Uma questão que vem tirando o sono do contribuinte do IPTU diz respeito ao repentino lançamento do IPTU com efeito retroativo, motivado por reformas empreendidas no prédio implicando aumento de área constituída e consequente alteração do valor venal.
Sobre essa questão dispõe a Lei nº 6.989/1966 (Código Tributário Municipal) em seu art. 2º:
“Art. 2º constitui fato gerador do Imposto Predial a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel construído localizado na zona urbana do Município.
§ 1º Considera-se ocorrido o fato gerador do Imposto Predial:
I – em 1º de janeiro de cada exercício;
II – no primeiro dia do mês subsequente ao que ocorrer:
a) construção ou modificação de edificação que implique alteração do valor venal do imóvel, nos termos da Lei nº 10.235, de 16 de dezembro de 1986, com as alterações posteriores;
b) constituição de novo terreno, sobre o qual haja edificação incorporada;
c) instituição de condomínio edilício em planos horizontais ou em planos verticais.
§ 2º Ocorridas as hipóteses previstas no inciso II do § 1º:
I – caso as alterações no imóvel não resultem em desdobro, englobamento ou remembramento do bem, o eventual acréscimo de Imposto Predial, com relação ao lançamento que considerou a situação anterior do imóvel, será cobrado proporcionalmente ao número de meses ainda restantes do exercício;
II – caso as alterações no imóvel resultem em desdobro, englobamento ou remembramento do bem:
a) serão efetuados lançamentos do Imposto Predial, referentes aos novos imóveis, de forma proporcional ao número de meses ainda restantes do exercício; e
b) os eventuais lançamentos de Impostos Predial e Territorial Urbano, referentes à situação anterior, passarão a ser proporcionais ao número de meses já decorridos desde o seu respectivo fato gerador até o novo fato gerador.
§ 3º Para efeito de contagem do número de meses restantes do exercício, a que se refere o § 2º, será incluído o mês da ocorrência do novo fato gerador a que se refere o inciso II do § 1º.
§ 4º A ocorrência do novo fato gerador referido no inciso II do § 1º implica a constituição de créditos tributários complementares, com eventuais abatimentos ou devoluções de indébitos, na forma estabelecida no regulamento do imposto”.
O inciso I, do § 1º, do art. 2º prescreve que o fato gerador do IPU ocorre no dia 1º de janeiro de cada ano, conferindo-lhe natureza anual a esse imposto, mediante renovação anual do seu fato gerador.
Nas hipóteses previstas nas letras a a c do inciso IIconsidera-se ocorrido o fato gerador no primeiro dia do mês subsequente ao que ocorrer os eventos aí mencionados.
Nessas hipóteses, incluído o mês da ocorrência do novo fato gerador, far-se-á “a constituição de créditos tributários complementares, com eventuais abatimentos ou devolução de indébitos, na forma estabelecida no regulamento do imposto” (§ 4º, do art. 2º, da Lei nº 6.989/66).
O dispositivo está correto, porque o princípio da anterioridade só tem aplicação nos casos de criação de novo imposto ou da majoração do imposto existente. E no caso sob comento não há novo imposto, nem aumento de alíquota.
Trata-se simplesmente de, por via de lançamento complementar, alcançar a porção do imóvel não abrangido no lançamento primitivo.
Acontece que a Prefeitura de São Paulo vem procedendo ao lançamento retroativo, ora anulando inteiramente o lançamento original e exigindo novo IPTU por inteiro em função da alteração verificada no imóvel, ora procedendo apenas ao lançamento complementar pela diferença de valor resultante da modificação introduzida no imóvel, inclusive, quanto à aplicação do fator de obsolescência em caso de reforma estrutural do prédio.
Toda a problemática se resolve no fato de a administração tributária ter ou não ter tomado conhecimento da alteração das características físicas do imóvel à época dos fatos.
A alteração da ficha cadastral do imóvel, a cargo do contribuinte, não é o único meio de a administração tributária do Município tomar conhecimento da inovação fática do imóvel.
Se a reforma tiver sido precedida de alvará respectivo, seguido de auto de conclusão ou auto de vistoria (habite-se) é obvio que, independentemente, da alteração da ficha cadastral, o fisco tomou conhecimento desse fato constitutivo do novo fato gerador, descabendo o lançamento retroativo para abranger períodos ainda não alcançados pela decadência.
Não pode o fisco depois de decorridos 15 ou 20 anos do fato, promover lançamento retroativo dos últimos cinco exercícios, quer para cobrar a diferença, quer para cobrar por inteiro segundo o novo fato gerador, remetendo o contribuinte ao moroso processo de repetição de indébito dos valores pagos constantes de lançamentos originários.
A inércia do fisco não pode implicar responsabilidade do contribuinte além dos limites permitidos em lei, salvo na hipótese de dolo fornecendo dados incorretos para diminuir o valor do imposto.
A outra situação diz respeito à constituição de condomínio (art. 2º, § 1º, inciso II, letra c da Lei nº 6.989/66)
Tivemos um caso em que o cliente instituiu no prédio identificado por um único número de contribuinte (SQL) um condomínio vertical, passando a existir seis unidades autônomas.
Tudo foi feito nos conformes legais culminado ao final com a expedição do auto de vistoria (habite-se), reconhecendo a regularidade da especificação condominial. Esse “habite-se” datava de 2019.
Ocorre que em 2022 o citado cliente recebeu a notificação de lançamento retroativo a 2019, separadamente para cada unidade autônoma, sem compensação do valor pago nos lançamentos originários.
É claro que na hipótese, independentemente, da alteração da ficha cadastral do imóvel pelo contribuinte a Prefeitura tomou conhecimento do fato, desde a expedição do “habite-se” em 2019, cabendo a ela proceder de ofício ao desdobro do número de contribuinte dando margem a seis novos números, tarefa que não cabe ao contribuinte executar.
Logo, o lançamento retroativo a 2019 é ilegal e essa ilegalidade é agravada pela total desconsideração do lançamento único original.
Na pior das hipóteses, cabia à Prefeitura paulistana proceder à compensação proporcional do imposto pago nos lançamentos primitivos relativamente a cada unidade autônoma objeto de novo lançamento.
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