INTRODUÇÃO
O Decreto nº 7.567/2011, que regulamentou os artigos 5º e 6º da Medida Provisória nº 540/2011, faz parte do início de um projeto traçado pelo Governo Federal para incremento da indústria automotiva do país. “Trata-se de um programa de investimento em tecnologia, que dará competitividade à atividade no país.”[1]
Inicialmente, pode ser visto como medida pura e simples de proteção. No entanto, não é esse o objetivo mediato do nosso Estado. O setor nacional terá que se ajustar aos critérios mínimos estabelecidos pela legislação atual e futura, caso contrário, sofrerá também o aumento do IPI. Quanto aos importadores, não haverá saída para manter a competitividade, exceto pela sua instalação no Brasil.
Desta forma, essa medida, em geral, protege imediatamente e dinamiza a médio e longo prazo a indústria nacional em detrimento das montadoras ou representantes que importam automóveis. Ficará cada vez mais pouco competitivo importar veículos automotivos para o nosso país.
CENÁRIO BRASILEIRO
Há mais de 60 anos instalada no Brasil, “a nossa indústria automotiva nunca foi considerada uma excelência em tecnologia”[2]. Nossos carros sempre tiveram alguma defasagem em relação aos mercados desenvolvidos. Tal questão encontrava fundamento no perfil social: sem um grande mercado consumidor de fato, sem políticas governamentais que protegessem o consumo nesse quesito, as quatro maiores montadoras instaladas no país (Volkswagem, GM, Fiat, Ford) “não se sentiam pressionadas a melhorar a qualidade dos seus produtos”[3].
Com a estabilidade da moeda e o aumento da renda da população, o mercado interno brasileiro cresceu e ganhou notoriedade mundial. Tornamo-nos um dos grandes consumidores de automóveis. No entanto, tal realidade ainda não reflete na qualidade dos carros produzidos em solo nacional.
A partir disso, a procura por carros importados começa a aumentar. A insatisfação com os automóveis nacionais somada com o aumento da renda fez a procura por importados. Desta forma, montadoras e representantes aumentaram o volume de importações de carros pra suprir os anseios por tecnologia avançada.
LEGISLAÇÃO
O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) se trata de um imposto cuja função é extra-fiscal[4], sendo utilizado pelo Estado para regular o mercado quando julgar apropriado. Previsto pelo inciso IV, do art. 153, da Constituição Federal, compete a União instituir, majorar ou isentar determinado produto da sua incidência, utilizando para isso a alíquota, que incidi sobre a base de cálculo (preço de venda da mercadoria).
A Carta Magna também prevê no artigo 150, inciso III, alínea c, a vedação da cobrança do tributo antes do decorrido noventa dias da data em que tenha sido publicada a lei que o instituiu ou aumentou. Desta forma, é de fácil e lamentável constatação a inconstitucionalidade do referido decreto, quando determina a sua entrada em vigor na data da publicação, sendo essa reconhecida em medida liminar pelo plenário do Supremo Tribunal Federal na ADI 4661[5].
O Código Tributário Nacional no seu artigo 46, parágrafo único, “ considera industrializado o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo[6]”. Além disso, estabelece que o fato gerador do IPI na situação em questão é desembaraço aduaneiro, sendo esse o momento da liberação do carro importado para ingressar no nosso território.
EFEITOS
Inicialmente, houve um debate sobre a inconstitucionalidade do artigo 16 do referido decreto, fato que já foi acolhido liminarmente. De fato, não foi por desconhecimento que o Governo Federal determinou que o decreto entraria em vigor na data da publicação. Isso seria para evitar que as importadoras desembaraçassem grandes volumes de veículos automotores para garantir preços competitivos por um tempo superior aos noventa dias. No entanto, a Constituição assim determina para dar segurança aos contribuintes. Desta forma, o Governo jamais poderia ter agido contra a Lei Maior da nossa República.
Outro ponto em destaque é o período da vigência do decreto. Ele estará em vigor até 12 de Dezembro de 2011. Nesse período, acredita-se que o Governo Federal lance um programa mais completo e que permita flexibilidade para a instalação no país das empresas importadoras, além de outros critérios para os veículos nacionais.
Assim, de acordo com o consultor André Belchior, essa medida, em geral, pode aumentar “em até 15% do valor atual dos carros importados ou os que não atendam às condições estabelecidas”[7]. Além disso, também terá aumento os caminhões, as camionetes e os veículos comerciais leves.
CONDIÇÕES PARA REDUÇÃO DO IPI
As condições para redução do IPI estabelecem além da efetiva instalação da montadora no país ou naqueles com os quais o Brasil tem acordo comercial automotivo[8] requisitos que assegurem um percentual da cadeia de produção em nosso país.
Tudo isso é necessário para garantir a proteção social e a geração de riqueza à sociedade brasileira. A exploração comercial desse setor realizada há 60 anos já deu sinais claros que esse mercado não se regulará apenas com a concorrência. É essencial a intervenção estatal, por mais mínima que seja, para proteger o consumidor contra os abusos de carros com baixos índices de segurança[9].
Assim, o Governo Federal estabeleceu condições a obtenção do desconto no Imposto de Importação para as empresas que concomitante:
1. Fabriquem veículos com, no mínimo, 65% de conteúdo regional médio;
2. Realizem investimentos em inovação, pesquisa ou desenvolvimento tecnológico de produtos no Brasil, correspondentes, no mínimo, a 0,5% da receita bruta total de venda de bens e serviços, excluídos os impostos e contribuições incidentes sobre a venda;
3. Desenvolvam pelo menos seis das onze seguintes atividades em 80%, no mínimo, da produção de veículos no Brasil: a. montagem, revisão final e ensaios compatíveis; b. estampagem; c. soldagem; d. tratamento anticorrosivo e pintura; e. injeção de plástico; f. fabricação de motores; g. fabricação de transmissões; h. montagem de sistemas de direção, de suspensão, elétrico e de freio, de eixos, de motor, de caixa de câmbio e de transmissão; i. montagem de chassis e de carrocerias; j. montagem final de cabines ou de carrocerias, com instalação de itens, inclusive acústicos e térmicos, de forração e de acabamento; l. produção de carrocerias preponderantemente através de peças avulsas estampadas ou formatadas regionalmente[10].
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo do Decreto nº 7.567/2011 não é apenas uma medida de proteção da indústria nacional, mas a inovação, a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico dos automóveis produzidos no país. Acreditamos também ser possível que não há apenas esse mecanismo para elevar esses níveis, mas seria um paradoxo adotar o liberalismo por uma equipe governamental que tem como principal programa a causa social.
Claro que enfrentando um país como a China com folhas salariais baixas e alto níveis de automação, o Brasil precisa tomar medidas para proteger a nossa sociedade. Teríamos uma perda de transferência de riqueza caso abríssemos totalmente o mercado automotivo para os importados, uma vez que a indústria aqui instalada não se encontra em condições de livre concorrência.
Também é necessário observar que os importados têm uma mínima fatia do nosso mercado. Desta forma, fica claro não só a preocupação pela “invasão estrangeira”, até porque ela é de apenas 4,95% conforme veiculado pela Abeiva.[11] É obvio o interesse do Governo em aumentar a qualidade dos carros.
Por fim, essas medidas são precisas na teoria. Na prática, a nossa República deverá fazer avaliações regularmente para verificar o andamento do programa, observando sempre os ganhos para a sociedade, afinal, esse é o bem comum do nosso Estado.
BIBLIOGRAFIA
BOTTALO, Eduardo Domingos. IPI – Princípios e estrutura. 1ª Ed. São Paulo. Dialética. 2010.
CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. Disponível em: http://www.receita.fazenda.gov.br/legislacao/codtributnaci/ctn.htm Acessado em: 10 de Dezembro de 2011.
COSTA, Alcides Jorge. Estudos sobre IPI. 1ª Ed. São Paulo. Dialética. 2009
DECRETO 7.567. Disponível em : http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7567.htm Acessado em: 20 de Dezembro de 2011.
HARADA, Kiyoshi. O caráter seletivo do IPI a impedir a majoração imotivada sobre veículos importados. Disponível em:http://www.fiscosoft.com.br/a/5jju/o-carater-seletivo-do-ipi-a-impedir-a-majoracao-imotivada-sobre-veiculos-importados-kiyoshi-harada Acessado em: 09 de Dezembro de 2011.
MANTEGA NEGA REDUÇÃO. Disponível em: http://veja.abril.com.br/noticia/economia/mantega-nega-reducao-imediata-de-ipi-para-carros-nacionais Acessado em: 18 de Dezembro de 2011.
MELO, José Eduardo Soares de. IPI – Teoria e prática. 1ª Ed. São Paulo. Malheiros. 2009.
OLIVEIRA, Waldemar de. Regulamento do IPI. 21 Ed. São Paulo. Fiscosoft Editora . 2011.
SEGURANÇA RUIM NOS CARROS DA AMÉRICA LATINA. Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,seguranca-ruim-nos-carros-da-america-latina-,802685,0.htm Acessado em: 21 de Dezembro de 2011.
[1] Mantega nega redução para carros nacionais. Disponível em: http://veja.abril.com.br/noticia/economia/mantega-nega-reducao-imediata-de-ipi-para-carros-nacionais Acessado em: 18 de Dezembro de 2011.
[2] Miriam Leitão. Enfim, a sinceridade. Disponível em: http://oglobo.globo.com/economia/miriam/posts/2011/09/17/enfim-sinceridade-406168.asp Acessado em: 18 de Dezembro de 2011.
[3] Miriam leitão. Enfim, a sinceridade. Op. Cit.
[4] HARADA, Kiyoshi. O caráter seletivo do IPI a impedir a majoração imotivada sobre veículos importados. Disponível em:http://www.fiscosoft.com.br/a/5jju/o-carater-seletivo-do-ipi-a-impedir-a-majoracao-imotivada-sobre-veiculos-importados-kiyoshi-harada Acessado em: 09 de Dezembro de 2011.
[5] ADI 4661. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADIN&s1=4661&processo=4661 Acessado em: 10 de Dezembro de 2011.
[6] Código tributário Nacional. Disponível em: http://www.receita.fazenda.gov.br/legislacao/codtributnaci/ctn.htm Acessado em: 10 de Dezembro de 2011.
[7] IPI mais alto. Disponível em: http://economia.uol.com.br/ultimas-noticias/redacao/2011/12/16/ipi-mais-alto-de-carros-vale-a-partir-de-hoje-saiba-se-vale-comprar-agora.jhtm Acessado em: 18 de Dezembro de 2011.
[8] Acordo de Complementação Econômica nº 55 - MERCOSUL/México (Automotivo). O Brasil tem acordo automotivo com a Argentina, Uruguai, Paraguai e México. No entanto, no Paraguai existe nenhuma montadora de veículos automotores.
[9] Segurança ruim nos carros da América Latina. Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,seguranca-ruim-nos-carros-da-america-latina-,802685,0.htm Acessado em: 21 de Dezembro de 2011.
[10] Decreto 7.567. Disponível em : http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7567.htm Acessado em: 20 de Dezembro de 2011.
[11] Participação cresce. Disponível em: http://economia.terra.com.br/noticias/noticia.aspx?idNoticia=201112151259_TRR_80611707 Acessado em: 21 de Dezembro de 2011.
Graduado em Direito pelo Centro Universitário de João Pessoa - UNIPE, especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET, advogado e consultor tributário.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FILHO, Bismarque Fernandes Alves. Decreto 7.567/2011 : o início da modernização da indústria automotiva brasileira Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 dez 2011, 09:22. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/27520/decreto-7-567-2011-o-inicio-da-modernizacao-da-industria-automotiva-brasileira. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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