pequenos focos de incêndio, esquecemos de ir à fonte das queimadas. Ou seja, a sociedade consumista, que estimula a egolatria, o materialismo e a falta de solidariedade. Guarda compartilhada só existe onde há renúncia, humildade, companheirismo e solidariedade.
O mesmo Congresso que aprova tal lei, se recusa a regulamentar maior rigor para a imoral propaganda de bebidas alcoólicas voltada para jovens. Os mesmos pais que querem o "compartilhamento" da guarda se negam a fiscalizar (e impedir o acesso!) games violentos e filmes sexistas que seus filhos consomem. Aliás, muitas vezes, os consomem juntos, pra ser o "pai companheirão", aquele mesmo, iludido com o filho que "tem a cabeça boa". Não são raros os casos de pais que fumam sua bagana junto com os filhos, ou fazem destes seus companheiros de copo, sem medir as consequências futuras desse gesto irrsponsável.
Num momento em que se vive a crise da autoridade familiar, a guarda compartilhada, mal aplicada, mal compreendida, e eventualmente “forçada” pelos juízes (muitos deles muito jovens, muitos deles sem filhos) aos casais, pode trocar o equívoco criminoso da alienação parental pela formação de uma família “gelatinosa”, onde todos remam, mas ninguém dirige o barco.
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