Resumo: O presente artigo tem por objetivo analisar a utilização das normas tributárias brasileiras com o findo de preservar o nosso meio ambiente. Através da função parafiscal, o Estado destina seus recursos angariados para subsidiar parte de sua atuação de proteção da natureza. A função extrafiscal de determinados tributos objetiva a aplicação e continuidade de políticas públicas que visem a preservação do meio ambiente.
Palavras-chave: Tributo; Meio Ambiente; Imposto; Taxa; Contribuição
SUMÁRIO: Introdução; Base Constitucional do Direito Tributário Ambiental; Impostos; Taxa; Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico; Conclusão; Referências Bibliográficas.
INTRODUÇÃO
Apesar do desgaste do meio ambiente ser uma realidade antiga na história da humanidade, a preocupação com a proteção da natureza recebeu destaque jurídico apenas nos tempos atuais. Inseridos nesse contexto de conscientização acerca da necessidade de preservar o meio ambiente, observamos o nascimento e evolução de um importante ramo do Direito Público, o Direito Ambiental.
O Direito Ambiental brasileiro é a subdivisão de nosso ordenamento jurídico que versa predominantemente sobre a preservação de nosso meio ambiente. Apesar de ser classificado como um ramo distinto de direito, o Direito Ambiental não atua de forma independente. Sua aplicação, muitas vezes, encontra-se atrelada à normas de outras ramificações jurídicas, como o Direito Penal, Direito Internacional, Direito Administrativo, bem como o Direito Tributário.
Sob esse prisma chegamos ao objeto do presente artigo, a interação de outros ramos de direito, precisamente do Direito Tributário, com o Direito Ambiental. Será exposto como as diversas espécies tributárias brasileiras, os impostos, taxas e contribuições, atuam na preservação de nossa natureza.
1 BASE CONSTITUCIONAL DO DIREITO TRIBUTÁRIO AMBIENTAL
O Direito ao Meio Ambiente é considerado um interesse difuso, um interesse fundamental de 3ª geração. Ele elenca o rol dos Direitos Sociais, apesar de não estar expressamente inscrito no art. 6° da Constituição Federal, uma vez que um Meio Ambiente balanceado é fundamental para manutenção da vida em sociedade.
A primeira abordagem constitucional a ser realizada em matéria ambiental ocorreu com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, tendo em seu texto dispositivos específicos sobre o tema de Direito Ambiental, destacando-se dentre eles o art. 225.
O caput do referido artigo busca preservar a vida humana dentro de todo o território nacional, bem como atribui ao Poder Público e a coletividade a responsabilidade pela preservação do meio ambiente.
Art. 225 da CRFB - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
Através da atividade tributária das admnistrações públicas dos entes federativos, tanto o Poder Público quanto a sociedade são detentores de uma indispensável ferramenta a fim de cumprir o dispositivo constitucional acima mencionado, como será visto nos capítulos a seguir.
2 IMPOSTOS
Segundo o doutrinador Ricardo Alexandre, a função fiscal se traduz no papel arrecadatório dos tributos. É sabido que o produto arrecadado, em parte, é posteriormente empregado na efetivação de políticas públicas, entre elas as políticas de conservação do meio ambiente.
Sob esse panorama nos deparamos com uma peculiaridade existente com o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte – ICMS. Temos que uma parte de sua arrecadação pode ser destinada à recompensar a atuação dos municípios na proteção do meio ambiente, parte essa conhecida como ICMS Ecológico.
A CRFB estipula que 25% do produto da arrecadação do ICMS é pertencente aos municípios. Contudo, compete aos estados legislar sobre a destinação de ¼ desse montante, vejamos:
Art. 158 da CRFB - Pertencem aos Municípios:
(...)
IV - vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.
Parágrafo único. As parcelas de receita pertencentes aos Municípios, mencionadas no inciso IV, serão creditadas conforme os seguintes critérios:
I - três quartos, no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seus territórios;
II - até um quarto, de acordo com o que dispuser lei estadual ou, no caso dos Territórios, lei federal. (grifou-se)
Observa-se que alguns estados, diante dessa competência delegada pela CRFB, optam por estipular critérios ambientais para a concessão dessa parcela para os municípios, incentivando com isso a conservação da biodiversidade.
A função extrafiscal dos tributos consiste na intervenção na sociedade ou na economia através da atividade tributária. Em se tratando de Direito Tributário Ambiental, ela objetiva a diminuição do consumo de bens danosos ao meio ambiente, orientando, mediante isso, o contribuinte à proteger o meio ambiente. É exercida pela sobretaxa de atividades nocivas ao meio ambiente, ou pela concessão de benefícios fiscais em razão de atividades que busquem a preservação ambiental.
O Imposto de Renda – IR poderá ter em suas declarações descontos ou abatimentos relativos à valores empregados no reflorestamento, conforme disposto na no artigo 1° da Lei n° 5.106/66, vejamos:
Art. 1º - As importâncias empregadas em florestamento e reflorestamento poderão ser abatidas ou descontadas nas declarações de rendimento das pessoas físicas e jurídicas, residentes ou domiciliados no Brasil, atendidas as condições estabelecidas na presente lei.
Cumpre lembrar que o Decreto-Lei 1.503/76 definiu que a partir de 1º de janeiro de 1977 não mais seriam concedidos, à pessoas jurídicas, incentivos fiscais para florestamento ou reflorestamento, nas condições previstas na Lei n. 5.106/66
Em se tratando do Imposto Territorial Rural – ITR, são isentos de seu pagamento proprietários de imóveis rurais em áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal, conforme estabelece o artigo 104 da lei n° 6.171/91:
Art. 104 - São isentas de tributação e do pagamento do Imposto Territorial Rural as áreas dos imóveis rurais consideradas de preservação permanente e de reserva legal, previstas na Lei n° 4.771, de 1965, com a nova redação dada pela Lei n° 7.803, de 1989.
Parágrafo único. A isenção do Imposto Territorial Rural (ITR) estende-se às áreas da propriedade rural de interesse ecológico para a proteção dos ecossistemas, assim declarados por ato do órgão competente federal ou estadual e que ampliam as restrições de uso previstas no caput deste artigo.
Posteriormente a lei n° 9.393/96, a qual dispõe sobre o ITR, excluiu da sua base de cálculo as áreas de floresta nativa, bem como outras áreas consideradas de preservação permanente, vejamos:
Art. 10. A apuração e o pagamento do ITR serão efetuados pelo contribuinte, independentemente de prévio procedimento da administração tributária, nos prazos e condições estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal, sujeitando-se a homologação posterior.
§1º Para efeitos de apuração do ITR, considerar-se-á:
I – VTN, o valor do imóvel, excluídos os valores relativos a:
(...)
d) florestas plantadas;
II – área tributável, área total do imóvel, menos as áreas:
a) de preservação permanente e de reserva legal, previstas na Lei n° 4.771, de 15 de setembro de 1965, com a redação dada pela Lei n° 7.803, de 18 de julho de 1989;
b) de interesse ecológico para a proteção dos ecossistemas, assim declaradas mediante ato do órgão competente, federal ou estadual, e que ampliem as restrições de uso previstas na alínea anterior;
c) comprovadamente imprestáveis para qualquer exploração agrícola, pecuária, granjeira, aqüícola ou florestal, declaradas de interesse ecológico mediante ato do órgão competente, federal ou estadual;
d) sob o regime de servidão florestal ou ambiental;
e) cobertas por florestas nativas, primárias ou secundárias em estágio médio ou avançado de regeneração;
(...)
IV – área aproveitável, a que for passível de exploração agrícola, pecuária, granjeira, aqüícola ou florestal, excluídas as áreas:
(...)
b) de que tratam as alíneas do inciso II deste parágrafo;
(...)
Observa-se que o legislador objetiva a manutenção das áreas florestais pelos proprietário rurais, através da concessão dos incentivos fiscais acima mencionados.
Por fim, tanto o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, quanto o Imposto de Importação – II, são tributos cujas alíquotas são fixadas seletivamente. É possivel notar a preocupação com o meio ambiente na fixação dessas alíquotas, como por exemplo, em seu aumento, quando seu fato gerador estiver relacionado à produtos feitos de materiais derivados de petróleo, se comparados com produtos feitos de materiais renováveis.
Outro exemplo de seletividade em benefício do meio ambiente é a redução de IPI para carros do tipo ‘flex’, incentivando assim a diminuição da emissão de gás carbônico.
3 TAXA
A taxa é espécie tributária cujo fato gerador é uma atividade estatal representada pela prestação de um serviço ou exercício regular do poder de polícia. O Poder de Polícia é a faculdade detida pela Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado
A Administação exerce o poder de polícia sobre todas as atividades que possam, direta ou indiretamente, afetar os interesses da coletividade. Trata-se de um poder instrumental da Administração Pública. Ele é nada mais do que um mecanismo de frenagem dos atos praticados por particulares, com o intuito de previnir e conter possíveis abusos. Ele se encontra definido no art. 78 do Código Tributário Nacional:
Art. 78 do CTN - Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.
4 CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO
A Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico - CIDE é um tributo que incide sobre a importação e a comercialização de gasolina, diesel e respectivas correntes, querosene de aviação e derivativos, óleos combustíveis, gás liquefeito de petróleo, inclusive o derivado de gás natural e de nafta, e álcool etílico combustível.
Previsto constitucionalmente no artigo 177, esse tributo se destina a financiar, entre outros, projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás, conforme transcrito a seguir:
Art. 177 da CRFB - Constituem monopólio da União:
(...)
§ 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes requisitos:
(...)
II - os recursos arrecadados serão destinados:
(...)
b) ao financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás;
É importante notar que houve um translado do texto constitucional para a legislação ordinária, com o advento da lei n° 10.336/01, a qual instituiu a referida contribuição, criando assim um tributo ambiental:
Art. 1o - Fica instituída a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre a importação e a comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível (Cide), a que se refere os arts. 149 e 177 da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional no 33, de 11 de dezembro de 2001.
§ 1o O produto da arrecadação da Cide será destinada, na forma da lei orçamentária, ao:
(...)
II - financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás; e
(...)
Posteriormente, a lei n° 10.636/02 determinou em seu artigo 4° a abrangência dos projetos ambientais elencados no art. 177 da CRFB e no art. 1° da lei n° 10.336/01, vejamos:
Art. 4o - Os projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás a serem contemplados com recursos da Cide, conforme estabelece a alínea "b" do inciso II do § 4o do art. 177 da Constituição Federal, serão administrados pelo Ministério do Meio Ambiente e abrangerão:
I – o monitoramento, controle e fiscalização de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras;
II – o desenvolvimento de planos de contingência locais e regionais para situações de emergência;
III – o desenvolvimento de estudos de avaliação e diagnóstico e de ações de educação ambiental em áreas ecologicamente sensíveis ou passíveis de impacto ambiental;
IV – o apoio ao desenvolvimento de instrumentos de planejamento e proteção de unidades de conservação costeiras, marinhas e de águas interiores;
V – o fomento a projetos voltados para a preservação, revitalização e recuperação ambiental em áreas degradadas pelas atividades relacionadas à indústria de petróleo e de seus derivados e do gás e seus derivados;
VI – o fomento a projetos voltados à gestão, preservação e recuperação das florestas e dos recursos genéticos em áreas de influência de atividades relacionadas à indústria de petróleo e de seus derivados e do gás e seus derivados.
VII - o fomento a projetos voltados à produção de biocombustíveis, com foco na redução dos poluentes relacionados com a indústria de petróleo, gás natural e seus derivados.
§ 1o Os recursos da Cide não poderão ser aplicados em projetos e ações definidos como de responsabilidade dos concessionários nos respectivos contratos de concessão, firmados com a Agência Nacional de Petróleo.
§ 2o Os projetos ambientais referidos no caput poderão receber complementarmente recursos de que trata o inciso II do § 2o do art. 50 da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997.
5 CONCLUSÃO
Conforme exposto na obra, alguns de nossos tributos auxiliam na defesa do meio ambiente, seja exercendo as funções fiscais e parafiscais, repassando parte de sua arrecadação para o financiamento de projetos ambientais, seja exercendo a função extrafiscal, incentivando o contribuinte a proteger o meio ambiente.
O Brasil não possui previsto em sua Constituição impostos e contribuições cujos fatos geradores estejam diretamente ligados à atividades potencialmente nocivas à natureza. Contudo, o presente artigo demonstra que através da legislação tributária, o Estado exerce sua função conferida pela Constituição de preservar o meio ambiente.
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional Positivo, 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado, 4ª ed. São Paulo: Método, 2010
GUERRA, Sidney. Direito Ambiental, 4ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009
NAVARRO COELHO, Sacha Calmon. Curso de Direito Tributário Brasileiro, 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004
SALIBA, Ricardo Berzosa. Fundamentos do Direito Tributário Ambiental, 1ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2005
TORRES, Heleno Taveira. Direito Tributário Ambiental, 1ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário, 17ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2010
Advogado. Bacharel em Direito pela UFRJ com Especialização em Direito Tributário pela EMERJ.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALMEIDA, Diogo Vollstedt de. O panorama geral do Direito Tributário Ambiental Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 jan 2012, 08:21. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/27559/o-panorama-geral-do-direito-tributario-ambiental. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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