O ser humano possui o direito primordial à vida com dignidade, sendo imprescindível o instituto dos alimentos como garantia a esse direito. O alcance da maioridade civil não gera necessariamente perda do direito a alimentos, existindo casos específicos em que tais pessoas ainda necessitem dos mesmos para a própria sobrevivência, a exemplo de incapazes e estudantes de ensino superior que não exerçam atividade remunerada.
Desta forma, existem situações peculiares em que são devidos alimentos a pessoas maiores, pois por algum motivo não podem exercer atividade laborativa que garanta seu próprio sustento. Seria fácil concluir que ao atingir a maioridade o ser humano estaria apto a manter-se, sem necessitar de seus parentes. Contudo, há circunstâncias, momentâneas ou permanentes, que impedem a própria subsistência, fazendo-se necessitar de auxílio. Estas circunstâncias englobam doenças, incapacidade de qualquer ordem, idade avançada, dentre outros.
Antes denominado de pátrio poder, o instituto jurídico do poder familiar está presente na relação entre pais e filhos menores. Entre estes não há propriamente obrigação alimentar e sim dever familiar, ou seja, dever de sustento e de mútua assistência, competindo aos pais a educação e criação de seus filhos.
Mesmo depois de dissolvida a união estável ou o casamento, permanece o exercício do poder familiar de ambos os cônjuges em relação a seus filhos menores, modificando-se apenas as questões relativas à guarda, para que o menor possa manter igual padrão de vida que possuía quando seus genitores mantinham um relacionamento conjugal.
O dever de sustento é imputável a ambos os cônjuges. A Constituição Federal dispõe no seu art. 229 que os pais têm o dever de assistir, educar e criar os seus filhos menores. Também consta como um dos deveres dos cônjuges o sustento, guarda e educação dos filhos (art. 395, II do CC). Ainda, o Código Penal prevê o crime de abandono material se deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do filho menor, conforme se extrai do art. 244. Nos ensina Maria Berenice Dias:
O pai não deve alimentos ao filho menor – deve sustento, no dizer de João Baptista Villela. Essa é a expressão correta e justa que tem assento constitucional (CF 229): os pais tem o dever de assistir, criar e educar os filhos menores. Esses são os deveres inerentes ao poder familiar (CC 1.634 e ECA 22): sustento, guarda e educação. (DIAS, 2009, p. 477)
Assim, cabe analisar se atingida a maioridade estaria extinto o direito à prestação alimentícia, uma vez que com a maioridade civil cessa o poder familiar e com ele o dever de sustento. Desta forma, é de suma importância a análise da diferenciação do dever de sustento e da obrigação alimentar, uma vez que nesta última se funda o direito a alimentos na maioridade.
Portanto, a obrigação alimentar é fundada na relação de parentesco e nasce depois de cessada a menoridade. Possui como fundamento o princípio da solidariedade familiar, ficando circunscrita aos ascendentes, descendentes e colaterais até o segundo grau.
Enquanto o dever de sustento é unilateral, pois possui como devedor os pais, e como credores os filhos menores, a obrigação alimentar é recíproca. Nesta os descendentes devem alimentos aos ascendentes e vice-versa.
O dever de sustentar os filhos também se diferencia da prestação alimentícia entre parentes em outro aspecto: na obrigação alimentar não há limitação temporal, pois pode perdurar por toda a vida, constituindo numa obrigação de dar, pois representa uma prestação periódica de uma quantia anteriormente fixada. Em contrapartida, o dever de sustento equivale a uma obrigação de fazer e cessa com a maioridade civil, em regra, uma vez que se vincula diretamente ao poder familiar.
Vale também ressaltar que, o dever de sustento dos filhos menores deve ser cumprido incondicionalmente por seus responsáveis. Ou seja, este dever será sempre exigível, não importando as condições financeiras do devedor, que tem o dever imposto por lei em manter e custear todas as despesas do menor, sob pena de responder pelo crime de abandono material se injustificadamente não o fizer. Contrariamente, a obrigação alimentar exige a análise do binômio necessidade-possibilidade, devendo ser observadas no caso concreto as circunstâncias que demonstrem a real necessidade do maior em receber os alimentos e a possibilidade do seu parente em prestá-lo.
O Código Civil revogado estabelecia o dever de mútua assistência entre os cônjuges como efeito do casamento e atribuía apenas ao marido a obrigação de prover a manutenção da família. Assim, a obrigação alimentar entre cônjuges era considerada apenas um dos efeitos do casamento, uma vez que se fundamentava apenas no referido dever de mútua assistência ou no dever exclusivo do marido em manter a família.
O antigo Código Civil, bem como a Lei do Divórcio, negavam o direito a alimentos pelo cônjuge culpado e pregava que, sendo a mulher inocente e pobre no desquite judicial, o marido lhe prestaria pensão alimentícia. Assim, a obrigação do marido em prestar alimentos à mulher após o desquite só existia se esta fosse considerada inocente e pobre. Caso contrário, se a mulher fosse considerada culpada, esta perderia definitivamente o direito de receber alimentos, como uma penalização por ser a responsável pela separação do casal.
Com a vigência do Código Civil de 2002, foram introduzidas diversas inovações a respeito da matéria. Estabeleceu que a mútua assistência é dever de ambos os cônjuges, retirando a obrigação exclusiva do marido em prover a manutenção da família, estabelecendo a equiparação dos direitos e deveres entre os cônjuges. A entidade familiar passa a se caracterizar pela unidade do orçamento, contribuindo ambos os cônjuges para as despesas do lar. Assim normatiza o art. 1.568 do CC: “Os cônjuges são obrigados a concorrer, na proporção de seus bens e dos rendimentos do trabalho, para o sustento da família e a educação dos filhos, qualquer que seja o regime patrimonial”. Também prevê o art. 226, §5º da CF a igualdade entre os cônjuges: “os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”.
Desta forma, a Legislação Civilista e a Carta Maior, passaram a prever a obrigação da mulher de também prover a manutenção da família. A legislação modificou sensivelmente no que tange à concessão de alimentos entre cônjuges, acompanhando a nova realidade social em que a mulher passou a ingressar no mercado de trabalho, tornando-se auto-suficiente.
Consequentemente, a mulher também poderá ser obrigada a prestar alimentos em favor do cônjuge varão, tendo em vista o princípio da igualdade estatuído pela legislação. Embora a sociedade de certa forma conservadora ainda enxergue a mulher como um ser humano frágil e submisso, a nova realidade mundial demonstra que a classe feminina tem alcançado cada vez mais um espaço de destaque no mercado de trabalho, e como conseqüência, muitas vezes possuindo uma renda mais elevada do que a do seu marido. Porém, não poderá existir obrigação alimentar se ambos os cônjuges possuem a mesma situação financeira.
O fundamento da obrigação alimentar entre os cônjuges está no dever de mútua assistência que surge quando do enlace matrimonial, e que persiste mesmo com a dissolução da sociedade conjugal através do divórcio, embasado no princípio da solidariedade familiar.
O antigo Código civilista prezava pela responsabilização total do cônjuge culpado pela ruptura da união, como uma forma de penalizar aquele, na realidade a mulher que era a parte mais fraca na relação, que descumpriu alguns do deveres da sociedade conjugal. Por exemplo, o antigo Código civilista previa que caso a mulher abandonasse o lar conjugal sem justo motivo, cessava para o marido a obrigação a obrigação de prestar alimentos.
Entretanto, o atual Código procura retirar o caráter indenizatório da prestação alimentícia, autorizando que até mesmo o cônjuge culpado tenha direito a receber alimentos, porém devendo ser observadas algumas particularidades. Nos ensina a doutrinadora Maria Berenice Dias:
Agora, o Código Civil assegura o direito a todos, para viverem de modo compatível com sua condição social. Até mesmo o cônjuge “culpado” pode receber alimentos. A identificação da responsabilidade pelo fim do casamento serve exclusivamente para limitar os valores do pensionamento. Ainda que sem o rigorismo anterior, continua sendo penalizado quem ousa afastar-se do casamento, adotando condutas inadequadas à vida em comum. O “culpado” somente perceberá o necessário para sobreviver. As seqüelas da culpa, portanto, são meramente quantitativas. (DIAS, 2009, p. 472)
Assim, conforme dispõe o art. 1.704 e parágrafo único do CC, a regra é que o cônjuge culpado não fará jus aos alimentos, porém excepcionalmente, se este necessitar da verba alimentar, não tiver aptidão para o trabalho e nem parentes em condições de prestá-la, o cônjuge culpado poderá fazer jus aos alimentos de que necessite. Porém, receberá apenas o indispensável à sua sobrevivência, ou seja, o mínimo que precisa para a sua manutenção vital.
Com isto, o Código Civil de 2002 introduziu a distinção entre alimentos necessários ou naturais, dos alimentos civis. O primeiro é aquele de âmbito restrito, que visa atender as necessidades básicas de quem os pleiteia, como no caso do cônjuge declarado culpado nos termos do art. 1.694, §2º do CC.
Já os alimentos civis visam suprir outras necessidades, intelectuais e morais, como se observa em outras situações em que não é declarada a culpa do cônjuge, conforme preleciona o art. 1.694, caput e §1º do CC. Neste caso, se o cônjuge não for declarado culpado, serão devidos os alimentos de que o cônjuge necessite para viver de modo compatível com a sua condição social, e não apenas as suas necessidades estritamente básicas.
Vale dizer que deverá ser observado o binômio necessidade-possibilidade também quando o cônjuge não declarado culpado vier a pleitear os alimentos. Não basta apenas a comprovação de que este se enquadra nos requisitos que a lei impõe, ou seja, que o mesmo necessite dos alimentos. Mesmo sendo comprovada a sua necessidade, deverá ser observado se o outro cônjuge possui condições de pagar a prestação alimentícia sem desfalque do necessário ao seu sustento.
Porém, pensão devida em razão do fim do casamento ou união estável não é devida infinitamente, podendo o devedor ser exonerado da obrigação alimentar em certos casos. No direito anterior, previa o art. 29 da Lei 6.515/77 que o dever de prestar alimentos pelo cônjuge devedor apenas cessava caso o cônjuge credor contraísse novo casamento. Atualmente, prevê o art. 1.708 do Código Civil que, não apenas o novo casamento contraído pelo cônjuge credor é tido como causa para a extinção da obrigação alimentar pelo cônjuge devedor, como também a realização de união estável, concubinato ou procedimento indigno contra o alimentante.
Essa inovação mostra que, contraindo novo casamento ou união estável, está o cônjuge credor assumindo uma nova relação e com ela as suas conseqüências. Assim, passa a estar obrigado a prestar alimentos o novo marido ou companheiro, uma vez que os encargos do relacionamento passaram a ser deste, pois, caso contrário, estaria ferindo a moral daquele que seria obrigado a prestar alimentos a ex-esposa ou companheira que já possui relacionamento com outro homem. Mesmo a dissolução do novo casamento ou união estável contraído pelo credor, não fará com que ressurja a obrigação alimentar do ex-cônjuge ou companheiro, uma vez que se trata de extinção do dever. Sobre tal dispositivo a doutrinadora Maria Berenice Dias entende que deve ser analisado com cuidado:
Esse dispositivo, no entanto, não pode ser tomado com muito rigorismo, quando se trata de alimentos alcançados pelos pais em favor de filhos. É que muitas vezes os filhos casam exatamente por contarem com o auxílio dos pais. Isso é muito comum no caso de gravidez inesperada. Os jovens ficam residindo na casa de um dos pais, sem terem mínimas condições de prover a própria subsistência, que dirá meios para sustentar o filho que vai nascer (DIAS, 2009, p. 508).
Em que pese a opinião da renomada doutrinadora, é sabido que atualmente existem diversos métodos contraceptivos no mercado. Ora, praticando um ato que ensejará numa gravidez indesejada, deverão os jovens arcar com as conseqüências, buscando um meio de sobrevivência. Caso contrário, estaria “presenteando” aqueles que agiram de forma inconseqüente. Entendemos que caso os genitores desejem auxiliar seus filhos neste momento, deve este ato ser entendido como mera liberalidade dos mesmos, porém jamais uma obrigação imposta.
Outra situação prevista em lei que gera a extinção da obrigação alimentar seria o concubinato do credor de alimentos. Tal previsão tem sido criticada pela doutrina, uma vez que jurisprudência é determinante ao entender que no concubinato não há dever de mútua assistência, e é uma relação que não configura entidade familiar. Consequentemente, não há obrigação alimentar neste tipo de relacionamento, não havendo sentido o legislador prever a extinção desta obrigação no caso de concubinato do credor, se esta nunca veio a existir.
Da mesma forma, estará exonerada a obrigação alimentar caso a mulher, embora considerada inocente, pratique atos tais como passar a viver com outro homem ou um estilo de vida de liberdade sexual. A prática de tais atos mostra que a mulher pode sustentar por si só ou pelo seu novo companheiro, não sendo compatível a permanência do direito a alimentos a ser pago pelo ex-cônjuge ou companheiro. O alimentando que se entrega à delinqüência ou à prostituição, por exemplo, pode perder o direito à pensão alimentícia (VENOSA, 2009, p. 371).
Porém outros doutrinadores entendem que a prática de liberdade afetiva praticado pelo credor não pode ser considerado como um ato de indignidade, uma vez que com o fim do casamento ou da união estável não mais existe o dever de fidelidade. A indignidade deve ser auferida no caso concreto.
Com o divórcio- e mesmo com a antecedente separação judicial- cessa o dever de fidelidade entre os ex-cônjuges. No entanto, se a mulher adota um estilo de vida de liberdade sexual, presume-se que pode sustentar-se à própria custa ou do eventual companheiro e não mais do ex-marido. A opção da mulher divorciada por um vida sexualmente liberada na sociedade moderna é perfeitamente compreensível e não deve ser censurada. O que não é lícito e moralmente tolerável é que ao ex-marido continue sendo imposta a responsabilidade pela manutenção desta vida livre [...] (CAHALI, 2006, p. 334)
Cabe ressaltar que em relação a todas hipóteses previstas no art. 1.708 do Código Civil, não poderá o devedor por si só se desonerar de prestar os alimentos. Deverá ajuizar uma Ação de exoneração de alimentos ou requerer a exoneração nos mesmos autos.
Diferentemente, caso o devedor venha a contrair novo casamento ou união estável, não se extingue a obrigação alimentar constante na sentença de divórcio ou dissolução da união, conforme preceitua o art. 1.709 do Código Civil. Assim, não poderá alegar como causa exonerativa da obrigação alimentar novo matrimônio do devedor.
Porém, a doutrina tem entendido que o referido dispositivo deve ser interpretado no sentido de que poderá existir uma redução dos alimentos prestados, caso venha a ocorrer certos encargos advindos do novo casamento ou união estável, a exemplo de nascimento de filhos. Vale dizer que, estamos falando em revisão do quantum alimentar, e jamais em exoneração da prestação alimentícia, uma vez que a realização de novo relacionamento foi um ato de mera liberalidade do devedor, que deverá arcar com tais conseqüências.
O presente tópico busca analisar se poderão ser concedidos alimentos aos companheiros quando finda a relação. O Código de 1916 não previa a existência de um direito a alimentos entre companheiros, e sim apenas entre cônjuges, vez que apenas a esposa legítima possuía legitimidade para tanto.
O direito a alimentos também não existia em relação às uniões que apenas se consolidavam no religioso, sem efeitos civis. Tal relação era tida como concubinato, que também não fazia surgir a pretensão alimentar. Antes da Constituição Federal de 1988, a relação concubinária não permitia que a mulher pleiteasse alimentos, uma vez que a obrigação alimentar estava restrita à relação de parentesco e ao casamento como condição de procedibilidade. Em suma, a união estável era proibida, pois tida como concubinato.
Com a Constituição Federal de 1988, a matéria restou totalmente reformada. No seu art. 226, § 3º, previu a Carta Maior que “é reconhecida a união estável entre homem e mulher como entidade familiar”, equiparando a união estável ao casamento. Assim, a união estável passou a ser considerada uma forma de família legítima, que merece proteção por parte do Estado, deixando o casamento de ser a única forma de relação entre homem e mulher reconhecida pelo direito.
Posteriormente, o novo Código Civil de 2002 veio a confirmar a equiparação da união estável ao casamento, conforme passou a dispor o art. 1.723. Reconheceu como entidade familiar “a união estável entre homem e mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”. Ainda, o art. 1.694 do mesmo diploma legal incluiu o companheiro ao lado dos cônjuges e parentes, como sujeitos da obrigação alimentar, que possuem legitimidade para pleitear pensão alimentícia.
Assim, o novo Código Civil estabeleceu a equiparação entre união estável e casamento em relação aos direitos e deveres recíprocos, inclusive no que tange à obrigação alimentar. Desde que presentes os requisitos exigidos por lei, quais sejam, a convivência pública, contínua, duradoura e com a intenção de constituir família, surge a possibilidade de se pleitear alimentos pelo companheiro. Ainda, deverá o magistrado analisar se presentes os pressupostos básicos da obrigação alimentar, quais sejam, o binômio necessidade-possibilidade, não bastando a simples comprovação de existência da união estável.
Diante disso, deverão ser aplicados à união estável os mesmos princípios e regras previstos à separação judicial no que tange à matéria de alimentos. Inclusive, caso seja comprovado que a culpa pela ruptura da união estável seja de um dos companheiros, a este serão devidos alimentos apenas para suprir as suas necessidades básicas, assim como acontece entre os cônjuges.
De modo algum deveria se cogitar um tratamento diferenciado que privilegiasse o ex-companheiro em relação ao cônjuge, pois isto seria contrário ao próprio espírito do art. 226, §3º, da Constituição. Do mesmo modo, aplica-se à ex-companheira a similar disciplina da perda, da redução e da exoneração da pensão alimentar atribuída ao cônjuge. (CAHALI, 2006, p. 163)
Diferentemente do dever de sustento, a obrigação alimentar se trata de um vínculo jurídico de natureza transitória, se constituiu numa obrigação de dar e sujeita-se aos pressupostos estabelecidos pelo Código Civil. Quando estamos abordando acerca da obrigação alimentar, necessariamente estamos nos referindo à relação de parentesco e não ao poder familiar, pois este se relaciona exclusivamente aos filhos menores.
Com maioridade civil cessa o poder familiar e com ele o dever de sustento, e nasce a obrigação alimentar. Nesta é irrelevante a análise do limite etário, e sim a análise dos pressupostos básicos. Se mesmo atingida a maioridade, persiste a necessidade do filho, e os genitores possuem condições de prestar os alimentos, será plenamente possível a fixação da prestação alimentar.
Pode ocorrer, todavia, que o filho maior se veja desprovido de meios para se manter, o que poderá acontecer, por exemplo, em caso de invalidez para o trabalho, ou de invencível e ocasional necessidade, originária de desemprego, doença, ruína, ou indigência, gerada pelo próprio comportamento do credor de alimentos, muitas vezes frutos de vícios e desregramentos (PEREIRA, 2007, p. 76)
Desta forma, existem diversos casos que autorizam a prestação alimentícia mesmo depois de alcançada a maioridade civil. O primeiro caso em que está presente a obrigação alimentar em relação aos filhos maiores, se refere àqueles que são portadores de alguma das incapacidades previstas nos arts. 3º e 4º do Código Civil. Dispõe o art. 1.920 do Código Civil que “o legado de alimentos abrange o sustento, a cura, o vestuário e a casa, enquanto o legatário viver, além da educação se ele for menor”.
Ao inserir o termo “cura” no referido dispositivo, o legislador se referiu às situações de enfermidade, podendo ser aplicado também aos casos de invalidez que acaba por gerar a incapacidade do ser humano em se manter por si só. Porém tal dispositivo é criticado pela doutrina, uma vez que se refere ao suprimento das necessidades relativas á educação apenas enquanto o alimentado for menor. Assim, tal disposição apresenta conflito com o art. 1.694 do Código Civil, já analisado, que prevê a prestação alimentícia entre parentes, cônjuges e companheiros, visando inclusive atender às necessidades relativas à educação.
Ainda, dispõe o art. 1.590 do Código Civil que “as disposições relativas à guarda e prestação de alimentos aos filhos menores estendem-se aos maiores incapazes”. Expressamente o Código Civil previu a obrigação alimentar dos pais em favor aos filhos maiores e incapazes, equiparando-os aos filhos menores. Entendeu o legislador que as necessidades dos maiores e incapazes são presumidas, diante da impossibilidade de exercer plenamente os atos da vida civil, assim como os menores. É o único caso em que a lei obriga a mantença daqueles que atingiram a maioridade, em virtude de alguma incapacidade. Porém, cessada a causa que ensejou a obrigação alimentar, neste caso a incapacidade, a obrigação de prestar alimentos desaparece.
Outro caso específico em que seria devidos alimentos, mesmo após atingida a maioridade, seria em relação àqueles que ainda estudam e não exercem atividade laborativa. É sabido que atualmente o mercado de trabalho está cada vez mais exigindo uma maior qualificação, muitas vezes não bastando o alcance de um diploma de curso de ensino superior. Assim, diversos tribunais tem entendido ser possível a prestação alimentícia aos estudantes, que embora tenham atingido a maioridade, ainda necessitam do auxílio de seus pais.
[...] sendo o filho maior, estudante e sem emprego, tem-se-lhe reconhecido direito a alimentos pelo pai, isto por espírito de equidade, mas, para tanto, o descendente deverá provar que não pode trabalhar e que, consequentemente, necessita ainda do sustento paterno. Todo homem maior e capaz deve prover o próprio sustento, e, no caso do filho estudante, este deverá comprovar que, em face do horário de suas aulas, está impedido de trabalhar [...] (CAHALI, 2006, p. 487)
No que tange ao filho maior e estudante, em que pese o posicionamento da doutrina e dos tribunais de que a obrigação alimentar neste caso perdure até os vinte e quatro anos de idade (invocando por analogia a Lei nº 1.474/51 que trata do imposto de renda), a realidade é que dependerá das circunstâncias de caso concreto e em respeito ao ideal da solidariedade familiar inserida no art. 3º, III da Constituição Federal.
Como foi dito, mesmo que o filho maior conclua um curso de ensino superior e venha a se formar, diante da intensa exigência do mercado de trabalho, possa vir a ser necessário que o mesmo freqüente um curso de pós-graduação. Ou ainda, que não tenha concluído o curso de ensino superior até os vinte e quatro anos, haja vista terem diversos cursos cujo prazo de conclusão é mais extenso, a exemplo do curso de medicina.
Em tais hipóteses deve-se ter conhecimento de que não pode cessar a obrigação alimentar imposta aos genitores, até mesmo tendo como parâmetro o princípio da solidariedade familiar e da dignidade da pessoa humana. De fato, significa que durante a menoridade presume-se, de forma incontestável, a necessidade do filho em receber os alimentos; adquirida a plena capacidade, a presunção é flexibilizada, incumbindo ao alimentando maior demonstrar a necessidade de continuar percebendo a pensão alimentícia, e claro, a possibilidade dos seus genitores em continuar a prestá-los.
Tem-se entendido que, por aplicação do entendimento fiscal quanto à dependência para o Imposto de Renda, que o pensionamento deva ir até os 24 anos de idade. Outras situações excepcionais, como condição de saúde ou outras situações avaliadas no caso concreto, poderão fazer com que os alimentos possam ir além da maioridade, o que deverá ser examinado no caso concreto. (VENOSA, 2009, p. 367)
Em suma, Belmira Pedra Welter (2005, p. 107) sintetiza que os pais podem ser obrigados a prestar alimentos aos filhos maiores em três hipóteses: a) aos filhos maiores e incapazes; aos filhos maiores e capazes que estão em formação escolar profissionalizante ou em faculdade; c) aos filhos maiores e capazes, porém em situação de indigência não proposital.
6. Considerações finais
Dessa maneira a maioridade civil não constitui, por si só, motivo suficiente para que o devedor deixe de prestar alimentos, o que somente ocorrerá quando não estiverem comprovados os pressupostos básicos, ou seja, a necessidade de percebê-los ou a impossibilidade de prestá-los.
Sendo assim, concluimos que o magistrado deve analisar se presentes estão os pressupostos básicos da obrigação alimentar, bem como se guiar pelos princípios gerais do direito, a exemplo da equidade, devendo analisar cada caso concreto. Vale ressaltar que, em regra, aquele que atingiu a maioridade e não possui nenhuma doença que o incapacite, deverá prover a sua própria subsistência. Assim ocorre naqueles casos em que o filho é maior e capaz de exercer atividade profissional, não devendo o instituto dos alimentos estimular o comodismo.
REFERÊNCIAS
CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. VI v. São Paulo: Saraiva, 2005.
RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: Direito de Família. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2009.
WELTER, Belmiro Pedro. Alimentos no Código Civil. Porto Alegre: Síntese, 2003.
Especialista em Direito do Estado pela Universidade Anhanguera - UNIDERP; Bacharel em Direito pela Universidade Tiradentes- UNIT; Analista de Direito do Ministério Público do Estado de Sergipe.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MENEZES, Elda Maria Gonçalves. Principais aspectos da obrigação alimentar na maioridade civil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 out 2010, 08:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/21726/principais-aspectos-da-obrigacao-alimentar-na-maioridade-civil. Acesso em: 23 dez 2024.
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