Considerando que o Brasil vivia em outro regime jurídico-constitucional, chefiado, na época, por Getúlio Vargas, farei breves apontamentos sobre a constitucionalidade, sob o crivo da Teoria da Recepção, da Lei 1.579/52:
art. 1°, caput: “terão ampla ação nas pesquisas destinadas a apurar os fatos determinados que deram origem à sua formação”, em face da atual Constituição, art. 58, § 3°, deve, com efeito, ser lido conforme a “interpretação autêntica” realizada hodiernamente pelo Supremo Tribunal Federal, ampliando, pois, os poderes das CPIs sem descurar da reserva jurisdicional, como por exemplo, a proibição de quebra de sigilo telefônico (MS 23.652, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 22-11-00, DJ de 16-2-01), dentre outras reservas;
art. 1°, parágrafo único: é de duvidosa constitucionalidade a disposição legal quando exige “deliberação plenária”, pois não há, na Constituição, art. 58, § 3°, a necessidade de deliberação plenária, exigindo-se, tão-somente, “requerimento de um terço de seus membros”, privilegiando o direito da minoria parlamentar;
art. 2°: constitucionalidade desde que interpretado conforme a Constituição, cujo poder de indiciamento, nos termos dos arts. 10, caput, 14 e 15, exemplificativamente, todos do Decreto-Lei 3.689, de 3 de outubro de 1941, recebido este último pela Constituição de 1988 como lei ordinária, de onde se infere que cabe, exclusivamente, às autoridades previstas no art. 144, I e IV, CF, indiciar fundamentadamente o acusado por ter cometido infração penal segundo seu jugo, finalizando a investigação mediante relatório destinado ao Poder Judiciário, que deverá abrir vista ao Ministério Público para formação de sua opinio delicti, não devendo ser estendido o poder de indiciamento às CPIs, destarte, porque não se trata, efetivamente, de indiciamento propriamente dito;
art. 3°, § 1°: muito embora reconheça-se o poder de requisição das CPIs, nos termos da reserva jurisdicional, cit., não vejo inconstitucionalidade na solicitação prevista neste dispositivo. Até mesmo os órgãos jurisdicionais solicitam – quando são órgãos de mesma hierarquia - colaboração de juízos onde se encontram pessoas que estão fora da jurisdição do órgão solicitante (precatórias).
Entendo, entretanto, que se trata de requisição, para efeitos legais, em relação aos destinatários da ordem emanada pelas CPIs, não sendo admissível, todavia, se tratar de requisição relativamente ao órgão jurisdicional executor da solicitação, podendo este último determinar a diligência se não vislumbrar qualquer ilegalidade do ato parlamentar [este parágrafo foi renumerado pela Lei 10.679, de 2003];
art. 3°, § 2°: constitucionalidade da norma, até porque foi objeto de inclusão pela Lei 10.679, cit., dentro do arcabouço constitucional de 88;
art. 4°, I e II: remissão aos arts. 329 e 342, ambos do Código Penal, Decreto-Lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940, recebido pela CF/88 como lei ordinária. Constitucionalidade, portanto, do dispositivo, por fazer remissão ao CP vigente, sem eiva de inconstitucionalidade neste sentido;
art. 5°, caput: considerando CPI instaurada somente pela Câmara dos Deputados, sua leitura se compatibiliza com o entendimento sobre a possibilidade, ao final dos trabalhos, de projeto de lei cujo objeto foi abordado pela Comissão Parlamentar de Inquérito;
art. 5°, § 1°: trata-se de norma procedimental, sem vício de inconstitucionalidade, à primeira vista; art. 5°, § 2°: constitucional, por ultimar o prazo, que é certo e que tem como limite, no máximo, a legislatura em curso. Pedro Lenza, citando Alexandre de Moraes, corrobora a constitucionalidade da norma ao mencionar, inclusive, a Lei 1.579/52 (Direito Constitucional ESQUEMATIZADO, 12ª ed. Saraiva: SP, 2008, p. 314, nota de rodapé 15);
art. 6°: inconstitucional, ou, não recebido pela Constituição, o presente dispositivo da Lei 1.579, na parte em que faz remissão exclusivamente a ela própria, pois a norma de validade de seus termos é a Constituição de 1988, regulamentada pelos regimentos internos da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do Congresso Nacional, e, subsidiariamente, pela lei em tela, cujo conteúdo somente em parte foi recebido pelo atual regime constitucional;
art. 7°: seria ilegal se houvesse, na época, paralelo ao que hoje prescreve a Lei Complementar 95, de 26 de fevereiro de 1998, precisamente o art. 9°, na redação da Lei Complementar 107, de 26 de abril de 2001.
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