O dispositivo legal em apreço tem sido chamado pela doutrina de julgamentosumário de mérito, improcedência prima facie, sentença proferida inaudita altera parte, dentre outras denominações. Aduz o já citado dispositivo que pode o Juiz, quando a matéria abordada nos autos for exclusivamente de direito, julgar de plano a lide, dispensando a citação do réu, desde que já tenha proferido sentença de improcedência em outras ações em que se verifique identidade na causa de pedir e do pedido.
Vê-se assim que o art. 285-A define mecanismo inédito em nosso sistema processual, vez que não apenas autoriza o julgamento liminar do mérito (que já existia por conta da regra do art. 295, IV, do CPC, nos casos de prescrição e decadência), mas permite que tal sentença seja prolatada tomando por base tão somente outros julgamentos havidos em ações em que se tenha apreciado a mesma tese jurídica. Destaque-se que referida sentença será prolatada antes mesmo de se ter a citação do réu, pois já está formado o processo (e sua formação independe da citação do réu, tanto que o indeferimento da petição inicial acarreta sua extinção – CPC, arts. 267, I e 295).
Contudo, torna-se imperioso frisar que alguns requisitos despontam como necessários para que se tenha a aplicação do julgamento de mérito pautado em casos repetitivos:
O primeiro requisito é que a matéria alegada na petição inicial, e que, por evidente, será apreciada pelo julgador, seja unicamente de direito. Este requisito significa que, para a aplicação do dispositivo legal em apreço, a causa deve envolver matéria fática que possa ser comprovada pela prova documental. Na verdade, ser a matéria controversa unicamente de direito implica na completa irrelevância dos fatos, sendo apenas importante saber quais as conseqüências jurídicas daqueles fatos. Em relação ao tema, Cássio Scarpinella Bueno salienta que não se terá, propriamente, uma questão unicamente de direito, mas sim, questão predominantemente de direito, vez que sempre existirá a questão de fato, qualquer que seja a ação. Ocorre que, sobre tal questão de fato, não pesa qualquer dúvida quanto à sua existência, seus contornos e seus limites, sendo apenas relevante saber qual o direito aplicável sobre aqueles fatos que não geram dúvidas, que não geram controvérsia entre as partes e perante o juiz.
O segundo requisito consiste na exigência de que a tese jurídica ventilada na ação em curso tenha sido exatamente a mesma de outra ação (evidentemente, envolvendo partes distintas) em que se tenha julgado totalmente improcedente o pedido. Assim, por óbvio, não há que se ter ações idênticas, pois tal situação acarretaria o fenômeno da coisa julgada (ou litispendência, caso a “ação paradigma” ainda estivesse em andamento) e, conseqüentemente, daria ensejo à extinção do processo sem a resolução do mérito. O que se exige é que os casos sejam idênticos. De acordo com Humberto Theodoro Júnior , a identidade que se reclama, para aplicar o art. 285-A, localiza-se no objeto da causa, isto é, na questão (ponto controvertido) presente nas diversas ações repetidas.
Como terceiro requisito para a aplicação do art. 285-A tem-se a necessidade de que os julgamentos anteriores tenham ocorrido no mesmo juízo, que se entende como a mesma unidade de competência territorial, ou seja, a mesma comarca, vara ou subseção judiciária.
Já o quarto requisito constitui a necessidade de que não apenas um, mas pelo menos dois casos idênticos tenham sido julgados anteriormente, sendo certo que tais processos servirão como paradigma para a ação que será julgada.
Por fim, como quinto requisito tem-se que o provimento jurisdicional tem que ser de improcedência total do pedido ou dos pedidos. Se um dos pedidos não for improcedente, mesmo que a matéria seja exclusivamente de direito, não cabe, a aplicação do referido dispositivo. Também se um dos pedidos envolver matéria fática, não há se falar em extinção prematura do processo.
Diante do exposto, vê-se que o artigo 285-A do CPC contribui para a celeridade e efetividade do processo, não violando os princípios constitucionais do devido processo legal, contraditório e ampla defesa.
Assim, o Direito Processual do Trabalho, por ser um ramo especializado do Direito Processual, e por ter por escopo a efetividade do processo, sofre, por força do artigo 769 da CLT (que assevera que o direito processual comum é fonte do Direito Processual do Trabalho – Princípio da Subsidiariedade) os impactos das mudanças do Código de Processo Civil.
Sabe-se que o procedimento trabalhista é oral, sintético e célere, visando à rápida satisfação do crédito do trabalhador. Assim, em razão do caráter oral do processo do trabalho, de ser um processo de partes e de tentativas obrigatórias de conciliação, muitos questionam a aplicabilidade do artigo 285-A ao CPC do Direito Processual do Trabalho.
De acordo com Mauro Schiave, o art. 285-A é perfeitamente aplicável ao Processo do Trabalho. O autor elenca alguns argumentos favoráveis à aplicação do referido dispositivo ao Processo do Trabalho:
a)instrumentalidade do Processo do Trabalho; b)racionalidade e efetividade ao procedimento; c)compatibilidade com o rito trabalhista e omissão da CLT (artigo 769); d)a retirada da expressão “conciliar” do artigo 114, pela EC 45/04.
Os argumentos apontados pelo o ilustre autor para o reconhecimento da compatibilidade do artigo 285-A do CPC convencem, pois o processo do trabalho tem caráter instrumental, não sendo um fim em si mesmo. Desse modo, uma norma do CPC que seja mais efetiva que a CLT pode ser aplicada ao Processo do Trabalho, ainda que não omissa a CLT. Os problemas da falta de tentativa de conciliação são os mesmos enfrentados pelo CPC, que também privilegia a conciliação como método basilar de solução dos conflitos. Por isso, cabe ao juiz, ao observar o que ordinariamente acontece no juízo, e diante do número reduzido de possibilidades de acordos sobre a matéria, optar por não tentar a conciliação. Embora o processo do trabalho seja um procedimento de partes (artigos 843 e 844, da CLT), em caso de matéria de direito, o comparecimento do autor somente se dá para se evitar o arquivamento e o comparecimento do réu, para evitar a revelia. Embora, no processo do trabalho não exista o despacho de recebimento da inicial e o juiz tome contado com o processo somente em audiência, nada impede que o juiz adote o procedimento de despachar a inicial e sanear o processo antes da audiência, como já o fazem alguns juízes do trabalho. Assim, com a aplicabilidade do artigo 285-A do CPC, o juiz não está descaracterizando o processo do trabalho, mas apenas adaptando-o aos novos rumos da racionalidade, efetividade e celeridade processual, princípios estes tão cobrados da Justiça do Trabalho na atualidade.
Tem sido esse o entendimento da jurisprudência laboral:
EMENTA
RECURSO ORDINÁRIO. 1 - PRELIMINARES. NULIDADE. ART. 285-A DO CPC. Inocorre negativa de prestação jurisdicional, quanto ao tema da exibição de documentos, não só porque abordado em tópico específico da sentença como também ante o fato de que a negativa por omissão somente poderia ser considerada em reexame recursal se a parte houvesse provocado a imprescindível declaração na mesma instância. Quanto à aplicabilidade da Lei nº 11.277/2006 à Justiça do Trabalho, o acréscimo resultante na redação do art. 285-A do CPC, que introduz a sentença liminar no sistema processual, "atende à finalidade da norma que visa à celeridade processual, simplicidade, instrumentalidade, publicidade, princípios estes balisadores também do processo laboral" ( Francisco Gonçalves Neto). TRIBUNAL: 2ª RegiãoACÓRDÃO NUM: 20090405999 DECISÃO:26.05.2009TIPO: RO01 NUM: 00360 ANO: 2007/ NÚMERO ÚNICO PROC: RO01 - 00360-2007-030-02-00-7.RECURSO ORDINÁRIO.TURMA: 4 ªÓRGÃO JULGADOR - QUARTA TURMA.DOE SP, PJ, TRT 2ª Data: 05/06/2009
Destaque-se assim que, atualmente, se exige uma postura mais ativa do juiz para garantir os resultados práticos do processo. A efetividade do processo depende não só de um juiz imparcial e independente, mas também, de um magistrado mais ousado, comprometido com a justiça e com os resultados úteis do processo, logo a lei processual deve ser interpretada no sentido de que o processo, efetivamente, seja um instrumento da justa composição da lide.
Referências Bibliográficas:
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DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. v. 1. 7. ed. Salvador: Jus Podium, 2007.
DONIZETTI, Elpídio Donizetti. Curso didático de direito processual civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
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THEODORO JÚNIOR, Humberto. As novas reformas do Código de Processo Civil: leis nºs 11.187, de 19.10.2005; 11.232, de 22.12.2005; 11.276 e 11.277, de 07.02.2006; e 11.280, de 16.02.2006. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
SCHIAVE, Mauro.Manual de Direito Processual do Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2009.
SCHIAVE, Mauro. Comentários às questões polêmicas e atuais dos concursos. São Paulo: LTr, 2009.
Advogada, formada pela Universidade Federal do Maranhão-UFMA.<br>Pós-graduanda em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Anhanguera.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CHAVES, Maria Cláudia Gomes. A Lei 11277/2006 que introduziu o artigo 285-A no Código de Processo Civil e sua compatibilidade com os princípios do Processo do Trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 mar 2010, 02:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/19401/a-lei-11277-2006-que-introduziu-o-artigo-285-a-no-codigo-de-processo-civil-e-sua-compatibilidade-com-os-principios-do-processo-do-trabalho. Acesso em: 23 dez 2024.
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