Encontra-se tramitando na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei no. 6.433/2009 do Deputado Paes de Lira (PTC-SP) em que prevê alteração no Código Civil, em específico nos artigos 1.704 e 1.707.
Para podermos analisar a referida proposta precisamos responder alguns questionamentos iniciais, começando assim com o que vem a ser exatamente alimentos e qual a natureza jurídica da obrigação de alimentar e posteriormente iremos analisar cada uma dessas propostas em separado.
Ø Conceituando alimentos:
Clóvis Beviláqua destaca que a palavra alimento tem, em direito, uma acepção técnica, de mais larga extensão do que a linguagem comum, pois que compreende tudo que é necessário à vida: sustento, habitação, roupa, educação e tratamento de moléstias.[1]
Orlando Gomes defende que os alimentos são prestações para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-las por si.[2]
Seguindo essa mesma linha de raciocínio Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald defendem que os são alimentos é o conjunto de meios materiais necessários para a existência das pessoas, sob o ponto de vista físico, psíquico e intelectual. (...) Nessa ordem de idéias, em concepção jurídica alimentos podem ser conceituados como tudo o que se afigurar necessário para a manutenção de uma pessoa humana, compreendidos os mais diferentes valores necessários para uma vida digna.[3]
Paulo Lobo conceitua alimentos da seguinte forma:
Alimentos, em direito de família, tem o significado de valores, bens ou serviços destinados às necessidades existenciais da pessoa, em virtude de relações de parentesco (direito parental), quando ela própria não pode prover, com seu trabalho ou rendimentos, a própria mantença. Também são considerados alimentos os que decorrem dos deveres de assistência, em razão de ruptura de relações matrimoniais ou de união estável ou dos deveres de amparo para os idosos (direito assistencial). Os alimentos podem ser em dinheiro, também denominados pensão alimentícia, e in natura, ou naturais, como a entrega de imóvel para moradia e de coisas para consumo humano. [4]
Miguel Reale ao explicar a história do novo Código Civil nos traz que a palavra alimentos foi considerada em sua mais ampla acepção, podendo tanto significar pagamento de uma quantia certa em dinheiro como conceder uma pensão alimentícia, ou dar hospedagem e sustento, sem prejuízo do dever de prestar o necessário à educação do alimentando[5].
Ø Natureza Jurídica:
Para Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald a natureza jurídica da obrigação de alimentar, trata-se de um direito de personalidade, pois se destinam a assegurar a integridade física, psíquica e intelectual de uma pessoa humana[6]. Posição essa também defendida por Maria Berenice Dias.[7]
Para Arnaldo Rizzardo a natureza da obrigação de alimentar tem como fundamentação a solidariedade humana e econômica que deve imperar entre os membros da família ou dos parentes. Há um dever legal de mútuo auxílio familiar, transformado em norma, ou mandamento jurídico.[8]
Para Paulo Nader a base da obrigação de alimentar encontra-se no princípio da solidariedade, que deve encontra-se presente nas relações familiares.[9]
Por sua vez Maria Helena Diniz defende que se trata de uma natureza mista, não restrita ao direito de personalidade, sendo assim de conteúdo eclético, já que apresenta conteúdo patrimonial e tem finalidade pessoal, ou seja apresentando-se como uma relação patrimonial de crédito-débito[10].
Ø Classificação dos alimentos:
Existem diversos critérios de classificação dos alimentos, assim iremos nos ater à classificação mais aceita entre os doutrinadores, fazendo assim a classificação quanto à finalidade, quanto à natureza e quanto à causa jurídica.
Quanto à natureza os alimentos são classificados em naturais ou civis. Os alimentos naturais ou necessários consistem em prestações para que se supram as necessidades primárias ligadas à subsistência, ou seja, alimentação, vestuário, saúde, habitação. Já os alimentos civis ou côngruos são aqueles alimentos que irão propiciar uma melhor qualidade de vida do alimentando. São os alimentos destinados ao lazer, à educação, dentre outros.
Quanto à causa jurídica podemos classificar em legítimos ou legais, voluntários e indenizatórios. Os alimentos legítimos ou legais são aqueles devido em razão do laço familiar: parentesco, relação conjugal ou união estável. Já os alimentos voluntários podem ocorrer de direitos criados por ato inter vivos ou causa mortis. Nesse caso além da órbita do direito de família temos que analisar os reflexos no direito obrigacional. E por fim, temos os alimentos indenizatórios ou ressarcitórios são aqueles destinados a indenizar a vítima de ato ilícito, como por exemplo o art. 948, II do CPC, quando o autor do homicídio deve prestar alimentos às pessoas a quem o falecido os devia.
Quanto à finalidade podemos classificar em alimentos provisionais, provisórios ou definitivos. Os alimentos provisionais ou acateulatórios são aqueles concedidos em ação cautelar preparatória ou incidental ajuizada ao mesmo tempo ou antes da ação de separação judicial, nulidade ou anulação de casamento ou de alimentos para que o autor ou sua prole – na pendência da ação – possa se manter. Apresenta natureza cautelar e pode ser revogado ou modificado a qualquer tempo e deverão ser pagos até o final da ação principal com o seu trânsito em julgado. Alimentos provisórios são aqueles fixados no curso de um processo em ação de alimentos de rito especial, após a prova de parentesco, casamento ou união estável para suprir as necessidades do credor enquanto espera a sentença de mérito. Apresenta natureza antecipatória. Já os alimentos regulares ou definitivos são aqueles estabelecidos pelo magistrado ou pelas partes com prestações periódicas, de caráter permanente, podendo ser revistos, conforme art. 1.699 do Código Civil.
Ø Análise do art. 1.707 do Código Civil:
O atual artigo 1.707 do Código Civil |
Proposta de nova redação: |
Art.1.707 Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora. |
Art. 1.707. Uma vez fixados os alimentos em sentença transitada em julgado, pode o credor deixar de exercer o direito, porém lhe é vedado renunciar, salvo o cônjuge, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora. |
Quando observamos os livros de doutrina de direito de família encontramos como característica da obrigação de alimentar a irrenunciabilidade. Porém, essa característica precisa ser analisada detalhadamente. Assim temos Arnaldo Rizzardo se manifestando:
Indisponibilidade e irrenuciabilidade
Isto no sentido de que o direito a alimentos não é suscetível de renúncia ou cessão. Mesmo que às pessoas se reconheça a absoluta liberdade, e que sejam elas capazes, não é admitida a renúncia ao direito, ou qualquer outra forma de disposição. E nem poderia ser diferente, pois os alimentos têm importância vital, significando a própria garantia à vida. Registra San Tiago Dantas, com propriedade “como não se pode renunciar à própria vida, também não se pode renunciar ao direito aos alimentos, de modo que, embora se recusando hoje uma prestação alimentar e outra amanhã, sempre se está em condições, a qualquer momento, retomar o exercício do direito de exigir alimentos dos parentes que os devem”[11].
Com base nessa idéia a análise feita ao projeto de lei 6.960/2002, tramitando atualmente sob o número de PL 276/2007[12] que tem por objetivo modificar o art. 1.707 passando a ser possível que o ex-cônjuge ou ao ex-companheiro venha a renunciar ao direito a alimentos
Doutrinariamente Zeno Veloso aponta divergência sobre a irrenunciabilidade do direito entre cônjuges:
Não há sentido ou razão para que um cônjuge, pessoa capaz, colocada em plano de igualdade com o outro cônjuge, no acordo de separação amigável, que tem, ainda, de ser homologado pelo juiz, não possa abrir mão de alimento, fique impedido de rejeitar esse favor, tolhido de renunciar a tal benefício, se possui bens ou rendas suficientes para sua sobrevivência, manutenção, e manter padrão de vida digno, ficando o outro cônjuge à mercê de uma reclamação futura de alimentos.[13]
Conforme observamos pela nova redação proposta pelo PL 6.433/2009 passa a ser possível ao cônjuge renunciar a esse direito. Tal alteração legislativa encontra suporte também em decisões recentes do Superior Tribunal de Justiça, já que esse se posiciona no sentido de que é possível ao cônjuge renunciar a esse direito e no caso de renúncia não é possível voltar a pleitear tal encargo, conforme REsp no. 701902/SP da 3ª. turma do STJ, vejamos:
Direito civil e processual civil. Família. Recurso especial. Separação judicial. Acordo homologado. Cláusula de renúncia a alimentos. Posterior ajuizamento de ação de alimentos por ex-cônjuge. Carência de ação. Ilegitimidade ativa.
- A cláusula de renúncia a alimentos, constante em acordo de separação devidamente homologado, é válida e eficaz, não permitindo ao ex-cônjuge que renunciou, a pretensão de ser pensionado ou voltar a pleitear o encargo.
- Deve ser reconhecida a carência da ação, por ilegitimidade ativa do ex-cônjuge para postular em juízo o que anteriormente renunciara expressamente.
Recurso especial conhecido e provido.
(STJ – 3ª. turma – Rel. Ministra Nancy Andrighi – REsp 701902/SP – Julgamento 15/09/2005 – Publicação DJ 03/10/2005).
Assim, o que se entende como irrenunciável ao direito aos alimentos se restringe aos vínculos de parentesco, e como cônjuge não são parentes, para eles não existiria tal vedação. Entendimento esse consubstanciado no Enunciado n. 263 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na III Jornada de Direito Civil.
Apesar do posicionamento jurisprudencial mais recente ser no sentido de que o cônjuge, por não ser parente, ao renunciar os alimentos não poderá posteriormente arrepender-se e com isso pleiteá-los em juízo, nos filiamos à corrente de que os alimentos são irrenunciáveis, seja em razão do parentesco ou no caso da união estável ou do casamento. E tal posicionamento se deve exatamente em razão do princípio da dignidade da pessoa humana, princípio esse que deve nortear todo o nosso sistema jurídico, bem como o princípio da solidariedade que norteia o direito de família. Assim, na ausência de parentes, o ex-cônjuge ou ex-companheiro poderá se socorrer daquele que em um momento no passado, buscou construir uma família. Esses laços não devem ser esquecidos, principalmente se dessa relação primeira adveio crianças. A própria essência do que vem a ser alimentos traduz essa necessidade de que é impossível renunciá-los, posto que se assim fosse, estaríamos concordando com uma espécie de suicídio.
Assim, entendemos que a alteração sugerida afronta o princípio da dignidade da pessoa humana e o princípio da solidariedade.
Além disso, essa inovação legislativa apresenta outro problema. Como regra, existe uma igualdade entre os cônjuges e os companheiros, já que a nossa Carta Magna permite as duas formas de constituição de família. Na forma proposta pelo projeto legislativo, que somente contempla o cônjuge, irá permitir que cheguemos a conclusões em que iremos desigualar esses dois, sendo assim, mas vantajoso ter uma união estável do que buscar a forma matrimonializada, já que a única exceção prevista é para o cônjuge e só se atinge esse status com o casamento.
Dessa forma, esse artigo não deve sofrer nenhuma alteração, mas se vier a sofrer alguma alteração deve incluir o companheiro no mesmo patamar que o cônjuge.
Ø Análise do art. 1.704 do Código Civil:
O atual artigo 1.704 do Código Civil |
Proposta de nova redação: |
Art. 1.704 Se um dos cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos, será o outro obrigado a prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não tenha sido declarado culpado na ação de separação judicial. Parágrafo Único. Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência.
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Art. 1.704. Se um dos cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos, será o outro obrigado a prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso o primeiro não tenha renunciado expressamente ao direito a alimentos ou sido declarado culpado na ação de separação. § 1º Quando a renúncia a alimentos, na separação consensual, der-se para fazer sucumbir a apuração litigiosa da culpa de um dos cônjuges por injúria ou infidelidade, o terceiro à sociedade conjugal que para ela tenha concorrido será obrigado a prestá-los em lugar do outro cônjuge, na forma do caput. § 2º Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, nem for a hipótese do § 1º deste artigo, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência. |
Pela proposta legislativa, aquele que der causa a separação – seja por injúria ou por infidelidade, pode então vir a ser condenado a prestar pensão alimentícia.
Analisando os princípios do direito de família, encontramos o princípio da não-intervenção familiar, previsto no art. 1.513 do Código Civil que determina que é proibido a qualquer pessoa, seja ela de direito público ou privado, intervir na comunhão instituída pela família.
Quando então uma terceira pessoa acaba sendo responsável pela dissolução do casamento, arcar com a prestação alimentícia, nada mais é do que algo justo, já que concorreu para aquele resultado.
Assim, o amante deve ser compelido a arcar com o pagamento de pensão alimentícia. A dificuldade que vislumbramos refere-se a como realizar esse pleito, como fazer essa prova da relação extraconjugal. E como irá ocorrer em nossos tribunais.
Vejamos o projeto de lei na íntegra:
PROJETO DE LEI Nº DE 2009.
(Do Senhor Paes de Lira)
Dá nova redação aos artigos 1.704 e 1.707
da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de
2002, que institui o Código Civil.
O Congresso Nacional Decreta:
Art. 1º Esta lei dá nova redação à Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, Código Civil.
Art. 2º O Art. 1.704 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, Código Civil, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1.704. Se um dos cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos, será o outro obrigado a prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso o primeiro não tenha renunciado expressamente ao direito a alimentos ou sido declarado culpado na ação de separação.
§ 1º Quando a renúncia a alimentos, na separação consensual, der-se para fazer sucumbir a apuração litigiosa da culpa de um dos cônjuges por injúria ou infidelidade, o terceiro à sociedade conjugal que para ela tenha concorrido será obrigado a prestá-los em lugar do outro cônjuge, na forma do caput.
§ 2º Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, nem for a hipótese do § 1º deste artigo, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência.
Art. 3º. O Art. 1.707 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, Código Civil, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1.707. Uma vez fixados os alimentos em sentença transitada em julgado, pode o credor deixar de exercer o direito, porém lhe é vedado renunciar, salvo o cônjuge, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora.
Art. 4º Esta lei entra em vigor na data da sua publicação.
JUSTIFICATIVA
Contrariamente ao objetivado por esta Casa Legislativa, a edição da Lei nº 10.406, de 2002, novo Código Civil Brasileiro, a teor dos seus atuais artigos 1.704 e 1.707, terminou por instituir a mais completa insegurança jurídica no âmbito das separações judiciais e posteriores divórcios, quando motivados por injúria ou infidelidade, porquanto acordos consensuados nessas circunstâncias entre pessoas maiores, livres e capazes, assistidas por advogados, sob o crivo do Ministério Público e tutela de Juiz de Direito, devidamente homologados em sentença judicial transitada em julgado, que em nome da paz social deveriam por termo definitivo a tais conflitos familiares, passaram a perpetuá-los, com o indesejável condão de sobrecarregar ainda mais a Justiça com demandas já mediadas.
Sabe-se à exaustão que a renúncia ao direito a alimentos em sede de separação consensual dá-se normalmente no interesse do cônjuge culpado em se eximir dos inconvenientes do litígio, evitando a exposição de sua imagem, bem como que sua conduta civilmente ilícita fique consignada de forma indelével nos autos de sua separação. Nessa razão, na realidade da conciliação judicial, o cônjuge culpado renuncia a direito que sabe perdido em razão da grave violação aos deveres conjugais, enquanto o cônjuge inocente, confiando na Justiça, renuncia à discussão sobre a causa da separação.
Tais acordos, porém, vêm sendo exitosamente frustrados por demandas espúrias impetradas pela parte implicitamente culpada, destinadas, em momento posterior à separação, a obter, com base nos dispositivos que ora se quer alterar, os alimentos renunciados, por estar, nesse novo momento processual, de todo precluso o direito do inocente de demonstrar a culpa da parte contrária. Mediante tal ardil, lograse, muitas vezes, com o concurso do próprio Judiciário, desconstituir a cláusula exoneratória de alimentos acordada anteriormente em Juízo, oportunizando ao cônjuge de má-fé contornar os erros pretéritos que lhe subtraíram o direito de ser pensionado, e assim impor injustos e ainda maiores prejuízos morais e materiais ao outro que, de boa-fé, confiou na Justiça.
Ainda que nossos Tribunais Superiores, em especial o STJ, já tenham sedimentado jurisprudência de que a irrenunciabilidade prevista no art. 1.707 do Código Civil contempla apenas os parentes, não alcançando os cônjuges (entre outros: STJ-3ª T.,REsp701.902, rel. in. Nancy Andrighi, j, 15.9.05, deram provimento, v.u., DJU 3.10.05, p. 249), aduz com lucidez a Exma. Dra. Maria das Graças Guerra de Santana Hamilton, MM Juíza de Direito de Vara da Família e Sucessões do Estado da Bahia, em sentença disponível, desde 02/12/2006, no “site” da Associação de Magistrados da Bahia, que a esdrúxula situação remanesce repercutindo negativamente na ordem processual, modificando o comportamento das partes e respectivos advogados e, até mesmo, de magistrados que não se sentem seguros em promover conciliações entre cônjuges quando percebem que o fato pode trazer conseqüências danosas para um deles que, sentindo-se preservado pela cláusula exoneratória, renuncia à discussão sobre a causa da separação, quadro de insegurança que labora gravosamente contra a eficácia e efetividade da prestação jurisidicional na solução dos conflitos conjugais e, por extensão, familiares.
Beirando o intolerável, ademais, avulta nesse contexto a irresponsabilidade reinante em nossa sociedade quanto ao estabelecimento de relacionamentos extraconjugais, em que terceiros aventuram-se despreocupadamente a se imiscuir em comunhões de vida alheias, concorrendo impunemente para desgraçar lares e desestruturar famílias, em prejuízo de todos os respectivos membros, por saberem que, depois da descriminalização do adultério, o Direito Civil brasileiro descurou de prever contra eles qualquer obrigação legal quando isso efetivamente acontece. Nem mesmo, sequer, a de prestar, em caso de necessidade, o mínimo de apoio material à pessoa com quem se relacionou ilicitamente. E não se aluda que cabe aos prejudicados o direito de mover ação reparatória, pois o constrangimento moral inerente inibe o seu exercício.
Visa, assim, a presente iniciativa a suprir a falta de institutos que responsabilizem objetivamente quem assim procede, atribuindo àquele que concorreu para a culpa por injúria ou infidelidade, de um dos cônjuges, determinante da separação ou divórcio, a obrigação de pensioná-lo caso não possa o mesmo, em decorrência da renúncia ou da declaração judicial de culpa, subsistir por conta própria após a separação conjugal, sem prejuízo ao direito do cônjuge aviltado de buscar a reparação entendida cabível pelos danos morais sofridos.
Por tão-só visar à higidez da família, contribuindo para a construção de uma sociedade mais justa, temos a certeza que os nobres pares apoiarão a presente proposição.
Sala das Sessões, em de de 2009.
PAES DE LIRA
Deputado Federal
[1] BEVILÁQUA, Clóvis. Direito de família, § 78, p. 283.
[2] GOMES, Orlando. Direito de Família. Saraiva, p. 427.
[3] FARIAS, Cristiano Chaves de e ROSENVALD, Nelson. Direito das Famílias. 2ª. edição. Rio de Janeiro: Editora Lumen júris, 2009, p. 668.
[4] LOBO, Paulo. Direto Civil – Famílias. Saraiva, 2009, p. 347.
[5] REALE, Miguel. História do novo código civil.p. 256.
[6] FARIAS, Cristiano Chaves de e ROSENVALD, Nelson. Direito das Famílias. 2ª. edição. Rio de Janeiro: Editora Lumen júris, 2009, p. 669.
[7] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. RT, p. 450.
[8] RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. Editora Forense, 2009, p. 731.
[9] NADER, Paulo. Curso de direito civil – direito de família. Forense, 2009, p. 428.
[10] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito civil Brasileiro – Família. Saraiva, p. 556 e 618.
[11] RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. Forense, p. 734-735.
[12] 127. Art. 1.707: A renúncia aos alimentos feita por cônjuge ou por companheiro é legítima. Os alimentos somente são irrenunciáveis se decorrentes de parentesco (jus sanguinis), sendo que o cônjuge e o companheiro não são parentes. Esclarece Yussef Said Cahali que, “como os cônjuges são maiores e capazes, podendo eles, de comum acordo, dispensar a prestação, reconhece-se ser lícito .... renunciar à pensão, sem direito de exigi-la posteriormente” (Yussef Cahali, Divórcio e Separação, São Paulo, Revista dos Tribunais, 9ª ed., 2000, p. 228). Assim, mesmo com a edição da súmula 379 do STF: “No acordo de desquite não se admite renúncia aos alimentos, que poderão ser pleiteados ulteriormente, verificados os pressupostos legais”, os Tribunais Estaduais e o Superior Tribunal de Justiça continuaram a decidir de forma diversa do estabelecido no provimento sumular.
A renunciabilidade dos alimentos no casamento e, evidentemente, na união estável está mais do que consagrada na jurisprudência, superada a súmula 379 do STF (...) Do jeito que está redigido a art. 1707, estaremos retornando ao sistema da irrenunciabilidade, o que é um retrocesso que precisa ser corrigido, razão pela qual é formulada a presente proposta.
[13] VELOSO, Zeno. Código civil comentado. Editora Atlas, 2003, vol. XVII, p. 60.
Advogada. Mestre em Direito pela UFPE. Professora na Graduação e na Pós-graduação de disciplinas tais como: Teoria Geral do Processo, Direito Processual, Introdução ao Estudo do Direito, dentre outras. Ex-Diretora do Curso de Direito da Universidade Católica de Brasília
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RENATA MALTA VILAS-BôAS, . Proposta de alteração legislativa: Renúncia pelo cônjuge a alimentos e terceiro sendo responsabilizado para pagar pensão alimentícia - Possibilidade prevista no PL 6.433/2009 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 fev 2010, 08:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/511/proposta-de-alteracao-legislativa-renuncia-pelo-conjuge-a-alimentos-e-terceiro-sendo-responsabilizado-para-pagar-pensao-alimenticia-possibilidade-prevista-no-pl-6-433-2009. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Remo Higashi Battaglia
Por: Marcos Antonio Duarte Silva
Por: Remo Higashi Battaglia
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