Co-autor: Matheus Morais de Oliveira Melo [1]
O presente trabalho parte da discussão sobre a formação e eficácia probatória dos contratos realizados por computador e da inexistência de legislação específica sobre o tema, e busca comprovar a validade dos negócios jurídicos realizados no ambiente virtual através da sua adequação aos requisitos exigidos para os contratos tradicionais, demonstrando a desnecessidade de regulamentação exaustiva sobre essa matéria. Objetivou-se, para tanto, conhecer a realidade da comercialização eletrônica, através da identificação do tipo de contrato e de indivíduo que, predominantemente, realiza esse tipo de transação comercial, para se concluir que o contrato é forma de assegurar as novas necessidades humanas.
A relevância social deste artigo científico é verificada pelo número cada vez maior de pessoas naturais e jurídicas que realizam os mais variados negócios utilizando a Internet e, por considerar que apesar de ser dever do ordenamento jurídico de qualquer nação acompanhar a modernização social de seu povo, o direito brasileiro ainda não sabe como lidar com a contratação eletrônica, embora seja doutrinariamente unânime que a lei não é fonte única e exclusiva do direito, prova disso é que o presente tema exige a utilização de técnicas de interpretação.
A Constituição Federal de 1988 consagra o intervencionismo estatal, institucionalizando a interferência do estado nas relações entre os particulares, que passam a ser limitadas, para se diminuir os riscos de insucesso, em especial das camadas economicamente mais frágeis da população. Substitui-se a idéia contratual clássica de igualdade formal entre as partes, pela igualdade material, onde o governo percebe a desigualdade fática entre os contratantes e intervem no contrato.
Essa nova forma de pensar, modifica ou ao menos fornece um norte aos juristas pátrios com relação a um meio diverso de aplicação do típico instituto do direito privado conhecido como contrato, alterando a antiga visão de autonomia plena da vontade, para um enfoque direcionado à realidade social dos envolvidos na relação contratual, não concebendo mais esse instituto sob a égide do pacta sunt servanda puro e simples.
A renovação do direito privado é fruto do engrandecimento do princípio da dignidade da pessoa humana como resposta da sociedade à disseminação dos contratos-modelo. A evolução por que passa o Direito Civil e por conseqüência o instituto do contrato decorre necessariamente da modificação dos interesses da coletividade, que propugna pela compatibilização dos princípios da liberdade contratual com o da igualdade entre os contratantes, ainda que tal harmonização custe a diminuição da esfera de liberdade individual e o maior intervencionismo estatal, para com isso evitar que a autonomia privada imponha suas valorações à sociedade.
A necessidade de adequação do direito aos anseios da coletividade é evidenciada pelo surgimento da informática, modificando radicalmente a relação entre informação e sociedade, o que se reflete em todos os setores da realidade social. Atualmente, verifica-se a informatização da sociedade. Até os limites de tempo e espaço estão sendo questionados por essa nova ciência, através do advento da internet. Observa-se uma migração dos meios tradicionais de negócios, pois a presença virtual, na modernidade, pode significar a sobrevivência de uma empresa.
2.1 A Internet
No Brasil, a internet surgiu em 1988, com uso restrito a universidades e centros de pesquisa. Sete anos depois, com a publicação da Portaria nº 295, de 20/07/1995, pelo Ministério das Comunicações, foi criada a figura do provedor de acesso privado à Internet, que, com isso, passou a ter uso comercial no País.
Os primeiros sites surgidos no Brasil eram de notícias. Em seguida vieram os de compras, entretenimento e pesquisa, fato que, aliado ao aumento nos índices de criminalidade, à diminuição do valor dos equipamentos de informática e ao constante aprimoramento dos serviços de telecomunicações atrai milhares de brasileiros à rede mundial de computadores. Tal evento vem provocando transformações sociais visíveis não só da forma como as pessoas passaram a se comunicar, tanto no ambiente de trabalho quanto na vida particular, como também, modificou a maneira tradicional de se adquirir produtos, serviços e, em especial, informação, algo inerente à socialização do próprio homem.
Surgem, então, as transações comerciais via internet, originando o que se convencionou chamar de comércio eletrônico ou e-commerce, que se divide em três segmentos: o B2C (da expressão em inglês business to consumer), o B2B (business to business) e bancos e corretoras on-line. O B2C corresponde às transações entre as empresas e os consumidores finais para a aquisição de produtos, como: CDs, livros, automóveis, eletrodomésticos, computadores, alimentos e vestuário ou serviços. Os shoppings on-line fornecem todas as informações necessárias para que o consumidor adquira um produto sem a necessidade de interação física com os representantes comerciais da empresa. O B2B refere-se a toda a venda (negócio) realizada entre empresas, órgãos públicos e outras entidades através da internet, como: venda e compra de matéria-prima, peças, equipamentos e serviços de todo tipo. No segmento de bancos e corretoras on-line está toda a movimentação feita entre instituições financeiras e seus clientes: compra de ações, transferência de dinheiro, aplicação em caderneta de poupança e títulos públicos etc.
A Internet adquiriu importância tamanha para a sociedade que foi criada uma bolsa de valores especialmente para o ramo, a Nasdaq.
A dependência do mundo virtual é incontestável, tarefas corriqueiras do cotidiano foram transportadas para a rede mundial de computadores e a tendência é a substituição gradativa do meio físico pelo eletrônico, como um espelho da vida moderna em sociedade.
2.2.1 Conceito
O contrato se forma através de um acordo de vontades, resultante da identidade entre duas declarações de vontade (oferta e aceitação), com a finalidade de produzir efeitos jurídicos, como a constituição, modificação, conservação ou extinção de direitos, impondo aos contratantes sua observância.
De forma genérica, pode-se conceituar contrato eletrônico como aquele ajustado ou executado por meio digital, englobando tanto aquele acordo de vontades formado pela via eletrônica[2] (contrato eletrônico stricto sensu), como também, o contrato que em algum momento, ainda que parcialmente, foi executado eletronicamente[3] (contrato eletrônico lato sensu).
Os atos negociais realizados através da internet são, portanto, celebrados em função de um tradicional instrumento jurídico denominado contrato, que no mundo digital sofre transformação quanto à sua forma da celebração, utilizando-se de um instrumento eletrônico através do qual as partes expressam seu interesse e consentem em pactuar. Há de se ter em mira, por isso, que não se trata do surgimento de nova modalidade de contrato no âmbito da teoria geral dos contratos, mas sim de forma nova de celebrá-lo ou executá-lo.
É mister ressaltar que o uso da expressão contrato eletrônico não é unanimemente aceita entre os juristas pátrios, alguns preferem as terminologias: contrato por computador, contrato on-line, contrato artificial-cibernético, contrato digital ou contrato informático. Por ser a mais usual, entretanto, adotou-se na presente obra a expressão contrato eletrônico, visando a percepção de que se trata de celebração contratual real, séria, verdadeira e confiável, além de seguir o mesmo padrão de denominação já consagrado nas expressões documento eletrônico, comércio eletrônico (e-commerce), correio eletrônico (e-mail), mensagem eletrônica, banco eletrônico, dentre outras.
Isto posto, destaca-se a assertiva abaixo:
[...] se entenderá por contrato formalizado pelo meio eletrônico aquele celebrado sem a presença física simultânea das partes no mesmo lugar, expressando estas o seu consentimento na origem e no destino por meio de equipamentos eletrônicos de processamento e armazenamento de dados, conectados por meio de cabo, rádio ou meios óticos ou eletromagnéticos. [...] (LORENZETTI, apud SILVA JÚNIOR; WAISBERG, 2001. p. 285).
O contrato eletrônico é, portanto, a manifestação do acordo celebrado entre duas ou mais pessoas estabelecendo, alterando ou anulando um vínculo jurídico, de natureza patrimonial, expressando suas respectivas declarações de vontade através do uso de máquinas (computadores) interligadas, podendo ou não possuir assinaturas eletrônicas, que, por sua vez, podem ou não ser certificadas. Trata-se do comércio clássico realizado entre empresários e clientes ou entre empresas para vender produtos e serviços através de contratações à distância, conduzidas por meios eletrônicos.
O conteúdo contratual não sofre qualquer alteração seja o ambiente físico ou digital, dependendo sempre do acordo de vontades das partes. O mesmo ocorre com relação à exteriorização e pluralidade de vontades, sendo necessário constatar a presença dos requisitos subjetivos, quais sejam, a presença de duas ou mais pessoas, com capacidades genérica e específica[4] e o consentimento (consenso) dos contratantes. Dos requisitos objetivos da licitude do objeto e sua possibilidade física e jurídica, além deste ser certo ou determinável e versar sobre interesse economicamente apreciável. E dos requisitos formais, devendo a convenção obedecer à lei quando a mesma exigir para a validade do ato forma especial, de modo que, não demandando o objeto da contratação forma prescrita em lei, é admissível como contrato válido e eficaz e apto a produzir os efeitos visados pela partes contratantes, o contrato celebrado por meio eletrônico.
2.2.2 Princípios
Por ser o contrato eletrônico, um contrato tradicional com diferente forma de celebração, a ele se aplicam todos os princípios norteadores do direito contratual, vale dizer, o Princípio da Autonomia da Vontade, desdobrado nos princípios da liberdade de contratar ou não, de contratar aquilo e quando se considerar oportuno, de escolher com quem se deseja celebrar o negócio jurídico e o conteúdo do que será pactuado, tudo isso, porém limitado pelo interesse coletivo e pela moralidade social. O Princípio do Consensualismo, que para alguns autores faria parte da própria autonomia de vontades, já que o acordo entre as partes, regra geral, é suficiente para que o contrato seja válido e eficaz. O Princípio da Obrigatoriedade da Convenção, pois o acordado entre as partes deve ser fielmente cumprido, sob pena do contratante inadimplente sofrer execução patrimonial, tal princípio sofre restrição no caso das partes espontaneamente rescindirem o acordo, se ficar constatada a existência de força maior ou caso fortuito, na hipótese de onerosidade excessiva no cumprimento da prestação por uma das partes ou no caso elencado no artigo 49 da Lei nº 8.078/90. O Princípio da Relatividade dos efeitos do negócio jurídico contratual apenas às partes contratantes, vez que a convenção decorre da convergência de suas vontades. E, finalmente, o Princípio da Boa-Fé[5], pelo qual as partes devem agir com lealdade e confiar uma na outra, pois na interpretação do contrato levar-se-á em consideração a intenção das partes deduzida através de suas declarações de vontade.
Além destes, aplica-se também o Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana, para que o pactuado pelas partes tenha, também, como finalidade a promoção do indivíduo, sua satisfação pessoal.
Vê-se, a seguir, alguns princípios aplicados especificamente na regulação da Internet e na tecnologia digital como um todo.
2.2.2.1 Liberdade de expressão
As Declarações Internacionais sobre Direitos Humanos, bem como a Constituição Federal Brasileira de 1988 (art. 5º, incisos IV e IX), contemplam aos indivíduos em sociedade o direito à liberdade de expressão, que deve ser entendido como o direito de decidir e agir segundo a própria vontade, no que diz respeito a exteriorizar os próprios sentimentos e pensamentos.
Trata-se, talvez, do mais importante princípio específico do mundo virtual, e aquele que provocou e continua a suscitar discussões a respeito de questões relevantes como: se existe responsabilidade dos provedores de informação e dos intermediários, se a internet é espaço público ou privado, se o direito de propriedade se sobrepõem ao de liberdade, se o meio eletrônico deve obedecer às mesmas considerações referentes aos demais meios de comunicação social, como por exemplo, através de informação (alerta) do conteúdo de cada site, como ocorre com o rádio e a televisão. Relacionada a esta última questão, legislações alienígenas como a Argentina limitam a liberdade pela via eletrônica e restringem o acesso a determinados sites, através da comprovação de idade.
2.2.2.2 Liberdade de comércio
Este princípio implica na auto-regulação das partes e, com isso, uma intervenção estatal mínima, limitada ao necessário para o funcionamento institucional do mercado.
Deve-se observar, no entanto, que essa liberdade de negociação entre o fornecedor e o consumidor com finalidade de lucro, como os princípios concernentes aos contratos em geral, sofreu restrições pela promulgação da Constituição de 1988 que preconiza uma maior intervenção do estado na ordem econômica em nome do bem-estar e da segurança social. Como exemplo do que foi afirmado, tem-se o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana que visa adaptar os valores encontrados nas relações civis aos anseios da sociedade e pela entrada em vigor do Código de Defesa do Consumidor, que constatando a existência de uma parte mais fraca, vulnerável numa relação contratual, oferece-lhe mecanismos de proteção, para que a negociação transcorra num patamar de igualdade material entre os contratantes.
2.2.2.3 Da não discriminação do meio digital
As partes são livres para adotar qualquer procedimento de formalização de seus negócios, salvo quando a lei dispõe em contrário. O Estado, contudo, ao elaborar normas para regulamentar a realização dos contratos deve tomar cuidado para que as mesmas não apresentem caráter discriminatório, no sentido de limitar a participação social nas negociações eletrônicas, tão somente por não ter sido utilizado um instrumento escrito. Tem, o poder público o dever de permitir que se possa provar em juízo que a transação realizada virtualmente é válida, até porque a própria Legislação Nacional permite que se demonstre a veracidade do que foi alegado por qualquer dos meios em direito admitidos e não somente através da apresentação de documento escrito.
2.2.2.4 Da proteção contratual
Trata-se em verdade de princípio limitador ao anteriormente explicitado princípio da liberdade de comércio. Visa proteger a parte mais fraca da relação negocial, impondo regras justas e que neutralizem as diferenças econômicas e de conhecimento (com relação ao produto ou serviço que se está adquirindo) que indubitavelmente existem entre os pactuantes. Essa proteção se dá, em especial, com a aplicação das regras contidas no Código de Defesa do Consumidor e das orientações que a Constituição Federal, no que diz respeito às partes de um contrato.
2.2.2.5 Proteção da privacidade
A proteção à privacidade entra em choque com dois outros princípios do mundo virtual, o da liberdade de expressão e da liberdade de comércio, todos direitos também protegidos pela Constituição de 1988. Em função disso, está-se diante do principal problema relacionado à organização do ambiente virtual.
A privacidade, aqui, deve ser compreendida não apenas como o direito de estar só, mas, principalmente do sujeito-usuário saber previamente da presença de fichários (cookies) na página eletrônica que visita e consentir que seus dados pessoais sejam neles armazenados. Através dos cookies se obtêm informações sobre os hábitos do usuário ao navegar pela internet,sites. Notícias que podem ser usadas de maneiras bastante variadas, sendo a mais comum a compra por grandes empresas de listas com endereços dos usuários, com a intenção de enviar mensagens publicitárias de seus produtos ou serviços (spam), sem a autorização do dono do e-mail, a fim de incrementar as vendas. aquilo que ele consome, freqüências de visitas a determinados tipos de
Essa situação abusiva tornou-se intolerável e, em resposta, surgiram reações sociais caracterizando tal prática como invasão de privacidade, originando o IBCI (Instituto Brasileiro de Proteção e Defesa dos Consumidores de Internet), entidade que tem como finalidade primordial a defesa e proteção dos direitos e interesses específicos e/ou difusos dos consumidores virtuais domiciliados no Brasil.
Em todo caso, é essencial que a página peça a autorização do usuário para enviar e-mail com propagandas, devendo informar ao internauta que dados seus serão registrados, para que se evite agressões à vida privada.
2.2.2.6 Liberdade de informação e de autodeterminação
Em função da criação de perfis, fichários dos usuários da rede mundial de computadores para fins diversos, como anteriormente explicado, desenvolveu-se o princípio do direito à autodeterminação da informação, que permite ao sujeito a prerrogativa de dispor dos dados referentes a sua vida privada, revelendo-os, transmitindo-os e em caso de arrependimento, cancelando a autorização dada para a sua utilização.
2.2.2.7 Caráter internacional
Por ser a internet uma tecnologia global, todas as regulamentações relacionadas ao seu uso devem levar em consideração esse princípio, segundo o qual as regras do comércio eletrônico devem ser interpretadas em observância ao seu caráter internacional. Esse entendimento cria uma tendência progressista de harmonização das regras aplicáveis nesta área, que em caso de divergência devem prevalecer sobre as leis nacionais.
2.3 Questões Relevantes
2.3.1 O documento eletrônico e o documento tradicional
“A palavra ‘documento’ deriva do latim documentu e designa qualquer base de conhecimento, fixada materialmente e disposta de maneira que se possa utilizar para consulta, estudo, prova etc”. (LUCCA, 2000, p. 43)
Juridicamente o documento possui relação com o instituto da prova, pois representam um meio real de representação de um fato. No século XX, surgiu uma tendência de associar-se a noção de documento ao papel (mero instrumento), como suporte da materialidade do fato. Entretanto, com a disseminação da internet a representação de um fato pode ser realizada através do computador e apreendida pelos sentidos utilizando-se de programa (software) apropriado, surge então o documento eletrônico, como forma atual de representação da realidade.
A diferença básica entre o documento tradicional e o eletrônico consiste na sua forma de materialização, pois esse último é a representação de um fato concretizado por meio do computador e armazenado em programa específico capaz de traduzir uma seqüência da unidade internacional conhecida como bit.
Questão relevante com relação ao documento eletrônico é a constatação de sua validade.
[...] Basta afirmar que uma simples mensagem enviada por e-mail dificilmente tem plena validade jurídica, equiparando-se à prova oral. Isso porque, em tese, por meio de recursos técnicos, é possível alterar documentos digitais sem deixar vestígios. Por outro lado, através da técnica da certificação eletrônica, é possível garantir a autenticidade e a veracidade de um documento eletrônico e, por conseqüência, atribuir-lhe validade jurídica. [...] Trata-se, em síntese, de uma codificação, garantida e atribuída por uma terceira pessoa (certificador), representada por um certificado (software) que identifica a origem e protege o documento de qualquer alteração sem vestígios. Por isso, aqueles que dispõem de assinatura digital já podem efetuar troca de documentos e informações pela rede com a devida segurança física e jurídica. (BLUM, 2001, p. 28).
No que diz respeito, tanto aos documentos tradicionais quanto aos documentos eletrônicos são exigidas a verificação da autenticidade, da integridade e da tempestividade. A autenticidade de um documento é relativa à possibilidade de verificação de sua procedência subjetiva. Geralmente o que demonstra a autoria de um documento tradicional é a assinatura aposta no suporte material; em se tratando de documento eletrônico é a assinatura digital que tem função de autentificação. A não-demonstração da autoria faz esvaziar sua força probante.
A verificação da integridade de um documento diz respeito à avaliação que se faz sobre ter sido ele modificado ou não após sua concepção. No caso dos documentos digitais esta verificação é determinada pela assinatura digital, que representa tudo que o autor desejou ao assinar o documento, sendo, pois, fiel ao fato documentado. Quanto à integridade do documento, se for comprovado que ocorreu adulteração, se esta se deu antes de ser firmado o documento, seu valor probante não ficará prejudicado. Caso persista dúvida tem-se que o documento foi adulterado posteriormente à sua assinatura, pois cabia aos interessados o ônus de ressalvar a emenda, o borrão, a entrelinha ou a rasura antes de firmá-lo, para que se aperfeiçoasse como instrumento idôneo a provar a declaração de vontade. Outro requisito importante para a confirmação da autenticidade é a verificação da tempestividade, a qual permite se saber com segurança se certo documento foi ou não produzido naquela ocasião. Sendo o suporte do documento o papel, fica fácil apurar qual sua idade, com a utilização das técnicas apropriadas, pois até mesmo a forma de impressão e tipo de tinta serão importantes para determinarmos a origem e a data de sua produção, pois nos informarão se são condizentes com a tecnologia disponível na época de sua feitura. Igualmente, pode-se detectar a data da feitura de um documento digital por meio da assinatura digital.
Segundo o Procurador da Fazenda Nacional, Castro:
[...] fundado sobretudo nos arts. 368 (‘escrito e assinado’), 369 (‘reconhecer a firma do signatário’), 371 (‘assinar’), 374 (‘assinado’), 376 (‘escreveu’), 386 (‘entrelinha, emenda, borrão ou cancelamento’), entre outros, do Código de Processo Civil, a existência e validade do documento eletrônico em si não pode ser recusada. Afinal, adotado um raciocínio hermenêutico sistemático e consentâneo com a evolução histórica das tecnologias manuseadas pelo homem, verificamos o império da liberdade de forma no direito pátrio. Não custa lembrar a aceitação inquestionável do contrato verbal. Assim, quem pode o mais pode o menos [...][6].
A Lei Modelo sobre Comércio Eletrônico aprovada pela Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional, conhecida como Uncitral, parte integrante da ONU, elaborou a minuta de uma lei sobre as relações comerciais por meio da Internet para servir de aconselhamento a fim de que os países do mundo sigam por uma mesma diretriz. No projeto, a Uncitral sugeriu que as leis nacionais fossem aproveitadas ao máximo, com a aplicação da legislação civil no que se refere à validade e existência dos atos jurídicos, bem como a questão da sua prova.
A Uncitral estabeleceu que, para o documento eletrônico ter o mesmo valor probatório dos documentos escritos, é necessário que eles contenham o mesmo grau de segurança dos documentos tradicionais, sendo necessário para que isto aconteça o uso de recursos técnicos de segurança. A Comissão considerou que, para o documento virtual ter a mesma função do documento escrito, será preciso que o documento eletrônico fique disponível para consultas posteriores, sendo o objetivo desta norma a possibilidade de reprodução e leitura a qualquer tempo. Para o reconhecimento da assinatura num documento eletrônico, a Uncitral entende que ela deve possibilitar a identificação da pessoa que assinou por algum método seguro e pessoal.
Além disso, no ordenamento jurídico pátrio para que um contrato produza todos os efeitos que seus celebrantes desejaram com sua realização, deve-se obedecer à forma prescrita ou não proibida pela lei.
2.3.2 A proteção do consumidor
“De tamanha importância a tutela estatal nas relações de consumo, que houve, quando da Carta Magna de 1988, previsão no art. 5º, inciso XXXII, in verbis ‘o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor’”. (MATTE, 2001, p. 91)
Em função da determinação legal foi elaborado o Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, para regular a relação de consumo, ou seja, a relação entre fornecedor e consumidor na qual este último adquire ou utiliza serviços ou bens como destinatário final.
Para Bechara, “o traço marcante da conceituação do consumidor é a identificação como hipossuficiente ou vulnerável” (2005, p. 71). Pois não dispõem de controle sobre os bens de produção, não possuem conhecimento técnico sobre aquilo que adquirem e o fazem para uso próprio e de sua família, e não para fins profissionais.
Há três modalidades de consumidor:
1ª) consumidor em sentido estrito, individual, direto ou padrão: qualquer pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final;
2ª) consumidor indireto: todo aquele exposto a dano, a prejuízo, decorrente do uso de produto ou serviço;
3ª) consumidor em sentido coletivo: todo aquele exposto às práticas comerciais. (BECHARA, 2005, p.72).
Todas estas vertentes da pessoa consumidor encontram-se previstas no próprio CDC, respectivamente nos artigos 2º, caput, 17, 2º, parágrafo único e 29. E, encaixam-se perfeitamente na figura do internauta no caso da pessoa física e das empresas e órgãos, pessoa jurídica.
Fornecedor pode ser conceituado como toda:
[...] pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. (BECHARA, 2005, p. 72).
É considerado fornecedor toda pessoa que e forma habitual e profissionalmente oferte produtos ou serviços no mercado de consumo, visando atender a demanda dos consumidores, não sendo relevante a que título tal oferta é feita. Imprescindível, todavia, que se distinga entre as espécies de fornecedor (direto ou indireto), com o objetivo de melhor delimitar a responsabilidade pelos danos causados ao consumidor, bem como visando definir a cadeia de responsabilização no exercício da via regressiva, pois todos os fornecedores são responsáveis solidária (no caso de vício de qualidade) ou subsidiariamente (em se tratando de responsabilidade por fato do produto ou serviço).
Produto constitui tudo que é destinado à satisfação de uma necessidade, podendo ser qualquer bem, móvel ou imóvel, durável ou não durável, material ou imaterial. Enquanto serviço consiste em qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, exceto as relações de natureza trabalhista.
Após tais definições, constata-se que o Código de Defesa do Consumidor é aplicado aos contratos de consumo, sejam eles materializados no papel ou no formato eletrônico. Sendo que, “as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor” (art. 47 do CDC).
Portanto, em qualquer site, deve obrigatoriamente constar todos os requisitos necessários para a formação de um contrato, tais como a descrição clara, precisa e em língua portuguesa[7]web- publicidade, o preço e informações como peso, dimensões utilidades. O fornecedor deve, portanto, sempre prestar informações o mais detalhadamente possível ao consumidor, até para se prevenir contra eventual responsabilização. do bem ou produto, em caso de o fornecedor colocar fotos do produto ao organizar a publicidade, possui o ônus de veracidade e vigilância em relação a
Os direitos básicos do consumidor estão elencados no artigo 6º do CDC e são: o direito à vida, saúde e segurança; educação, liberdade nas contratações e igualdade; informação adequada; proteção contra publicidade enganosa e abusiva; revisão e modificação das cláusulas contratuais; proteção contra práticas abusivas comerciais ou contratuais; reparação integral por danos; e facilitação dos meios de prova.
Ao consumidor é garantido o direito de desistência do contrato, em quase todos os países do mundo, no Brasil isso deve ocorrer no prazo de 07 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, quando a contratação ocorrer fora do estabelecimento comercial, como ocorre com a contratação eletrônica (art. 49 do CDC). O Código de Proteção ao Consumidor pretendeu com esta previsão, possibilitar à parte hipossuficiente voltar atrás em sua decisão, sem que haja necessidade de justificativa, pois o consumidor não teve contato físico com a mercadoria ou produto.
Um grande problema em matéria de exercício do direito de arrependimento em meio tão fluido como o meio eletrônico, é a prova – pelo consumidor – de que este se realizou. A jurisprudência brasileira tem aceitado, neste caso qualquer telefonema ou alegação sobre o envio de e-mail, e invertido o ônus da prova. (MARQUES, 2004, p. 278).
Apesar dessas colocações, só o caso concreto indicará se é possível o direito de arrependimento
[...] quando, por exemplo, o consumidor estiver habituado a adquirir determinado produto de um mesmo fornecedor, cujo preço, especificações, garantia, entre outras qualidades já forem de seu conhecimento [...], tendo o contrato de consumo mantido as mesmas bases, não há do que se arrepender. (MARQUES, 2004, p. 111).
Fica evidente, portanto, a plenitude de aplicação da Lei do Consumidor aos contratos, independentemente da forma de celebração, se tradicional ou por meio virtual.
2.3.3 Contratantes virtuais
A dificuldade na solução de conflitos oriundos de contratos celebrados pelo meio virtual surge quando os contratantes se encontram em diferentes países (soberanias), e diz respeito ao local de celebração do negócio jurídico, por meio do qual é fixada a competência, ou seja, a lei aplicável ao caso concreto. O caráter nacional ou internacional do contrato é levado em consideração no momento de sua interpretação, devendo-se atentar para os usos e costumes deste lugar.
O local de celebração do contrato é, inicialmente, fixado pelas partes, por tratar-se de direito dispositivo. Na ausência de acordo entre os celebrantes, o lugar do contrato será determinado pelo legislador.
A Lei de Introdução ao Código Civil, art. 9º, § 2º, determina que “para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem. [...] A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente”. O artigo 435 do Código Civil Brasileiro dispõe, “reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto”.
A divergência entre os textos legais acima transcritos, no entanto, é aparente, pois a tendência doutrinária recente se direciona no sentido de considerar formado o contrato no domicílio do destinatário da oferta.
[...] Porque o verbo residir tem dois sentidos: significa estabelecer morada ordinária, morar, ter sede, mas significa achar-se, ser, estar, e com este último sentido é que se encontra o art. 9º, § 2º. Lugar em que residir o proponente, quer dizer lugar onde estiver o proponente. A pessoa pode ter residência, morada, no estrangeiro, e propor contrato no Brasil; e o que o art. 435 do Código Civil e o art. 9º, § 2º, da Lei de Introdução têm em vista é o lugar onde foi feita a proposta. Se for feita no Brasil, aqui se considerará constituída a obrigação, e pelo direito brasileiro é que deverá ser regida no fundo e na forma. (MARQUES, 2004, p. 116).
Uma das maiores inovações da negociação realizada pela internet é a possibilidade de contratação entre partes de diferentes localidades. Em se tratando de Direito interno, a regra geral do Código de Processo Civil é de que o foro competente para a composição das lides entre os contratantes é o do domicílio do réu. Em caso de contratação efetuada por pessoas submetidas a diferentes soberanias, ocorrendo inadimplemento da obrigação pactuada será competente para julgar a demanda o juízo do lugar onde se desenvolve a atividade econômica, existindo vários estabelecimentos, será aquele onde se presta um serviço concreto ou no local em que o fornecedor tenha o seu centro de atividades.
No entanto, quando se tratar de relação de consumo, o CDC atribui competência territorial para o foro do domicílio do consumidor, visando beneficiar a parte vulnerável, que, poderá abrir mão desta prerrogativa, elegendo a regra geral (art. 94 do CPC), que é a do domicílio do réu. A cláusula de eleição de foro diverso do domicílio do consumidor será considerada abusiva quando estipulada em cláusulas contratuais gerais ou quando ocorrer em contrato de adesão, pois dificulta a defesa do consumidor em juízo, direito básico, encontrado no rol do art. 6º do CDC.
O consumidor só poderá, então, abrir mão de propor a demanda onde residir se isso lhe trouxer algum benefício, como diminuir suas despesas, for mais célere na aplicação da norma ao caso concreto, mas, necessariamente, a sentença que condenar o réu, deverá ser reconhecida, para poder ser executada em solo estrangeiro, podendo, ainda ser este o motivo para que o consumidor não utilize sua prerrogativa de foro, justamente para evitar a necessidade de reconhecimento da decisão, optando por propô-la no domicílio do demandado.
Contudo, o mais coerente seria que no caso do conflito entre jurisdições, os critérios de competência fossem regidos por Convenções Internacionais (acordos celebrados entre estados soberanos e regidos pelo direito internacional) aonde os países viessem a estabelecer as regras de competência, dando prevalência para o entendimento de que o juízo competente para o feito seria o do local onde os efeitos prejudiciais dos atos foram mais intensamente sentidos pelo indivíduo lesionado.
2.3.4 A responsabilidade
Quando um sujeito é obrigado a ressarcir ou reparar os danos ou prejuízos causados injustamente a outrem, está-se referindo a chamada responsabilidade civil. O Código Civil trouxe, no § único do art. 927, importante inovação no que diz respeito à responsabilidade civil do profissional: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.
Um dos mais graves problemas oriundos da utilização da web, diz respeito à gama de condutas ilícitas que podem ser praticadas e a responsabilização.
É indiscutível que aquele que causa o dano tem o dever de indenizar. Dúvida surge, porém acerca da situação dos provedores de acesso à rede. A maioria dos doutrinadores civilistas tem se posicionado a favor da responsabilidade do provedor de internet sobre os produtos e serviços que, de forma direta, oferecer ao usuário, ou seja, o provedor de acesso responde perante seus clientes por qualquer vício ou defeito no fornecimento dos serviços objeto do contrato (responsabilidade contratual), como o gerenciamento da caixa postal, o fornecimento de programas, a rapidez dos acessos, a venda de softwares por parte do provedor. Isso porque o provedor assume os riscos do seu negócio.
Questão mais complexa é aquela hipótese de responder o provedor de internet por todas as transações e conteúdos ofertados por terceiros, em uma responsabilidade extracontratual, por ultrapassar a gama de produtos e serviços por ele diretamente disponibilizados para o consumo direto de seus serviços. O entendimento mais recente direciona-se para a impossibilidade do provedor de acesso ser responsabilizado por crimes cometidos por terceira pessoa, pois o mesmo é apenas um mecanismo de disponibilização dos sites e responsabilizá-lo seria um golpe ao princípio da liberdade de expressão assegurado pela Constituição Brasileira. Em sentido contrário, as autoridades estariam causando um prejuízo ainda maior pois ao apreenderem, por exemplo, os computadores do provedor ou proibissem seu funcionamento estariam lesionando uma infinidade de clientes que em nada contribuíram para o acontecido causando um verdadeiro atentado ao direito de terceiros e por conseguinte a paz social.
No caso dessa terceira pessoa de qualquer forma interagir com a atividade empresarial do provedor de acesso[8], então este último atrai para si responsabilidade extracontratual. Nesse caso,
Como a responsabilidade é objetiva, decorre de simples colocação no mercado de determinado produto ou prestação de dado serviço, ao consumidor é conferido o direito de intentar as medidas contra todos os que estiverem na cadeia de responsabilidade que propiciou a colocação do mesmo produto no mercado ou então a prestação do serviço. (GRINOVER, 1998, p. 40).
A obrigação de reparar o dano ocorrerá independentemente de culpa, ou seja, serão considerados somente o dano e a autoria pelo evento danoso, nesse caso o mantenedor do site será responsabilizado na condição de difusor de informação. A constatação da culpa não representará prova necessária. O Código de Defesa do Consumidor, já vislumbrava este cenário, quando se referia a defeitos relativos à prestação dos serviços ou desenvolvimento de produtos. Contudo, o Código Civil é mais abrangente pela desnecessidade de configuração de situação de consumo.
Logo, destaca-se:
Se o autor direto do dano não puder ser identificado, é razoável a defesa da responsabilidade do operador do site. O mesmo ocorreria no caso em que o autor do dano não estivesse submetido à jurisdição da nacionalidade do operador (quando, por exemplo, residir em outro país). (REINALDO FILHO, 2004, p. 51).
Contudo, não se pode descartar que as situações que eliminam o nexo causal entre o dano e a ação ou omissão do agente, são excludentes de sua responsabilização. No caso das relações de consumo, o Código de Defesa do Consumidor ainda elenca como excludente a culpa exclusiva de terceiro, mediante prova do fornecedor (arts. 12, § 3º, III e 14, § 3º, II).
A inclusão das chamadas cláusulas de irresponsabilidade pode produzir efeitos no que tange à responsabilidade contratual, excluindo-se os contratos de relação de consumo, nos quais as referidas cláusulas são consideradas abusivas, portanto, nulas de pleno direito. Além do imediato reparo pelo problema apresentado, em muitas situações, o cliente procura ressarcimento pelos eventuais danos causados.
3 A FORMAÇÃO E A EFICÁCIA PROBATÓRIA DOS CONTRATOS POR COMPUTADOR
O contrato é instrumento que contêm um acordo de vontades, depende, assim, do consenso entre os pactuantes, o que se consegue quando contrato se mostra vantajoso para ambas as partes.
O Código Civil (art. 104) determina que um negócio jurídico será válido quando realizado entre agentes capazes, para a aquisição de objeto lícito, possível, determinado ou determinável e obedecendo a forma prescrita ou não defesa em lei. Não existindo como um contrato, celebrado de forma tradicional ou virtual, desvincular-se dessas regras e poder ser considerado válido e eficaz.
Não há, porém, rigor quanto à forma de manifestação da vontade das partes em contratar (princípio da ausência de solenidade), apenas com a exteriorização da intenção negocial do contratante surge um vínculo jurídico obrigacional, gerando efeitos para as partes, independentemente da forma por elas escolhida. Somente em casos excepcionais a lei impõe a observância de regras para que o negócio jurídico seja válido. E mesmo os contratos eletrônicos devem seguir a forma estabelecida pela norma legal, em caráter de exceção, para a validade do contrato.
A contratação por meio eletrônico, contudo, observadas certas peculiaridades, é constituída normalmente por uma proposta, denominada policitação (considerada o marco inicial do contrato), trata-se de declaração unilateral de vontade que pode tanto ser enviada a destinatário certo, através de e-mail (elemento estrutural, identificado pela convergência de duas ou mais vontades), ou pela disponibilização na internet, nos sites e-commerce, por exemplo, de oferta ao público (proposta de contratar feita a número indeterminado de pessoas) com a finalidade de realizar um contrato específico.
Em se tratando de sítio na web, deve-se ponderar que o mesmo pode ser qualificado como oferta ao público, como anteriormente mencionado, ou como convite para ofertar, situação totalmente diversa. No primeiro caso, a contratação é formalizada com a declaração do comprador, já que o fornecedor/proprietário da página é quem faz a proposta. “A maioria das transações eletrônicas realizadas na atualidade se baseiam em acordos que são aceitos pressionando uma tecla de uma página da Web” (LUCCA, 2000, p.442). Caso a declaração contida na página acessada não possua os elementos constitutivos de uma oferta por não haver possibilidade de conclusão do negócio por ação do internauta, estar-se-á diante da segunda hipótese, quando então o “navegante” é quem fará a oferta e a aceitação será prerrogativa do fornecedor.
A contratação entre ausentes é a regra dos contratos celebrados através do computador. Porém, tudo dependerá da situação das pessoas no momento da aceitação, sendo entre presentes, o acordo firmado pelas partes através de um chat[9], por exemplo, equiparado ao telefone, vez que há transmissão instantânea da aceitação e a retratação[10] não é admissível. Em contrapartida a proposta efetuada pelo correio eletrônico, equiparado à carta, será contrato eletrônico entre ausentes em virtude do espaço de tempo constatado entre o envio da oferta e a resposta, aceitação, nesse caso, será possível a retratação.
Realizada a aceitação ter-se-á por completado o ciclo negocial, formado o negócio jurídico, que passa, então, a produzir todos os seus efeitos, vinculando as partes ao acordado, graças ao princípio da vinculação ou da obrigatoriedade da proposta.
Deve-se sublinhar que a validade jurídica dos documentos eletrônicos representa o principal tema em debate no campo do direito da informática, pois, o traço que diferenciador da sociedade da informação, consiste justamente na desmaterialização de conceitos tradicionais, como o de contrato.
Para a concretização da viabilidade do comércio virtual e, portanto, da validade da contratação virtual é necessário atentar para alguns aspectos concernentes à segurança jurídica dos contratos havidos por meio eletrônico, ou seja, a originalidade de documento registrado em suporte eletrônico.
Segundo a Lei Modelo da Uncitral para o documento eletrônico assinado digitalmente seja aceito como original, tenha valor probante igual ao dos documentos escritos, é necessário que contenha grau de segurança semelhante ao dos documentos tradicionais. Para que isto aconteça é imprescindível o uso de recursos técnicos de segurança, já que a não-demonstração da autoria do documento impossibilita a aceitação da sua validade e esvazia sua força probante, ou seja, sua utilização como prova da celebração do contrato.
Nesse aspecto demonstra-se a indispensabilidade da utilização de certificação digital para a expansão garantida dos negócios via computador, pois através dela se confere a necessária autoria e segurança (confiabilidade de que o contrato eletrônico será mantido íntegro, não será adulterado) ao documento eletrônico, além de conferir aos documentos digitais, caráter probatório.
A Comissão da Lei Modelo citada anteriormente considerou que, para o documento virtual ter a mesma função do documento escrito, será preciso que o documento eletrônico fique disponível para consultas posteriores, sendo o objetivo desta norma a possibilidade de reprodução e leitura a qualquer tempo.
São, portanto, os atos jurídicos praticados eletronicamente plenamente válidos e eficazes, aptos a gerar vínculos obrigacionais, quando observarem os requisitos elencados na própria legislação brasileira, razão pela qual deve o magistrado, ao se deparar com causa envolvendo negócio jurídico realizado em ambiente eletrônico, proferir decisão aplicando a lei, atendendo aos fins sociais a que ela se dirige, às exigências do bem comum, observando os princípios da livre manifestação de vontade e da obrigatoriedade do cumprimento do avençado, pacta sunt servanda. E como a regra civilista quanto à prova do alegado é pela utilização de meios idôneos, conclui-se pela possibilidade da prova através do uso do documento eletrônico.
Pelo exposto, os contratos por meios eletrônicos, em nada inovaram a não ser pelo meio físico utilizado, continuam sendo expressões da vontade humana, logo, os requisitos essenciais para a realização de negócio jurídico num ambiente físico, tradicional, serão os mesmos a serem observados no ambiente virtual, que origina contratos com os mesmos requisitos de validade que os contratos a muito tempo celebrados, visto que, a presença de dois ou mais indivíduos, de vontade livremente manifestada e da capacidade civil para a prática do ato, devem estar presentes para que o acordo seja válido. Contudo, por não existir lei específica abordando o comércio eletrônico, o documento eletrônico e a assinatura digital não gozam, por enquanto, de validade jurídica. Nesse aspecto, o Brasil tem que se adaptar à nova forma de documento, pois a tecnologia cresce a cada dia e não se pode permanecer estático frente às transformações.
A internet é um meio de comunicação a nível mundial, neste aspecto é evidente que o meio virtual necessita de normas especiais em virtude de sua natureza global, até pelo fato de avançar de forma frenética a utilização eletrônica para a realização de atos jurídicos, sendo progressivamente abandonadas as formas de armazenamento de informação em papel.
Contudo, algumas vezes a solução do litígio oriundo da rede mundial de computadores encontra-se na legislação pátria vigente, neste caso cabe somente ao magistrado interpretá-la corretamente. Assim, não é necessária grande inovação em termos legislativos, pois diante do contido no artigo 104 do Código Civil, acrescido à manifestação de vontade expressa e à certificação da autenticidade do contratante, é possível que os tribunais utilizem-se da legislação em vigor para proferir decisões acertadas nos casos que envolvam negociação através da internet e aceitem como prova o documento eletrônico. Mister se faz também ampliar o conjunto probatório, que deve ser valorado conforme as normas atemporais do direito processual.
A rede mundial de computadores ainda é um ambiente desregulamentado, nesse sentido é necessária que a legislação seja elaborada, mas tratando de situações genéricas, estabelecendo princípios, certas garantias, estabelecendo órgãos de fiscalização, regulamentando os bancos de dados e questões relativas à segurança na ambiente virtual etc, observando como o assunto está sendo discutido em outros países, sob pena de lei excessivamente detalhista que queira, de uma só vez, disciplinar todos os aspectos envolvidos no comércio eletrônico, comprometer a dinamicidade das trocas eletrônicas e a constante evolução dos meios de comunicação.
Conclui-se, portanto, que não há qualquer impedimento legal para a eficácia dos contratos eletrônicos, pois em verdade o computador nada traz de novo ao que já se sabe em matéria de formação dos contratos e da eficácia probatória dos seus instrumentos. Introduz, somente, inovações significativas na forma de compreender o tema.
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NOTAS:
[2] Exemplo: transfere-se para um dos contratantes um bem digitalizado, como base de dados ou música e o mesmo paga com cartão de crédito digital.
[3] Uma parte pode formular sua declaração e utilizar o meio eletrônico para envia-la ou o contratante pode enviar um e-mail e receber um documento escrito para assinar. Pode ocorrer, ainda, o caso de se enviar bem digital e se pagar com cheque de banco ou adquire-se bem físico, enviado por transporte e paga-se através de transferência eletrônica de dinheiro.
[4] Deve-se lembrar que é uma pessoa real, o usuário, quem manuseia o computador e nada impede que, por meio desse instrumento, contrate com quem quiser.
[5] Talvez seja o princípio mais importante para os contratos praticados pela internet, pois atualmente a instabilidade jurídica causada por esses novos acontecimentos, torna imprescindível a observância da lealdade e confiança dos contratantes e da segurança oferecida nesse meio, para que adquira credibilidade perante a sociedade, sob pena do contrato eletrônico cair em desuso.
[6] CASTRO, Aldemário Araújo. O Documento Eletrônico e a Assinatura digital (Uma Visão Geral). Disponível em :< http:// www.aldemario.adv.br/doceleassdig.htm>.Acesso em: 28 fev. 2005.
[7] É entendimento mundial que os sites devem traduzir suas páginas para diversos idiomas, mesmo que o faça através de tradutores automáticos.
[8] É a responsabilidade para com os atos de terceiros que utilizam, da mesma forma que o usuário acima retratado, dos serviços do provedor, quer seja locando espaço em seu servidor, quer seja anunciando em suas páginas, quer seja vendendo produtos e/ou serviços e remunerando o servidor para tanto, e, de tal forma, contribuindo para que o consumidor adquira ou se utilize destes bens ofertados, mediante a participação indireta do provedor de acesso à internet.
[9] Sites da internet que possibilitam que duas ou mais pessoas digitando se comuniquem, em tempo real.
[10] Trata-se do ato de desdizer-se, de retirar uma afirmação anteriormente feita.
Analista do Ministério Público do Estado de Sergipe. Pós-graduada em Direito Penal e Pcessual Penal pela Faculdade de Sergipe - FASE.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTANA, Lícia Vanessa de Andrade. A formação e a eficácia probatória dos contratos por computador Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 out 2010, 08:58. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/21917/a-formacao-e-a-eficacia-probatoria-dos-contratos-por-computador. Acesso em: 23 dez 2024.
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