RESUMO
Este artigo se propõe a estudar a origem, o desenvolvimento e a situação atual dos presídios no mundo, mas, em especial, no Brasil, apresentando uma nova solução para os problemas de nosso sistema prisional: a terceirização. Para defender essa nova proposta de modelo prisional, são elencados os argumentos contrários à terceirização para serem refutados um a um, de modo, a explicitar a fragilidade dos mesmos e enfatizar as vantagens da presença da iniciativa privada na construção e gestão das prisões. Por fim, demonstra-se que muitos países já estão adotando a terceirização e ela é a nova tendência mundial para combater a ineficiência do Estado em administrar o sistema prisional, bem como é um instrumento apto a fortalecer a Segurança Pública Nacional.
PALAVRAS-CHAVE: histórico das prisões e do sistema prisional; terceirização; política penitenciária brasileira.
1 INTRODUÇÃO
“A prisão é uma maneira muito cara de tornar as pessoas piores”
Douglas Hurd, ex-ministro da Justiça inglês.
A epígrafe acima reflete o entendimento de grande parte da sociedade sobre o que é o sistema penitenciário brasileiro. A percepção de que esse sistema está com sérios problemas é irradiada por toda sociedade ora pelos meios de comunicação, ora pela própria comunidade, que sente em seu cotidiano os efeitos desse descaso do Estado com a Segurança Pública.
Nesse cenário, as penitenciárias têm mostrado forte influência tanto na ineficiência de ressocializar condenados quanto na incapacidade de controlar os criminosos que estão sob sua tutela. Quem sofre com isso é a sociedade brasileira, pois as ondas criminosas estão mais freqüentes e cada vez em mais Estados da Federação: São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo – só para citar alguns que já foram vítimas.
O objetivo deste artigo é, justamente, fazer um estudo de uma possível alternativa a ser seguida para modernizar o aparato prisional, atendendo assim com eficiência e efetividade as finalidades da pena, quais sejam: prevenir, punir (ou retribuir) e ressocializar (GRECO, 2007).
A proposta é estruturar a realidade atual na construção de um sistema penitenciário eficiente e apto a ser a ponta da lança de uma Política de Segurança Pública séria que combata a criminalidade, sem olvidar jamais dos compromissos constitucionais de um Estado Democrático de Direito para com seu povo.
Para tanto, neste estudo, analisa-se o assunto através de uma pesquisa que enfocará a forma qualitativa, através de fontes bibliográficas e com procedimentos não-experimentais e monográficos. A método de abordagem dialético, também, foi muito presente, na medida que, tornou-se imprescindível o confronto entre a realidade atual e a proposta de terceirização apresentada no corpo deste estudo.
O presente artigo, por fim, divide-se em: uma breve abordagem histórica da pena privativa de liberdade, evidenciando a origem e a função do local chamado prisão; posteriormente, analisou-se a evolução dos sistemas prisionais no mundo e no Brasil, atentando-se para a situação crítica na atualidade brasileira e a evolução da população carcerária brasileira; a partir do tópico anterior, apresenta-se a terceirização como uma nova alternativa de política penitenciária, tal item, por sua vez, subdivide-se na análise dos argumentos contrários à terceirização e na menção aos casos de sucesso no mundo e em nosso país; enfim, faz-se as considerações finais do artigo.
2 AS PRISÕES: UMA BREVE ABORDAGEM HISTÓRICA
É espinhosa a tarefa de definir quando nasceram os sistemas prisionais, posto que tudo dependerá daquilo que se considera como prisão[1]. Nesse diapasão, o professor Cezar Roberto Bitencourt (2001) contribui com uma análise histórica da Antiguidade até nossos dias que é de grande valia para contextualizarmos este artigo.
Na Antiguidade, mais especificamente Grécia e Roma, não existia uma concepção da prisão como lugar de cumprimento de pena, pois as sanções limitavam-se a morte, penas corporais e infamantes. “A finalidade da prisão, portanto, restringia-se à custódia dos réus até a execução das condenações referidas. A prisão dos devedores tinha a mesma finalidade: garantir que cumprissem as suas obrigações”. (BITENCOURT, 2001, p. 8, grifo nosso).
A Idade Média, por conseguinte, contribuiu para o sistema prisional com a chamada prisão do Estado – que englobava a função de custódia e de detenção até receber o perdão do rei – e com a prisão eclesiástica. Um bom exemplo daquela é a Bastilha, em Paris, famosa por ter sido palco da Revolução Francesa e símbolo do Absolutismo francês. Além disso, percebe-se nessas prisões uma inadequada arquitetura para os fins prisionais, porém tal revolução arquitetônica adviria com o pensamento Panóptico de Jeremy Bentham (FOUCAULT, 2005).
Já a prisão canônica destinava-se ao internamento com fins de penitência e meditação. A principal pena aplicada era a “detrusio in monatesrium e consistia na reclusão em um mosteiro de sacerdotes e religiosos infratores das normas eclesiásticas” (BITENCOURT, 2001, p. 10); já os hereges eram punidos com a prisão denominada murus largus.
Nesse modelo prisional eclesiástico, destaca-se a figura de Clemente XI, que implementou uma reforma carcerária para transformar o ambiente prisional num lugar de reabilitação e educação para o condenado, ou seja, algo bem similar ao que entendemos como deve ser o que “atualmente qualificamos de tratamento institucional do delinqüente” (ibidem, p. 21).
A Idade Moderna adveio com diversos problemas oriundos da expansão da pobreza e dos delitos de violência, da crise do sistema feudal, das longas guerras, dos distúrbios religiosos, etc. Para entender o porquê dessa crise, basta recordar o momento histórico vivido por aquela sociedade: a peste bubônica, a Guerra de Cem Anos e a Fome assolavam a Europa. Era preciso reprimir este descontrole social (BITENCOURT, 2001).
Santos (2005) aduz, ainda, que a massa de expropriados expulsa dos campos pela política de cercamento das áreas comunitárias (open fields ou commom fields) concentrou-se nas cidades e converteu-se numa população de mendigos, vagabundos, ladrões e outros tipos de delinqüentes comuns na vida urbana.
Como resposta a este cenário, surge, na metade do século XVI, o Castelo de Bridwell, para onde eram enviados mendigos, vagabundos e afins, com a intenção de reformá-los através do trabalho e da disciplina.
No século seguinte, por conseguinte, nasce uma instituição que canalizou toda esta força de trabalho ociosa e resolveu os problemas de exclusão social do capitalismo: as workhouses (Inglaterra). Essas instituições objetivavam disciplinar e adequar para o trabalho assalariado, os camponeses expropriados, os mendigos, os delinqüentes, enfim, todo os excluídos.
Ao lado disso, na Holanda, aparecem as chamadas rasphuis. Essas instituições focavam-se no combate as pequenas delinqüências e já assinalavam “o surgimento da pena privativa de liberdade moderna” (BITENCOURT, 2001, p. 18), visto que instituía o trabalho obrigatório como método pedagógico para reconstruir o homo economicus (SANTOS, 2005).
O que se observa nesse breve histórico é uma transformação da prisão custódia em prisão-pena que pode ser explicada por diversos motivos, conforme Bitencourt (2001). Primeiramente, pela ideologia que, a partir do século XVI, adveio com idéias que valorizavam a liberdade e o racionalismo (Humanismo).
Ocorre, nessa época, a mudança da publicização dos castigos para uma forma de castigo mais disfarçada, ou seja, oculta que fazia e faz, ainda hoje, a sociedade esquecer das pessoas sobre as quais aplicou-se a pena. Ao contrário dos suplícios em praça pública que valorizavam a barbárie da sociedade sobre o homem, ou melhor, do soberano sobre seus súditos (FOCAULT, 2005).
Houve, também, um crescimento excessivo da criminalidade, já apontado acima. Tal ampliação demandava novos meios de aplicação das penas, haja vista a irracionalidade em se aplicar a pena de morte ou de castigos corporais a tamanho contingente populacional, pois essa prática estava criando um exército de aleijados que não poderiam mais trabalhar e contribuir para a dinâmica de produção de riquezas da sociedade capitalista nascente.
Nesse sentido, destaca-se o fator econômico e sua imprescindível contribuição para o nascimento do sistema prisional tal qual o percebemos hoje, isto é, uma prisão-pena. Uma prova maior dessa assertiva assenta-se, no fato, de “as primeiras casas de internamento aparecerem na Inglaterra nos pontos mais industrializados do País: Worester, Norwich, Bristol” (ibidem, p. 30).
Corroborando com esse pensamento e indo além, Santos (2005) estabelece uma relação de dependência recíproca entre a prisão e as fábricas:
As relações de produção materiais, fundadas na separação trabalhador / meios de produção, e a disciplina do trabalho na fábrica, organizada com objetivo de lucro, dependem diretamente da prisão, principal instituição de controle social; inversamente, os fins retributivos e preventivos da prisão garantem as relações sociais baseadas na contradição capital / trabalho assalariado, enquanto método punitivo da prisão objetiva transformar o sujeito real (condenado) em sujeito ideal (trabalhador), adaptado à disciplina do trabalho na fábrica, principal instituição da estrutura social. A correlação fábrica / cárcere – ou, de modo mais geral, a correlação capital (estrutura social) e prisão (controle social) – é a matriz histórica da sociedade capitalista, que explica o aparecimento do aparelho carcerário nas primeiras sociedades industriais (Holanda, Inglaterra, Estados Unidos e França), além de permitir explicar a origem e decadência dos múltiplos sistemas de exploração da força de trabalho carcerária (SANTOS, 2005, p. 42-43).
Essa última causa apresentada é bem próxima de uma visão marxista, ou melhor, de um materialismo histórico em que a prisão encontra-se dentro da superestrutura jurídica. Melossi e Pavarini apud Bitencourt (2001) aduzem, ainda, que
a prisão surge quando se estabelecem as casas de correção holandesa e inglesa, cuja origem não se explica pela existência de um propósito mais ou menos humanitário e idealista, mas pela necessidade que existia de possuir um instrumento que permitisse não tanto a reforma ou reabilitação do delinqüente, mas a sua submissão ao regime dominante (capitalismo). Serviu também como meio de controle de salários, permitindo, por outro lado, que mediante o efeito preventivo-geral da prisão se pudesse “convencer” os que não cometeram nenhum delito de que deviam aceitar a hegemonia da classe proprietária dos bens de produção. Já não se trata de dizer que a correção sirva para alcançar uma idéia metafísica e difusa de liberdade, mas que procura disciplinar um setor da força de trabalho “para introduzi-lo coativamente no mundo da produção manufatureira”, tornando o trabalhador mais dócil e menos provido de conhecimentos, impedindo, dessa forma, que possa apresentar alguma resistência (MELOSSI e PAVARINI apud BITENCOURT, 2001, p. 23, grifo nosso).
Em poucas palavras, as workhouses vêm ao mundo com objetivo fundamental de formar trabalhadores disciplinados e aptos à produção capitalista.
A linha de pensamento acima encontra fundamentos também em outro grande filósofo da atualidade, Michel Focault. Este francês nos chama a atenção para uma disciplina advinda com a modernidade que visa a “fabricação” de corpos dóceis e úteis. Sendo que, entende-se por dócil “um corpo que pode ser submetido, que pode ser utilizado, que pode ser transformado e aperfeiçoado” (2005, p. 118). Já a caracterização da utilidade de um indivíduo perpassa por uma arte do corpo humano que visa uma série de habilidades e controles para torná-lo mais obediente e, por conseguinte, mais útil.
Focault aduz que
a disciplina produz, a partir dos corpos que controla, quatro tipos de individualidade, ou antes uma individualidade dotada de quatro características: é celular (pelo jogo da repartição espacial), é orgânica (pela codificação das atividades), é genética (pela acumulação do tempo), é combinatória (pela composição das forças). E, para tanto, utiliza quatro grandes técnicas: constrói quadros; prescreve manobras; impõe exercícios; enfim, para realizar a combinação das forças, organiza “táticas”. A tática, arte de construir, com os corpos localizados, atividades codificadas e as aptidões formadas, aparelhos em que o produto das diferentes forças se encontra majorado por sua combinação calculada é sem dúvida a forma mais elevada da prática disciplinar (FOUCAULT, 2005, p. 141).
Isto posto, a forma geral encontrada para tornar os indivíduos dóceis e úteis, através de uma disciplina e de um controle sobre seu corpo, é a instituição-prisão. “Desde o começo a prisão devia ser um instrumento tão aperfeiçoado quando (sic) a escola, a caserna ou o hospital, e agir com precisão sobre os indivíduos” (FOUCAULT, 1998, p.131).
Há, também, neste momento histórico, o surgimento de um modelo compacto do dispositivo disciplinar: o panoptismo. O Panóptico[2], já mencionado anteriormente, foi muito difundido no século XIX, principalmente nos Estados Unidos e na Costa Rica. Atualmente, as idéias desse modelo contribuem “tanto do ponto de vista da doutrina penitenciária como no plano arquitetônico” (BITENCOURT, 2001).
Por fim, a história da repressão, ou melhor, das prisões teve, nos séculos XVIII e XIX, a formação de um novo tipo de exercício do poder, “em que percebeu-se ser, segundo a economia do poder, mais eficaz e mais rentável vigiar que punir” (FOUCAULT, 1998, p. 130).
3 HISTÓRICO DOS SISTEMAS PRISIONAIS
A grande importância dos antecedentes acima (workhouses e rasphuis) fundamenta-se na influência deles sobre os sistemas penitenciários que surgiram depois, ou seja, o pensilvânico ou celular, o auburniano e o progressivo. Esses sistemas contemporâneos, por sua vez, nasceram em países industrializados[3] e exerceram uma forte influência sobre todo mundo ocidental na construção dos diversos modelos prisionais. No Brasil, constata-se isso, por exemplo, no art. 33 § 2º do Código Penal de 1940[4], que sofreu modificação pela Lei 7.209/84, estabelecendo a forma progressiva na execução das penas privativas de liberdade.
Analisemos, a priori, sistema pensilvânico ou celular. Sua inauguração ocorreu em 1790, com a construção de um edifício celular no jardim da prisão de Walnut Street, localizada no estado norte-americano da Pensilvânia. Tal edificação visava a aplicação da solitary confinement aos condenados. Apesar dos importantes defensores (Benjamin Franklin e William Bradford), da presença de princípios quaqueiros e da forte influência de pensadores como Howard e Beccaria, o sistema celular foi um fracasso. Os motivos apontados para esse malogro consistem, basicamente, em sua rigidez excessiva[5] e na impossibilidade de se “introduzir uma organização do tipo industrial nas prisões” (BITENCOURT, 2001, p.62).
Na tentativa de superar as limitações do modelo celular, sobreveio o auburniano. A influência do Capitão Elan Lynds foi primordial na instalação e definição do que seria o sistema auburniano. O capitão iniciou a sua direção da prisão de Auburn em 1821, marcando-a com um militarismo implacável em que não se “acreditava nas possibilidades de reforma do recluso e somente se preocupava em conseguir prisioneiros obedientes, mantendo-os encarcerados com o máximo de segurança” (ibidem, p. 71). Tal sistema adotou o trabalho em comum, durante o dia, e o confinamento, durante a noite. Todavia, o interessante é que foi mantida a regra do silêncio absoluto, sendo permitido tão-somente falar-se com os guardas, com licença prévia e em voz baixa.
O regime progressivo, por sua vez, inovou, pois passou a medir a duração da pena por uma soma de trabalho e de boa conduta imposta ao condenado. Esse sistema, também, foi denominado de mark system, visto que estipulava uma espécie de conta, onde os condenados reduziam (crédito) ou aumentavam (débito) sua pena, dependendo da sua conduta e do seu trabalho[6].
O nome do autor deste sistema é ponto de controvérsia na doutrina, alguns entendem que foi o Capitão Alexander Maconochie (sistema inglês), outros atribuem tal criação a Walter Crofton (sistema irlandês) e há, ainda, quem considere que esse sistema nasceu com Manuel Montesinos e Molina (BITENCOURT, 2001).
Doravante, o grande mérito do modelo progressivo é que se procurou estimular o desejo de liberdade dos presos e, assim reconduzi-los à sociedade. É, justamente, aí que se acampa a principal diferença deste sistema para o pensilvânico ou para o auburniano, pois estes limitavam-se a disciplinar somente o regime interior das prisões, enquanto que aquele se preocupa com a recondução do preso para a sociedade, ou seja, com seu retorno para a liberdade e para o convívio junto aos seus semelhantes.
Há que se ressaltar, também, a forte influência do sistema irlandês com a introdução de uma idéia inovadora: o estabelecimento de prisões intermediárias. Estas instituições funcionariam como períodos intermediários entre a prisão e a liberdade total, isto é, estabeleceu-se “uma prisão intermediária entre o estabelecimento fechado e a liberdade condicional, com a finalidade de possibilitar o contato com o exterior e facilitar a reincorporação definitiva” (ibidem, p. 86) do condenado.
Por fim, hoje, existe uma corrente doutrinária que entende que o sistema progressivo está em crise e aponta para dois vetores possíveis:
por um lado, a individualização penitenciária (individualização científica), e, por outro, a pretensão de que regime penitenciário permita uma vida em comum mais racional e humana (por exemplo, quando se estimula o regime aberto). (BITENCOURT, 2001, p. 97).
As causas para essa crise são múltiplas, mas destaca-se a evolução gigantesca da consciência moral de nossa sociedade. Os exemplos desta evolução são encontrados nos inúmeros tratados para respeito a direitos humanos existentes atualmente: a Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), a Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica (1969), etc. Enfim, esse ambiente de ampla discussão teórica fortalece a reflexão sobre as razões e os modos de existência da pena privativa de liberdade.
4 A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE NO BRASIL
Num primeiro momento, chama-se Júnior e Shecaira (2002) e sua asserção sobre o período pré-colonial ou indígena. Nesse período, existiram formas de punição na forma de talião: vingança de sangue, perda da paz, pena de morte através de tacape e as penas corporais. Malgrado esses autores entenderem que as práticas punitivas dos povos indígenas se encontravam em estágio pouco avançado de civilização[7] e “em nada influíram na legislação penal brasileira”, há que se lembrar que o sistema capitalista não vigia entre eles, destarte, “os índios desconheciam a prisão como forma de punição autônoma” (p. 38).
Já no período colonial, o professor Romeu Falconi aduz que o cárcere era “um local de permanência temporária ou de trânsito, para guarda de acusados que esperavam a condenação, ou mesmo a execução da pena, de regra a capital, como soía acontecer na época” (1998, p. 63).
A chegada da Cote portuguesa ao Rio de Janeiro em 1808 ensejou alterações significativas na estrutura da sociedade brasileira. O interessante é que a Corte Portuguesa era numerosa e acabou por desalojar diversos moradores da cidade carioca, inclusive os presos da Cadeia Pública, que foram deslocados para a prisão eclesiástica de Aljube, sendo que essa prisão transformou-se num importante centro de detenção da Corte nas primeiras décadas do século XIX. Logo, a problemática de nossas penitenciárias não é recente, remonta sim a uma realidade histórica secular.
Com o advento do Código Criminal de 1830, já na fase imperial, percebeu-se a necessidade de novas prisões. Nasceram, então, a Casa de Correção de São Paulo e a do Rio de Janeiro.
Basicamente, os problemas penitenciários atravessaram o período imperial e perduraram até mesmo depois da implantação do terrível Código Penal de 1890 que previa a pena de “prisão celular, reclusão, prisão com trabalho obrigatório e prisão disciplinar” (FALCONI, 1998, p. 64).
Sob a vigência do Código Penal de 1890, é inaugurado um símbolo das penitenciárias brasileiras: o Carandiru. Um verdadeiro exemplo de prisão no início, em 1921[8], uma grande ofensa à dignidade da pessoa humana no meio[9] e um grande massacre no fim[10]. Essa é a breve história da Casa de Detenção do Carandiru que foi implodida em dezembro de 2002.
Em 1940, entra em vigor o Código Penal atual, “estabelecendo a reclusão, a detenção e a prisão simples como os tipos de sanção para a prática de infrações penais” (LEMOS, 2007, p. 58). No entanto, apenas com a grande reforma de 1984, as penas alternativas passaram a ser uma opção para o julgador, malgrado já termos enraizado na sociedade a pena privativa de liberdade como a única, realmente, efetiva.
Atualmente, o sistema prisional está falido[11] (BITENCOURT, 2001). Os números do DEPEN (Departamento Penitenciário Nacional) mostram um crescimento vertiginoso da população carcerária brasileira. A taxa de crescimento de 1995 até junho de 2007 gira em torno de 9,02 % ao ano, algo que demanda do sistema penitenciário a capacidade de dobrar o seu tamanho a cada 11 anos.
“Independentemente da causa, é certo que temos um grave quadro em nossas prisões” (LEMOS, 2007, p.40). Tal realidade expansionista é difícil de ser acompanhada, até mesmo pelas melhores organizações privadas, o que dirá pelo burocrático aparato estatal. Em poucas palavras, “nossas prisões repetem o abandono do Estado em outros setores da vida social” (LEMOS, 2007, p. 63).
Gráfico 1. Crescimento da população carcerária no Brasil de 1995 a Junho de 2007.
Fonte: Ministério da Justiça, DEPEN.
5 A TERCEIRIZAÇÃO COMO UMA ALTERNATIVA PARA A POLÍTICA PENITENCIÁRIA BRASILEIRA
Num primeiro momento, apresenta-se como imprescindível distinguir privatização[12] de terceirização. Aquela é entendida como a entrega pelo Estado ao setor privado de toda responsabilidade dos estabelecimentos prisionais (OLIVEIRA, 1996)[13]. Já esta é percebida como um processo de gestão pelo qual se repassam algumas atividades para terceiros - com os quais se estabelece uma relação de parceria – ficando-se concentrado apenas em tarefas essencialmente ligadas ao negócio em que atua (CURRID, 1995).
Não obstante, a definição do Professor Carlos Eduardo Ribeiro Lemos (2007) de terceirização é mais próxima dos fins a que se propõe este artigo, pois contempla, justamente, como ocorre esse processo em presídios brasileiros, percebendo neles uma alternativa para a recuperação de um sistema prisional falido. Carlos Lemos considera “terceiras todas aquela pessoas físicas ou jurídicas prestadoras de serviços para a organização contratante dos serviços” (2007, p. 84) e aduz, ainda, que:
Os projetos de terceirização em geral podem ser implantados tanto nas empresas públicas como na privadas, nas seguintes áreas: serviços de alimentação; serviços de conservação patrimonial e de limpeza; serviços de segurança; serviços de manutenção geral, predial e especializada em engenharia, arquitetura e manutenção de máquinas e equipamentos de serviços de oficina mecânica, frota de veiculo [...].
Lemos (2007) acrescenta, também, que a natureza jurídica dos contratos de terceirização é de direito comum, ou seja, reguladas pelo Código e tendo como partes duas pessoas jurídicas. Doravante, também não haveria nenhum problema de legalidade com a terceirização do sistema prisional, pois tanto a Carta Magna quanto a legislação extravagante possibilitam a adoção deste caminho.
A proposta de terceirização dos presídios coaduna com a Lex Mater, na medida, em que essa não proibiu, logo acabou por permitir tal possibilidade. No que tange as leis extravagantes, destacam-se: Decreto-Lei 200 de 25.02.67, que permitiu a contratação de empresas privadas para a prestação de serviços ao setor público; a Lei 5.645/70 (artigo 3º, parágrafo único) que enumera as atividades aptas a serem prestadas por empresas privadas: “relacionadas com transporte, conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhadas”; a Lei 8.666/93 que institui normas para licitações e contratos da Administração Pública, também permite a realização de obras e a prestação de serviços por terceiros; por fim, a Lei 11.079/04 (Lei das Parcerias Público-Privadas - PPPs) que adveio como um convite concreto ao setor privado para que se torne parceiro na construção e gestão de estabelecimentos prisionais. Todas essas normas, afinal de contas, permitem “uma saída interessante para a ampliação rápida das penitenciárias e a qualificação dos serviços aí prestados” (LEMOS, 2007, p. 129).
5.1 ANÁLISE DAS PRINCÍPAIS CRÍTICAS FEITAS À TERCEIRIZAÇÃO PRISIONAL
As críticas às propostas de terceirização são muitas, porém as benesses desse sistema também são evidentes.
A primeira crítica repousa na preocupação que se tem de a iniciativa privada focar apenas no lucro, olvidando dos seus deveres para com a ressocialização do preso e para o bem-estar da comunidade. Essa crítica fundamenta-se, no fato, de não se poder esperar que o empresário possua um espírito tão-somente filantrópico ao decidir construir e manter um presídio. No entanto, a solução para ela está no próprio art. 61 da LEP que estabelece os órgãos de execução penal:
Art. 61. São órgãos da execução penal:
I - o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária;
II - o Juízo da Execução;
III - o Ministério Público;
IV - o Conselho Penitenciário;
V - os Departamentos Penitenciários;
VI - o Patronato;
VII - o Conselho da Comunidade.
Em poucas palavras, esses órgãos mencionados possuem a incumbência legal de avaliar, inspecionar e acompanhar as execuções penais pelo país afora. Logo, já existe uma estrutura fiscalizadora definida em lei que poderá vigiar as medidas e as práticas adotadas por presídios terceirizados, controlando assim quaisquer distorções ou desvios dessas instituições.
Outrossim, refletindo-se sobre o anseio por lucros das empresas, poder-se-ia estabelecer, de forma contratual, o equivalente ao custo total do interno, mais uma taxa de administração peculiar, onde residiria justamente o lucro do empresário. Preservar-se-ia, assim, os resultados dos trabalhos intramuros, pois estes deveriam se converter quase na totalidade para o condenado, excluindo-se tão-somente os custos do empreendedor privado na produção do bem.
Edmundo Oliveira (1996), entretanto, propõe que
os lucros obtidos com o produto dos investimentos serão auferidos pelo grupo ou empresa privada, deduzidas as despesas de gerenciamento, prestação de serviços, manutenção, funcionamento do estabelecimento e remuneração condigna do trabalho dos presos (OLIVEIRA, 1996, p. 210).
Em poucas palavras, para o “problema do lucro” existem diversas soluções possíveis que mitigam o argumento que empresas privadas visarão apenas a lucratividade e falharão em suas atividades. Enfim, essa linha de pensamento é contraditório por si só, pois a empresa tenderá a dar o melhor de si, obtendo indicadores favoráveis de sua atividade, justamente, para perpetuar o negócio, manter sua rentabilidade e obter o retorno do capital investido na atividade.
Uma segunda crítica à terceirização defende que é dever constitucional exclusivo do Estado: punir e recuperar delinqüentes. Esse argumento contraria uma interpretação dada ao artigo 144 da Lex Mater[14] que entende a Segurança Pública como dever do Estado, mas, também, responsabilidade de todos, ou seja, a sociedade como um todo, incluindo aí a iniciativa privada, é responsável pela ordem pública e pela incolumidade das pessoas e do patrimônio (SILVA, 2007). Outrossim, a terceirização não transfere o ius puniendi a terceiros, apenas repassa a função de execução material, que pode ser traduzida na prestação de serviços de hotelaria e treinamento de pessoal.
Nesse contexto, acrescenta-se que o art. 4 da LEP já prevê a possibilidade do Estado “recorrer à cooperação da comunidade nas atividades de execução da pena e da medida de segurança”, ou seja,
não há nenhum impedimento para a atuação de empresas, órgãos ou entidades privadas no gerenciamento ou realização de obras ou serviços que envolvam qualquer “atividade extrajudicial” na execução da pena (OLIVEIRA, 1996, p. 205).
Uma terceira crítica projeta que o número de encarcerados aumentará e essa realidade será melhor para a empresa privada obter mais lucros[15]. Esse argumento é frágil, pois se percebermos, atentamente, o aumento da população carcerária pouco sofre influência do sistema prisional, haja vista os grandes responsáveis por enviar novos condenados ao sistema prisional são: a polícia, o poder judiciário e, principalmente, as leis. Essa última, por sua vez, destaca-se vis-à-vis a forte onda de Lei e Ordem que, atualmente, influencia a criação de normas penais (MACHADO, 2007).
Uma quarta censura à terceirização repousa no perigo da empresa ser controlada pelo crime organizado. Esse risco é inerente de qualquer contrato, porém tal possibilidade se enfraquece, na medida, em que a Administração Pública possa romper o contrato a qualquer indício de irregularidade, bem como estabeleça já no edital da concorrência pública, critérios para a seleção de empresas devidamente qualificadas e de boa reputação.
Outrossim, uma observação empírica da realidade atual já nos conduz para uma conclusão que, apesar de carente de dados estatísticos, percebe que boa parte de nossos presídios já são informalmente controlados pelo crime organizado através da corrupção[16]. Para constatar essa afirmação, basta lembrar dos últimos acontecimentos, chamados de a “maior onda de violência” que se tem notícia ocorrida em um Estado da Federação (São Paulo), em 12 de maio de 2006, onde do interior das penitenciárias, os líderes da organização criminosa intitulada PCC (Primeiro Comando da Capital) comandaram uma série de atentados à sociedade paulistana.
Outra crítica feita à terceirização aduz que as instituições privadas só vão querer presos bem comportados e irão deixar os mais perigosos para o Estado (THOMPSON, 2001). Essa crítica, por sua vez, nem parece estar desbotando a tese da terceirização dos presídios, pois, na realidade está apenas ratificando que o Estado deve focar-se em indivíduos realmente perigosos para seu funcionamento, ou seja, a máquina estatal deve sim manter presídios especiais para custodiar criminosos de tamanha periculosidade que põem em risco a própria ordem pública. Contudo, para os criminosos de menor periculosidade, os presídios terceirizados são uma perfeita solução, ressaltando que esses são a imensa maioria que incha atualmente o sistema prisional brasileiro.
A sexta apreciação desfavorável à terceirização entende que a empresa privada não investirá no progresso pessoal do preso, porque preferirá ter uma mão-de-obra limitada intelectualmente e não esclarecida. Esta crítica esquece-se que os índices de reincidência serão também indicadores para a avaliação da eficiência da prisão, pois quanto menor for o índice de reincidência, melhor será aquele modelo prisional e mais atraente economicamente ele será. Abrindo-se, ainda, a possibilidade de bonificação com o pagamento de prêmios-extras a tais instituições de excelência, desde que estipuladas previamente nos contratos.
Uma sétima crítica defende que os servidores penitenciários precisam de uma formação técnica homogênea para cuidarem da recuperação do preso. Tal assertiva não leva em conta o fato de, por exemplo, no “Espírito Santo, o quadro de funcionários [que trabalham em prisões] é constituído de 70% de cargos comissionados” (LEMOS, 2007, p. 70). Logo, a realidade já desnivela os funcionários que atuam no sistema prisional, porém a iniciativa privada devido a sua maior flexibilidade, oferece mais estímulos funcionais e melhores condições de trabalho aos seus empregados. Nesse sentido, Oliveira (1996, p. 219) acrescenta que “não é exagero dizer que os funcionários públicos estão menos dispostos a inovar, porque, em geral, não são recompensados por suas iniciativas”.
Critica-se, também, que uma empresa privada não pode impor sanção disciplinar a um preso, já que é com o Estado que ele possui relação jurídica. Nesse ponto, há que se distinguir, mais uma vez, que o poder da empresa privada não será jurisdicional, visto que esta função é
indelegável, [e] permanece nas mãos do Estado, que, por meio de seu órgão juiz, determinará quando um homem poderá ser preso, quanto tempo assim ficará, quando e como ocorrerá punição e quando o homem poderá sair da cadeia, numa preservação do poder de império do Estado, que é o único titular legitimado para o uso da força, dentro da observância da lei (LEMOS, 2007, p. 146).
Uma nona crítica acampa-se no receio de que a empresa privada implante um trabalho forçado, algo pouco provável, uma vez que a empresa prestadora de serviço deve respeitar a Lei 7.210/84 (Lei de Execuções Penal) que estabelece o trabalho como dever social do condenado, porém não o obriga a realizá-lo[17]. A inobservância desta lei por parte da empresa privada pode implicar na rescisão contratual.
Existe, ainda, um último argumento contrário que percebe o risco das empresas gastarem mais como publicidade para preservar a boa imagem e olvidarem-se das devidas despesas com sua atividade de prestação de serviços prisionais. O interessante é que esta crítica não percebe que a contratação das empresas para gestão dos presídios dar-se-á através de licitação, onde pouco valor terá a campanha publicitária da empresa, visto que os critérios são objetivos, conforme preceitua a já citada Lei 8.666/93.
Refutaram-se, acima, algumas críticas ao sistema prisional terceirizado, ressaltando a fragilidade desses argumentos. Destarte, considerando a realidade de falência visível do aparato prisional, é mister a inserção da iniciativa privada nesta realidade, visando contribuir com seu know-how e agregando conhecimentos a experiência prisional pública. Como afirma Oliveira (1996, p. 220), “quanto à eficácia do serviço privado, em matéria de economia e de pessoal, ela é incontestável”. Logo, somente unindo as forças poder-se-á superar a crise de Segurança Pública que vive, atualmente, a sociedade brasileira.
5.2 ALGUMAS EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO DO MODELO TERCEIRIZAÇÃO NO MUNDO E NO BRASIL
Apresenta-se, neste tópico, algumas experiências bem sucedidas de terceirização de presídios na Espanha e em alguns Estados brasileiros. Na obra “A dignidade humana e as prisões capixabas”, o Lemos destaca as vantagens do sistema terceirizado espanhol já na construção da unidade prisional, in verbis:
Existe um rigoroso sistema de controle de qualidade realizado pelo engenheiro responsável e por uma segunda empresa contratada para esse fim, sendo que as peças não aprovadas são imediatamente descartadas (LEMOS, 2007, p. 112).
Este cuidado com a construção é também observado nos sanitários, pias, chuveiros, torneiras, luminárias, canos, grades (retangulares), enfim o ambiente prisional terceirizado é distinto do observado em uma prisão pública. As condições são, nesse sentido, fortemente influenciadas pela eficiência inerente que se exige da iniciativa privada.
No Centro Penitenciário de Algeciras, localizado no sul da Espanha, “estão detidos presos de baixa, média e alta periculosidade, inclusive uma ala destinada a terrorista do ETA” (ibidem, p. 115). Prova-se, assim, que o sistema prisional sob a gerência da iniciativa privada é, perfeitamente, apto a implantar uma realidade mais eficiente à realidade prisional existente. Foi, assim, na Espanha e está sendo assim no Brasil.
No nosso país, também já existem alguns exemplos de sucesso que sustentam a eficiência do modelo terceirizado frente ao malogro da Administração Pública na gestão do sistema prisional.
No Paraná, existe a Penitenciária Industrial de Guarapuava e a Penitenciária para presos provisórios de Curitiba. Ambos estabelecimentos, são apontados como modelos, simplesmente, porque conseguem cumprir a risca a Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal). Trata-se de uma conquista que serve de exemplo aos outros presídios do nosso país e a prova encontra-se nos índices de reincidência, “perto dos 12%, contra os 70% do modelo público nacional” (ibidem, p. 99).
Outros casos de sucesso são encontrados no Ceará, no Amazonas, no Mato Grosso do Sul, na Bahia, em São Paulo e no Espírito Santo. No que tange a este último estado, há uma experiência pioneira no Presídio de Segurança Média de Colatina (PSMECOL) que, apesar das críticas de ter lesado os cofres públicos (LEMOS, 2007), mostra-se como bem sucedido e já está repercutindo na discussão de criação de outros presídios similares no mesmo Estado[18].
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diversos países vêm colocando em prática novos modelos administrativos de gestão moderna através da aliança com iniciativa privada: Estados Unidos, França, Inglaterra, Bélgica, etc. Apesar dessa tendência mundial, há no Brasil, ainda, uma forte resistência para a implantação de um modelo terceirizado de gestão prisional.
Nos Estados Unidos, o forte crescimento do número de presos influenciou sobremaneira o progresso da corrente a favor da privatização. Já na França, a superpopulação foi fator essencial para aumentar a participação do setor privado nos serviços penitenciários. No Brasil, existem os dois problemas, tanto está crescendo o número de detentos quanto a superlotação das prisões já é uma realidade. Logo, já passou o momento ideal e se está correndo o risco de perder o “bonde” definitivamente. Sendo assim, são cogentes a criação de vagas e a resolução da situação prisional, sob pena de pôr-se em risco toda a Segurança Pública Nacional.
A terceirização já é uma realidade, em grande parte dos presídios brasileiros, porém sua amplitude limita-se, ainda, ao fornecimento de alimentação ou de outros serviços (LEMOS, 2007). Há, também, os Centros de Ressocialização, em São Paulo, que com o auxílio das Organizações Não-Governamentais estão reduzindo os custos e os índices de reincidência da população carcerária do Estado bandeirante (NACIF, 2006).
Certamente, o combate ao crime só será eficaz com investimentos constantes e significativos nas áreas sociais e de infra-estrutura. Ao lado disso, o uso inteligente das leis penais e processuais deve sempre visar o respeito à ordem legal e aos objetivos fundamentais de nossa Constituição, quais sejam: a construção de uma sociedade livre, justa e solidária; erradicar a pobreza e a marginalização, reduzindo as desigualdades sociais e regionais; e, enfim, promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade quaisquer outras formas de discriminação. Esses devem ser os objetivos de quaisquer políticas públicas e, principalmente, na Segurança Pública.
Nesse artigo, defenderam-se alguns parâmetros que apontam uma alternativa a ser seguida, bem como indicam novas agendas de pesquisa de temas que envolvam a Segurança Pública, tais como: a viabilidade da privatização dos presídios, a finalidade das penas num contexto capitalista, os fatores que influenciam a tendência de aumento da criminalidade no Brasil, a dosimetria adequada na aplicação das penas, etc.
Por fim, a história das prisões evidencia que tal instituição, como lugar de cumprimento de pena, sempre esteve bem próxima do capitalismo, principalmente, na criação de corpos dóceis e úteis para a perpetuação do regime.
Portanto, deixar que uma das instituições que melhor representa o espírito do capitalismo, a empresa privada, divida também a responsabilidade pelos presídios é o caminho natural dentro do atual sistema.
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[1] Rogério Greco (2007) aduz, ainda, que a primeira forma de punição está na Bíblia, quando Deus expulsou Adão e Eva do Paraíso.
[2] O Panóptico de Bentham é a figura arquitetural dessa composição. O princípio é conhecido: na periferia uma construção em anel; no centro, uma torre; esta é vazada de largas janelas que abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção; elas têm duas janelas, uma para o interior, correspondendo às janelas da torre; outra que dá para o exterior, permite que a luz atravesse a cela de lado a lado. Basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um escolar. Pelo efeito da contraluz, pode-se perceber da torre, recortando-se exatamente sobre a claridade, as pequenas silhuetas cativas nas celas da periferia. Tantas jaulas, tantos pequenos teatros, em que cada ator está sozinho, perfeitamente individualizado e constantemente visível. O dispositivo panóptico organiza unidades espaciais que permitem ver sem parar e reconhecer imediatamente (FOUCAULT, 2005, p. 165-166).
[3] O sistema pensilvânico e o auburniano nasceram nos Estados Unidos. Já o progressivo possui dupla origem, pois sofreu influência tanto da Inglaterra quanto da Irlanda.
[4] Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).
§ 1º - Considera-se: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).
a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;
b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;
c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado.
§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).
[5] O isolamento e o silêncio eram quase absolutos. Tentou-se, ainda, diminuir esse isolamento com a permissão de certos trabalhos dentro da própria cela, porém eram freqüentemente trabalhos tediosos e sem sentido (BITENCOURT, 2001).
[6] Tal sistema é o adotado pelo Brasil, vide artigo 112 da Lei de Execução Penal de 11.07.84: “A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão”. (Redação dada pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)
[7] Visões evolucionistas das sociedades são etnocêntricas e são reputadas pela antropologia desde o final do século XIX com Franz Boas (LARAIA, 2006).
[8] “Chegou a ser considerado um dos cartões postais da cidade” (TEIXEIRA, 2007, p. 1).
[9] A partir de 1940, atingiu sua lotação máxima e entrou em decadência.
[10] No dia 2 de outubro de 1992, a rebelião na Casa de Detenção do Carandiru, foi reprimida pela invasão da Polícia Militar que resultou na maior chacina da história das penitenciárias brasileiras com a morte de 111 detentos.
[11] Nesse sentido, recomenda-se a leitura das seguintes bibliografias: BITENCOURT (2001) e NACIF (2006).
[12] A idéia de privatização não é nova. Segundo Thompson (2001), Jeremy Betham já havia sugerido a entrega da administração de prisões a particulares, em 1834, na Inglaterra, porém não obteve êxito junto ao Poder Público que refugou tal idéia.
[13] Existem dois modelos: o americano e o francês (ou europeu). Segundo Oliveira (1996), “nos Estados Unidos a iniciativa privada pode assumir a responsabilidade completa pela direção, gerenciamento e administração da prisão, inclusive pelo setor de serviço de segurança, na França foi implantado um modelo de dupla responsabilidade, cabendo ao próprio Estado e ao grupo privado o gerenciamento e a administração conjunta do estabelecimento” (p. 197-198).
[14] Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio (...).
[15] Nesse sentido, Thompson (2001, p. 84) afirma: “cria-se a vaga, cria-se o preso”.
[16] Thompson (2001, p. 91) chama esse fenômeno de “corrupção de varejo do sistema penitenciário oficial”.
[17] Art. 28. O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva.
§ 1º Aplicam-se à organização e aos métodos de trabalho as precauções relativas à segurança e à higiene.
§ 2º O trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho.
Art. 29. O trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a 3/4 (três quartos) do salário mínimo.
§ 1° O produto da remuneração pelo trabalho deverá atender:
a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outros meios;
b) à assistência à família;
c) a pequenas despesas pessoais;
d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores.
§ 2º Ressalvadas outras aplicações legais, será depositada a parte restante para constituição do pecúlio, em Caderneta de Poupança, que será entregue ao condenado quando posto em liberdade.
Art. 30. As tarefas executadas como prestação de serviço à comunidade não serão remuneradas.
[18] Palestra intitulada “O Sistema Prisional no Espírito Santo. e a Ressocialização do Preso”, proferida nas Faculdades de Vitória – FDV pela representante da SEJUS/ES, Quésia da Cunha Oliveira, em 04.10.2007.
Graduado em Administração com Habilitação em Comércio Exterior pelo Centro Universitário do Estado do Pará (CESUPA), Especializado em Docência do Ensino Superior pelo Centro Universitário do Estado do Pará (CESUPA), Especializado em Planejamento e Gestão do Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Pará (UFPA), Graduado em Direito pelas Faculdades Integradas de Vitória (FDV), Pós-Graduando em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Anhanguera - UNIDERP. Atualmente, é Administrador Pleno da Petróleo Brasileiro S/A (Petrobras) e instrutor da Universidade Petrobras (UP/EGN) no curso de "Logística e Transporte Internacional". Escritor das Colunas "Foco no Conceito" e "Concurseiro" da Revista Capital Público.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FARACHE, Jacob Arnaldo Campos. Prisões brasileiras: a terceirização como alternativa para a gestão do sistema prisional Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 fev 2009, 08:48. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/16646/prisoes-brasileiras-a-terceirizacao-como-alternativa-para-a-gestao-do-sistema-prisional. Acesso em: 23 dez 2024.
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