RESUMO
Estudo acerca da atuação do Ministério Público no que tange à exigência de eficiência na prestação dos serviços públicos. Breves considerações sobre serviço público, incluindo natureza jurídica, prestação dos serviços públicos, concessão, titularidade, relação contratual. Considerações sobre o princípio da eficiência e atuação extrajudicial e judicial do Ministério Público quando da exigência da eficiência na prestação dos serviços públicos.
Palavras-chave:
Eficiência, serviço público, exigência, Mistério Público.
ABSTRACT
Study on the role of prosecution in relation to the requirement of efficiency in the delivery of public services. Brief notes on public service, including legal, public service delivery, empowerment, ownership, contractual relationship. Considerations on the principle of efficiency, performance and extra-judicial public prosecutor when the requirement of efficiency in the delivery of public services.
Key words: Efficiency, public service requirement, Mystery public.
INTRODUÇÃO
Após a publicação da Emenda Constitucional nº 19/1998 o princípio da eficiência fora inserido no artigo 37 da Constituição Federal.
Conforme se ensina na doutrina, tal princípio significa que a administração pública deverá prestar um serviço rápido, de qualidade e que dê rendimento.
Diante da previsão expressa desse princípio e ao mesmo tempo diante de se constatar na prática a deficiência do Estado, quando da prestação dos serviços públicos, se faz necessário discorrer sobre essa problemática.
De outra banda, prevendo a Constituição Federal a existência de uma instituição encarregada de zelar pelos respeito aos serviços de relevância pública, surgiu a necessidade de estudar de que forma essa instituição pode atuar no sentido de exigir que os serviços públicos com eficiência.
Para tanto, este trabalho científico visa discorrer inicialmente sobre o que vem a ser o serviço público, desvendando a sua natureza jurídica e outros pontos importantes da matéria, para em outro capítulo discorrer sobre o princípio da eficiência e as formas de intervenção do Ministério Público quando da prestação de um serviço público ineficiente.
1 SERVIÇO PÚBLICO
1.1 Natureza jurídica
Ao se falar em serviço público corre-se o risco de se utilizar o lugar comum em termos doutrinários, já que as obras acadêmicas de Direito Administrativo são convergentes quando tratam do assunto, tendo em sua maioria a mesma origem ao discorrer sobre o tema.
A doutrina indica, ao iniciar o estudo, os ensinamentos de Gaston Jéze e de Leon Duguit, que com autoridade clássica buscavam explicar a natureza jurídica do serviço público, mas pecavam pela descrição ampla e imprecisa.
Para Gaston Jéze o serviço público se caracteriza pela sua unicidade, o que significa dizer que a sua prestação é única, enquanto que para Duguit o serviço público seria a atividade mais característica da Administração Pública, a razão de existir do Estado, conforme informa Diógenes Gasparini
Adotando essa compreensão ampla do que seja serviço público, Gaston Jéze passou a sustentar que a sua prestação é única, e Leon Duguit a afirmar que é a primordial atividade da Administração Pública. Outros, com o mesmo entendimento, passaram a dizer que a presença do Estado não se justifica senão para prestá-los. Assim, o oferecimento dos serviços públicos seria a única razão a justificar a existência do Estado. Esse sentido lato, certamente, não satisfaz. Nele acaba-se por incluir atividades que induvidosamente não são serviço público. Seu conceito, por isso, carece de ser precisado. (2002, p. 260)
Embora a descrição feita pelos clássicos seja por demais imprecisa, ampla, e centralizadora, já que admite o Estado como provedor da mais variada sorte de serviços, ela não deve ser descartada, do contrário, ela representa a natureza e a essência do que seja o serviço público.
Essa noção de essencialidade, de ter o sujeito estatal como prestador desse serviço, é inerente ao instituto, já que a existência do interesse coletivo requer essas características.
O serviço público é uma atividade direcionada à coletividade, tem o objetivo de atender às necessidades coletivas, ao contrário dos serviços regidos pela livre iniciativa, que visam a satisfação dos objetivos da pessoa privada, inerentes ao interesse individual.
Existem serviços que devido à importância para o Estado, devem ser considerados públicos, sobretudo porque a sua execução deficiente pode gerar prejuízos à economia, à incolumidade física das pessoas, à segurança pública, dentre outros, conforme ensina Celso Antônio Bandeira de Mello
Com efeito, ao erigir-se algo em serviço público, bem relevantíssimo da coletividade, quer-se também impedir, de um lado, que terceiros o obstaculizem e; de outro; que o titular deles; ou quem haja sido credenciado a prestá-los; procedam, por ação ou omissão, de modo abusivo quer por desrespeitar direitos dos administrados em geral, quer por sacrificar direitos ou conveniências dos usuários do serviço. (2003, p. 613)
Exemplos desses serviços podem ser considerados o transporte urbano coletivo de passageiros, a polícia de vigilância sanitária, o fornecimento de água, energia.
Portanto, a lição dada pelos clássicos é relevante, pois embora centralize no Estado a prestação do serviço, reflete a concepção histórica dos autores, já que a noção de serviço público varia conforme o sistema econômico e social da época em que está inserido o Estado.
Em um Estado que visa o bem estar social, certamente será muito mais centralizada a prestação dos serviços públicos, se comparado a um Estado liberal, que deixa ao alvedrio dos particulares a satisfação das suas necessidades.
Por isso, existem serviços que poderão ser considerados públicos em um determinado momento histórico, e em outro momento não, pois, repita-se, a importância atribuída pelo Estado a determinados serviços varia conforme o momento histórico, as necessidades públicas, a cultura, os valores que são atribuídos por determinadas sociedades, Celso Antônio Bandeira de Mello, ensina outra vez
Sabe-se que certas atividades (consistentes na prestação de utilidade ou comodidade material) destinadas a satisfazer a coletividade em geral, são classificadas como serviços públicos quando, em um dado tempo e lugar, o Estado reputa que não convém relegá-las simplesmente à livre iniciativa; ou seja, que não é socialmente desejável fiquem tão só assujeitadas à fiscalização e controles que exerce sobre a generalidade das atividades privadas (fiscalização e controles que se constituem no chamado “poder de polícia”). Justamente pelo relevo que lhes atribui, o Estado considera seu dever assumi-las como pertinentes a si próprio (mesmo que sem exclusividade) e, em conseqüência, exatamente por isso, coloca sob uma disciplina peculiar instaurada para resguardo dos interesses nela encarnados: aquela disciplina que naturalmente corresponde ao próprio Estado, isto é, uma disciplina de direito público (2003, p. 611)
Essa indefinição do que seja serviço público e a celeuma em se determinar quais serviços podem ser assim considerados, levou a doutrina à criação de conceitos, advertindo que existem basicamente três enfoques a serem dados, o subjetivo, o formal e o material.
Do ponto de vista subjetivo ou orgânico, o serviço público seria a satisfação das necessidades dos administrados pelo Estado, através da Administração Pública em geral, por seus órgãos, agentes públicos, seria por assim dizer a máquina estatal interferido na realização do interesse público.
Já do ponto de vista material, o serviço público seria a atividade concreta, fruível, palpável, prestada pela Administração Pública aos seus cidadãos, como por exemplo a prestação do serviço de saúde em um hospital, o fornecimento de água, de energia elétrica, enfim, diz respeito a atividades concretas, que influenciam diretamente na vida dos administrados.
Existe também o enfoque formal do serviço público, que se relaciona intimamente com o regime jurídico do serviço, pois considera que esse serviço, por ser de tamanha importância para a sociedade, se submete a regras de direito público, que extrapolam as normas civis quotidianas, tendo o Estado uma posição privilegiada na relação de prestação do serviço.
O conceito exposto por Celso Antônio Bandeira de Mello, consegue reunir os três enfoques
Serviço Público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça às vezes, sob regime de Direito Público – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais -, instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo. (2003, p. 612)
De posse desse conceito, vislumbra-se que o Estado toma para si a titularidade do serviço público porque em última análise é o provedor do bem comum, chamando pra si a titularidade desses serviços, pois não pode arriscar que a sua execução seja regida por normas privadas.
Não permite o Estado que a prestação de tais serviços fique submetida exclusivamente à livre iniciativa, que visa de sobremaneira ao lucro, caso contrário, restaria a instauração do caos social quando uma empresa privada resolvesse, por exemplo, não mais fornecer água à população de uma cidade, por não mais lhe render lucro essa atividade.
É com base nesse conceito que se apropriará de duas características do serviço público, o interesse coletivo e o regime de direito público.
O interesse coletivo significa que o serviço público diz respeito ao que a sociedade tem como metas materiais de convivência de forma não individual, por ter abdicado da sua liberdade e formado o Estado, caso contrário, não seria necessária a criação de uma ficção jurídica como o Estado, para usar de sua força através do poder de polícia.
Quanto ao regime de direito público, quer-se dizer que o Estado possui prerrogativas na relação de prestação do serviço, justamente para garantir a efetivação das necessidades públicas. No fim, essas prerrogativas são instrumentos para se conseguir a realização do bem comum.
Quanto a essa mesclagem entre interesse público e regime de direito público, mais uma vez as palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello
Por meio de tal regime o que se intenta é instrumentar quem tenha a seu cargo garantir-lhes a prestação com os meios jurídicos necessários para assegurar a boa satisfação dos interesses públicos encarnados no serviço público. Pretende-se proteger do modo mais eficiente possível às conveniências da coletividade e, igualmente defender a boa prestação do serviço. (2003, p.613)
Em suma, o serviço público se caracteriza pela sua importância para a coletividade, estando por isso submetido a um regime jurídico de direito público, possuidor de regras específicas que garantem ao Estado, titular desse serviço, a supremacia, pois afinal estar-se-á conduzindo o interesse público.
2.2 A prestação
Os serviços públicos podem ser prestados tanto de forma centralizada, quando o Estado, através dos seus próprios órgãos os executa, como de forma descentralizada, através de pessoas jurídicas de direito público ou de direito privado criadas pelo Estado ou por particular.
O elevado número de comodidades e utilidades públicas criado pela sociedade pós-moderna, com demandas variadas e complexas de serviços que possuem a natureza pública, fez com que o Estado se tornasse incapaz de executar sozinho essa empreitada.
Há inclusive determinados serviços em que a sua execução por parte do Estado se tornaria economicamente inviável, em razão das constantes mudanças no meio tecnológico, que se não forem rotineiramente observadas podem tornar o serviço ineficaz, como no caso dos serviços de telecomunicações.
A prestação dos serviços públicos de forma centralizada ocorre quando o Estado, através de seus órgãos, por conta própria e sob sua inteira responsabilidade, desenvolve os serviços considerados como públicos.
Trata-se, portanto, de execução do serviço pela administração direta ou centralizada, cuja competência está delineada nos diversos órgãos administrativos, que frize-se, não possuem personalidade jurídica.
São exemplos de prestação centralizada, os serviços públicos realizados pelos Ministérios, na esfera federal e Secretarias na esfera estadual, que podem distribuir internamente a competência para a execução desses serviços, o que se denomina de desconcentração.
Diógenes Gasparini assim leciona sobre a prestação centralizada
Diz-se que a prestação ou a execução dos serviços públicos é centralizada quando a atividade, sobre integrar o aparelho administrativo do Estado, é realizada por meio dos órgãos que o compõem, em seu próprio nome e sob sua inteira responsabilidade. O serviço vai da Administração Pública, que o executa e explora, ao administrado, seu beneficiário último sem passar por interposta pessoa. (2002, p. 279)
Já a execução descentralizada ocorre quando o serviço é prestado por pessoas jurídicas de direito público ou privado criadas pelo Estado, que são as autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista prestadoras de serviço público, ou por particulares através de pessoas físicas ou jurídicas para os quais é trespassado o desempenho do serviço público.
Na execução indireta o exercício da atividade é atribuído a entidade distinta da Administração Pública, conforme mais uma vez ensina Diógenes Gasparini
A prestação dos serviços públicos é descentralizada na medida em que a atividade administrativa (titularidade e execução) ou sua mera execução é atribuída a outra entidade, distinta da administração pública, para que realize. Desloca-se a atividade, ou tão só o seu exercício, da Administração Pública central para outra pessoa jurídica, esta privada, pública ou governamental (2002, p. 280)
Por essa razão, quando se fala em execução descentralizada do serviço está-se a falar no instituto jurídico administrativo da descentralização e não na desconcentração, que pode ou não ocorrer na execução centralizada do serviço público.
Assim, “Ocorre a descentralização porque a relação existente se dá entre duas pessoas, que são a entidade central e a descentralizada, enquanto que na desconcentração existe somente uma pessoa, que é a central” (GASPARINI, 2002, p.280).
Seguindo-se o mesmo doutrinador, vê-se ainda que a descentralização pode ser para pessoa pública, quando se atribui a execução do serviço a uma autarquia ou fundação pública, por exemplo, ou para pessoa privada, é como se transcreve
A Administração Pública, sempre que desejar descentralizar uma dada atividade cuja cura lhe foi atribuída pelo ordenamento jurídico ou quando assume um serviço que não é próprio mas de execução permitida a qualquer um, inclusive ao particular, como ocorre com o ensino superior, observado, naturalmente, o interesse público, cria, por lei, uma pessoa pública de natureza administrativa e para ela transfere a titularidade da atividade ou serviço e, obviamente, sua execução. A entidade criada para esse fim é a autarquia. (2002, p. 282).
Questão que deve ser esclarecida é a de que ao descentralizar a prestação do serviço, o Estado não perde a condição de titular daquele. O que pode ocorrer é a transferência da titularidade, no caso em que a execução do serviço é feita por pessoa jurídica de direito público.
Nesse caso, como o Estado estará criando pessoa jurídica de direito público, poderá transferir a titularidade, dando competência àquele ente administrativo para executar o serviço público de forma autônoma, em nome próprio e por sua conta e risco.
Não se deve, portanto, confundir a titularidade do serviço público, que é sempre do Estado com o exercício dessa titularidade, pois a concessão do exercício da titularidade é apenas uma forma de o Estado, incapaz materialmente falando de exercer todos os serviços públicos, permitir através da descentralização que esses sejam exercidos. O Mestre Celso Antônio Bandeira de Mello, em sua obra Curso de Direito Administrativo assim o esclarece
Não se deve confundir a titularidade do serviço com a titularidade da prestação do serviço. Uma e outra são realidades jurídicas visceralmente distintas. O fato de o Estado (União, Estados, Distrito Federal e Município) ser titular de serviços públicos, ou seja, de ser o sujeito que detém “senhoria” sobre eles (a qual, de resto, é, antes de tudo, um dever em relação aos serviços que a Constituição ou as leis puseram ou venham a por seu cargo) não significa que deva ser obrigatoriamente prestá-los por si ou por criatura sua quando detenha a titularidade exclusiva do serviço. (2003, p. 620).
Portanto, os serviços públicos podem se prestados diretamente pelo Estado, através da execução centralizada, ou por meio de pessoas jurídicas alheias à Administração Pública direta, através da descentralização, sendo que o Estado não perde a sua titularidade.
3 A CONCESSÃO
3.1 considerações gerais
Como já se afirmou, a excessiva demanda por serviços públicos existente no seio social não permite que o Estado possua a capacidade material de executá-los em sua a totalidade. Ademais, o momento político econômico por qual passa a humanidade, conhecido como neoliberalismo, esvazia por demais as possibilidades econômicas da prestação, já que o Estado, além de exercer funções administrativas, teria que se dedicar a atividades altamente competitivas que podem ser praticadas por particulares.
A doutrina, diante dessa impossibilidade estatal de exercer serviços públicos específicos, principalmente aqueles que demandam maiores investimentos, passou a formular que essa impossibilidade é o fundamento político da concessão.
O fundamento político indica que a concessão é calcada na oportunidade e conveniência da Administração Pública, que pode ou não delegar os serviços públicos a particulares, conforme ensina mais uma vez Diógenes Gasparini
O fundamento político reside na conveniência e oportunidade de ser descentralizado o serviço público aproveitando-se o potencial econômico, financeiro e tecnológico de particulares, transformados após firmado o contrato em concessionários. Estes, por não atuarem vinculados aos rígidos princípios que regulam as atividades administrativas, podem realizar os serviços que lhes foram transferidos com mais presteza e segundo as mais modernas técnicas existentes para o oferecimento de comodidades e utilidades à coletividade. Ademais, com a participação dos concessionários a Administração Pública concedente evita investimentos em atividades que não lhes são primordiais e, mediante vigilância constante, torna compatível a atuação desses executores com os interesses que persegue. (2002, p. 298)
Já o fundamento jurídico para a concessão está encastelado na Constituição Federal, em seu artigo 175, no capítulo que trata da ordem econômica e financeira, quando dispõe que incumbe ao Estado a prestação dos serviços públicos, diretamente, ou sob o regime concessão ou permissão.
Esse artigo da Carta Magna reforça a idéia de que a titularidade do serviço é do Estado, no entanto ressalva a possibilidade de que o seu exercício seja outorgado a pessoas alheias à administração pública.
Essa idéia de titularidade remonta à intenção do Poder Constituinte Originário, qual seja, a de não permitir que o Estado se esquive de um mister inerente à sua razão de existir que é o de prestar o serviço público, seja de forma centralizada ou descentralizada.
Daí se extrai o caráter eclético da Constituição Federal, que traduz em última razão o modo de ser do povo brasileiro, pois de um lado não se deixou de reconhecer que se vive em uma economia globalizada, onde as necessidades criadas pelo consumo são inúmeras, e o Estado não pode intervir na economia, nem prestar toda a sorte de serviços, mesmo que sejam públicos. Todavia, pôs uma ressalva a essa realidade, prescrevendo que mesmo que a atividade econômica não execute os serviços por meio da concessão, o Estado tem que prover as necessidades públicas.
Fazendo jus à importância do instituto da concessão e para que se possa melhor entendê-lo, traz-se um conceito da lavra de Celso Antônio Bandeira de Mello
Concessão de serviço público é o instituto através do qual o Estado atribui o exercício de um serviço público a alguém que aceita prestá-lo em nome próprio, por sua conta e risco, nas condições fixadas e alteradas unilateralmente pelo Poder Público, mas sob garantia contratual de equilíbrio econômico-financeiro, remunerado pela própria exploração do serviço, em geral e basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários do serviço.(2003, p. 267)
Vê-se que esse conceito é claro ao indicar que a concessão possui a natureza jurídica contratual. É o que se interpreta quando o autor descreve que a concessão se submete ao regime da proteção contratual de equilíbrio econômico financeiro para o concessionário.
Tal posicionamento acerca da natureza jurídica da concessão é por demais sintonizado com a Constituição Federal.
A Carta Magna, no inciso I do parágrafo único do seu artigo 175, se utiliza da expressão contrato ao dispor sobre a prestação dos serviços públicos pelas empresas concessionárias.
Ademais, doutrinadores como Diógenes Gasparini entendem que seja essa a natureza jurídica da concessão, embora se registrem entendimentos diversos acerca do tema, considerando a concessão um ato unilateral.
De fato não se pode desconsiderar que a unilateralidade, característica dos contratos de Direito Público, conduz o intérprete a pensar inicialmente que se trata de um ato unilateral, no qual apenas o concedente possui direitos.
Todavia, não se deve conduzir a uma interpretação que atribui apenas direitos ao Estado, e ao concessionário somente deveres, pois na prática se tornaria inviável a execução de serviço público por particulares.
O concessionário também deverá ser respeitado nessa relação, pois a relação é de natureza contratual, e as partes se encontram vinculadas por meio de um contrato. Contudo, frise-se que o concessionário de serviço público somente passa a adquirir direitos quando da realização do contrato com a Administração Pública.
Não há que se falar em direito subjetivo do interessado a ser contemplado com uma concessão antes de celebrar o contrato administrativo, não podendo aquele reclamar o respeito a qualquer direito adquirido, conforme ensina Diógenes Gasparini
Esses atos e contratos são, ademais, constitutivos de direito. De fato, o interessado não tem, em tese, qualquer direito subjetivo à execução e exploração de serviços de alçada da Administração Pública. Os pretendentes participam, perante a Administração Pública, dos procedimentos licitatórios que visam transferir a execução e exploração de um serviço público, embora saibam que a essas atividades não têm direito. Assim, se investidos no privilégio desejado, resta obvio que tiveram sua esfera de direitos aumentada. Antes da manifestação da Administração Pública, tinham apenas uma expectativa de direito, e, após, passam a ter direito e a desfrutar de novas prerrogativas. Por força dessa investidura têm direito a ver a outorga e os direitos dela decorrentes respeitados pela Administração Pública titular dos serviços trespassados, cabendo contra medidas arbitrárias os competentes processos judiciais e administrativos. (2002,p. 295)
Trata-se, portanto, de um instituto que possui a natureza contratual criando direitos e obrigações para ambas as partes, estando o Estado em posição de supremacia, por ser em última análise guardião do interesse público, conforme se abordará em tópico posterior.
Entretanto, é importante ressaltar, repita-se, que esses direitos do concessionário somente estarão a sua disposição quando concretizada a relação contratual, não se falando em direito adquirido antes dessa etapa inicial.
3.2 Serviços que podem ser concedidos
Sabendo-se que os serviços públicos podem ser executados por particulares, cabe fazer o seguinte questionamento: quais serviços poderão ser concedidos ao particular pelo Estado? Responder a essa pergunta demanda necessariamente afirmar que existem serviços públicos que podem ser delegados, e outros que não o podem.
Os serviços públicos indelegáveis se confundem com a própria razão de existir do Estado, são exemplos os serviços judiciários, os de manutenção da ordem pública, os inerentes ao Poder de Polícia do Estado, dentre outros, assim leciona José dos Santos Carvalho Filho, em sua obra Manual de Direito Administrativo
Serviços delegáveis são aqueles que, por sua natureza ou pelo fato de assim dispor o ordenamento jurídico, comportam ser executados pelo Estado ou por particulares colaboradores. Como por exemplo os serviços de transporte coletivo, energia elétrica, sistema de telefonia, etc. Serviços indelegáveis, por outro lado, são aqueles que só podem ser prestados pelo Estado diretamente, ou seja, por seus próprios órgãos ou agentes. Exemplificamos com os serviços de defesa nacional, segurança interna, fiscalização de atividades, serviços assistenciais etc. (2003, p. 262)
Essa classificação dos serviços públicos em delegáveis e não delegáveis é por demais importante, haja vista o Estado somente possuir autorização para conceder a particulares a execução dos serviços públicos delegáveis.
3.3 A Relação contratual
Sabendo-se que o instituto da concessão possui natureza jurídica contratual, conforme anteriormente explanado, parte-se para saber de que forma se realiza o contrato entre administração concedente e particular concessionário.
É importante pesquisar se as mencionadas partes estão em relação de igualdade nessa relação e se existem regimes diferenciados previstos pelo ordenamento jurídico para regular as diversas outorgas do serviço público a particulares.
O estudo das características do serviço público, quais sejam, sujeito estatal, interesse coletivo e regime de direito público, ante explicitados neste trabalho, é capaz de indicar que a concessão dos serviços públicos em geral deve obedecer a regras específicas, diferentes das de direito civil, sobretudo porque existe a supremacia do interesse público.
Como poderia o Estado outorgar a execução de serviços que tratam de interesse público, que afetam uma coletividade de pessoas, se ele não possuísse prerrogativas capazes de evitar prejuízos para os administrados?.
Conclui-se, portanto, que o princípio da autonomia das vontades certamente não poderia ser aplicado irrestritamente em relações contratuais tão complexas, pois não se poderia tolerar que o concessionário de um serviço público ditasse suas regras acima de um interesse público superior aos interesses particulares.
É por esse motivo, dentre inúmeros outros trazidos pela doutrina, que a concessão de serviço público se submete a um regime contratual diferenciado, se submete a regras onde prevalece o poder de império da administração pública, instrumentalmente utilizado na consecução do interesse público.
A concessão de serviço público, por isso, submete-se à disciplina geral dos contratos administrativos. Sobre a natureza jurídica das concessões, leciona Celso Antônio Bandeira de Mello, em sua obra Curso de Direito Administrativo
A concessão é uma relação jurídica complexa, composta de um ato regulamentar do Estado que fixa unilateralmente condições de funcionamento, organização e modo de prestação do serviço, isto é, as condições em que será oferecido aos usuários; de um ato-condição, por meio do qual o concessionário voluntariamente se insere debaixo da situação jurídica objetiva estabelecida pelo Poder Público, e de contrato, por cuja via se garante a equação econômico-financeira, resguardando os legítimos objetivos de lucro do concessionário. Sem embargo do que se vem de dizer, no Direito brasileiro a concessão de serviço público tanto como a de obra pública são pura e simplesmente nominadas de contratos administrativos. (2003, p. 653)
Buscando entender os contratos administrativos, infere-se que estes são regidos por uma lógica específica. De um lado a administração pública zelando pelo interesse público, de outro, o setor privado em busca do lucro.
É essa relação que direciona o regramento jurídico das concessões de serviço público, de onde se originam as características desses contratos, que são regidos por claúsulas exorbitantes de direito privado, que significa uma relação contratual previamente desigual, na qual a administração pública possui supremacia, a fim de zelar pelo interesse público, podendo aquela alterar unilateralmente o contrato, dentre outras prerrogativas.
Quanto ao particular, resta àquele a garantia de que o equilíbrio econômico financeiro sempre estará preservado, ou seja, independentemente das alterações realizadas pela administração, este terá o direito de ser compensado em seus prejuízos.
De acordo com Diógenes Gasparini, são atitudes passíveis de serem adotadas pela administração no exercício das cláusulas exorbitantes
Nos contratos administrativos reconhecem-se em razão da lei, da doutrina e da jurisprudência, a favor da Administração Pública contratante, certas prerrogativas, a exemplo de a) modificar a execução do contrato a cargo do contratante particular; b) acompanhar a execução do contrato; c) impor sanções previamente estipuladas d) rescindir, por mérito ou legalidade, o contrato. Esses privilégios ou, mais precisamente, deveres-poderes, consubstanciam as claúsulas exorbitantes, que, segundo Vedel, são as não comuns ao contrato de Direito Privado porque nulas (desigualam as partes) ou impróprias (poder de fiscalização e de impor sanções) para essa espécie de ajuste.(2002, p. 550).
Exposta sucintamente a disciplina dos contratos de concessão de serviço público, vale ressaltar que a outorga dos serviços públicos deve ser procedida mediante prévia licitação, conforme exigência da Constituição Federal brasileira, em seu artigo 37, inciso XXI.
Do ponto de vista infraconstitucional, a concessão de serviço público é disciplinada pela Lei nº. 8.987 de 13 de fevereiro de 1995. No entanto, a Lei em comento somente disciplina a concessão de serviços público simples e de serviço público precedido de obra pública.
4 O PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, pode-se afirmar que houve uma mudança de paradigma na relação Estado-Cidadão, tanto é que os direitos e garantias fundamentais passaram a preceder a Organização do Estado e dos Poderes, estando dispostos nos primeiros capítulos da Constituição Federal.
A premissa de que a razão de o Estado existir é a satisfação do bem comum passou a ser divulgada na sociedade durante a redemocratização do Estado e as pessoas passaram a tomar conhecimento dos seus direitos e das limitações do Estado frente aos indivíduos.
Toda essa mudança de paradigma fez com que a sociedade cobrasse eficiência na prestação dos serviços públicos.
No ano de 1998, a Emenda Constitucional n° 19, conhecida como a Emenda da reforma administrativa, incluiu no artigo 37 da Constituição Federal o Princípio da eficiência:
Art. 37 A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidadde, publicidade e eficiência.
Frise-se que mesmo antes da Emenda Constitucional nº 19/1988, o Estado não estava autorizado a se eximir da prestação eficiente de serviços, uma vez que já havia presunção axiológica dessa obrigação dentro do contexto normativo da Constituição.
Bandeira de Mello, ao lecionar sobre o princípio, informa que a sua existência remonta ao princípio da legalidade e ao princípio maior da boa administração:
De toda sorte, o fato é que tal princípio não pode ser concebido (entre nós nunca é demais fazer ressalvas óbvias) senão na intimidade do princípio da legalidade, pois jamais uma suposta busca de eficiência, justificaria postergação daquele que é o dever administrativo por Excelência . Finalmente, anote-se que este princípio da eficiência é uma faceta de um princípio mais amplo já superiormente tratado, de há muito, no Direito Italiano: o princípio da boa administração. (2003, p. 112)
De mais a mais, o fato é que o princípio da eficiência está previsto de forma literal no artigo 37 da Constituição Federal e pré dispõe que a Administração Pública deverá prestar um serviço rápido, perfeito e que produza rendimento.
Nas palavras de Diógenes Gasparini:
Conhecido pelos italianos como “dever da boa administração”, o princípio da eficiência impõe à Administração Pública direta e indireta a obrigação de realizar suas atribuições com rapidez, perfeição e redimento, além, por certo, de observar outras regras, a exemplo do princípio da legalidade. (2002, p. 19)
A introdução do princípio da eficiência pela Emenda Constitucional nº 19 de 1998 reflete uma nova visão da Administração Pública, que fora adotada após a reforma administrativa do Estado, conforme asseveram os autores Marcelo Alexandrino e Vicente Filho:
Desde a última década do século passado vem sendo promovida no Brasil uma série de alterações constitucionais e legais com o objetivo de implantar entre nós um modelo de administração pública conhecido como “administração gerencial” fundado, em tese no princípio da eficiência, visando a substituir o padrão tradicional da Administração Pública, dita burocrática cuja ênfase recai sobre o princípio da legalidade (...) Esse conjunto de idéias, quando posto em prática, leva a duas linhas de movimentos bastante nítidas: a) a partir da noção de “administração gerencial”, que privilegia o princípio da eficiência, o foco desloca-se para a obtenção de resultados pela máquina estatal busca-se ampliar a autonomia dos órgãos e entidades integrantes da Administração Pública, mormente pela redução de controles de procedimentos (...) ademais, utilizam-se de instrumentos tendentes a assegurar que a produtividade dos agentes públicos dos quadros profissionais da administração seja próxima daquela que se observa quanto aos trabalhadores de empresas privadas. (2009, p. 130)
Em resumo, o fato é que, adotando o legislador o paradigma da administração gerencial, passou-se a exigir que o Estado preste um serviço público, não como uma mera obrigação, mas um serviço público rápido e perfeito, capaz de atender às necessidades dos cidadãos.
3- A EXIGÊNCIA DA EFICIÊNCIA PELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
Sabe-se que o Ministério Público, após a Constituição Federal de 1988, passou a ser a instituição responsável por zelar pelo respeito aos poderes públicos e pelos serviços de relevância pública:
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
II – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevência pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia.
Além dessa atribuição, o Ministério Público passou a atuar em outros casos nos quais o interesse social se faz presente, deixando de ser apenas um Órgão com função de fiscalizador da aplicação da lei ou mesmo de acusador no Processo Penal, passando a ser também ombudsman, órgão que atua na defesa da sociedade, conforme ensina Paulo Gustavo Guedes Fontes, Procurador da República e autor:
A Constituição de 1988 confirmou o Ministério Público nessas atribuições e erigiu numa espécie de ombudsman encarregado dos interesses coletivos em geral. Foi no quadro dessas novas funções que a instituição pôde encetar um controle importante sobre a Administração Pública. (2006, p. 26)
Diante dessas novas atribuições, pode-se afirmar que o Ministério Público é a instituição que melhor poderá cobrar eficiência na prestação dos serviços públicos, uma vez que obteve status de instituição autônoma e independente e os seus membros passaram a dispor das mesmas garantias e prerrogativas dos membros do Poder Judiciário.
Ademais, vê-se que os serviços públicos, por natureza, são serviços de relevância pública, uma vez que se baseiam em dois pilares: interesse coletivo e regime de direito público, o que se amolda perfeitamente à previsão constitucional referente à atuação do parquet.
3.1 exigência da eficácia na prestação dos serviços públicos, através de medidas judiciais e extrajudiciais.
Em razão da crescente demanda e espécies de serviços exigidos pela sociedade de massas, o Estado nem sempre consegue atuar de forma eficiente quando da prestação dos serviços públicos.
Embora o Estado não possa se esquivar da sua obrigação em prestar o serviço de forma eficaz, uma vez que é seu titular, há casos nos quais o Ministério Público deverá tentar solucionar a questão da ausência de eficácia, por meio de medidas extrajudiciais, resguardando-se a adotar as medidas judiciais cabíveis em último caso.
A atuação do Ministério Público de forma resolutiva, ou seja, sem a necessidade de ingresso com demanda judicial vem sendo apresentada como uma nova linha de atuação ministerial e tem sido exitosa, conforme leciona Leonardo Barreto Moreira:
Uma vez compreendido que o Ministério Público pode ter atuação classificada como demandista (quando busca o Poder Judiciário) ou resolutiva (quando resolve internamente determinado problema a partir de seus instrumentos e prerrogativas sem necessidade de provocação da prestação jurisdicional), a doutrina institucional progressista, constitucionalmente oxigenada, tem acentuado a necessidade de se estimular o desempenho desse segundo papel, quer pela morosidade infelizmente usual do Poder Judiciário na atenção à tutela coletiva, quer, sobretudo, pelo caráter democrático, fortalecimento e valorização das próprias atribuições do Ministério Público quando se consegue obter bons resultados para a sociedade dessa forma (2010, p. 34)
Nessa senda, filiando-se ao posicionamento de que as medidas judiciais devem ser utilizadas após a tentativa extrajudicial de resolução, defende-se que inicialmente deverão ser adotadas as medidas extrajudiciais para que, posteriormente, se possa ingressar com uma demanda judicial.
3.1.1 envio de Ofícios solicitando informações e realização de audiências públicas.
Em muitos casos, o simples envio de Ofício requisitando informações aos órgãos, entidades públicas ou até mesmo empresas privadas prestadoras de serviço publico, pode ser útil e até sanar pequenas irregularidades.
Além de ser a primeira medida a ser adotada pelo Órgão Ministerial, é através desse expediente que o Ministério Público irá obter informações originárias do próprio concessionário, que poderão servir de instrumento de prova da eventual prática abusiva.
Assim leciona Moreira:
É por meio de ofício que se comunicam aos órgãos internos a abertura desses expedientes, bem como por intermédio deste instrumento que se viabiliza a instrução das investigações, incluindo a imprescindível diligência de serem requisitados documentos para exame e apreciação, entre outros atos. (2010, p. 63)
Com base nessas informações o Órgão Ministerial poderá designar a realização das audiências públicas, que registre-se, é um dos grandes instrumentos de aproximação do Ministério Público com a sociedade, conforme se transcreve do mesmo doutrinador:
Na função de defesa do povo e da sociedade civil (ombudsman), dentro das atribuições extrajudiciais de fiscalização e tomada de providências em relação a poderes constituídos ou autoridades, inevitável que a prática e realização de reuniões e audiências públicas revelem espaços e compromissos constantes, necessários e úteis ao bom desempenho das atribuições extrajudiciais do Ministério Público (2010, p. 65)
Durante as audiências públicas será possível coletar uma maior quantidade de dados e provas necessárias à instrução dos procedimentos administrativos e apreender informações técnicas de entidades participantes da audiência.
Além disso, durante a realização das audiências públicas é possível que os concessionários se comprometam a solucionar o descumprimento das suas obrigações, realizando termos de ajustamento de conduta, instrumento que a seguir será explanado.
3.1.2 Recomendações Administrativas
As Recomendações Administrativas são peças elaboradas pelos órgãos ministeriais, com vista a alertar os seus destinatários acerca de eventual irregularidade existente.
É uma peça que emite a posição do Ministério Público e adverte o infrator, passando-se a mensagem de que em caso de descumprimento, o Ministério Público adotará as medidas cabíveis.
Ensinam Leonardo Barreto Moreira Alves e Marcio Soares Berclaz:
A Recomendação Administrativa, em síntese, trata-se de peça narrativa e argumentativa na qual o Ministério Público emite posição e orientação em determinado sentido, alertando e advertindo o destinatário da medida de que o descumprimento do comportamento cobrado e exigido implicará na adoção das providências cabíveis dentro das atribuições ministeriais” (2010, p. 35).
Havendo deficiência no que tange à prestação do serviço público é possível que uma Recomendação Administrativa seja suficiente para a solução do impasse.
É bom frisar que as Recomendações Administrativas não são meras cartas de orientação, mas possuem um conteúdo cogente, uma vez que deixam expressa a obrigação do fornecedor e no caso de descumprimento, deixa patente que o fornecedor está praticando uma conduta abusiva, apesar de devidamente notificado.
Cita-se mais uma vez os ilustres membros do Ministério Público anteriormente citados:
Como se vê, não obstante a denominação possa gerar algum tipo de confusão ou mesmo caracterizar impropriedade terminológica do legislador, obviamente que a Recomendação Administrativa não é uma simples sugestão, conselho ou recado destituído de força cogente e coativa, predicados, aliás, não inerentes ao universo jurídico e ao próprio campo do direito enquanto ciência (2010, p. 36)
Portanto, pode-se ver, através dos ensinamentos dos membros do Ministério Público acima citados, que as Recomendações Administrativas são instrumentos eficazes, dos quais dispõem os membros do Ministério Público para efeito de buscar a eficiência, quando da prestação dos serviços públicos.
3.1.2 Termos de Ajustamento de Conduta.
Os Termos de Ajustamento de Conduta ou Compromissos de Ajustamento de Conduta são acordos celebrados entre o Ministério Público e os fornecedores. Uma grande vantagem desses acordos é que eles possuem a natureza jurídica de título executivo extrajudicial.
Cita-se Moreira e Berclaz;
O termo de ajustamento de conduta (TAC) nada mais é do que uma transação ou acordo formalizado buscando estabelecer determinada conduta ou comportamento, sob pena de sanção, acerto de vontades que, uma vez firmado, constitui título executivo passível de realização pelas modalidades executórias disponíveis. (2010, p. 47)
Os Termos de Ajustamento de Conduta podem ser celebrados a qualquer momento, não só na fase extrajudicial, mas também na fase judicial, conforme ensinam os mesmos autores:
O momento da sua incidência é extremamente diversificado e depende da realidade de cada situação concreta. Situa-se ordinariamente no âmbito extrajudicial vinculado a determinado procedimento administrativo (exemplo: Procedimento Preparatório ou Inquérito Civil) ou mesmo Recomendação Administrativa autônoma, mas não sendo de se afastar a possibilidade da sua celebração ocorrer após ajuizamento de Ação Civil Pública, portanto, posteriormente ao desempenho de alguma atribuição de natureza judicial (2010, p. 48)
Assim, após a expedição de uma Recomendação Administrativa, ou após a realização de uma audiência pública ou até mesmo após uma simples conversa entre o Órgão Ministerial e o concessionário, caso haja interesse de se acordar sobre determinada questão, poderá ser celebrado um TAC com vistas à solução do litígio, podendo inclusive ser arbitrada multa, para o caso de descumprimento do acordo por parte do fornecedor.
Caso haja o descumprimento, o Acordo valerá como Título Executivo Extrajudicial e poderá se ingressar com uma Ação Civil Pública para executar o título.
Assim, é possível afirmar que o TAC é um dos instrumento mais importantes a ser utilizado quando da solução extrajudicial dos conflitos. Além de ser possível arbitrar uma multa em caso de descumprimento e além de ter a eficácia de título executivo extrajudicial, o TAC é um instrumento através do qual o Ministério Público obtém a confissão fática do Requerido, não precisando ingressar com uma Ação Civil Pública de Conhecimento. Basta executar o TAC, inclusive a multa nele prevista.
3.1.3 Ação Civil Pública
A Ação Civil Pública é uma medida Jurisdicional de solucionar o litígio, quando não mais for possível a resolução extrajudicial do litígio. É a medida mais conhecida, sobretudo porque é a mais relatada nos trabalhos acadêmicos.
Por essa razão, não se faz necessário discorrer com profundidade sobre o tema, sob pena de se tornar repetitivo.
A Ação Civil Pública está prevista na Lei 7347/85 e trata-se de uma Ação que visa proteger os direitos difusos e coletivos, tanto é assim que o cidadão individualmente não possui legitimidade para ajuizá-la, mas somente as associações e o Ministério Público.
No caso de haver a ocorrência de práticas abusivas pelos fornecedores de serviços de plano de saúde, após esgotadas as tentativas extrajudiciais, aconselhável o ingresso co a ACP buscando inclusive a tutela inibitória com fixação de multa em caso de descumprimento.
CONCLUSÃO
Diante dos fatos narrados, pode-se afirmar que o Ministério Público poderá cobrar a eficiência na prestação dos serviços públicos através de medidas judiciais ou extrajudiciais, sendo que a adoção das medidas extrajudiciais deverá ser a regra, quando do início da tentativa de solução do litígio.
Em relação às medidas extrajudiciais será possível se utilizar do envio de Ofícios, requerendo informações acerca da ausência ou defeito na prestação do serviço, poderam ser realizadas audiências públicas ou até mesmo celebrados os Termos de Ajustamento de Conduta.
No que tange às medidas judiciais a serem adotadas para se exigir a eficiência na prestação dos serviços, tem-se que a Ação Civil Pública é a Ação Judicial adequada, podendo ser uma Ação Executiva de Termo de Ajustamento de Conduta ou mesmo uma Ação Civil Pública de Conhecimento, onde poderá ser aplicada a Tutela Inibitória.
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Analista do Ministério Público do Estado de Sergipe. Especialista em Direito Público e Direito do Consumidor.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NETO, Gonçalo Ribeiro de Melo. A exigência da eficiência na prestação dos serviços públicos pelo Ministério Público Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 out 2010, 10:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/21795/a-exigencia-da-eficiencia-na-prestacao-dos-servicos-publicos-pelo-ministerio-publico. Acesso em: 23 dez 2024.
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