Resumo: As sanções administrativas não se confundem com as medidas administrativas, pois possuem natureza e objetivos distintos. As sanções encontram-se previstas no art. 3º do Decreto 6.514/2008 e as medidas administrativas encontram-se previstas no art. 101 do Decreto 6.514/2008. As sanções decorrem tão-somente do cometimento de uma infração administrativa, já as medidas administrativas decorrem da constatação de uma infração ambiental, mas são aplicadas em razão do exercício do poder de polícia e diante da necessidade específica de prevenir a ocorrência de novas infrações, resguardar a recuperação ambiental e garantir o resultado prático do processo administrativo. Só as sanções administrativas se submetem à Lei 9.873/99
Palavras-Chave: Sanção Administrativa. Infração Administrativa. Medida Administrativa. Poder de polícia. Incidência da Lei 9.873/99.
Sumário: 1. Introdução. 2. Desenvolvimento: 2.1 Da Sanção Administrativa. 2.2 Da Medida Administrativa. 2.3.Sanção Administrativa X Medida Acautelatória. 3. Conclusão.
1. Introdução
A Constituição Federal de 1988 assegura em seu art. 225 que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
A prática de condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados[1].
No que tange à esfera administrativa, tem-se que as infrações administrativas ambientais, no âmbito federal, encontram respaldo, fundamentalmente, na Lei n° 9.605/98 e no Decreto n° 6.514/2008, de 22 de julho de 2008, que revogou o Decreto n° 3.179/99.
A Lei n° 9.605/98 dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Já o Decreto n° 6.514/2008 dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, e dá outras providências.
O art. 70, caput, da Lei 9.605/98 traz a previsão de que se considera infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
O art. 3°, do Decreto 6.514/2008, traz um rol de sanções passíveis de aplicação quando do cometimento de infrações administrativas.
No âmbito federal, cumpre destacar também a Instrução Normativa nº 14/2009 do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis-IBAMA, que regula os procedimentos para apuração de infrações administrativas por condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, a imposição das sanções, a defesa ou impugnação, o sistema recursal e a cobrança de multa e sua conversão em prestação de serviços de recuperação, preservação e melhoria da qualidade ambiental no âmbito do IBAMA.
2. Desenvolvimento
2.1. Da Sanção Administrativa
As sanções administrativas previstas no art. 3º do Decreto 6.514/2008 podem ser impostas pelo agente autuante ou pela autoridade julgadora e são aplicadas em decorrência do cometimento de ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
As sanções administrativas, constantes do aludido art. 3° são: a) advertência; b) multa simples; c) multa diária; d) apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora e demais produtos e subprodutos objeto da infração, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração; e) destruição ou inutilização do produto; f) suspensão de venda e fabricação do produto; g) embargo de obra ou atividade e suas respectivas áreas; h) demolição de obra; i) suspensão parcial ou total de atividades e j) restritiva de direitos.
O agente autuante, ao lavrar o auto de infração, indicará as sanções estabelecidas neste Decreto, observando a gravidade dos fatos, tendo em vista os motivos da infração e suas conseqüências para a saúde pública e para o meio ambiente; os antecedentes do infrator, quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental; e a situação econômica do infrator[2].
Cumpre destacar que as sanções aplicadas pelo agente autuante estarão sujeitas à confirmação pela autoridade julgadora[3] e se o infrator cometer, simultaneamente, duas ou mais infrações, ser-lhe-ão aplicadas, cumulativamente, as sanções a elas cominadas[4].
Quanto à sanção de demolição de obra, o Decreto 6.514/2008 prevê em seu art. 19 que poderá ser aplicada pela autoridade ambiental, após o contraditório e ampla defesa.
2.2. Da medida Administrativa
As medidas administrativas encontram-se previstas no art. 101 do Decreto 6.514/2008 e poderão ser aplicadas pelo agente autuante, no uso do seu poder de polícia, quando constatada uma infração ambiental.
O aludido dispositivo legal, traz um rol de 06 (seis) medidas administrativas, quais sejam: a) apreensão; b) embargo de obra ou atividade e suas respectivas áreas; c) suspensão de venda ou fabricação de produto; d) suspensão parcial ou total de atividades; e) destruição ou inutilização dos produtos, subprodutos e instrumentos da infração; e f) demolição.
A aplicação de tais medidas será lavrada em formulário próprio, sem emendas ou rasuras que comprometam sua validade, e deverá conter, além da indicação dos respectivos dispositivos legais e regulamentares infringidos, os motivos que ensejaram o agente autuante a assim proceder[5].
O agente autuante, no momento da fiscalização, pode imputar ao infrator ambiental as medidas administrativas acautelatórias, sem que isto resulte em qualquer violação ao devido processo legal ou contraditório, pois as mesmas têm com o objetivo prevenir a ocorrência de novas infrações, resguardar a recuperação ambiental e garantir o resultado prático do processo administrativo.
2.3. Sanção Administrativa X Medida Administrativa
Praticada uma infração administrativa há um rol de sanções que devem ser imputadas àquele que por ação ou omissão que violou as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
Contudo, quando constatado o cometimento dessa infração ambiental poder-se-á aplicar uma medida administrativa desde que se faça necessário prevenir a ocorrência de novas infrações, resguardar a recuperação ambiental e garantir o resultado prático do processo administrativo.
As sanções decorrem tão-somente do cometimento da infração administrativa, já as medidas administrativas decorrem desse cometimento somado a uma necessidade específica, mas em função do poder de polícia.
Quanto ao poder de polícia cumpre destacar a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello[6]:
“A atividade estatal de condicionar a liberdade e a propriedade ajustando-as aos interesses coletivos designa-se “poder de polícia”. A expressão, tomada neste sentido amplo, abrange tanto atos do Legislativo quanto do Executivo. Refere-se, pois, ao complexo de medidas do Estado que delineia a esfera juridicamente tutelada da liberdade e da propriedade dos cidadãos.”
O art. 78 do Código Tributário Nacional, por sua vez, traz o conceito legal de poder de polícia, senão vejamos:
“Art. 78 - Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.”
Como se vê, em que pese algumas medidas administrativas serem também sanções, não se podem confundi-las, pois possuem natureza e objetivos distintos.
A sanção administrativa tem natureza de punição pela violação das regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente e tem uma função eminentemente repressiva e pedagógica, sendo aplicada pelo Estado para que o poluidor e a sociedade saibam que não é admissível a prática de ilícitos ambientais[7].
Já a medida administrativa tem uma natureza acautelatória e se dá em função do poder que a Administração Pública tem de limitar o direito, interesse ou liberdade dos indivíduos em benefício do interesse público.
Essa distinção repercute na incidência ou não da Lei 9.873/99, que trata do prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta, e dá outras providências.
Isto porque, só as sanções administrativas se submetem à Lei 9.873/99, na medida em que esta se refere à prescrição da pretensão punitiva da Administração Pública.
Nesse contexto, a Procuradoria Federal Especializada junto ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis-IBAMA aprovou a Orientação Jurídica Normativa de n° 06/2009 referente a prescrição em infrações administrativas ambientais, em que se adota o entendimento de que não se aplica a Lei n° 9.873/99 às medidas administrativas acautelatórias (art. 101, §1°, do Decreto nº 6.514/2008), por não tratarem de sanções e sim decorrerem do poder de polícia, conforme excerto, que se segue
“No que toca aos efeitos da prescrição, estendem-se a todas as penalidades, inclusive, apreensão, embargo etc., que acompanham o auto de infração, salvo quando tais medidas tenham caráter acautelatório decorrentes do exercício do poder de polícia na tutela do bem ambiental (art. 101, Decreto 6.514/2008). A decisão que reconhecer a prescrição deve manifestar-se sobre a penalidade e seu efeitos. Esclareça-se, ainda, que não se aplica a Lei nº 9.873/99 às medidas acautelatórias (art. 101, § 1º do Decreto nº 6.514/2008), por não tratarem de sanções e sim decorrerem do poder de polícia.” [destaquei]
Cumpre registrar que as referidas Orientações Jurídicas Normativas da Procuradoria Federal Especializada junto ao IBAMA representam o entendimento consolidado de uma determinada tese jurídica, sendo que a sua adoção é de natureza obrigatória, podendo, no entanto, o Procurador ressalvar seu entendimento pessoal.
3. Conclusão
As sanções administrativas previstas no art. 3º do Decreto 6.514/2008 podem ser impostas pelo agente autuante ou pela autoridade julgadora e são aplicadas em decorrência do cometimento de ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
As medidas administrativas acautelatórias encontram-se previstas no art. 101 do Decreto 6.514/2008 e poderão ser aplicadas pelo agente autuante, no uso do seu poder de polícia, quando constatada uma infração ambiental, com o objetivo prevenir a ocorrência de novas infrações, resguardar a recuperação ambiental e garantir o resultado prático do processo administrativo.
Em que pese algumas medidas administrativas serem também sanções, não se podem confundi-las, pois possuem natureza e objetivos distintos.
Desse modo, as sanções decorrem tão-somente do cometimento da infração administrativa, já as medidas administrativas decorrem da constatação de uma infração ambiental, mas emanam do exercício do poder de polícia e diante da necessidade específica de prevenir a ocorrência de novas infrações, resguardar a recuperação ambiental e garantir o resultado prático do processo administrativo.
A compreensão da distinção mostra-se relevante, uma vez que só as sanções administrativas é que se submetem à Lei 9.873/99, que trata do prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta, e dá outras providências.
[1] §3° do art. 225 da CF/88.
[2] Art. 4º, I, II e III do Decreto 6.514/2008.
[3] §2º do art. 4º do Decreto 6.514/2008.
[4] §1° do art. 72 da Lei 9.605/98.
[5] §2° do art. 101 do Decreto 6.514/2008.
[6] MELLO, Celso Antônio Bandeira de, Curso de Direito Administrativo, 15ª edição, São Paulo: Malheiros Editores, 2003, pg. 709.
[7] BESSA ANTUNES, Paulo de. Dano Ambiental. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n.7, 1997, p. 117 apud TRENEPOHL, Curt, Infrações Contra o Meio Ambiente – Multas e Outras Sanções Administrativas, Belo Horizonte: Fórum, 2006, pg. 31.
Procuradora Federal. Especialista em Direito Público pela Unifacs-Universidade Salvador.
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