Anistia
1. Conceito e Contexto histórico
Anistia conceitua-se como sendo um ato pelo qual uma autoridade concede o perdão a determinados indivíduos, geralmente por crimes de teor político.
Relatos indicam que tenha surgido na Grécia, no período de 594 a.C, no governo de Sólon que instaurou um regime democrático e concede atos de clemência ao reintegrar os direitos aos cidadãos perseguidos pelos regimes tirânicos antecedentes, concedendo assim o perdão a todos aqueles que foram perseguidos, exceto aos condenados por traição ou homicídio. Em Roma temos a figura do generalis abolitio, que segundo Rui Barbosa possuía os mesmos efeitos, o mesmo significado que anistia, significa esquecimento, ou perdão. No período medieval, com a ascensão do feudalismo, observa-se uma “vulgarização” desse conceito visto que, não havia nenhuma lei que regulamentasse sua concessão, era concedia a partir dos critérios pessoais de cada senhor feudal. Essa situação vai até a Revolução Francesa em 1791, onde a idéia de graça no texto da constituição ficou como uma atribuição privativa do Presidente da República e a anistia aparece pela primeira vez na Constituição como atribuição do poder legislativo. Após a Revolução Francesa, a anistia foi incorporada em diversas constituições da Europa, e permanece até os dias atuais.
Fica evidente que historicamente a anistia é um ato político que visa perdoar àqueles envolvidos em crimes e processos decorrentes contra os governos de forma a estabelecer a paz.
2. Histórico da Anistia no Brasil: Colônia, Império e República
No Brasil, a anistia tem uma longa história e data do período colonial no processo de colonização com o surgimento das capitanias hereditárias. Os donatários tinham um amplo poder e estes iam desde a aplicação da pena de morte a clemência. Assim, diversos condenados à pena de morte obteriam perdão ao se comprometer a lutar contra os invasores e rebeldes. Também houve muitas revoltas neste período, como por exemplo, a Insurreição Pernambucana em 1654, onde foi assinado um acordo de paz concedendo anistia aos derrotados. Em todos os movimentos revoltosos dessa fase, exceto na Inconfidência Mineira e na Conjuração Baiana, os envolvidos foram anistiados.
Entretanto, é apenas com a Independência e a Constituição de 1824 que a anistia passa a figurar como instituto constitucional, cabendo ao Imperador concedê-la ou não.
No período regencial ocorreram muitas rebeliões com características distintas. Em 1835, o Imperador concede a anistia a todas as pessoas envolvidas em crimes políticos até 1834 na província de Minas Gerais e do Rio de Janeiro. No final desse período, antecipando o Golpe da Maioridade, baixou-se um decreto de anistia geral.
No segundo reinado, têm-se as anistias de 1842, onde o Imperador anistiava os envolvidos em crimes políticos que foram cometidos neste mesmo ano nas províncias de São Paulo e Minas Gerais e a de 1875, que envolvia os bispos de Olinda e do Pará na “Questão Religiosa”.
Durante o Período Republicano é fácil de encontrar vários “momentos” de anistia desde os primeiros presidentes, estas geralmente foram concedidas a militares que participaram de algumas incursões revoltosas nesse primeiro momento republicano. Em 1930, quando Vargas toma o poder, ele concede anistia a todos os civis e militares que se envolveram nos movimentos revolucionários do país direta ou indiretamente. Outro momento “famoso” de anistia no país é quando é concedida anistia a todos os presos políticos, entre eles, Luís Carlos Prestes, em 1945, entretanto, essa anistia é parcial.
Com o golpe militar e a instauração da ditadura, tem-se um período de forte repressão, e com a instauração do AI-5, institucionaliza a ditadura, há forte censura e um controle rígido à imprensa, tudo que não estava de acordo com o regime era censurado. Surgem então diversos movimentos de esquerda, muitos foram mortos e presos, os que conseguiram escapar eram exilados. As organizações da sociedade civil têm um papel importante na denuncia das arbitrariedades cometidas pela ditadura. Depois de muita repressão, o movimento estudantil e operário saem as ruas e é nesse contexto que surgem os Comitês Brasileiros de Anistia.
Em 18 de agosto de 1979, o presidente, João Batista Figueiredo, encaminha um projeto ao Congresso Nacional que é aprovado e promulgado dias depois, era uma anistia geral, ampla e restrita, pois excluía os condenados pela pratica de terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal.
Em 1988, com a Constituição da República temos no art. 8º do seu ADCT, a concessão de anistia, sua fundamentação e a identificação dos destinatários (§5º) :
“ É concedida anistia aos que, no período de l8 de setembro de l946 até a data da promulgação da Constituição, foram atingidos em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares, aos que foram abrangidos pelo Decreto Legislativo nº 18 de 15/12/1961, e aos atingidos pelo Decreto-Lei nº 864 de 12/09/1969, asseguradas as promoções, na inatividade, ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo, obedecidos os prazos de permanência em atividades previstas nas leis, regulamentos vigentes, respeitadas as características e peculiaridades das carreiras dos servidores públicos civis e militares e observados os respectivos regimes jurídicos"
§ 5º - A anistia concedida nos termos deste artigo aplica-se aos servidores públicos civis e aos empregados em todos os níveis de governo ou em suas fundações, empresas públicas ou empresas mistas sob controle estatal, exceto nos Ministérios militares, que tenham sido punidos ou demitidos por atividades profissionais interrompidas em virtude de decisão de seus trabalhadores, bem como em decorrência do Decreto-Lei nº 1.632, de 4 de agosto de 1978 , ou por motivos exclusivamente políticos, assegurada a readmissão dos que foram atingidos a partir de 1979, observado o disposto no § 1º.. (ATO DE DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS).
Este artigo, entretanto, só veio a ser regulamentado em 2002, através da Lei nº. 10.569 de 13.11.2002 que criou em seu art. 12 a Comissão de Anistia e ficaria a encargo do Ministério da Justiça.
3. A anistia nos dias atuais
Prevista na Constituição Federal e no Código Penal, configura-se como uma excludente de punibilidade. Como já foi dito anteriormente, é o esquecimento jurídico do ato ilícito e tem por objeto os fatos definidos como crimes, não as pessoas, ou seja, refere-se aos atos cometidos não as pessoas que os cometeram. Pode ser aplicada a qualquer momento, entenda-se a qualquer momento, antes ou depois da sentença. Pode ser:
a) Própria: concedida antes da condenação
b) Imprópria: concedida após a condenação
c) Geral ou Plena: Cita fatos e atinge todos os criminosos.
d) Parcial ou Restrita: Cita fatos, entretanto exige uma condição pessoal;
e) Incondicionada: a lei não determina qualquer requisito para sua concessão.
f) Condicionada: a lei exige requisitos para sua concessão.
A anistia, é inaplicável aos delitos que se referem a “pratica de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afim, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos.” (art. 2º, Lei 8.072 /1990)
A Constituição Federal disciplina a lei que concede a anistia no art. 21, XVII e art. 48, vII que possuem caráter retroativo, isto é , ex tunc, “apaga” o crime como se ele nuca tivesse existido, extinguindo assim todos os efeitos penais (inclusive o pressuposto de reincidência) não abrangendo entretanto, os efeitos civis, ou seja, a obrigação de indenizar permanece; e é irrevogável, independe da aceitação dos anistiados. A concessão de anistia é de competência exclusiva do Congresso Nacional. Sendo concedida, o juiz declarará extinta a punibilidade (art. 187 da LEP)
Graça e indulto
A graça e o indulto juntamente com a anistia são formas de extinção da punibilidade (art.107, II, CP). A graça destina-se a pessoa determinada e não ao fato, já o indulto, é uma medida de caráter coletivo. Ambas, só podem ser concedidas pelo Presidente da Republica que pode delegar tal atribuição a Ministro de Estado ou a outras autoridades.
A graça, considerada como um indulto individual pode ser total, quando alcança todas as sanções impostas ao condenado, ou parcial, quando ocorre a redução ou substituição da sanção e possui por objeto os crimes comuns. A CF de 88, não consagra a graça como instituto autônomo apesar do CP assim a considerar, assim, ela é vista como um indulto individual. Ela pode ser provocada por petição do condenado, por iniciativa do Ministério Público, do Conselho penitenciário, ou da autoridade administrativa (art. 188 da LEP).
O indulto propriamente dito, ou indulto coletivo, destina-se a um grupo determinado de sentenciados e inclui os beneficiários tendo em vista a duração das penas que lhe foram aplicadas, além de outros requisitos subjetivos que poderão ser estabelecidos por lei. Pode ser total, com a extinção das penas, ou parcial, quando as penas são diminuídas ou substituídas, aqui observa-se que não há uma extinção da punibilidade, mas somente uma diminuição na diminuição da “reprimenda”, ou seja, abranda-se a penalização. Diferentemente da graça, é espontâneo, como citado anteriormente de competência do Presidente da República sendo delegável.
Assim como ocorre na anistia, não são aplicáveis aos delitos que se referem a “pratica de tortura, trafico ilícito de entorpecentes e drogas afim, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos.”
A graça e o indulto extinguem somente as sanções mencionadas nos respectivos decretos, permanecendo os demais efeitos da sentença condenatória, sejam penais ou civis. Não podem ser recusados, salvo no caso de ser condicionado, ou seja, onde existem certas condições para sua concessão.
Bibliografia:
· BITENCOURT, Cezar R. Tratado de Direito Penal : Parte Geral 1 . 14ª edição. São Paulo, Editora Saraiva, 2009.
· BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil:. Organização do texto: Marcos Antonio Oliveira Fernandes. 15ª. ed. São Paulo: Editora Rideel, 2009.Coleção de Leis Rideel.
· BRASIL.Lei nº 8.072. de 25 de julho de 1990. Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providencias. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/LEIS/L8072.htm > Acesso em 29 de novembro de 2009.
· COSTA, Homero de O. Incursões na História das Anistias Políticas no Brasil. Disponível em < http://www.dhnet.org.br/direitos/anthistbr/redemocratizacao1988/homero_anistia.html > . Acesso em 27 de novembro de 2009.
· MIRABETE, Julio F. ; FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal, Parte Geral I. 25ª edição revista e atualizada. São Paulo. Editora Atlas. 2009
Acadêmica do Curso de Direito da Universidade Tiradentes - Aracaju/SE.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PERETE, Itala Rayara Santos. Anistia, graça e indulto Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 abr 2010, 01:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/19712/anistia-graca-e-indulto. Acesso em: 23 dez 2024.
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