Orientadora: CÁTIA GUIMARÃES
Professora da Faculdade FG
SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Sentença; 2.1. Requisitos da Sentença; 2.1.1. Relatório; 2.1.2. Fundamentação; 2.1.3. Dispositivo; 2.2. Conteúdo das Sentenças; 2.3. Efeitos da Sentença; 3. Coisa Julgada; 3.1. Coisa julgada Formal e Material; 3.2. Efeitos da Coisa Julgada; 3.3. Revisão da Coisa Julgada. 4. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por escopo analisar o conceito de sentença à luz da legislação e doutrina, como também os elementos e requisitos essenciais que devem compor a decisão judicial, assim como a classificação e os efeitos das sentenças.
Por conseguinte, o texto trata acerca do conceito e definição de coisa julgada, formal e material, e consequentemente sobre os efeitos nas diversas esferas judiciais, como também sobre revisão da coisa julgada.
Para tanto, foram necessárias pesquisas bibliográficas, ao arcabouço legislativo e jurisprudencial a fim de expor informações concisas e contribuir, ainda que de maneira precária, para o desenvolvimento do presente tema.
2. SENTENÇA
Recentemente o legislador modificou o conceito de sentença contido no §1º do art. 162 do Código de Processo Civil onde constava a seguinte redação: “Sentença é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa.”
A partir da Lei 11.232/2005 o conceito de sentença no processo civil passa a ser o seguinte: “Sentença é o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei.”
Desta forma, as decisões judiciais proferidas com ou sem resolução de mérito, que tenham por conteúdo as hipóteses previstas nos artigos 267 e 269 da codificação processual civil, são classificadas como sentenças, independentemente de porem termo ao processo.
A finalidade da referida alteração, certamente, foi de salientar que a sentença não mais extingue o processo, tendo em vista que após a prolação da sentença o juiz não mais encerra sua atividade jurisdicional, pois deverá continuar a atuar na fase executiva no mesmo processo. [1]
Contudo, nem toda decisão que tiver por conteúdo uma das hipóteses dos arts. 267 e 269 do CPC resultará na extinção do procedimento, em algumas situações haverá decisão interlocutória, pois resolvem uma questão sem por fim ao procedimento em primeira instância.
Diante disso, surge a dificuldade de identificar o instrumento que deve ser utilizado para recorrer da decisão prolatada, posto que no caso de decisão interlocutória o instrumento cabível é o agravo, conforme art. 522 do CPC. Já se a decisão for considerada sentença o recurso cabível seria a apelação, nos termos do art. 513.
Segundo Didier Jr., “a sentença é um ato jurídico que contém uma norma jurídica individualizada, ou simplesmente norma individual, definida pelo Poder Judiciário, que se diferencia das demais normas jurídicas” [2]
Marinoni diz que “se nas teorias clássicas o juiz apenas declarava a lei ou criava a norma individual a partir da norma geral, agora ele constrói a norma jurídica a partir da interpretação de acordo com a Constituição”. [3]
Desta feita, percebe-se que o conceito jurídico e fático de sentença tem evoluído através do tempo e que apesar da tentativa legislativa em tentar acompanhar tais mudanças ainda há necessidade de melhores adequações na conceituação para evitar confusões na hora de escolher o instrumento de recurso cabível.
2.1. REQUISITOS DA SENTENÇA
Para que a sentença seja válida, é necessário que sejam atendidos os requisitos determinados pelo art. 458 do Código de Processo Civil dispõe os três requisitos essenciais da sentença:
Art. 458............................................................
I- o relatório que conterá os nomes das partes, a suma do pedido e da resposta do réu, bem como o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;
II- os fundamentos em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;
III- o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões, que as partes lhe submeterem.
Passaremos a analise de cada um dos itens acima elencados, que são obrigatórios, via de regra, cumulativamente, sob pena de nulidade, conforme disposição legal e entendimento jurisprudencial. [4]
2.1.1. RELATÓRIO
Trata-se de síntese onde constará o registro das principais ocorrências durante a tramitação do processo, tais como qualificação das partes; suma do pedido constante da petição inicial; resposta do réu; parecer do Ministério Público, se for o caso; e os demais fatos relevantes que ocorreram no processo.
Contudo, esta regra comporta exceções, nesse sentido encontra-se a dispensa de relatório, contida no art. 38 da Lei 9.099/95, concernente aos juizados especiais cíveis.
Admite-se, também, a validade das decisões em que o magistrado se reporta ao relatório feito em outra decisão do processo, desde que isso, igualmente, não gere nenhum prejuízo às partes – é o chamado relatório per relationem. [5]
2.1.2 FUNDAMENTAÇÃO
Esta é uma garantia constitucional, insculpida no art. 93, IX da Carta Magna, onde estabelece que toda decisão judicial deve ser motivada, sendo sua ausência penalizada pela nulidade, pois trata-se de vício gravíssimo, que pode ser conhecido de ofício ou através de ajuizamento de ação rescisória. [6]
A exigência de motivação das decisões judiciais decorre da necessidade de as partes conhecerem os motivos que levaram o magistrado a formar o seu convencimento diante das provas produzidas na fase de instrução do processo.
É nesta etapa que o magistrado resolve inicialmente as questões de fato postas que ainda não foram resolvidas em momento pretérito, tais como as provas produzidas no processo por iniciativa das partes ou do próprio julgador, e em seguida passa à análise das questões jurídicas de mérito.
Ainda é nesta fase que o magistrado deve analisar a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de ato normativo, por requerimento das partes ou de ofício, por tratar-se de questão de direito, o que produzirá efeitos apenas entre as partes.
Por outro lado, é importante lembrar que o teor constante da fundamentação bem como os motivos da sentença não faz coisa julgada, nos termos do art. 469 do CPC. Desta forma, todo este conteúdo pode ser revisto em outros processos sem configurar litispendência.
2.1.3 DISPOSITIVO
Trata-se de elemento conclusivo e fundamental da sentença, em que o órgão jurisdicional estabelece um preceito em resposta ao pedido formulado pelo autor da demanda. Não existe sentença judicial sem dispositivo.
Diferentemente do relatório e da fundamentação o dispositivo é a parte da sentença em que incide diretamente a coisa julgada e os respectivos efeitos, que serão tratados posteriormente. [7]
De acordo com o princípio da congruência, disposto no art. 460 da codificação processual civil, o juiz não poderá proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida.
Chama-se de ultra petita a decisão que concede ao autor além do que foi pedido pelo autor, ou seja, o juiz excede os limites constantes da petição inicial, o que não se confunde com a decisão chamada extra petita, pois neste caso o magistrado concede pretensão divergente do pedido não formulado.
Quanto à decisão citra petita é aquela que deixa de analisar o pedido formulado pelo autor na petição inicial, ou seja, há uma omissão quanto ao exame da questão.
2.2. CONTEÚDO DAS SENTENÇAS
As sentenças de procedência podem ter em seu conteúdo disposições condenatórias, constitutivas ou meramente declaratórias.
As sentenças condenatórias são as que reconhecem a existência da relação jurídica afirmada pelo autor e aponta a sanção que incidirá sobre o demandado caso se recuse a cumprir a sentença.
Esta sanção nada mais é do que a possibilidade de autorizar o demandante a iniciar, com fulcro na sentença prolatada e não cumprida, o processo de execução, a fim de satisfazer o direito reconhecido e declarado na decisão.
Desta forma, a sentença condenatória possui dupla função: a primeira é declarar o direito existente - função declaratória; outra, que lhe é própria, consistente na aplicação da sanção - função sancionadora. Como é esta função que a distingue das demais sentenças e a caracteriza, tem-se que a sentença condenatória formula a especificação da sanção prevista na lei. [8]
Quanto às sentenças meramente declaratórias, encontram fundamento legal no artigo 4.º do Código de Processo Civil:
Art. 4º. O interesse do autor pode limitar-se à declaração:
I - da existência ou da inexistência de relação jurídica;
II - da autenticidade ou falsidade de documento.
Parágrafo único. É admissível a ação declaratória, ainda que tenha ocorrido a violação do direito.
Pode-se dizer, ainda, que a sentença declaratória satisfaz, por si só, os desejos do requerente, uma vez que independe de outros atos para compor o conflito de interesses deduzido em juízo e entregar, a quem tenha razão, o objeto almejado, qual seja, a certeza acerca do documento ou da relação jurídica. Dessa forma, se o demandante desejar a satisfação de seu direito deverá mover uma nova ação, agora de natureza condenatória. [9]
É possível, ainda, afirmar que as sentenças declaratórias gozam de efeito ex tunc, ou seja, retroagem à data em que a relação jurídica declarada se formou, ou à data em que a falsificação do documento se consumou.
As sentenças constitutivas embora tenham conteúdo semelhante às sentenças declaratórias, apresentam um elemento a mais, um traço diferenciador, pois criam, modificam ou extinguem uma relação jurídica.
A declaração, portanto, de existência ou inexistência de uma relação jurídica é antecedente lógico para que se possa processar a modificação ou mesmo a extinção de uma relação jurídica anteriormente existente para que se justifique a criação de uma nova relação jurídica.
2.3 EFEITOS DA SENTENÇA
A doutrina divide em principais e secundários os efeitos decorrentes da sentença. Dizem-se efeitos principais aqueles que decorrem diretamente do conteúdo da decisão, tais como, as providências executivas, a certeza jurídica, a constituição da situação jurídica nova, dentre outras.
Quanto aos efeitos secundários, segundo a doutrina são aqueles decorrentes de previsão legal, ou seja, não são conseqüência do conteúdo da decisão, mas de uma determinação legislativa específica. São efeitos indiretos e automáticos que resultam do fato de a decisão existir. [10]
3. COISA JULGADA
Trata-se de garantia constitucional expressa no art. 5º XXXVI da Constituição da República, onde o poder constituinte originário assegurou aos jurisdicionados a segurança jurídica necessária à imutabilidade das decisões emanadas do Poder Judiciário, em que já não caiba interposição de recurso.
A coisa julgada é a imutabilidade da parte dispositiva da sentença. Contudo, somente a chamada coisa julgada material é amparada pelo manto da imutabilidade, haja vista que quanto à coisa julgada formal ainda há possibilidade de rediscussão da matéria.
3.1. COISA JULGADA FORMAL E MATERIAL
A coisa julgada formal é a imutabilidade da decisão judicial restrita aos limites do processo em que foi proferida, em decorrência do esgotamento das vias recursais ou pelo decurso do prazo, o que levará a impossibilidade de rediscussão da matéria dentro dos limites daquele processo, a exemplo do indeferimento da petição inicial, onde o autor poderá ajuizar novo procedimento posteriormente.
Já a coisa julgada material produz efeitos para além dos limites daquele processo em que foi produzida a sentença, ou seja, a imutabilidade se opera dentro e fora do processo, tornando-se inalterável.
Para tanto, deverão estar presentes quatro pressupostos: a decisão deve ser jurisdicional; o provimento deverá versar sobre mérito da causa; o mérito deve ter sido analisado em cognição exauriente; tenha havido a preclusão máxima.
3.2 EFEITOS DA COISA JULGADA
A coisa julgada produz efeitos, efeito negativo, qual seja, impede que a questão principal seja novamente julgada como questão principal em outro processo.
Já o efeito positivo gera a vinculação do julgador de outra causa ao que foi decidido na causa em que a coisa julgada foi produzida, ou seja, o juiz fica adstrito ao que foi decidido em outro processo, pois a coisa julgada deve ser levada em consideração.
Há, ainda, o efeito preclusivo, ou seja, com a formação da coisa julgada, preclui a possibilidade de rediscussão de todos os argumentos, conforme dispõe o art. 474 do CPC, em que transitada em julgado a decisão todas as alegações e defesas reputam-se argüidas e repelidas, tornam-se irrelevantes todos os argumentos e provas que as partes tinham a alegar ou produzir em seu favor.
3.3. REVISÃO DA COISA JULGADA
Existem alguns instrumentos para revisão da coisa julgada, quais sejam: a ação rescisória e a querella nulitatis; impugnação com base na existência de erro material; a impugnação da sentença inconstitucional. [11]
A ação rescisória é uma ação autônoma de impugnação de decisão de mérito transitada em julgada, eivada de vícios rescisórios, de acordo com o art. 485 da codificação processual civil.
Já o meio de impugnação de decisão maculada por vícios transrescisórios é a querella nulitatis, quando: a decisão for proferida em desfavor do réu em processo que correu à sua revelia em decorrência de citação defeituosa. Trata-se de ação desconstitutiva que pode ser ajuizada até dois anos após o prazo previsto para a ação rescisória.
4. CONCLUSÃO
Ante o exposto, sem maiores pretensões, podemos chegar às seguintes considerações:
I- O conceito de sentença passou por mudanças doutrinárias e legislativas significativas nos últimos tempos, o que culminou na edição da Lei 11.232/2005, que alterou a disposição contida no §1º do art. 162 do Código de Processo Civil;
II- Tal modificação legislativa, embora tenha ampliado a abrangência do que possa ser considerado como sentença, trouxe dificuldades para identificação do instrumento recursal cabível para determinadas decisões;
III – Os requisitos da sentença, conforme disposto no art. 458 da codificação processual civil, em regra, são obrigatórios, e a inobservância por parte do magistrado pode ocasionar nulidade da sentença ou até mesmo a inexistência, no último caso faltando o dispositivo;
IV- Os efeitos da sentença, em regra afetam as partes e os interessados diretamente no processo. Contudo, há casos em que esse efeito se prolonga para além dos limites do processo;
V- A distinção entre coisa julgada formal e material, a primeira apesar de imutável nos limites do processo em que foi proferida pode ser rediscutida em outro processo, e na segunda seus efeitos ultrapassam os limites do processo em que foi proferida.
REFERÊNCIAS
1. DIDIER Jr., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Bahia: JusPodivm, 2007, vol. 2, p 221.
2. DIDIER Jr., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Op. cit, p. 225.
3. MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo. São Paulo: RT, 2006, v.1, p. 99. In: DIDIER Jr., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Op. cit, p. 226.
4. BRASIL. Tribunal Regional Federal, 3ª Região. Apelação Cível nº 1549 SP 2007.03.99.001549-3. Relator: Juiz Newton de Lucca. Julgamento em 23/07/2007. Pub. DJU: 05/09/2007, p. 276.
5. DINAMARÇO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 3ed. São Paulo: Malheiros, 2003, v.3, p.660. In: DIDIER Jr., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Op. cit, p. 227.
6. BRASIL. Tribunal de Justiça do Paraná. 8ª Câmara Cível. Agravo de Instrumento nº 7668842. Relator: João Domingos Kuster Puppi. Julgamento em 30/06/2011. Pub. DJ 674.
7. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 3ª turma. REsp 909157. Relator Humberto Gomes de Barros. Julgamento 18/12/2007. Pub: DJ 08.02.2008 p. 1.
8. GUEDES, Murilo Carrara. Da sentença civil: evolucionismo histórico, definição e classificação. Disponível em: http://www.advogado.adv.br/artigos/2005/ murilocarraraguedes/sentencacivil.htm, acessado em 22/11/2011.
9. GUEDES, Murilo Carrara. Op. cit.
10. SANTOS, Moacyr Amaral. Comentários ao Código de Processo Civil. 3ª ed., vol. 3, p.10. In: DIDIER Jr., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Op. cit., p. 295.
11. DIDIER Jr., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Op. cit., p. 504.
Bacharela em Direito pela Faculdade Guanambi; desde 2007 exerce o cargo efetivo de técnico judiciário do Tribunal Regional Eleitoral De Alagoas, removida para o Tribunal Regional Eleitoral da Bahia.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PAES, Janiere Portela Leite. Breves considerações: sentença e coisa julgada no Processo Civil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 dez 2011, 07:56. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/27319/breves-consideracoes-sentenca-e-coisa-julgada-no-processo-civil. Acesso em: 23 dez 2024.
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