1. Introdução
Com o processo de urbanização e industrialização, juntamente, com o desenvolvimento da comunicação de massa, o direito ao lazer passou a ganhar ainda mais importância, necessitando para isso de um sistema que assegurasse a todo e qualquer cidadão o seu livre exercício.
Consagrado constitucionalmente como um direito social, o lazer é o responsável pela manutenção da saúde, integridade física e mental de todo ser humano, inclusive dos presos, que embora marginalizados e discriminados, vêem no lazer um forma de orientação no retorno ao convívio social.
Desta forma, o presente trabalho visa traçar todos os aspectos do direito ao lazer, desde o seu surgimento e conceito até o seu exercício dentro dos presídios, destacando a sua importância na vida de todos os seres humanos, principalmente daqueles que se encontram encarcerados com a sua liberdade ambulatorial cerceada.
2. Lazer: Conceito e Surgimento
O lazer existe desde que o homem é homem, mas o seu estudo, e a compreensão da sua importância, se intensificou com a urbanização e a industrialização aonde os meios de comunicação se desenvolveram, fazendo surgir a sociedade moderna, juntamente, com o fortalecimento do lazer de massa.
Paul Lafargue em sua obra “O direito à preguiça”, procurou conscientizar a classe operária da importância do lazer, incitando os trabalhadores a lutarem pela redução da jornada de trabalho. Para Lafargue o lazer se apresenta com um momento de exercício da própria consciência em que a classe operária possui liberdade de pensamento e consciência de sua condição como ser explorado:
Se, extirpando do peito o vício que a domina e que avilta a sua natureza, a classe operária se levantasse em sua força terrível, não para exigir os Direitos do Homem, que não passam os direitos da exploração capitalista; não para reivindicar o Direito ao Trabalho, que não passa o direito a miséria, mas para forjar uma lei de bronze que proíba o trabalho além de três horas diárias. (LAFARGUE apud Marcela Semeghini, p.6)
De acordo com a mestre em Direito, Marcela Semeghini, em seu artigo científico Direito ao Lazer e Legislação Vigente no Brasil, a palavra lazer não é fácil de conceituar em razão de tratar-se de um fenômeno problemático e ambíguo. Dentre várias definições, a autora cita Dumazedier, que define lazer como sendo:
Conjunto de ocupações às quais o individuo pode entregar-se de livre vontade, seja para repousar, seja para diverti-se, recrear-se e entreter-se, ou ainda, para desenvolver sua informação ou formação desinteressada, sua participação social voluntária ou sua livre capacidade criadora após livrar-se ou desembaraçar-se de suas obrigações profissionais, familiares e sociais.
Percebe-se que o lazer corresponde a uma necessidade natural do homem, no sentido de recuperar-se dos desgastes físicos e psicológicos decorrentes das obrigações sociais, uma vez que a sua energia não esta sendo colocada a disposição de outrem, mas, sim, a sua própria satisfação de forma voluntária e livre.
Acerca da função do lazer existem três correntes: a romântica, a compensatória e a utilitarista. De acordo com a primeira, o lazer tem uma conotação extremamente positiva e feliz, ligada a alegria, beleza e liberdade. Já a segunda, entende que a função do lazer seria a de compensar a insatisfação e a alienação sofrida pelo trabalhador. E, por último, a terceira reduz a função do lazer a de recuperar as forças e energias do trabalhador.
Na área da medicina, estudiosos consideram o lazer como fonte restauradora da saúde da pessoa e de suas energias, conforme dispõe Martinez apud Marcela Semeghini (p.9):
Para o trabalhador, massacrado pela rotina do dia-a-dia, o descanso e a alternância de ares, são absolutamente imprescindíveis ao seu restabelecimento periódico. Às vezes, o simples distanciamento do local de trabalho, mediante viagens, é suficiente para o reequilíbrio da força perdida.
O texto acima demonstra a importância do lazer na qualidade de vida do trabalhador, que apenas o distanciamento do local de trabalho para o exercício de uma atividade lúdica é suficiente para o restabelecimento da saúde física e mental do mesmo.
3. Lazer como um Direito Constitucionalmente Garantido
3.1- Art. 6°- Direito Social
A partir do século XIX, a revolução industrial provocou profundas mudanças sociais na vida das pessoas. O desenvolvimento das cidades, a péssima condição de trabalho dos operários e a marginalização política, fizeram com que os trabalhadores, influenciados pelos pensamentos socialistas, se unissem e reivindicassem por novos direitos, fazendo surgir a segunda geração de direitos agora pautados no valor da igualdade.
Com a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, os direitos sociais, juntamente com os direitos civis e políticos, ganharam, ainda mais importância, sendo elevados ao status de direitos fundamentais do homem, partindo do principio de que são de suma importância na garantia da dignidade da pessoa humana.
Nesse sentido ensina o mestre José Afonso da Silva:
“os direitos sociais, como dimensão dos direitos fundamentais do homem, são prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que se ligam ao direito de igualdade”.
No Brasil, os direitos sociais foram consagrados na Constituição Federal de 1988 em seu art.6° e seguintes:
Art. 6°: São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Sendo assim, o lazer é tratado com um direito social, ou seja, um direito que ultrapassa a esfera individual e contempla toda a coletividade, essencial ao ser humano, assim como a saúde, educação, moradia e o próprio trabalho.
3.2- Art. 7°- Direito dos Trabalhadores
A Constituição Federal assegura ao trabalhador o direito ao descanso, ao repouso, às férias e a aposentadoria no Art. 7°, incisos XIII, XIV, XV, XVII e XXIV.
Art. 7° da CF: São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XIII: duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;
XIV- jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva;
XV- repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos;
XVII- gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;
XXIV- aposentadoria.
O direito às férias, ao descanso semanal remunerado e as leis que limitam a jornada diária de trabalho são uma conquista universal dos trabalhadores. Estes direitos visam garantir e defender o lazer.
Dessa forma, o Estado é obrigado a assegurar ao trabalhador o direito ao lazer, haja vista ser um direito fundamental e imprescindível a qualidade de vida daquele.
Nesse sentido explica a Mestre em Direito, Marcela Andresa Semeghini: “ O direito ao lazer proporciona ao homem fazer uso de sua liberdade, de sua criatividade e relacionar-se com o outro. O lazer é o momento de prazer e ser do homem e por isto tem grande importância”.
4. Direito ao Lazer dos Presos
Tendo em vista que até agora o direito ao lazer foi tratado de uma forma geral, trazendo a sua importância para a qualidade de vida do ser humano, passo, neste instante, a debruçar-me de forma mais específica, analisando as determinações legais do direito ao lazer dos presos e a sua importância na orientação do retorno ao convívio social.
O direito ao lazer do preso está assegurado no art. 41° da Lei n°7.210/84 (Lei de Execução Penal):
Art. 41°- Constituem direitos do preso:
V- proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação;
VI- exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena.
Sendo assim, atividades como leitura, esportes, arte, devem ser fomentadas, a fim de garantir ao preso um momento de prazer que desenvolva sua participação social voluntária e a sua livre capacidade criadora.
Atividades como estas são de extrema importância para a ressocialização do indivíduo cuja liberdade ambulatorial restou cerceada, uma vez que, como dito anteriormente, o lazer proporciona ao preso um momento de recuperação de todos os desgastes físicos e mentais decorrentes do cárcere.
Se o lazer é importante para aquele indivíduo cuja liberdade é gozada de forma absoluta, é ainda mais, para aquele que tem ou terá a sua liberdade suprimida durante anos, além de suportar todos os desgastes resultantes de um encarceramento.
6. Conclusão
Em suma, o lazer constitui um direito social e, conseqüentemente, um direito fundamental do homem que preserva a sua dignidade ao passo que proporciona momentos de descanso físico e mental decorrente das obrigações sociais.
É ainda mais importante para aquele indivíduo cuja liberdade de locomoção restou tolhida, haja vista que o lazer exerce sobre o preso um momento de prazer e bem estar, resgatando-lhe a dignidade e promovendo a sua orientação ao retorno do convívio social.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 33° Ed. 2010
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 14° Ed. Editora: Saraiva, 2010
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 3° Ed.- Niterói: Impetus, 2009
MARTINS, Sergio Pinto.Direito do Trabalho. 26° Ed. Editora: Atlas, 2010.
MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal. 7° Ed. rev. e atual- São Paulo: Saraiva 2009
CAPEZ, Fernando. Execução Penal Simplificado. 14° Ed. Editora: Saraiva.2011.
Técnico do Ministério Público do Estado de Sergipe e graduando do curso de Direito pela Universidade Tiradentes.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NETO, Roque José de Sousa. Direito ao lazer dos presos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 out 2010, 07:54. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/22015/direito-ao-lazer-dos-presos. Acesso em: 23 dez 2024.
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