RESUMO: Discorre sobre as situações de cabimento do instituto de suspensão da segurança pelo Poder Público. Analisa se este instituto fere o princípio da isonomia.
Palavras-chave: Isonomia. Direitos Individuais. Direitos Coletivos. Mandado de Segurança.
ABSTRACT: Addressing the situation in the place of the institute for suspension of security by public powder. Analyze weether this institute wonds or not the principle of parity.
Key-words: Parity. Individual Rights. Colective Rights. Warrant Security.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO; 2 O MANDADO DE SEGURANÇA; 3 A SUSPENSÃO DA SEGURANÇA; CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS.
1 INTRODUÇÃO
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, inciso LXIX, manteve um instituto de suma importância para a garantia de direito individual ou coletivo, líquido e certo. Este direito poderá ser concedido contra atos discricionários e atos vinculados, cujo responsável pela ilegalidade ou abuso de poder seja autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. Trata-se do mandado de segurança, que o prejudicado ou aquele que se achar ameaçado de prejuízo a direito seu poderá valer-se quando tal direito não puder ser amparado por habeas corpus ou por habeas data.
O mandado de segurança é um instituto utilizado, seja por pessoa física ou jurídica, contra o Poder Público. Este, por sua vez, dispõe de um instituto, também previsto pela Constituição, cuja finalidade é sustar os efeitos gerados pelo mandado de segurança contra o Poder Público, sob a alegação de lesão causada à ordem, à economia, à saúde ou à segurança públicas (art. 4º da Lei nº. 4.348/64).
Mesmo considerando-se que o interesse público deve prevalecer sobre o interesse privado, é justo a consideração de que o particular é hipossuficiente em relação ao Poder Público. Dessa maneira, se faz importante a discussão no que concerne à relação entre a suspensão da segurança e o princípio da isonomia ou igualdade. Estará a suspensão de segurança ferindo este princípio fundamental? Esta questão será o foco do presente trabalho.
2 O MANDADO DE SEGURANÇA
O mandado de segurança é uma ação de natureza civil, é residual, pois só será ajuizado quando o direito líquido e certo a ser protegido não puder ser amparado por habeas corpus ou por habeas data; e tem por objeto a proteção de direito líquido e certo, lesado ou ameaçado de lesão, por ato ou omissão de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.[1]
Caberá mandado de segurança nas seguintes situações:
- ato comissivo ou omissivo de autoridade praticado pelo Poder Público ou por particular decorrente de delegação do Poder Público;
- ilegalidade ou abuso de poder;
- lesão ou ameaça de lesão;
- proteção ao direito líquido e certo não amparado por habeas corpus ou habeas data (caráter subsidiário).[2]
Não caberá mandado de segurança nas seguintes hipóteses (art. 5º - Lei nº. 1.533/51):
- quando houver recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução;
- contra decisão judicial ou despacho judicial para o qual haja recurso processual eficaz, ou possa ser corrigido prontamente por via de correição;
- contra ato disciplinar, a menos que praticado por autoridade incompetente ou com inobservância de formalidade essencial;
- contra decisão judicial com trânsito em julgado e contra lei ou ato normativo em tese, salvo se veicularem autênticos atos administrativos, produzindo efeitos concretos individualizados.[3]
Sempre será cabível o mandado de segurança se os itens acima descritos não forem suficientes para proteger o direito líquido e certo do impetrante.[4]
O STF e o STJ não têm competência originária para processar e julgar mandado de segurança impetrado contra qualquer ato ou omissão de Tribunal Judiciário.[5]
Se os requisitos necessários à medida liminar em sede de mandado de segurança se fizerem presentes, a concessão de medida liminar será fundamental à proteção de direito líquido e certo, sendo qualquer proibição por ato normativo inconstitucional, por deixar desprotegido o direito líquido e certo do impetrante.[6]
3 A SUSPENSÃO DA SEGURANÇA
Conforme mencionado anteriormente, a suspensão de segurança é um instituto disponível ao Poder Executivo, utilizando-o sempre que houver necessidade de suspensão das medidas de urgência contra o Poder Público, chocando-se com as garantias constitucionais do processo e com o direito de ação do particular contra o poder estatal.[7]
Dentre os doutrinadores, há divergências sobre a natureza jurídica do instituto da suspensão de segurança. Há quem entenda que se trata de um sucedâneo recursal; outros sustentam que é um ato administrativo; há quem defenda que a suspensão de segurança tem natureza de medida cautelar.[8]
O pedido de suspensão não pode ser considerado recurso por não ter tal previsão em lei, e também por não gerar reforma, anulação ou desconstituição da decisão liminar ou antecipatória, visa apenas suspender os efeitos da decisão, sem discutir sobre a sua justiça ou validade.[9]
A natureza da suspensão de segurança também não pode ser de ato administrativo, de competência discricionária do presidente do Tribunal. Tal controle administrativo seria uma função atípica do Poder Judiciário, e, de acordo com o princípio constitucional da separação dos poderes, qualquer função que não seja típica aos poderes deve ser permitida expressamente pela Constituição Federal. Além do mais, se fosse ato administrativo não teria a necessidade de provocação, típica da função jurisdicional.[10]
Outra corrente, e esta parece ser a mais sensata, entende que a suspensão de segurança é um incidente processual, com finalidade de contracautela, não se examinando o mérito da controvérsia principal, considerando apenas se houve lesão a interesses públicos relevantes.[11]
As medidas cautelares e outras liminares contra a Fazenda Pública podem ser sustadas através de um pedido de suspensão a ser intentado perante o presidente do respectivo Tribunal. Tal instituto pode ser aplicado à sentença proferida em processo de ação cautelar inominada, em processo de ação popular e na ação civil pública, antes do trânsito em julgado (art. 4º da Lei nº. 8.437/92).[12]
Todos aqueles inseridos no conceito de Fazenda Pública podem utilizar a suspensão de segurança, como a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios, as Autarquias e Fundações Públicas, assim como o Ministério Público. As concessionárias de serviço público integram a Administração Pública indireta, logo podem valer-se do instituto de suspensão de segurança, desde que, no exercício da atividade pública, houver algum provimento que lesione a ordem, a economia, a segurança e a saúde públicas.[13]
O presidente do Tribunal é quem tem competência para apreciar o pedido de suspensão, respeitando a hierarquia do Poder Judiciário. Mas, se, por exemplo, um juiz estadual estiver exercendo competência federal nos casos previstos pelo art. 109, § 3º - CF/88, a apreciação do pedido de suspensão caberá ao presidente do Tribunal Regional Federal, pois, nesse caso, o juiz estadual está hierarquicamente submetido ao TRF.[14]
Se o provimento de liminar ou de tutela antecipatória for concedido, originariamente, pelo Tribunal, o pedido de suspensão deverá ser intentado junto ao presidente do STF ou ao presidente do STJ, se, respectivamente, a causa tiver como fundamento matéria constitucional ou infraconstitucional.[15]
Caso o pedido de suspensão de segurança seja concedido monocraticamente por membro do Tribunal, e dessa decisão couber agravo interno, tal pedido deverá ser dirigido ao presidente do Tribunal a que pertence o relator (CPC, art. 527, inc. III). De acordo com entendimento do STF, no mandado de segurança, não cabe agravo da decisão do relator, logo, nesse caso, o pedido de suspensão em mandado de segurança deve ser dirigido ao STF ou ao STJ.[16]
Caberá agravo apenas contra a decisão do Presidente do Tribunal que:
- rejeita liminarmente o pedido de suspensão;
- concede liminarmente o pedido de suspensão;
- concede em caráter definitivo o pedido de suspensão após o contraditório;
- denega em caráter definitivo o pedido de suspensão, após o contraditório (ocorre o contraditório somente se o presidente do Tribunal admitir o incidente ou conceder, liminarmente, a suspensão da decisão).[17]
Se deferido o pedido de suspensão, a pretensão da Fazenda Pública estará atendida, restando ao autor da ação originária interpor agravo interno que será apreciado pelo Pleno ou pela Corte Especial. Se o agravo do autor não for acatado, conforme orientação do STF e do STJ, não cabe recurso extraordinário nem recurso especial de decisões proferidas no âmbito do pedido de suspensão, sendo mantida a suspensão até o trânsito em julgado da decisão de mérito na ação principal. A Fazenda Pública também poderá interpor agravo interno para o Pleno ou para a Corte Especial do respectivo Tribunal no caso de indeferimento do seu pedido de suspensão. Se o agravo interposto não for acatado, da mesma forma, não caberá recurso extraordinário nem recurso especial até o trânsito em julgado da decisão de mérito na ação principal.[18]
A vedação quanto à interposição de recurso especial e de recurso extraordinário é decorrente não da impossibilidade de análise de matéria de fato ou de prova, pois a lesão aos interesses que motivam a interposição de suspensão de segurança depende geralmente do contexto fático da demanda.[19]
Se confirmada a denegação do pedido de suspensão interposto pela Fazenda Pública, esta poderá renovar o pedido de suspensão após o julgamento proferido no agravo interno, agora para o presidente do STF ou do STJ, dependendo do fundamento, se constitucional ou infraconstitucional, respectivamente. A renovação ocorre para o Tribunal superior que irá suspender ou não a decisão de um juízo de primeira instância.[20]
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Poder Público conta com dupla proteção numa mesma situação processual. O novo regime do agravo confere ao Relator a possibilidade de conceder efeito suspensivo ao recurso em caso de perigo de dano de grave ou difícil reparação. Também a Medida Provisória nº. 2.180-35 concedeu mais uma possibilidade de suspensão da decisão pelos Tribunais superiores em favor das pessoas jurídicas de direito público, caso a primeira lhe seja negada, ou se for negado provimento a agravo de instrumento interposto contra a concessão de liminar ao particular (§§ 4º e 5º, da Lei nº. 8.437/92). Toda essa proteção ao Poder Público fere o princípio da isonomia, já que o próprio instituidor da norma é o seu beneficiário.
A supremacia do interesse público sobre o privado não é mais uma visão atual do Estado. Um dos objetivos das leis é frear o poder estatal, e não reforçá-lo ainda mais em detrimento do cidadão, tão hipossuficiente em relação ao Estado. Um Estado Democrático de Direito tem como uma de suas bases a igualdade. Para a existência de prerrogativas que beneficiem um dos litigantes, este deve ser mais frágil em relação à outra, sob pena de violação da paridade de armas e do princípio da isonomia.
O pedido de suspensão da segurança deve ser uma prerrogativa não do Poder Público, mas do interesse público. A Fazenda Pública dispõe de todos os meios processuais necessários à defesa do interesse público, não necessita de mais normas. Cabe ao Poder Judiciário fazer o juízo de valor sobre quais direitos, individuais ou coletivos, devem prevalecer diante de cada situação fática. O uso indiscriminado do instituto de suspensão da segurança torna o cidadão ainda mais vulnerável e distante de garantir seus direitos, estes cada vez mais restringidos pelo Poder Público.
REFERÊNCIAS
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 12 ed. São Paulo: Atlas, 2002.
BRANDÃO, Flávia Monteiro de Castro. “A suspensão das medidas de urgência nas ações contra o Poder Público à luz do devido processo legal”. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo: Dialética, 2003, n. 4.
DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. 4 ed. rev., amp. e atual. Editora JusPodium. Salvador, 2007, v. 3.
[1] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, 12 ed. cit., p.164.
[2] Ibid., p.164.
[3] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, 12 ed. cit., p.165.
[4] Ibid., p.165.
[5] Ibid., p.170.
[6] Ibid., p.172.
[7] BRANDÃO, Flávia Monteiro de Castro. “A suspensão das medidas de urgência nas ações contra o Poder Público à luz do devido processo legal”. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo: Dialética, 2003, n. 4, p. 29.
[8] Ibid., p.30.
[9] DIDIER JR, Fredie; Cunha, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. 4 ed. rev., amp. e atual. Editora JusPodium. Salvador, 2007, v. 3, p. 404 , 405 e 419.
[10] BRANDÃO, Flávia Monteiro de Castro. “A suspensão das medidas de urgência nas ações contra o Poder Público à luz do devido processo legal”. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo: Dialética, 2003, n. 4, p. 30 e 31.
[11] DIDIER JR, Fredie; Cunha, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. 4 ed. rev., amp. e atual. Editora JusPodium. Salvador, 2007, v. 3, p. 406.
[12] Ibid., p. 404.
[13] Ibid., p. 406 e 407.
[14] Ibid., p. 408.
[15] Ibid., p. 408.
[16] DIDIER JR, Fredie; Cunha, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. 4 ed. rev., amp. e atual. Editora JusPodium. Salvador, 2007, v. 3, p. 409.
[17] Ibid., p. 415.
[18] Ibid., p. 416.
[19] Ibid., p. 405.
Acadêmico do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB. E-mail: [email protected]
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FARIAS, Flávio Rocha. A suspensão da segurança, meio autônomo de impugnação das decisões judiciais de uso exclusivo do poder público, e o princípio da isonomia no âmbito recursal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 jan 2010, 09:12. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/19094/a-suspensao-da-seguranca-meio-autonomo-de-impugnacao-das-decisoes-judiciais-de-uso-exclusivo-do-poder-publico-e-o-principio-da-isonomia-no-ambito-recursal. Acesso em: 23 dez 2024.
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