Virada de ano é momento de fazer balanços, avaliar progressos, questionar mudanças. A busca de resultados é feita por cada um com relação à sua vida. No entanto, as instituições e a própria justiça também se sujeitam a esta verdadeira prestação de contas. As retrospectivas provam isso.
Ao menos em sede de Direito das Famílias há o que comemorar. Duas leis referendaram avanços que já vinham sendo reconhecidos por decisões pioneiras de juízes com sensibilidade de visualizar o justo. E, com certeza, cristalizar a jurisprudência vanguardista é a melhor forma de legislar. O resultado é sempre positivo.
Guarda compartilhada
O rompimento da vida em comum não leva à cisão nem dos direitos e nem dos deveres dos genitores com relação aos filhos. Porém, a concessão da guarda unilateral a um, assegurando ao outro singelo direito de visita, não obedece ao preceito constitucional que prioriza o interesse de crianças e adolescentes (CF 227). Visando minorar os efeitos da separação – sempre traumática para a prole – a Lei 11.698, de 13 de junho de 2008, elegeu a guarda compartilhada como forma de garantir a responsabilidade conjunta e a participação igualitária de ambos os pais no exercício da autoridade parental. O novo instituto retira da guarda a idéia de posse e assegura a continuidade do vínculo afetivo que a simples visitação não dá espaço.
Mesmo que um dos genitores não aceite a guarda compartilhada, comprovado que ambos têm condições de ter o filho em sua companhia, deve o juiz determinar, de ofício, o compartilhamento. A discordância de um dos pais ou eventuais desavença entre eles não impede sua concessão, cabendo encaminhá-los, se necessário, a acompanhamento psicológico ou psiquiátrico (ECA 129, III).
A lacuna legal inibia alguns juízes, que sequer homologavam acordos em que, de forma consensual, tinha sido adotada a guarda conjunta. Daí a importância da alteração levada a efeito. Além de melhor preservar os filhos, impõe o engajamento de ambos os pais no cumprimento dos deveres inerentes ao poder familiar. Ao depois, a possibilidade de o juiz impor a nova modalidade de convivência diminui o grau de litigiosidade do casal, pois a guarda não cabe mais ser disputada e nem o filho utilizado como instrumento de poder.
Alimentos gravídicos
A Constituição Federal garante o direito à vida (CF 5º), impondo aos pais o dever de assegurar aos filhos o direito à vida, à saúde, à alimentação (CF 227), encargo a ser exercido igualmente pelo homem e pela mulher (CF 226, § 5º). O Código Civil põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro (CC 2º).
Ainda assim, a tendência sempre foi reconhecer a obrigação paterna exclusivamente depois do nascimento do filho e somente a partir do momento em que os alimentos eram pleiteados em juízo. A Lei 11.804, de 5 de novembro de 2008 garante alimentos à gestante. É mais um avanço que consagra direito reconhecido pela jurisprudência de vanguarda.
Assegurar à mulher grávida o direito de receber alimentos de quem ela afirma ser o pai do seu filho, dá efetividade à proteção conferida ao nascituro. Como a responsabilidade parental surge com a concepção, o encargo alimentar deve ser imposto de forma retroativa.. Esse é o verdadeiro alcance da nova lei.
O legislador teve o cuidado de enumerar as despesas que precisam ser atendidas no período que vai da concepção até o parto. Bastam indícios da paternidade para a concessão dos alimentos que perduram mesmo após o nascimento, oportunidade em que a verba fixada reverte a favor do filho. Ainda que o pai não conteste a ação e nem providencie no reconhecimento do filho, a procedência da ação autoriza a expedição de mandado de registro, sendo dispensável a instauração do procedimento de averiguação da paternidade (L 8.560/92).
As leis não foram muitas, mas os avanços são significativos. Provocaram verdadeira mudança de paradigmas ao dar especial relevo ao princípio da paternidade responsável. E, gerar responsabilidades desperta a consciência do dever, o que alavanca avanços importantes em benefício daqueles que serão os cidadãos de amanhã.
Como prognóstico para o futuro, é bom torcer para que, daqui para frente, tanto o legislador como a justiça tenham consciência de que é chegada a hora de reconhecer que o afeto é uma realidade digna de tutela.
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