Introdução
No que tange ao rito procedimental, a nova Lei Antidrogas impôs notórias modificações acerca dos prazos processuais, tornando-os mais longos que os da Lei nº 10.409/02.
Nessa seara, somando-se todos os prazos do atual diploma, não mais existe aquele total de 36 (trinta seis) dias previsto na lei anterior, que após a entrada em vigor da Lei nº. 8.072/90, Lei dos Crimes Hediondos, passou a ser de 72 (setenta e dois) dias. Tampouco é aplicado o prazo de 81 (oitenta e um) dias previsto no rito ordinário do Código de Processo Penal. Com o advento da nova lei, a soma total dos prazos que rege seu rito passou a ser de 180 (cento e oitenta) dias.
1. Inquérito Policial
Os prazos para a conclusão do inquérito policial foram ampliados. Enquanto a Lei nº. 10.409/02 previa um prazo de 15 (quinze) dias, se o indiciado estivesse preso, e 30 (trinta) dias, se estivesse solto, a nova Lei Antidrogas estabelece que, uma vez surpreendido o agente em flagrante delito, deverá a autoridade policial proceder à lavratura do respectivo auto, comunicando ao juiz competente no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, devendo concluir o inquérito policial no prazo de 30 (trinta) dias, se o acusado estiver preso, ou 90 (noventa) dias, se estiver solto, conforme dispõe o seu art. 51, in verbis:
Art. 51. O inquérito policial será concluído no prazo de 30 (trinta) dias, se o indiciado estiver preso, e de 90 (noventa) dias, quando solto.
Parágrafo único. Os prazos a que se refere este artigo podem ser duplicados pelo juiz, ouvido o Ministério Público, mediante pedido justificado da autoridade de polícia judiciária. (Art. 51 da Lei 11.343/06)
Na realidade, o prazo de 30 (trinta) ou 90 (noventa) dias para a conclusão do inquérito policial, ainda mais em se tratando dos crimes previstos na Lei nº 11.343/06, dadas as suas peculiaridades, consiste, de acordo com os processualistas modernos, num razoável lapso temporal para que a autoridade policial possa, efetivamente, providenciar todas as formalizações e diligências necessárias para encaminhá-lo com segurança ao juízo competente, para que este comunique ao Ministério Público, titular da ação penal pública.
Também é importante ressaltar que o parágrafo único do artigo em epígrafe prevê expressamente a possibilidade de haver a duplicação dos prazos, desde que exista real necessidade para que a autoridade policial possa, como já mencionado, proceder a eventuais diligências que se façam misteres para o encaminhamento do inquérito a juízo.
Nesse sentido, em relação à necessidade de a autoridade policial proceder às diligências durante o Inquérito Policial, Fernando da Costa Tourinho Filho ensina que[1]:
De qualquer sorte, instaurado o inquérito, a Autoridade Policial deve determinar uma série de diligências visando ao esclarecimento do fato e à descoberta da autoria, observada a regra programática prevista no art. 6º. Do CPP. Ali há uma série de diligências que podem ou devem ser realizadas conforme a natureza da infração. O item I, com a redação dada pela Lei n. 8.862, de 28-3-1994, por exemplo, determina deva a Autoridade Policial “dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e a conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais”. Evidente que o Delegado de Polícia não tomará essa providência em qualquer crime. Se houver um crime de calúnia, de lesão corporal, por exemplo, não será realizada tal diligência. E as razões são óbvias[...](TOURINHO FILHO, 2006, p. 05).
Outrossim, Guilherme de Souza Nucci destaca que, “estando preso ou solto o indiciado, o órgão ministerial terá o prazo exíguo de dez dias para se manifestar” [2] (pela Lei 6.368/76 o prazo era de três dias, caso o indiciado estivesse preso). Ultrapassado esse lapso temporal, e estando o investigado preso, configurar-se-á constrangimento ilegal, devendo ser posto em liberdade.
Convém, ainda, ponderar o fato de que a doutrina mais abalizada, bem como a jurisprudência pátria em geral, firmam o entendimento de que se os prazos estabelecidos em lei para a conclusão do inquérito não forem categoricamente obedecidos não acarretará, como consectário necessário, o relaxamento da prisão do indiciado, mesmo porque em se tratando especificamente dos crimes previstos na Lei nº 11.343/06 haverá casos em que a apuração dos fatos será de difícil elucidação.
Diante dessas possíveis dificuldades, Zenildo Bodnar[3] ensina que:
Esta conclusão decorre do fato de que em função da especial complexidade de algumas investigações, pode ocorrer atraso justificado para além do prazo legalmente previsto. Nessa hipótese o excesso de prazo deverá ser avaliado no conjunto de etapas utilizadas até o término da instrução e não apenas analisado isoladamente considerando a fase do inquérito. Caso ocorra atraso injustificado, considerando o conjunto de etapas do procedimento, aí sim deverá ser assegurado ao réu o direito à liberdade. (BODNAR, 2006 et al, p. 179)
Portanto, ao instituir os novos prazos para a conclusão do inquérito policial como procedimento administrativo que tenha por escopo apurar os delitos previstos na Lei nº. 11.343/06, quis o legislador tão somente estabelecer um lapso de tempo razoável a fim de que seja angariado o necessário substrato probatório com o escopo de que o Ministério Público tenha as melhores condições possíveis para promover a respectiva Ação Penal Pública, não significando que os aludidos prazos não possam ser estendidos caso a complexidade da investigação assim exija.
2 Instrução Criminal
Quanto à instrução criminal, há de se observar que a Lei nº 11.343/06 trouxe importantes alterações, em relação à revogada Lei nº. 10.409/02.
Nesse contexto, o art. 54 da nova lei assim dispõe:
Art. 54. Recebidos em juízo os autos do inquérito policial, de Comissão Parlamentar de Inquérito ou peças de informação, dar-se-á vista ao Ministério Público para, no prazo de 10 (dez) dias, adotar uma das seguintes providências:
I - requerer o arquivamento;
II - requisitar as diligências que entender necessárias;
III - oferecer denúncia, arrolar até 5 (cinco) testemunhas e requerer as demais provas que entender pertinentes. (Art. 54 da Lei 11.343/06)
Assim, verifica-se que ocorreram três inovações.
A primeira delas é a inserção da possibilidade de o juiz receber relatório de Comissão Parlamentar de Inquérito, sendo que tal medida já era prevista pela Lei nº. 10.001/00, de 04 de setembro de 2000, conforme estabelece seu art. 1º, in verbis:
Art. 1o Os Presidentes da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional encaminharão o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito respectiva, e a resolução que o aprovar, aos chefes do Ministério Público da União ou dos Estados, ou ainda às autoridades administrativas ou judiciais com poder de decisão, conforme o caso, para a prática de atos de sua competência. (Art. 1º da Lei 10.001/00)
Essa mesma lei estabelece em seu art. 2º que, recebidas as peças da CPI, a autoridade a quem foi encaminhada deverá dar ciência ao remetente “no prazo de trinta dias, as providências adotadas ou a justificativa pela omissão” (art. 2º, da Lei nº. 10.001/00).
A segunda mudança ocorrida em face da Lei nº 10.409/02 é a possibilidade de o magistrado receber qualquer outra peça informativa. A respeito dessa alteração, Marcello Granado[4] afirma que:
À luz do art. 40 do CPP, a referência pode parecer desnecessária. Entretanto, não é. É que, conforme o citado art. 40 do CPP quando, em autos, ou papéis de que conhecerem, os juizes ou tribunais verificarem a existência de crime de ação penal pública, remeterão ao Ministério Público as cópias e os documentos necessários ao oferecimento da denúncia. Nota-se que o disposto no CPP confere aos juízes a possibilidade de um juízo de valor acerca da existência de crime como condição para as remessas das peças ao MP. (GRANADO, 2006 et al, p. 193)
Dessa feita, o magistrado aguardará a manifestação do representante do Ministério Público para proceder ao arquivamento das peças de informação.
A terceira e última alteração trazida pelo artigo em tela é a supressão da contradição que existia no teor dos incisos I e IV do art. 37 da Lei nº 10.409/02. Tais dispositivos estabeleciam respectivamente que poderá o representante do Ministério Público, ao receber os autos do inquérito policial, adotar as seguintes providências: “I – requerer o arquivamento”, ou ainda; “IV – deixar, justificadamente, de propor ação penal contra os agentes ou partícipes dos delitos”.
Nesse contexto, o doutrinador Guilherme de Souza Nucci [5]assinala que:
Requerimento de arquivamento: previsão inútil. Não há razão alguma para a lei especial prever situação já descrita satisfatoriamente no Código de Processo Penal. Quando o Ministério Público recebe inquérito policial concluído (ou outras peças de informação), pode requerer o arquivamento. Em caso de discordância, o juiz, na esfera estadual, segue o disposto no art. 28 do CPP [...] Na esfera federal, remete-se o feito para apreciação de uma Câmara Criminal, composta por membros do Ministério Público Federal de 2.º grau, que tomará as mesmas providências já descritas. (NUCCI, 2006, p. 821-822)
Assim, mostrou-se bastante pertinente a exclusão de tal contradição pela Lei nº 11.343/06, como esclarece Marcello Granado ao afirmar que “‘requerer o arquivamento’ como previsto naquele revogado inciso I já era suficiente, já que tal promoção deveria ser fundamentada (justificada) como preceitua o art. 129, VIII, da CRFB”.
3 Defesa prévia
Quanto à defesa prévia, antes de ordenar a notificação do denunciado, deverá o magistrado exercer o que Marcello Granado [6](2006) denomina de “juízo de admissibilidade prévio”, averiguando se a denúncia obedece às formalidades previstas no art. 41 do Código de Processo Penal.
Sendo o referido juízo positivo, a nova Lei Antidrogas manteve, ainda, a fase de defesa preliminar do denunciado, que já era prevista na Lei nº. 10.409/02. O art. 55 do atual diploma estabelece que o acusado terá dez dias para apresentar sua defesa prévia, contados a partir da notificação judicial.
É importante frisar que o Superior Tribunal de Justiça, em recente decisão, manteve o entendimento que já adotava durante a vigência da Lei nº. 10.409/02 segundo o qual deverá o magistrado, antes do recebimento da denúncia, possibilitar ao acusado o oferecimento da defesa prévia, sob pena de nulidade absoluta de todo o processo desde o recebimento da denúncia, conforme se observa na ementa transcrita a seguir:
CRIMINAL. RHC. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. NULIDADE. DEFESA PRELIMINAR NÃO APRESENTADA ANTES DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. INOBSERVÂNCIA DO PROCEDIMENTO DA LEI N.º 10.409/02. PRESCINDIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. DIFICULDADE DE DEMONSTRAÇÃO. NULIDADE CONFIGURADA. REVOGAÇÃO DA LEI PROCESSUAL. VIGÊNCIA DA LEI N.º 11.343/2006.
PROCEDIMENTO QUE DEVE SER APLICADO AO CASO. EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ DE SOLTURA DETERMINADA. ORDEM CONCEDIDA.
Hipótese na qual ao recorrente foi imputada a prática do crime de tráfico de entorpecentes, sendo que o Juízo monocrático recebeu, de pronto, a inicial acusatória, sem possibilitar a apresentação de defesa prévia. Com a modificação do procedimento penal para a apuração dos crimes que envolvem substâncias entorpecentes, a instrução criminal deve ser realizada nos moldes estabelecidos pela nova lei. A teor do art. 38 da Lei n.º 10.409/2002, há necessidade de abertura de prazo para a apresentação de defesa preliminar antes do recebimento da denúncia, a todos os procedimentos em andamento durante a vigência da Lei n.º 10.409/2002, a qual foi publicada em 11/01/2002. É prescindível a comprovação de prejuízos para justificar a anulação do processo, tendo em vista a dificuldade de demonstrá-los. Precedentes do STF. A Lei n.º 10.409/2002, vigente à época do processamento do feito, foi revogada pela Lei n.º 11.343/2006, publicada em 24/08/2006, a qual se encontra vigente no presente momento e contém, em seu artigo 55, a mesma regra de notificação do réu para apresentar defesa preliminar antes do recebimento da peça acusatória, devendo, portanto, ser respeitado o rito processual descrito nesse novo Diploma Legal, em obediência ao art. 2º do Código de Processo Penal. Deve ser cassado o acórdão recorrido e anulada ação penal instaurada contra o recorrente, desde o recebimento da denúncia, inclusive, a fim de lhe ser concedida a oportunidade de apresentação da defesa preliminar, respeitando-se o procedimento estabelecido na Lei n.º 11.343/2006, com a conseqüente expedição de alvará de soltura em seu favor, se por outro motivo não estiver preso. Recurso provido, nos termos do voto do Relator. (STJ, RHC 20821 / SP - RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS 2007/0026968-8. Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA. Ministro Relator, GILSON DIPP, Julgado em 19/04/2007).
Porém, é necessário ressaltar que apenas a não concessão da oportunidade para apresentação da defesa prévia é que vai gerar a nulidade do processo, uma vez que, dado o referido prazo ao acusado, não há que se falar em nulidade, já que não houve violação do contraditório e a ampla defesa.
Deve-se observar que essa defesa não é de cunho obrigatório. Porém, deve ser concedido ao acusado o prazo para a sua apresentação, como bem esclarece Fernando da Costa Tourinho Filho [7] ao lecionar que:
Muito embora a defesa prévia não tenha caráter de obrigatoriedade, como se constata pela leitura do art. 396 e parágrafo único do art. 401, ambos do CPP, não deve o Advogado descurar-se daquele prazo de três dias a que se refere o art. 395 do mesmo código. Em outras palavras: embora a defesa prévia não seja peça essencial do processo, o Advogado não deve deixar passar em brancas nuvens aquele prazo para oferecê-la. Por quê? Em virtude do que se contém nos arts. 395, 397 e 399 do CPP. (TOURINHO FILHO, 2006, p 206)
Não obstante o autor retro mencionado ter se referido à defesa prévia de forma geral, ou seja, aquela prevista no Código de Processo Penal, o sentido utilizado em suas palavras abrange todas as conjecturas em que seja possível a aplicação desse instituto prévio, inclusive nos casos dos crimes disciplinados pela nova Lei Antidrogas, devendo ser conferido ao acusado o prazo de dez dias para o oferecimento de sua defesa prévia.
Outra questão a se destacar é a fundamental importância da defesa prévia para o acusado. Acerca desse ponto, Marcello Granado[8] ensina que:
A defesa prévia antes do recebimento da denúncia é, em geral, providência salutar reclamada diante do art. 5º., LV, da CFFB, haja vista o constrangimento que a própria existência de uma ação penal traz para o status dignitatis do indivíduo. Entretanto, a prática da defesa preliminar, já sob a égide da Lei nº 10.409/02, mostrava que, principalmente nos casos com prisão em flagrante, o alargamento do procedimento tornava o rito, nas mais das vezes, desnecessariamente longo, inclusive com dois interrogatórios. Porém, a providência de defesa preliminar antes do juízo de admissibilidade definitivo é importante, principalmente considerando que se assentou na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que o recebimento da denúncia é preclusivo para o juiz, isto é, salvo anular o procedimento ou declarar extinta a punibilidade, o juiz não pode retroceder para rejeitar a denúncia que recebera. (GRANNADO, 2006 et al, 197)
Portanto, verifica-se a notória necessidade de se oferecer ao acusado prazo para, previamente, exercer a sua defesa, evitando-se, assim, os conhecidos “julgamentos paralelos”, feitos freqüentemente pela mídia, ainda mais em se tratando de crimes relacionados a drogas, que possuem uma repercussão geralmente mais ampla.
Outra alteração relevante consiste na extinção do prazo atribuído ao Ministério Público para se manifestar após a apresentação da defesa prévia. Na égide da revogada Lei nº. 10.409/02 tinha o parquet, na qualidade de custos legis o prazo de cinco dias para opinar pelo recebimento ou rejeição ou denúncia. Todavia, a nova Lei não prevê expressamente essa medida, em que pese não haja qualquer proibição para que o magistrado escute a opinião do Ministério Público dentro do prazo de cinco dias previsto no art. 55, §4º, da Lei nº 11.343/06 para exercer o juízo de prelibação e decidir.
4 Rejeição da denúncia
O art. 39 da Lei nº 10.409/02 estabelecia que poderia haver a rejeição da denúncia, observado o teor do art. 43 do Código de Processo Penal, nas seguintes hipóteses: quando fosse manifestamente inepta; quando ausente pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal e; na ausência de justa causa para acusação.
Quanto à Lei nº 11.343/06, absteve-se o legislador em preceituar expressamente a respeito das hipóteses de rejeição da denúncia. Sendo assim, deverão ser aplicadas as regras de rejeição de denúncia dispostas no Código de Processo Penal, conforme esclarece Granado (2006, p. 200) ao afirmar que “Naturalmente, aplicam-se as regras dos arts. 41, a contrario sensu e 43, I, II e III, do CPP”. Nesse caso, observam-se as regras do diploma processual penal, como bem afirma Fernando da Costa Tourinho Filho[9]:
O Juiz poderá rejeitar a denúncia ou queixa: a) se ausente uma das condições genéricas (possibilidade jurídica do pedido, legitimatio ad causam ou interesse de agir); b) se ausente a condição específica; c) em se tratando de queixa, se o instrumento procuratório não obedecer ao disposto no art. 44; e, finalmente, d) quando inobservado o disposto no art. 41. (TOURINHO FILHO, 2006, p 164)
5 Recebimento da denúncia
De acordo com o art. 56 da nova Lei Antidrogas, caso o juiz receba a denúncia, “designará dia e hora para a audiência de instrução e julgamento, ordenará a citação pessoal do acusado, a intimação do Ministério Público, do assistente, se for o caso, e requisitará os laudos periciais”. (Lei nº 11.343/06)
Deve-se observar que o § 2º do mesmo artigo preceitua que “A audiência a que se refere o caput deste artigo será realizada dentro dos 30 (trinta) dias seguintes ao recebimento da denúncia, salvo se determinada a realização de avaliação para atestar dependência de drogas, quando se realizará em 90 (noventa) dias”. (Lei nº 11.343/06)
Merece destaque, também, o fato de que o § 1º, do mesmo dispositivo estabelece que, in verbs:
Tratando-se de condutas tipificadas como infração do disposto nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 a 37 desta Lei, o juiz, ao receber a denúncia, poderá decretar o afastamento cautelar do denunciado de suas atividades, se for funcionário público, comunicando ao órgão respectivo. (art. 56, § 1º, Lei nº 11.343/06)
6 Realização da audiência de instrução e julgamento
Quanto à realização da audiência da instrução e julgamento, verifica-se que há uma ordem de atos processuais a ser seguida pelo magistrado, conforme ensina Ricardo Antonio Andreucci[10]:
14) Realização da audiência de instrução e julgamento: nessa oportunidade, os atos processuais seguirão a seguinte ordem:
a) interrogatório do acusado: após o interrogatório, o juiz indagará as partes se restou algum fato para ser esclarecido, formulando as perguntas correspondentes, se entender pertinente e relevante;
b) inquirição de testemunhas de acusação e de defesa;
c) sustentação oral do Ministério Público: o prazo será de 20 minutos, prorrogável por mais 10, a critério do juiz;
d) sentença: poderá ser proferida de imediato ou no prazo de 10 dias. Nessa oportunidade, não tendo havido controvérsia no curso do processo sobre a natureza ou quantidade da substância ou do produto, ou sobre a regularidade do respectivo auto, determinará o juiz que se proceda a destruição da droga, preservando-se, para eventual contraprova, a fração que determinar. Deve o juiz, ainda, decidir sobre o perdimento do produto, bem ou valor apreendido, seqüestrado ou declarado indisponível. (ANDREUCCI, 2007, p. 94)
Assim, constata-se que o legislador manteve, no art. 57 da nova Lei Antidrogas, a estrutura e organização na realização dos aos processuais, já preconizada pelo art. 41 da revogada Lei nº. 10.409/02.
7 Regime de cumprimento da pena aplicada aos traficantes
A Lei nº 11.343/06 foi omissa no que tange ao cumprimento da pena privativa de liberdade, vigorando, em princípio, o preceito estabelecido pelo § 2º da Lei n 8.072/90, Lei dos Crimes Hediondos, que impõe o regime integralmente fechado para os condenados pela prática de crimes hediondos e assemelhados.
Porém, recentemente fora instaurada uma grande celeuma quanto à possibilidade ou não da progressão de regime para os crimes hediondos e assemelhados, sendo que, atualmente, a orientação jurisprudencial é no sentido de que cabe a progressão, conforme o trecho da decisão exarada pelo Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus n. 82.959, transcrito a seguir:
PENA - REGIME DE CUMPRIMENTO - PROGRESSÃO - RAZÃO DE SER. A progressão no regime de cumprimento da pena, nas espécies fechado, semi-aberto e aberto, tem como razão maior a ressocialização do preso que, mais dia ou menos dia, voltará ao convívio social. PENA - CRIMES HEDIONDOS - REGIME DE CUMPRIMENTO - PROGRESSÃO - ÓBICE - ARTIGO 2º, § 1º, DA LEI Nº 8.072/90 - INCONSTITUCIONALIDADE - EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. Conflita com a garantia da individualização da pena - artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal - a imposição, mediante norma, do cumprimento da pena em regime integralmente fechado. Nova inteligência do princípio da individualização da pena, em evolução jurisprudencial, assentada a inconstitucionalidade do artigo 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90. (STF, HC 82959/SP Relator: Min. Marco Aurélio. Julgamento: 23/02/2006. DJ 01-09-2006)
Desse modo, como ensina Ricardo Antonio Andreucci[11] “[...] a suprema corte afastou a proibição do regime de cumprimento de pena aos réus condenados pela prática de crimes hediondos e assemelhados”. Todavia, o mesmo autor (Op. cit) destaca que o referido decisório ocorreu em sede de controle difuso de constitucionalidade, pelo que terá que ser comunicado ao Senado Federal para que esta casa edite o correspondente decreto-legislativo declarando a inconstitucionalidade do referido dispositivo.
8 Competência da Justiça Federal
A revogada Lei nº. 6.368/76 estabelecia, em seu art. 27, que a regra geral para aferir a competência para o processo e julgamento dos crimes de “tráfico com o exterior” seriam da Justiça Federal, salvo se o lugar em que tiver sido praticado o delito fosse município que não fosse sede de vara da Justiça Federal, caso em que a competência se deslocaria para a Justiça Estadual, com recurso para o extinto Tribunal Federal de Recursos.
O art. 70 da nova Lei Antidrogas é mais direto que o da lei anterior e prevê que nos casos dos crimes previstos nos arts. 33 a 37, se ficar caracterizado “ilícito transnacional”, a competência para o processamento e julgamento do feito será da Justiça Federal. Já o parágrafo único do art. 70 estabelece que “Os crimes praticados nos Municípios que não sejam sede de vara federal serão processados e julgados na vara federal da circunscrição respectiva”.
Assim, percebe-se que além garantir mais objetividade, o legislador infraconstitucional buscou modificar o termo delimitador dos crimes de competência da Justiça Federal, que pela lei anterior eram os de “tráfico com o exterior” e pela nova lei passaram a ser os crimes em que se caracterize o “ilícito transnacional”.
Para definir quais os crimes de competência da Justiça Federal, a doutrina e jurisprudência modernas passaram a empregar o termo “internacionalidade”, como informa Marcello Granado:
Nos casos de crimes de tráfico de substância entorpecente, na Lei nº 6.368/76, o legislador utilizou o termo “tráfico com o exterior”, tanto para representar os casos de delegação da competência federal (art. 27), como para definir a causa de aumento de pena (art. 18). Estes dispositivos legais foram recepcionados pela Constituição, pois a utilização do termo “tráfico com o exterior” está em consonância com a regra constitucional do art. 109 da Constituição, que determina a competência da Justiça Federal. A jurisprudência e a doutrina reiteradamente utilizam o termo “internacionalidade” para representar o tráfico de substâncias entorpecentes nos casos de competência da Justiça Federal. (GRANADO et al, 2006, p. 227)
Porém, não se deve olvidar o fato de que para a competência ser da Justiça Federal, faz-se necessária prova inequívoca da internacionalidade do delito, conforme ementa do Tribunal Regional Federal da 4ª região, a seguir transcrita:
EMENTA. TRÁFICO DE ENTORPRCENTES. COMPETÊNCIA. AUSÊNCIA DE INTERNACIONALIDADE. NULIDADE.
1. Não obstante a denúncia ter descrito o tráfico forâneo, a efetiva internacionalidade, para que a competência seja da Justiça Federal, há ser comprovada. Não o sendo, é de afastar-se a competência, declarando a nulidade do feito desde o recebimento da denúncia, com a remessa dos autos à Justiça Estadual.
2. Inaplicável a regra do art. 81 do CPP nas hipóteses em que o crime praticado foi de tráfico interno denunciado como internacional e não conexo com nenhum outro delito de competência federal. (TRF da 4ª Região, 7ª Turma, Apelação Criminal nº 2004.70.02.007915-8/PR, Rel. Dês. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère, Julgamento: 25/4/2006).
Portanto, apenas no caso de haver um substrato probatório apto a provar indubitavelmente a internacionalidade do delito é que o crime poderá ser processado e julgado na justiça federal, ficando os outros crimes na esfera de competência da justiça estadual, ou, a depender do caso, dos tribunais superiores.
REFERÊNCIAS
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SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Jurisprudência. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(64340.NUME.%20OU%2064340.ACMS.)&base=baseAcordaos>. Acesso em: 03 setembro 2007.
[1] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Prática de Processo Penal. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
[2] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal: parte geral: parte especial. 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
[3] BODNAR, Zenildo, et al. Nova Lei Antidrogas – Teoria, Críticas e Comentários à Lei 11.343/2006. Rio de Janeiro: Impetus, 2006.
[4] GRANADO, Marcello, et al. Nova Lei Antidrogas – Teoria, Críticas e Comentários à Lei 11.343/2006. Rio de Janeiro: Impetus, 2006.
[5] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal: parte geral: parte especial. 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
[6] GRANADO, Marcello, et al. Nova Lei Antidrogas – Teoria, Críticas e Comentários à Lei 11.343/2006. Rio de Janeiro: Impetus, 2006
[7] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Prática de Processo Penal. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
[8] GRANADO, Marcello, et al. Nova Lei Antidrogas – Teoria, Críticas e Comentários à Lei 11.343/2006. Rio de Janeiro: Impetus, 2006.
[9] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Prática de Processo Penal. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
[10] ANDREUCCI, Ricardo Antonio. Legislação Penal Especial. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
[11] ANDREUCCI, Ricardo Antonio. Legislação Penal Especial. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
Analista do Ministério Público do Estado de Sergipe - especialidade Direito
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COSTA, Marcos Matheus Dantas. O rito procedimental estabelecido pela lei nº 11.343/06 (novos prazos) Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 set 2010, 08:54. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/21472/o-rito-procedimental-estabelecido-pela-lei-no-11-343-06-novos-prazos. Acesso em: 23 dez 2024.
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