Como é de conhecimento geral, o recolhimento da contribuição sindical do patronato difere da realizada pelo trabalhador. Aqui, quem faz o desconto no salário do empregado é o próprio patrão (fevereiro) e ao longo do mês de março efetua o recolhimento ao sindicato representativo da categoria profissional paritária a da patronal.
Já a empresa, no mês de janeiro, efetua seu recolhimento diretamente à entidade sindical devida. Portanto, fica claro que a hoje carcomida e caduca legislação sindical, representada pela Consolidação das Leis do Trabalho, subscrita por Getúlio Vargas no Estado Novo (década de 40) tornou o patrão agente de cobrança e repassador obrigatório da contribuição de seus empregados. Se não o fizer, ficará incurso nas penalidades prescritas em artigos constantes do Capítulo III da CLT.
E se a empresa deixar de pagar a contribuição sindical, compulsória obrigatória por ela devida à entidade representativa de sua categoria econômica, como fica? Das duas, uma. Ou será instada a fazê-lo de forma amigável e harmônica, ou sofrerá cobrança executiva.
Mas, enfim, a quem compete executar judicialmente? A Justiça comum ou a Justiça do Trabalho?
Até a edição da Emenda Constitucional Complementar 45/2004 as ações executivas de cobrança da contribuição sindical intentadas por sindicato, federação ou confederação respectiva contra o empregador eram processadas, claramente, na Justiça comum, exatamente porque o oposto ocasionava um cristalino conflito de competência.
Afinal, a Justiça do Trabalho é um órgão judicante criado exatamente para dirimir conflitos entre entes do setor profissional com o patronal e vice-versa. Assim, usualmente era considerada uma verdadeira heresia jurídica que a Justiça do Trabalho julgasse um feito proposto por uma entidade patronal contra um seu representado. Claro que tal matéria nunca foi ponto pacífico. Haviam divergências de interpretação. Mas a maioria dos magistrados entendia o problema dessa forma.
Todavia, com a cognominada “Reforma do Judiciário”, formalizada através da dita Emenda Constitucional 45, de 08 de dezembro de 2004, o entendimento passou a ser diferente. Segundo fonte do STJ –Superior Tribunal de Justiça (e corroborando com o acima explanado no tópico anterior) “antes da emenda constitucional, as discussões sobre representação sindical eram examinadas, de forma definitiva, pela Justiça comum; contudo, frequentemente a Justiça do Trabalho decidia a questão de maneira incidente, analisando-a de forma periférica no julgamento de processos em que se discutia estabilidade, enquadramento e financiamento sindicais. Assim, estava aberta a possibilidade de decisões contraditórias, com prejuízo à segurança do jurisdicionado.”
O mesmo informativo oficial do STJ prossegue: “do trabalho elaborado pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) no qual se conclui que a regra de competência prevista no inciso III do art. 114 da CF/88 abarca as ações relacionadas à representação sindical, mas também aquelas entre sindicatos, entre sindicatos e empregadores e entre sindicatos e trabalhadores, desde que a discussão se refira à atuação sindical(...)” Culmina dito informativo por esclarecer “que o entendimento que ficou firmado foi o de que, após a Emenda Constitucional 45, a Justiça do Trabalho passou a deter competência para processar e julgar tanto as ações sobre representação sindical (externa – relativa à legitimidade sindical –e interna- relacionada à escolha dos dirigentes sindicais) quanto os feitos intersindicais e os processos que envolvam sindicatos e empregadores ou sindicatos e trabalhadores. Dessa forma, as ações judiciais visando à cobrança da contribuição sindical propostas seja por sindicato, por federação ou confederação contra o empregador, também devem ser processadas e julgadas na Justiça do Trabalho. Após a edição da emenda, tornou-se inaplicável a Súmula 222/STJ, que determinava competir à Justiça comum processar e julgar as ações relativas à contribuição sindical prevista no artigo 578 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).”
Isto posto, vamos o que realmente interessa saber. Seja pela Justiça comum ou pela Trabalhista, interessa efetivamente à entidade patronal acionar cobrança executiva de contribuição sindical devida por seu filiado?
A resposta mais inteligente não poderia ser outra. Claro que não. Há de se esgotar todos os esforços no sentido de harmonizar amigavelmente a pendência. O que é importante saber é que, embora obrigatória, com conotação parafiscal e alojada no art. 149 da Constituição, a contribuição sindical não tem características mercantis. Não é igual que protestar um título oriundo de dívida de alguém que efetuou uma compra e não pagou. Sua utilização é claramente desagregadora. Num momento da vida sindical que se vislumbra claramente o fim da contribuição sindical compulsória e impositiva, diante de uma crise estrutural no setor sem precedentes, embora possível do ponto de vista legal, do ângulo prático é um tiro no pé recorrer ao judiciário. No instante que um sindicato patronal aciona na Justiça –e não importa se na comum ou na do Trabalho- um representado, um partícipe de sua categoria econômica, essa má escolha poderá transformar-se num caminho sem volta. Até porque e até que ela seja extinta, convém lembrar que a contribuição sindical é de periodicidade anual. Cobrada judicialmente as anteriores não pagas, como fica a próxima, vincenda? Quem acredita que o contribuinte passará a pagá-la religiosamente, como um cordeirinho espantado, deve ter perdido o juízo.
Isto mesmo. Perda de juízo. Nos dias atuais o quadro sindical patronal é completamente diferente de outrora. Hoje, é muito mais o sindicato que precisa do filiado do que o oposto. Enquanto no âmbito dos trabalhadores a contribuição sindical é descontada e repassada ao respectivo sindicato laboral, no patronal paga quem quiser. E quem focar no argumento de que o seu sindicato trata-se de uma entidade que lhe presta serviços e que de fato é merecedora da sua contribuição, terá o amparo geral. Jamais, porém, pelo simples e isolado caráter meramente institucional de órgão legal representativo da categoria econômica. Este galardão, isoladamente, nos dias atuais já não representa muita coisa aos olhos da coletividade econômica. Já foi o tempo que apenas isso bastava!
É por tudo isso que o meu trabalho profissional pauta pelo culto e prática do associativismo. Como eram as entidades na fase pré-sindical: associações civis que depois receberam do Estado (por meio do órgão governamental pertinente, isto é, o Ministério do Trabalho) a chamada “carta sindical”. Com ela obtiveram registro na Caixa Econômica Federal para a cobrança da contribuição obrigatória. Nos idos tempos de fartura econômica, ninguém reclamava da inadimplência, pelo seu pífio percentual. Mas à partir dos anos 90, com os planos econômicos mirabolantes iniciados no governo Collor, começaram as agruras das entidades patronais.
As dos trabalhadores não estão nem um pouco preocupadas, pois tem seus aportes de recursos garantidos pelo superado e viciado modelo getulista. Ungidas que foram por uma legislação ainda prevalecente, não obstante seus 70 anos de anacronismo, fazem do patrão o agente que é obrigado a descontar do salário do empregado e dar-se ao trabalho de repassar seu valor ao sindicato profissional respectivo.
Lembremos um claro exemplo disto. Quando, em passado recente, foi proposta no Congresso Nacional a Emenda Constitucional 21, de autoria do Deputado Augusto Carvalho (PPS/DF) alterando do art. 582 da CLT, passando a dispor “que o empregador somente poderá descontar a contribuição sindical compulsória de seu empregado se autorizado expressamente por este” o mundo sindical da ala dos trabalhadores foi acometido de um homérico chilique. E vejam bem. Não se falou em fim da contribuição sindical. Tão somente em que ficaria sob a incumbência do trabalhador efetuar ele mesmo, diretamente, o recolhimento, de vez que o que efetivamente capitula a obrigatoriedade de pagamento da contribuição sindical é art. 578. Assim, se a Emenda 21 fosse aprovada, o trabalhador continuaria sendo devedor da mesma. Não é preciso lembrar o que ocorreu. Além de vetada a Emenda 21, o governo aproveitou o ensejo para formalizar o reconhecimento das centrais sindicais e destinar-lhes a metade dos 20% a que faz jus do rateio da contribuição sindical...
Não importa se a substituição havida foi fruto de conquista de natureza corporativista de entidades associativas de magistrados da Justiça do Trabalho. Todos neste País tem o direito de lutar por conquistas legítimas que revertam em benefícios ao seu labor.
O que necessita é ser evidenciado se a substituição processual da Justiça comum pela Justiça do Trabalho na cobrança executória de contribuições sindicais patronais devidas e impagas, rigorosamente dentro do contexto de Lei em vigor, resultou em processo mais ágil e eficaz na solução deste tipo de conflito.
A resposta é a que se imagina: nenhuma!. O sindicato patronal que quiser acionar seu representado na Justiça do Trabalho tem de continuar pedindo ao Ministério do Trabalho a devida certidão de crédito e todo o idêntico ritual que antes era exigido na Justiça comum. Quanto ao aceleramento do feito, continua em idêntica lentidão.
O resultado, pois, é estéril. Como inexiste fonte oficial de consulta em que se possa cotejar os níveis de demanda e de resultados, servi-me de experientes e consagrados ases dos meandros da Justiça do Trabalho, formadores de opinião respeitados e calejados. Todos foram unânimes em afirmar que a medida em nada contribuiu para agilização dos processos desse naipe, até porque a demanda de julgamentos decorrentes de litígios trabalhistas decorrentes da velha “indústria da reclamação trabalhista” não foi freada, ainda que o esforço no sentido da conciliação seja cada vez mais potencializado.
Ainda assim, a Justiça do Trabalho continua entupida de feitos e a lentidão persiste como inexorável decorrência.
Assim, senhores dirigentes de sindicatos patronais, tenham em conta de que o melhor caminho para dirimir entraves derivados da falta de pagamento da contribuição sindical patronal ainda é a disposição ao diálogo à exaustão com o seu representado. A persuasão ainda é a mais indicada.
Isso só não é válido para quem não quer enxergar que o novo e redentor sindicalismo é um processo que se inicia de dentro para fora. Portanto, mudar para melhorar é a receita. O remédio? Não há outro, culto e prática do associativismo. A saúde financeira dos sindicatos de trabalhadores só melhor dos patronais em função do acima exposto. No instante em que essa legislação for revista ou simplesmente extinta, a quebradeira será total. Quem viver, verá!
(O autor é Consultor Sindical Patronal e dos livros O sindicalismo brasileiro clama por socorro (fev/2001) e S.O.S.SINDICALpt (março/2009) ambos pela Editora LTr. Consulte outros artigos em http://falvesoliveira.zip.net/ Contatos: [email protected] ou [email protected]
Consultor Sindical Patronal e autor de livros sobre o tema, editados pela Editora LTr, além de artigos publicados na mídia eletrônica. Maiores detalhes sobre o palestrante e suas obras em: http://falvesoliveira.zip.net/ . Contato: [email protected]
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Fernando Alves de. Cobrança de contribuição sindical patronal pela Justiça do Trabalho: Contrasenso jurídico ou exacerbado corporativismo? Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 fev 2010, 07:50. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/19274/cobranca-de-contribuicao-sindical-patronal-pela-justica-do-trabalho-contrasenso-juridico-ou-exacerbado-corporativismo. Acesso em: 23 dez 2024.
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