Apesar de a estrutura sindical estar presente no Brasil há décadas, ocorre um desrespeito generalizado ao princípio mor do Direito Coletivo, qual seja, o princípio da liberdade sindical. Tal princípio pode ser violado por todos os atores sociais envolvidos na relação trabalhista, prejudicando um regular desenvolvimento do ser coletivo obreiro, bem como o desenvolvimento de relações trabalhistas pautadas pela boa-fé. Diante do impacto que as condutas antissindicais para apresentam no seio trabalhista, foram criados meios para uma adequada repressão a estes atos.
A liberdade sindical foi direito conquistada de forma árdua pelos trabalhadores. Tal conquista garante, até os dias atuais, uma efetiva organização do movimento coletivo obreiro, protegendo-o da interferência estatal, patronal e até mesmo de atores sindicais que frustram o exercício coletivo da manifestação de vontade.
Apesar da existência de preceitos constitucionais asseguradores da liberdade sindical ( arts. 5º, XVIII e 8º da CF/88), persistem em nossa sociedade as chamadas práticas antissindicais, atos que agridem o princípio da liberdade sindical, subsistindo em práticas desleais[1],de discriminação anti-sindical[2] e atos de ingerência[3]. Uriarte os define como toda atitude ou conduta que prejudica a causa da atividade sindical ou que limita além do que decorre do jogo normal das relações coletivas[4].No entendimento da ilustre professora Alice Monteiro de Barros[5]:
... o conceito de condutas ou atos anti-sindicais é amplo e vem sendo definido como “... aqueles que prejudiquem indevidamente um titular de direitos sindicais no exercício da atividade sindical ou por causa desta ou aqueles atos mediante os quais lhe são negadas, injustificadamente, as facilidades ou prerrogativas necessárias ao normal desempenho da ação coletiva.”
Desde as raízes históricas da liberdade sindical, tais práticas, são vedadas pelo ordenamento jurídico. Caso seja caracterizada alguma prática antissindical, o arcabouço jurídico vigente (convenções da OIT[6], Constituição Federal de 1988 e a CLT) oferece mecanismos para a adequada prevenção ou reparação do dano, além de penalizar tais condutas[7]. Segundo Uriarte:
Numa sistematização dos meios de proteção da atividade sindical – os que não envolvem entre si, mas que podem ser complementares ou acumulativos -, podem distinguir-se: a) os mecanismos de proteção; b) os mecanismos de reparação; e c) outros mecanismos, tais como a publicidade de decisões administrativas ou judiciais, a aplicação de decisões administrativas ou penais, e a autotutela coletiva[8].
Uriarte ainda enumera três instrumentos complementares destinados à garantia da efetividade das citadas medidas, sendo eles:
(i) a suspensão do ato anti-sindical, para evitar a consolidação dos seus efeitos; (ii) a inversão do ônus da prova, dada a dificuldade do hipossuficiente de produzi-la, de maneira que ficaria a cargo do ofensor a demonstração de que sua conduta não feriu a liberdade sindical; e (iii) a celeridade do processo, uma vez que, nesses casos, o tempo produz efeitos devastadores para a reparação dos danos e a demora equivale a uma denegação de justiça[9].
No direito brasileiro, como propõe Araújo[10], há previsão de todas as modalidades de tutela e, quanto às outras medidas, acrescenta que:
O dirigente sindical tem assegurado o exercício da função sindical e a permanência em local que possibilite o desempenho da sua atividade sindical (art. 543 da Consolidação das Leis do Trabalho). Soma-se a isso o seu direito à reintegração no emprego, se a despedida não estiver assentada em justo motivo previsto no art. 482 da Consolidação Trabalhista, consoante o art. 8º, inciso VIII, da Constituição Federal. Não se pode olvidar que o ordenamento jurídico brasileiro albergou diversas garantias aos trabalhadores, como a estabilidade provisória ao dirigente sindical e ao membro da CIPA, impõe dificuldades à transferência do dirigente sindical, além de fixar sanções administrativas quando da prática de atos incompatíveis com a liberdade sindical (art. 543, §5º da CLT), resguardando o trabalhador de pressões e represálias patronais e estatais.
Diante do exposto, não se chega a outra conclusão senão que a efetiva liberdade sindical somente será uma realidade quando estiver de fato jungida às medidas protetivas conta atos antissindicais. Destarte, todos os mecanismos destinados a coibir tais condutas devem ser utilizados, visando a preservação de princípio tão caro ao ser coletivo obreiro, a liberdade sindical.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAÚJO, Adriane Reis de. Liberdade sindical e os atos anti-sindicais no direito brasileiro. Revista do Ministério Público do Trabalho - 32 - Ano XVI - Outubro, 2006. p. 29-48.
BARROS, Alice Monteiro. Condutas anti-sindicais -procedimento. Disponível em:www.mg.trt.gov.br/escola/download/revista/rev_59/Alice_Bar ros.pdf. Material da 2ª aula da Disciplina Relações Coletivas de Trabalho, ministrada no Curso de PósGraduação Lato Sensu TeleVirtual em Direito e Processo do Trabalho – Anhanguera-UNIDERP|REDE LFG.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 8 ed. São Paulo: Editora LTR, 2009.
LIMA, Leonardo Tibo Barbosa. Liberdade sindical e a proteção contra atos anti-sindicais . Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2014, 5 jan. 2009. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12152>. Acesso em: 10 jul. 2010.
URIARTE, Oscar Ermida. A proteção contra os atos anti-sindicais. Trad. Irany Ferrari. São Paulo: LTr, 1989.
[1] A recusa à negociação coletiva e o uso da violência, intimidação e represálias contra trabalhadores a fim de impedir a criação de sindicatos, associações profissionais, núcleos de representação sindical e profissional, comissões internas etc., configuram o que se conhece como prática desleal. A CLT, art. 543, § 6º,coíbe esse tipo de proceder patronal, sujeitando o infrator a sanções administrativas, sem prejuízo da reparação a que tiver direito o empregado (verbas trabalhistas e indenização por danos patrimoniais e morais).
[2] Reza o § 1º do art. 1º da Convenção nº 98 da OIT que: .os trabalhadores deverão gozar de adequada proteção contra todo ato de discriminação tendente a diminuir a liberdade sindical em relação ao seu emprego.
[3] O art. 2º, § 1º, da Convenção OIT nº 98 aborda diretamente a conduta antisindical de ingerência: .as organizações de trabalhadores e de empregadores devem gozar de adequada proteção contra todo ato de ingerência de umas contra as outras.. No § 2º, o referido art. 2º dessa Convenção alude a alguns atos de ingerência do empregador (que também podem ser perpetrados pelo Estado): .criar ou estimular a constituição de organizações favoráveis, dirigir, influenciar ou sustentar economicamente entes sindicais, delegações, comissões ou grupos de representação.. Em suma, todo procedimento que vise à dominação, ao controle ou à interferência nas organizações obreiras é visto como indevido e ilícito.
[4] URIARTE, Oscar Ermida. A proteção contra os atos anti-sindicais. Trad. Irany Ferrari. São Paulo: LTr, 1989, p. 35.
[5] BARROS, Alice Monteiro. Condutas anti-sindicais - procedimento. Disponível em: www.mg.trt.gov.br/escola/download/revista/rev_59/Alice_Bar ros.pdf. Material da 2ª aula da Disciplina Relações Coletivas de Trabalho, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Direito e Processo do Trabalho – Anhanguera-UNIDERP|REDE LFG.
[6] A Convenção nº 98 da OIT, protetiva da liberdade sindical e a Convenção 135/1971 da OIT, que reconhece e garante a liberdade sindical no âmbito empresarial são diplomas que proibem atos antissindicais. Não se olvida também a Convenção nº 87 de 1948 da OIT, que trata de maneira abrangente da liberdade sindical, vedando qualquer tipo de interferência nas entidades sindicais. A Convenção nº 98 se refere à adequada proteção contra todo ato de discriminação tendente a diminuir a liberdade sindical em relação ao seu emprego. (§ 1º do art. 1º); à proteção contra a conduta patronal de condicionar o emprego à desfiliação ou a não-filiação sindical (§ 2º do art. 1º); à proibição contra a despedida por causa da filiação ou da afinidade sindical (§ 2º do art. 1º); à garantia de que .as organizações de trabalhadores e de empregadores deverão gozar de adequada proteção contra todo ato de ingerência de umas contra as outras. (§ 1º do art. 2º), reprimindo eventuais restrições empresariais a obreiros em face do exercício sindical, potencializando o ser coletivo obreiro e privilegiando o princípio da liberdade sindical.
[7] O art. 199 do Código Penal Brasileiro, por exemplo, tipifica o crime de atentado contra a liberdade de associação, com pena de detenção de um mês a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência, para aquele que constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a participar ou deixar de participar de determinado sindicato ou associação profissional.
[8] URIARTE, Oscar Ermida. A proteção contra os atos anti-sindicais. Trad. Irany Ferrari. São Paulo: LTr, 1989, p. 45
[9] URIARTE, Oscar Ermida. A proteção contra os atos anti-sindicais. Trad. Irany Ferrari. São Paulo: LTr, 1989, p. 55.
[10] ARAÚJO, Adriane Reis de. Liberdade sindical e os atos anti-sindicais no direito brasileiro. Revista do Ministério Público do Trabalho - 32 - Ano XVI - Outubro, 2006. p. 45.
Analista do Ministério Público do Estado de Sergipe e Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Sergipe.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DIAS, Licia Regia dos Santos. Condutas anti-sindicais e as consequências de sua caracterização Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 out 2010, 09:14. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/21733/condutas-anti-sindicais-e-as-consequencias-de-sua-caracterizacao. Acesso em: 23 dez 2024.
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