Está virando moda em Belo Horizonte e em algumas outras Capitais do País, em face da preocupação obsessiva com a segurança, a retenção do documento de identidade, para fins de escaneamento, de toda pessoa que se dirija a alguns edifícios comerciais ou condomínios residenciais.
O indivíduo que necessite entrar em determinados prédios, à procura de alguns serviços, odontológicos, médicos, advocatícios etc, é barrado pelo porteiro que somente o libera após haver feito cópia de seu documento de identidade através de scanner ligado a um microcomputador.
Muita gente tem-se rebelado contra isso. Chegam a chamar a Polícia, que por sua vez ainda não possui entendimento claro e determinações objetivas a respeito, quanto à legalidade da conduta ou de sua natureza possivelmente criminosa.
Pairam infindáveis dúvidas sobre se tratar de defesa dos interesses dos que labutam ou residem naquele endereço, tentando uma inequívoca identificação dos freqüentadores do lugar, em auxílio às imagens de VHS que possivelmente foram capturadas através de circuito interno de video-monitoramento.
Para alguns outros, entretanto, não passa de abuso intolerável contra a privacidade ou contra o direito sagrado de locomoção. Parece que estamos diante de um conflito de garantias entre interesses bastante opostos: proteção versus liberdade de ir e vir. Porque a condição da cópia do documento é sine qua non para o acesso ao sobredito local que o exige.
Se estivéssemos a tratar de exigência de Órgãos Estatais, poder-se-ia perceber claramente a proteção de interesse ou bem público, por agentes a seu serviço, no exercício de dever legal, plenamente justificável pela circunstância, pelo objeto e pelos sujeitos envolvidos. É a proteção especial que merece a res publica, com fincas na legislação vigente.
Acontece que isso tem-se dado na esfera privada, o que tem servido de motivo de espanto e irresignação. O ato de identificar-se, por si só, é bastante natural e aceito pela população como providência de proteção para ela própria, inclusive. Apresentar o documento, deixar que ele seja manuseado pelo agente da “barreira”, podendo, também, fazer anotações de dados nele contidos, tudo bem.
Mas a cópia dele extraída vai alimentar um arquivo diferente em cada prédio, deixando as seguintes dúvidas e indagações:
1. Quanto tempo esse arquivo vai ficar em poder do condomínio?
2. Esse arquivo é mantido, guardado e operado de forma segura?
3. O porteiro que o exige, sem qualquer demérito ao seu status profissional, social ou cultural, é a pessoa mais idônea para lidar com tal material?
4. Há possibilidade de transferência desse arquivo para mãos de estelionatários ou outros escroques?
5. É possível, a partir dessas cópias, fazerem-se montagens fraudulentas de novos documentos? (para contas bancárias frias, falsidade ideológica, abertura de empresas fantasmas)
Para nossa tristeza, temos as respostas de todas essas perguntas. O que se tem visto, que é a pura expressão da verdade, são funcionários de portaria, quase sem nenhuma qualificação ou preparo intelectual, executando essa malfadada tarefa de exigir, copiar e armazenar cópias de documentos como discutido.
Esse acervo documental pode, perfeitamente, ser objeto de furto, de roubo, de comércio ilegal por parte de funcionários do condomínio ou invadidos por hackers , com gravíssimas seqüelas morais e materiais para seus respectivos titulares.
Pode-se, tranqüilamente concluir que é imprudente e inconveniente reter cópia eletrônica de documentos das pessoas, em tais casos, pelos indubitáveis malefícios que podem ocasionar, resultando situação de extrema vulnerabilidade para o identificado.
Uma última pergunta poderia ser feita sobre a obrigatoriedade de sujeição a tal processo de identificação. permite-se, também, afiançar que a resposta é negativa, porque carente de respaldo legal. Convém lembrar que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (CF, art. 5º, II). E, felizmente, não há comando legal nesse sentido.
De tudo se infere que a exigência em comento é imprópria, inadequada, ilegal e criminosa por tipificar conduta prevista no artigo 146 do Código Penal Brasileiro, tratando-se de Constrangimento Ilegal.
Ser identificado em qualquer portaria de condomínio comercial ou residencial não é nada de novo nem de irregular, inclusive com anotação de dados do documento. Porém retirada de cópia, por qualquer meio, da identidade apresentada se afigura como prática abusiva, injustificável e criminosa!
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