RESUMO: O presente artigo analisa a viabilidade da devolução em dobro de tributos pagos indevidamente, examinando a aplicação das normas de direito privado em matéria tributária e suas limitações.
ABSTRACT: This article analyzes the feasibility of double reimbursement of taxes paid erroneously, examining the application of private law rules in tax matters and their limitations.
PALAVRAS-CHAVE: Direito Tributário – Devolução em Dobro – Repetição de Indébito.
KEYWORDS: Tax Law – Double Reimbursement – Undue Payment Repetition.
Muitas empresas e algumas pessoas físicas buscam diariamente o Poder Judiciário para discutir os seus tributos pagos, o que é natural e muito positivo para o Estado Democrático de Direito, pois precisamos de uma tributação justa no Brasil.
No entanto, ao estudar alguns casos práticos enfrentados pelos Tribunais, notei alguns requerimentos de repetição do indébito em dobro, o que me chamou a atenção e me fez redigir o presente artigo para responder à seguinte pergunta: a devolução em dobro em matéria tributária é viável?
Ao analisar a fonte dos pedidos de devolução dobrada, percebi que os fundamentos lançados nas petições são oriundos do art. 940 do Código Civil e do art. 42, Parágrafo Único do Código de Defesa do Consumidor (Normas de Direito Privado), inexistindo qualquer base no Código Tributário Nacional ou em outras normas fiscais.
Portanto, ao considerar que os impostos estão disciplinados pelas Normas de Direito Público, conclui-se que os mencionados instrumentos não se aplicam à repetição do indébito tributário. Assim, a devolução dificilmente será em dobro para os tributos, o que derruba as narrativas de alguns dos contribuintes.
Para demonstrar a aplicabilidade prática da impossibilidade do ressarcimento dobrado, foi feita uma busca na jurisprudência paulista e, ao analisar a Apelação n. 0003888-12.2009.8.26.0244, restou constatado que "não se aplica à repetição do indébito tributário o disposto no art. 42, parágrafo único, do CDC, eis que a relação entre a Fazenda Municipal e o contribuinte não é de consumo".
Também foi contatado que o art. 940 do Código Civil não pode ser aplicado à relação tributária, inexistindo o dever de restituição dobrada nos casos de cobrança de tributo pago. Cito um caso prático:
1. RECURSO INOMINADO. TAXA DE COMBATE A INCÊNDIO. MUNICÍPIO DE PRESIDENTE PRUDENTE-SP. INEXIGIBILIDADE RECONHECIDA, COM IMPOSIÇÃO DE DEVOLUÇÃO DE FORMA SIMPLES. 2. Recurso da autora pedindo imposição da devolução em dobro pelo Município dos valores indevidamente recolhidos. 3. Decisão: Pretensão improcedente. Matéria tributária. Ausência de má-fé. Aplicabilidade do CTN. Ausência de previsão legal de penalidade de repetição em dobro de cobrança indevida de tributo. Restituição de indébito de forma simples bem decidida. 4. Recurso da autora não provido. Sentença mantida. (TJSP; Recurso Inominado Cível 1014514-52.2020.8.26.0482; Relator: Paulo Gimenes Alonso; Órgão Julgador: 1ª Turma; Foro de Presidente Prudente - Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 16/06/2021; Data de Registro: 16/06/2021 - grifei).
Portanto, não restam dúvidas de que as chances de êxito ao se pedir a devolução em dobro são bem remotas. Cabe ao advogado e ao cliente analisarem os riscos de eventual improcedência desse pedido antes de fazê-lo.
Reforçamos que não há relação consumerista entre o Fisco e o contribuinte, tampouco há regulamentação da matéria no Código Tributário Nacional, o que deve ser considerado antes de confeccionar qualquer pedido de restituição dobrada em face do Fisco.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação Cível n. 0003888-12.2009.8.26.0244, Relator: Carlos Giarusso Santos, Data do Julgamento: 31/01/2013, 18ª Câmara de Direito Público, Foro de Iguape - 1ª Vara Judicial, Data de Registro: 05/02/2013.
BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo, Recurso Inominado Cível n. 1014514-52.2020.8.26.0482, Relator: Paulo Gimenes Alonso, Data do Julgamento: 16/06/2021, 1ª Turma, Foro de Presidente Prudente - Vara da Fazenda Pública, Data de Registro: 16/06/2021.
Precisa estar logado para fazer comentários.