A Constituição Federal, em seu artigo 22, inciso XXVII atribui competência privativa à União para legislar sobre "normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios", bem como nos casos se exploração de atividade econômica pelas empresas públicas e sociedades de economia mista, observando, para estas, o disposto no artigo 173, §1º.
Tal competência legislativa deve obedecer, ainda, ao disposto no artigo 37, XXI da CF que dispõe acerca da obrigatoriedade de ser a contratação precedida de licitação pública e realizada em procedimento isonômico. Este dispositivo foi regulamentado pela Lei 8.666/1993, que estabelece as regras do certame de observância obrigatória a todos os entes federados[1].
O artigo 173, §1º da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional 19/1998 prevê a existência de um estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços dispondo sobre licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública[2].
Entretanto, deve-se ressaltar que apesar da referida previsão de estabelecimento de normas mais flexíveis para as referidas entidades, enquanto o regulamento não for editado entende-se que, "por força do expresso comando do art. 12 da Lei 8.666/1993, as normas gerais obre licitações e contratos públicos constantes da Lei 8.666/1993 são de observância obrigatória, também, para todas as empresas públicas e sociedade de economia mista"[3].
Observe-se, por oportuno, que a doutrina e jurisprudência entendem que as entidades estatais exploradoras de atividade econômica, não são obrigadas a licitar em caso de alienação cujo objeto for relacionado à sua atividade-fim, uma vez que a sua atividade poderia restar inviabilizada devido à impossibilidade de concorrência[4].
Quanto ao caso da Petrobrás, importante registrar que o artigo 67 da Lei 9.478/1997 estabelece procedimento licitatório simplificado. O dispositivo foi regulamentado pelo Decreto 2.745/1998 e tem a sua constitucionalidade discutida perante o Supremo Tribunal Federal. A Corte Suprema não tem posição definida até o presente momento, mas existe forte tendência em ser considerado legítimo tal procedimento simplificado[5].
O Supremo Tribunal Federal, nos julgamentos do MS 21.797-9 e da ADIN 1.717/DF declarou a natureza autárquica dos conselhos de fiscalização profissional, motivo pelo qual o Tribunal de Contas da União tem se manifestado no sentido de que estes conselhos de classe estão obrigados a licitar, conforme v.g., acórdão 1.889/2007: "(...) Os conselhos de fiscalização profissional sujeitam-se aos princípios constitucionais aplicáveis à Administração Pública e devem observar, portanto, os ditames da Lei nº 8.666/93"[6].
Entretanto, o STF concedeu à Ordem dos Advogados do Brasil uma posição diferenciada consagrando uma “discriminação juridicamente insustentável”[7] reconhecendo-lhe natureza de “autarquia sui generis”, e lhe desobrigando de realizar licitações.
Organizações Sociais são entidade privadas organizadas de acordo com os padrões próprios da iniciativa privada (Lei 9.637/1998), não se admitindo, portanto, a influência Estatal em sua constituição e funcionamento. Dessa forma, os recursos recebidos por estas entidades deverão ser geridos nos parâmetros exigidos pela iniciativa privada, não estando subordinados à licitação, mas podendo ser aplicadas as regras de improbidade administrativa[8].
Já as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP's), regulamentadas pela Lei 9.790/1999, nos termos das reiteradas decisões da referida Corte de Contas, não são obrigadas a seguir a regras da Lei de Licitações, uma vez que se submetem a regulamento próprio, mas devendo observância aos princípios da Administração Pública. Transcrevo trecho de um dos acórdãos do TCU sobre o tema[9]:
(...) as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público - Oscips, contratadas pela Administração Pública Federal, por intermédio de Termos de Parceria, submetem-se ao Regulamento Próprio de contratação de obras e serviços, bem como para compras com emprego de recursos provenientes do Poder Público, observados os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e da eficiência, nos termos do art. 14, c/c o art. 4º, inciso I, todos da Lei 9.790/99 (...)
Todavia, quanto a estas duas últimas categorias de entidades (Organizações Sociais e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público) registre-se a necessidade de licitação pública para realização de contrato de gestão e de termo de parceria. Nesse sentido[10]:
(...) É obrigatória a adoção de procedimento licitatório para realização tanto do contrato de gestão como do termo de parceria. Não é facultado à Administração escolher, sem prévio procedimento licitatório, uma determinada organização da sociedade civil para realizar um "termo de parceria" e, a partir daí, atribuir-lhe recursos para contratações as mais diversas não subordinadas a licitação. Isso seria a porta aberta para a fraude e a destruição da regra constitucional da obrigatoriedade da Licitação. Bastaria a própria Administração produzir o nascimento de uma "organização", submetida a seu estrito controle, e dela se valer para realizar todo o tipo de contratação sem prévia licitação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Administrativo Descomplicado. Marcelo Alexandrino, Vicente Paulo. 17ª ed. rev. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense. São Paulo: Método, 2009.
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 12ª ed. São Paulo: Dialética, 2008
BRASIL. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/_Constitui%C3%A7aoCompilado.htm. Acesso em 20.11.2009.
BRASIL. LEI 8.666 DE 21 DE JUNHO DE 1993. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8666compilado.htm. Acesso em 20.11.2009.
BRASIL. Lei nº 8.666 de 21 de junho de 1993. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8666compilado.htm. Acesso em 20.11.2009.
BRASIL. STF. Informativos 426 e 522. Brasília, maio/2006 e outubro/ 2008. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/informativo/pesquisarInformativo.asp. Acesso em 20.11.2009.
Notas:[1] Lei 8.666/93. Art. 1º. Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Parágrafo único. Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
[2] CF. Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (...) III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública; (...)
[3] ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Administrativo Descomplicado. Marcelo Alexandrino, Vicente Paulo. 17ª ed. rev. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense. São Paulo: Método, 2009, p. 536.
[4] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 12ª ed. São Paulo: Dialética, 2008. pp. 27/28
[5] Informativo 426. AC 1193 QO-MC/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 9.5.2006. (AC-1193): A Turma, resolvendo questão de ordem, deferiu medida cautelar para emprestar efeito suspensivo a recurso extraordinário interposto pela Petróleo Brasileiro S/A - Petrobrás contra acórdão do STJ que, também em medida cautelar, restabelecera a eficácia de tutela antecipada que suspendera as suas licitações, as quais utilizavam procedimento licitatório simplificado, previsto na Lei 9.478/97 e regulamentado pelo Decreto 2.745/98.
Informativo 522. RE 441280/RS, rel. Min. Menezes Direito, 30.9.2008. (RE-441280): A Min. Cármen Lúcia abriu divergência e proveu o recurso extraordinário por considerar que os princípios constantes do art. 3º da Lei 8.666/93 e as regras, genéricas, que estruturam o instituto da licitação, aplicam-se indistintamente a todos os entes integrantes da Administração Pública, seja direta ou indireta. Não vislumbrou, em conseqüência, obstáculo para que a recorrida adotasse o processo licitatório. No ponto, realçou que o processo seria um meio, enquanto o procedimento, um modo e que este diferenciar-se-ia para empresas prestadoras de serviço público e para empresas que intervêm na atividade econômica.
[6] TCU. Acórdão 1889/2007 - Plenário. Processo 003.042/2004-7. Ministro Relator RAIMUNDO CARREIRO.
[7] JUSTEN FILHO, Marçal. op. cit. p. 24.
[8] JUSTEN FILHO, Marçal. op. cit. p. 37.
[9] TCU. Acórdão 1777-43/05-p. Processo 008.011/2003-5.Sessão: 09/11/05. Grupo: II. Classe: V. Relator: Ministro MARCOS VINICIOS VILAÇA.
[10] JUSTEN FILHO, Marçal. op. cit. p. 38.
Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Sergipe; Servidor do Ministério Público Federal em Sergipe. Pós-graduando em Direito Público pela Universidade Anhanguera-UNIDERP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DIAS, Aldo Luiz de Menezes. A aquisição de bens e serviços e pelos Conselhos de Classe, Petrobrás, Organizações Sociais e OSCIP'S ante a Lei de Licitações Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 jul 2010, 07:55. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/20512/a-aquisicao-de-bens-e-servicos-e-pelos-conselhos-de-classe-petrobras-organizacoes-sociais-e-oscip-s-ante-a-lei-de-licitacoes. Acesso em: 23 dez 2024.
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