O presente trabalho visa esclarecer questões relacionadas a competência em matéria acidentária envolvendo Órgão Previdenciário ou relação empregado/empregador.
Conforme preceitua o art.7º inciso XXVIII da Carta Magna, a obrigação do empregador em indenizar o empregado pelos danos sofridos em virtude do acidente do trabalho, não se confunde com a obrigação devida pelo Órgão Previdenciário. Entretanto, quando se fala em competência para julgamento em matéria de responsabilidade civil do empregador em decorrência da infortunística, celeumas passam a surgir após a Emenda Constitucional 45, tendo em vista que alguns defendem ser de competência da justiça comum estadual, enquanto outros, defendem ser da Justiça Especializada Trabalhista.
O art. 109 da Constituição Federal estabelece que compete aos juízes federais processar e julgar:
I- as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.
Isto posto, observa-se que não cabe aos juízes federais julgar causas de acidente do trabalho em que figure no pólo da relação processual o Instituto Nacional da Seguridade Social-INSS, que compreende uma autarquia federal, da mesma forma que se verifica no art.129 inciso II da Lei 8.213/91.
Noutra senda, vale dizer que o constituinte originário não incluiu neste artigo da Magna Carta as causas relativas a acidente do trabalho em que os litigantes sejam empregados e empregadores discutindo a indenização decorrente da infortunística, pois neste caso, em acordo com o que traz o art.114 inciso VI da CF/88 é competência material da justiça do trabalho julgar as causas relativas a indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes da relação de trabalho, estando pois inserido nesta hipótese, a indenização relacionada ao acidente do trabalho que possui natureza trabalhista. Com a Emenda Constitucional nº45, o Constituinte Derivado deixou claro ser a matéria da responsabilidade civil do empregador na infortunística, competência da justiça especializada.
O STJ através da Súmula 15, publicada em 1990, diz ser competência da justiça ordinária os processos e julgados decorrentes do acidente do trabalho. Entrementes, esta súmula passou a ser fortemente criticada, tendo em vista não deixar claro a questão à medida que não diferenciava as causas em que são partes o empregado e o empregador, das causas em que é parte o Órgão Previdenciário, assim sendo, destaca-se o posicionamento de Florindo (2002 apud PAROSKI, 2003) quando diz:
Ademais, a menção à Súmula n.15 do Tribunal Superior de Justiça(...), sempre mencionada no estudo da presente questão data vênia, representa um equivoco, pois esta se refere, exclusivamente, a responsabilidade objetiva do INSS, limitando-se, obviamente ao direito previdenciário postulado. A história revela que esta súmula foi editada, tendo em vista ações previdenciárias típicas decorrentes de acidente de trabalho, é dizer, aquelas propostas contra o Órgão Previdenciário.Importa dizer, que referida súmula originou-se do julgamento de inúmeros conflitos de competência(...), o que implica dizer que não estava em discussão a aplicabilidade do art.114 do mesmo texto constitucional. Como se vê o alvo não eram as ações de acidente do trabalho propostas em face do empregador. Portanto, a Súmula n.15 do STJ jamais poderia respaldar decisões contrarias à ‘thesi’ de que o Judiciário Trabalhista é competente para julgar a presente ação acidentária, estando presentes empregado e empregador.(INTERNET,2003)
Ante esta assertiva, verifica-se que a súmula em comento, trata das demandas acidentárias entre segurado e o INSS, não podendo ser utilizada para dirimir conflito de competência pertinente a questão em que figura na relação processual empregado e empregador.
Restou também perceptível, com a EC n.45 que deu nova redação ao art. 114 da CF/88, que o § 2º do art.643 da CLT encontra-se revogado, tendo em vista sua incompatibilidade com o que atualmente preceitua a Carta Magna, porquanto aquele dizia ser as questões pertinentes a acidente do trabalho de competência da Justiça Comum.
Outro posicionamento merecedor de destaque é o do ilustre juiz do trabalho de Minas Gerais, professor Oliveira (2004) que com bastante propriedade defendeu a competência da justiça laboral quanto a questão- problema ora em foco, pois, para este, com o advento da CF/88 a indenização por acidente do trabalho a cargo do empregador encontra-se incluída no rol dos direitos dos trabalhadores do art. 7º XXVIII e, sendo assim, por ser direitos trabalhistas, os dissídios individuais entre empregados e empregadores relacionados a indenização por acidente do trabalho é de competência única e exclusivamente da Justiça do Trabalho.
O que importa realmente dizer é que, atualmente, a questão da competência sobre matéria de indenização decorrente da relação de trabalho e no caso específico do acidente do trabalho já se encontra pacificada no STF, tendo em vista que o Pleno desta Colenda Corte em 09 de dezembro de 2005 decidiu a questão- Conflito de Competência n.7.204-1 tendo como relator o Ministro Carlos Brito, conforme se verifica :
EMENTA: constitucional. Competência judicante em razão da matéria. Ação de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, proposta pelo empregado em face de seu (ex-) empregador. Competência da justiça do trabalho. Art.114 da magna carta.redação anterior e posterior a emenda constitucional nº45/04. Evolução da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.Processo em curso na justiça comum dos estados.Imperativo de política judiciária.
Sendo, portanto, o STF o guardião-mor da Constituição Federal, este decidiu por maioria que o marco temporal para competência da matéria na Justiça laboral foi a EC nº45, dando uma nova orientação no sentido de que os processos pendentes de julgamento de mérito na Justiça Estadual deverão ser remetidos para a Justiça do trabalho no estado em que se encontram, aproveitando todos os atos até então praticados, entretanto, aquelas ações que se encontram tramitando na Justiça Estadual com sentença de mérito anterior a EC n.45, lá deverão permanecer até o seu transito em julgado e sua possível execução.
AI634728AgR/GO-GOIÁS
AG. REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO
Relator(a): Min. Ayres Britto
Julgamento: 01/06/2010. Órgão Julgador: primeira Turma
EMENTA: CONSTITUCIONAL. COMPETENCIA JUDICANTE EM RAZÃO DA MATÉRIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS DECORRENTES DO ACIDENTE DE TRABALHO, PROPOSTA PELO EMPREGADO CONTRA SEU (EX-) EMPREGADOR. COMPETENCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ART.114 DA MAGNA CARTA DE 1988. PROCESSO EM CURSO NA JUSTIÇA COMUM DOS ESTADOS. IMPERATIVO DE POLÍTICA JUDICIÁRIA. SÚMULA VINCULATE 22 DO STF. 1. O plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do conflito de competência 7.204, da minha relatoria, concluiu que a Lei Republicana de 1988 conferiu a Justiça do Trabalho a competência para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho. Mais: como imperativo da política judiciária, decidiu por maioria, que o marco temporal da competência da Justiça Trabalhista é o advento da EC 45/04. 2. A nova orientação, cristalizada na Súmula Vinculante 22 do STF, alcança os processos em trâmite pela Justiça comum estadual, desde que pendentes de julgamento de mérito. 3. Agravo Regimental desprovido.
Verifica-se assim, que a matéria da competência em foco encontra-se cristalizada na Corte Suprema, inclusive com a edição da Súmula Vinculante 22 que diz:
A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes do acidente do trabalho proposta por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da Emenda Constitucional nº 45/04
Destarte, pode-se inferir que atualmente a matéria da competência para julgamento das ações decorrentes do acidente do trabalho, seja envolvendo o Órgão Previdenciário, seja envolvendo a relação empregado/empregador, encontra-se pacificada no STF, evitando celeumas, discussões e demandas judiciais que tanto já inquietaram o judiciário brasileiro.
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS:
BRASIL.Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento- AI634728 AgR/GO.Agravante Brasil Telecom S/A. Agravado Eleuzabeth Rodrigues de carvalho Oliveira. Relator: Min. Carlos Ayres Britto. Publicado em 06/08/2010.Disponível em: www.stf.jus.gov.br
BRASIL.Supremo Tribunal Federal. Conflito de Competência- CC-7.204. Suscitante Tribunal Superior do Trabalho. Suscitado Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais Relator: Min. Carlos Ayres Britto. Publicado 09/12/2005. Disponível em: www.stf.jus.gov.br
BRASIL.Supremo Tribunal Federal. Súmula Vinculante nº 22. Disponível em: www.stf.jus.gov.br
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº15. Disponível em: www.stj.gov.br
BRASIL. Constituição(1988).Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília,DF: Senado Federal,2005.
BRASIL.Consolidação das leis do trabalho.31.ed.São Paulo:Saraiva,2004.
BRASIL. Lei nº 8.213 de 24 de julho de 1991.Lex: Coleção RT Mini Códigos. 3.ed. ver. atual. e ampl. São Paulo: LTr,2002.p.783-816.
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação infraconstitucional.São Paulo: Atlas,2002. 398p.
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenização por acidente do trabalho ou doença ocupacional.São Paulo; Ltr,2005. 359p.
PAROSKI, Mauro Vasni.Indenização por dano moral e dano material decorrente de acidente de trabalho: matéria de competência da Justiça do Trabalho.Jus Navegandi. Paraná, 07.abr.2003. Disponível em:http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6380.htm Acesso em 28 out.2005.
SALEM NETO,José. Acidentes do trabalho: doutrina e prática. Bauru,SP: Jalovi, 1977. 302p.
Analista do Ministério Público do Estado de Sergipe. Graduada em Direito e Serviço Social pela Universidade Tiradentes. Pós Graduada em Direito Constitucional pela UNISUL.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, Vanessa Mota Coutinho Inácio de. A competência para julgamento nas ações decorrentes de acidente do trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 set 2010, 09:50. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/21609/a-competencia-para-julgamento-nas-acoes-decorrentes-de-acidente-do-trabalho. Acesso em: 23 dez 2024.
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