INTRODUÇÃO
Com o advento da internet, a troca de informações, comunicação e a interação entre as pessoas ficaram mais fáceis. A internet, como facilitadora do intercâmbio de informações, trouxe diversas oportunidades de educação, lazer e entretenimento. No entanto, a rede mundial tem sido também, um ambiente extremamente favorável à proliferação da sexualidade e da pornografia e, de um modo ainda mais sensível, tem servido como campo fértil para a disseminação do crime de pornografia infantil e da pedofilia virtual.
DESENVOLVIMENTO
A pornografia infantil quanto à pedofilia possuem o mesmo objetivo, ou seja, de aliciar a confiança das crianças e, posteriormente, abusá-las sexualmente. De forma que, alguns cometem os referidos abusos pela própria internet, outros, contudo, utilizam da internet para marcar encontros pessoais com suas vítimas.
Importa mencionar que essas pessoas que buscam na pedofilia ou na pornografia infantil maneiras de encontrar prazer não se contentam somente com isso. Uma vez que, o fator financeiro pode servir de alicerce para a futura exploração sexual de crianças e adolescentes. Assim, aquele que antes era um pedófilo, passa a ser um especialista em tráfico de crianças, lucrando valores altos com esse crime, que começou com um simples bate-papo virtual.
Dessa forma é que surge o chamado turismo sexual, o qual se caracteriza pelo deslocamento transitório de pessoas, individualmente ou em grupos, cuja finalidade é única e exclusivamente o sexo. Melhor dizendo, "uma complexa rede de agentes e logradouros que utilizam o estímulo do prazer sexual como elemento agregador da atividade turística" (CEZAR, 2007. p. 35).
Para tanto, a violência sexual contra crianças e adolescentes é uma violação de direitos humanos universais, de regras sociais e familiares das sociedades em que ocorre. É, portanto, uma ultrapassagem dos limites humanos, legais, culturais, sociais, físicos, psicológicos. Trata-se de uma transgressão e, nesse sentido, é um crime, ou seja, um ato delituoso, delinquente, criminoso e inumano da sexualidade da criança e do adolescente. (FALEIROS, 2003, p. 21).
Em verdade, sabe-se que, o abuso sexual não é um problema contemporâneo, mas advém de longa data. Desse modo, sua conceituação não é fácil, pois, segundo Cezar, "se trata de fenômeno cultural de modelos que incluem raça, consciência étnica, classe e tempo histórico em que ocorre". (CEZAR, 2007, p.42).
Assim sendo, acredita-se que o abuso sexual começou a ter maior revelação e atenção a partir da instalação dos Conselhos Tutelares, órgãos através dos quais o Estatuto da Criança e do Adolescente concretiza, define e personifica o dever de zelar pelos direitos da criança e do adolescente, abstratamente imposto, na Constituição Federal, à sociedade. (DOBKE, 2001, p.22).
De tal modo, pode-se verificar que o abuso sexual é um fenômeno universal que atinge todas as classes sociais, etnias, religiões e culturas, sendo que sua verdadeira incidência é desconhecida, acreditando-se ser, "[...] uma das condições de maior subnotificação e subregistros em todo mundo". Apesar de o percentual de denúncias serem tímidos, estima-se que milhões de pessoas sejam abusadas sexualmente. (DREZETT, 2001).
Nesse passo, entende-se que o abuso sexual em todas as suas modalidades é muito mais sério do que se pode imaginar. E combater essa prática fica ainda mais difícil por se estar diante, ainda, de um tema-tabu, pois, para muitos, é doloroso entender e aceitar que o abuso sexual existe. Além do que, não há distinção de classes sociais e tem como vitimizador, na maioria dos casos, alguém ligado à criança por laços afetivos fortes, como o pai, padrasto ou alguém responsável pela sua educação.
Por isso, todas as modalidades de violências praticadas contra a criança não podem, simplesmente, serem tratáveis com terapia, pois, conforme explica Veronese (2005, p.20), não basta a "[...] má reprogramação, ou que pudessem ser superados com exortações muito conhecidas como "esqueça", pois já passou, ou "supere", a questão é muito mais complexa [...]", isto porque, uma vez que a violação causa alterações físicas no cérebro, e até o momento ainda não foi descoberta uma possibilidade ou um mecanismo capaz de reverter tal alteração.
É de ressaltar, portanto, que o abuso sexual ocupa um lugar absolutamente relevante e incomodativo e que identificar e punir o abusador é o papel esperado do Poder Judiciário. No entanto, isso apenas não é suficiente, pois, são necessárias políticas públicas de prevenção e de tratamento, tanto para vítima quanto para o abusador.
Desta forma, nota-se que o atendimento adequado as crianças e adolescentes, vítimas de violência sexual, deve ser seguido de um bom auxílio profissional competente o qual acompanhará os depoimentos com os cuidados necessários para não prejudicar a saúde psicológica da criança e/ou do adolescente já abalada pelo abuso.
Destarte, que a estratégia global para encarar a questão do abuso sexual da criança e do adolescente implica na construção de novos paradigmas, quer no campo valorativo, ético e, principalmente, jurídico. É certo que a legislação brasileira, no que tange à prevenção, deixa muito a desejar. Segundo Araújo e Williams (2009, p.69) "a fragilidade da legislação concernente à exploração sexual de crianças e adolescentes no Brasil é patente". E, neste contexto, os autores complementam:
É verdade que a Constituição Federal de 1988 concebeu um novo enfoque sobre os princípios jurídicos ligados as questões da criança e do adolescente, inserindo a teoria da proteção integral e da prioridade absoluta em seu texto, mas não é menos verdade que a legislação ordinária carece melhoria. O art. 227 § 4º da Constituição Federal diz que a lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente. Contudo, faltam dispositivos legais específicos nas leis e os que existem não são capazes de suprir com absoluta eficácia as complexidades inerentes a esta modalidade criminosa. E sem instrumentos eficazes na lei ordinária, a doutrina da proteção integral a criança e do adolescente cai por terra. (ARAUJO E WILLIAMS, 2009, p. 69).
Segundo Azambuja (2004, p.159), "[...] observam-se ainda fartes resistências por parte do poder público em adequar suas práticas ao comando constitucional [...]", deixando de abster à criança a condição de prioridade absoluta, como dispõe o artigo 227 da Carta Maior.
A legislação, portanto, precisa evoluir para oferecer uma resposta a essa nova realidade trazida com o desenvolvimento tecnológico, com a criação de um novo tipo penal que contem imagens não fotográficas de abuso sexual de crianças e do adolescente.
O fato é que a justiça depara-se hoje com uma grande demanda de situações de violência sexual, desse modo, percebe-se que há uma necessidade enorme de assegurar que todos os profissionais envolvidos no sistema de justiça criminal, entre eles advogados, juízes, promotores e delegados, recebam treinamento adequando sobre abuso sexual, para que tenham uma compreensão mais profunda acerca das questões complexas envolvidas nele, tais como padrões de abuso, diferenças entre abuso sexual interno e externo à família, impacto do abuso, bem como efeitos emocionais e psicológicos do abuso sexual. (SANDERSON, 2005, p.300).
Por fim, conclui-se que, somente depois que tudo estiver adequadamente compreendido e conexo é que os profissionais do direito poderão tomar decisões apropriadas e implementar efetivas mudanças legislativas que protejam a criança e o adolescente estimulando assim a prevenção do abuso sexual no País.
CONCLUSÃO
Crianças e adolescentes possuem imaturo desenvolvimento psicológico, não compreendem as atividades sexuais. Portanto, incapazes de dar qualquer tipo de consentimento e legitimidade ao agressor. Muitas vezes, pela relação de confiança, a vítima aceita o ato por não saber dos danos que este pode causar, ou seja, obedece o seu pai, padrasto ou responsável, que na maioria das vezes, utiliza a vítima como um instrumento de descarga de seus impulsos, para aliviar suas tensões. Fisicamente, as vítimas são passivas, oferecem poucas ou não oferecem chance alguma de defesa. Isso demonstra a vulnerabilidade das crianças e dos adolescentes a se tornarem vítimas de abuso sexual.
Posta assim a questão, é de se dizer que a legislação deve visar à adequação da proteção legal das crianças e adolescentes às mudanças sociais, especialmente contra crimes e abusos sexuais, os quais, é notório, tem aumentado cada vez mais de proporção.
Assim, a proteção das crianças e dos adolescentes é assunto que deve ganhar mais atenção da sociedade e, por decorrência, dos legisladores. É a inovação necessária no sistema jurídico atual, respeitando a dignidade da pessoa humana e, desta forma, passando atender as exigências da sociedade moderna, ou seja, contribuindo de maneira significativa para tornar o Judiciário um sistema íntegro, leal e coerente com os cidadãos.
REFERENCIAS
ARAÚJO, Eliane Aparecida Campanha; WILLIAMS, Lúcia Cavalcanti de Albuquerque (Orgs.). Prevenção do abuso sexual infantil: um enfoque interdisciplinar. Curitiba: Juruá, 2009.
AZAMBUJA, Maria Regina Fay de. Violência sexual intrafamiliar: é possível proteger a criança? Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.
CEZAR, José Antonio Daltoé. Depoimento Sem Dano: uma alternativa para inquirir crianças e adolescentes nos processos judiciais. 1ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.
FALEIROS, Eva (Org.). O Abuso sexual contra crianças e adolescentes: os (des)caminhos da denúncia.Brasília: Presidência da República, Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2003.
RANGEL, Patrícia Calmon. Abuso sexual: intrafamiliar recorrente. Curitiba: Juruá, 2001.
Bacharel em Direito pela Universidade Norte do Paraná e Pós Graduada em Direito Material Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PELEGRINI, Francelise. O abuso sexual em face da fragilidade da legislação brasileira Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 fev 2012, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/27857/o-abuso-sexual-em-face-da-fragilidade-da-legislacao-brasileira. Acesso em: 23 dez 2024.
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