Sumário: 1 Introdução. 2 Os deveres referentes à sociedade conjugal violados na relação entre Miranda e Estela. 3 Notas Conclusivas. 4 Referências Bibliográficas.
RESUMO
As relações matrimoniais do mundo contemporâneo irradiam normas basilares do Direito de Família, sendo que sem elas não poderíamos discutir validade do casamento, os direitos e deveres recíprocos entre os cônjuges, bem como as suas relações econômicas, dissolução da sociedade conjugal e do vínculo matrimonial. Assim, essas normas surgem com o tecnicismo para orientar as ações dos cônjuges, trazendo à voga o objetivo principal do presente artigo, a saber, discutir os deveres referentes à sociedade conjugal violados na relação entre Miranda e D. Estela exposta no livro “O Cortiço” de Aluísio de Azevedo.
PALAVRAS-CHAVE: Relações matrimoniais; Direito de Família; Deveres; “O Cortiço” de Aluízio de Azevedo
1 INTRODUÇÃO
O casamento figura-se como vínculo jurídico havido entre o homem e a mulher, já que a lei exige a diversidade de sexo, com o fito de auxílio recíproco não só material, mas espiritualmente, seguindo as exigências (direitos e deveres) impostos pelo Código Civil de 2002 e direcionados sempre no interesse do casal e dos filhos.
É nesse contexto, que nos valemos das máximas que apontam a família como a base da sociedade e o casamento como a mais importante de todas as instituições concernentes ao direito privado para iniciarmos nossas discussões.
Assim, entendendo a importância concebida ao instituto do matrimônio tomaremos por base, face à amplitude do tema, os deveres referentes à sociedade conjugal violados na relação entre Miranda e D. Estela exposta no livro “O Cortiço” de Aluísio de Azevedo.
2 OS DEVERES REFERENTES À SOCIEDADE CONJUGAL
Em conseqüência ao ato matrimonial surgem para os cônjuges, de maneira automática, situações jurídicas que impõe tanto direitos quanto, principalmente, deveres mútuos, isso se deve à necessidade de preservar os núcleos familiares, assim o Estado vale-se da sua força normativa e apresenta elementos reguladores destinados à proteção familiar, bem como responsabilização dos cônjuges.
Tal posicionamento é explicitado no art. 226, § 5º da Constituição Federal de 1988, demonstrando assim a preocupação do legislador em atribuir não só a responsabilidade recíproca dos cônjuges, mas também reafirmar que a família, como base da sociedade, tem proteção estatal:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.
O Código Civil de 2002 vem elencar em seu art. 1.566, I, II, III, IV e V, os deveres dos cônjuges, assim em um rol exemplificativo, já que é entendimento doutrinário majoritário que a lei cogita apenas alguns deveres inerentes aos consortes e não todos, consideram-se a fidelidade recíproca, a vida comum no domicílio conjugal, a mútua assistência, o sustento, guarda e educação dos filhos e o respeito e consideração mútuos, obrigações a serem acatadas pelos esposos. Portanto, discutiremos a seguir os deveres exigidos no ato matrimonial dentro da perspectiva e análise da obra de Aluísio de Azevedo, “O Cortiço”.
3 OS DEVERES REFERENTES À SOCIEDADE CONJUGAL VIOLADOS NA RELAÇÃO ENTRE MIRANDA E ESTELA
Como explicitado anteriormente, a fidelidade é um dever a ser cumprido pelos consortes em conseqüência ao ato matrimonial. Tutelada a fidelidade pelo art. 1566, I do CC/02, o Estado objetiva preservar além da moral, a estabilidade e a segurança do lar, isso porque quando uma família é constituída, uma conseqüência lógica seria a procriação dos filhos, gerando a presunção de paternidade. Tais afirmações são endossadas pelo posicionamento de DIAS:
O filho nascido na constância do casamento presume-se filho do casal. Para dar sustentação a essa verdade ficta, sente-se o Estado autorizado a impor regras a serem respeitadas pelos cônjuges, inclusive durante a vigência do casamento. Assim, acaba por obrigar, à fidelidade como forma de garantir a legitimidade da prole, a preocupação, nitidamente, é de ordem patrimonial, para assegurar a transmissão do patrimônio familiar aos seus “legítimos sucessores”. (2008, p. 242):
Na obra analisada, “O Cortiço” de Aluísio de Azevedo, Miranda é um negociante português que comercializa com fazendas por atacado, sendo sua esposa D. Estela, uma senhora muito pretensiosa, cujos valores morais podiam ser questionados. Viviam na Rua do Hospício e em razão da infidelidade de D. Estela mudaram-se para uma casa próxima ao cortiço. Nesse breve relato podemos notar que D. Estela não se mostrava preocupada com um dos valores exigidos pelo ato matrimonial: a fidelidade. Tal menção pode ser notada no trecho do livro de AZEVEDO:
D. Estela era uma mulherzinha levada da breca: achava-se casada havia treze anos e durante esse tempo dera ao marido toda a sorte de desgostos. Ainda antes de terminar o segundo ano de matrimônio o Miranda pilhou-a em fragrante delito de adultério. No entanto o Miranda prezava acima de tudo sua posição social resolveu continuar casado, pois não queria ficar pobre já que sua mulher trouxera para o casamento uns oitenta contos em prédios e ações da dívida pública, de que se utilizava tanto quanto lhe permitia o regime total. (2005, p. 13)
Assim, em razão da infidelidade de D. Estela gerou-se uma instabilidade e insegurança muito grande por parte de Miranda que transcendeu da pessoa de Estela, passando a residir na filha deles, a Zulmira. Tal como mencionado anteriormente, a procriação dos filhos, gera a presunção de paternidade, porém o desrespeito ao valor fidelidade por parte de Estela foi fator que serviu para afastar ainda mais o casal e gerar desconfiança em Miranda a cerca da sua paternidade.
Da infidelidade de Estela podemos, ainda, mencionar a inobservância ao valor sustento, guarda e educação dos filhos, haja vista Miranda não nutria por Zulmira qualquer sentimento de afeto que o fizesse manter compromissos como um verdadeiro pai, o que pode ser comprovado na afirmação de AZEVEDO:
O nascimento de Zulmira veio agravar ainda mais a situação; a pobre criança, em vez de servir de elo aos dois infelizes, foi antes um novo isolador que se estabeleceu entre eles. Estela amava-a menos do que lhe pedia o instinto materno, por supô-la filha do marido, e este a detestava porque tinha convicção de não ser seu pai. (2005, p. 14)
Outros valores desobedecidos seriam a mútua assistência e o respeito e consideração mútuos. No que se refere à assistência mútua, é a “exigida de cada um dos cônjuges, não se trata apenas da relação material, implica ainda, mais fortemente, no carinho e atenção que os cônjuges têm obrigação de oferecer um ao outro”1. Na análise da obra, pudemos constar que Miranda e Estela odiavam-se, ambos sentiam um pelo outro desprezo que se transformou, em razão do tempo, em repugnância; a manutenção do casamento por parte de Miranda se dava em função do apreço que ele tinha por sua posição social e pelo dote que Estela trouxe consigo no ato do casamento.
Outro valor desrespeitado em relação ao casamento dos personagens em análise é a vida comum no domicílio conjugal, isso porque a vida em matrimônio exige a coabitação, que além de viver juntos os consortes, eles devem realizar o ato sexual. Tal posicionamento é reafirmando por DINZ, quando cita Antônio Chaves:
No dever de coabitação, distinguimos dois aspectos fundamentais: o imperativo de viverem juntos os consortes e o de prestarem, mutuamente, o débito conjugal, entendido este com o direito-dever do marido e de sua mulher de realizarem entre si o ato sexual. Um cônjuge tem o direito sobre o corpo do outro o normal atendimento dessas relações íntimas, não podendo, portanto, inexistir o exercício sexual, sob pena de restar inatendida essa necessidade fisiológica. (2009, p. 134)
4 NOTAS CONCLUSIVAS
Vale lembrar que o inadimplemento de um ou de todos os deveres, por um ou por ambos os cônjuges não afastam a validade, existência ou a eficácia do casamento, podendo, no entanto, buscar a dissolução matrimonial, de imediato, através do divórcio, possibilidade esta ofertada a partir da nova redação dada ao § 5º do Art. 226 pela Emenda Constitucional 66 de 13/07/2010, que extinguiu os prazos que eram obrigatórios para dar entrada no pedido, acabou com a possibilidade da separação judicial, além de ter permitido que a culpa deixe de ser discutida.
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AZEVEDO, Aluísio. O Cortiço. São Paulo: Avenida LTDA, 2005.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 2006.
Casamento: Direitos e Deveres. Disponível em http://www.consumidorbrasil.com.br/ consumidorbrasil/textos/familia/casamento.htm#Direitos. Acesso realizado em: 20 de outubro de 2010.[1]
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5 ed. rev. São Paulo: RT, 2009.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. v.5. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
BACHARELANDA NO CURSO DE DIREITO DA FACULDADE AGES- PARIPIRANGA-BA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FONSECA, Ana Carolina Rabelo Dantas. Os deveres referentes à sociedade conjugal tendo sob enfoque a relação de Miranda e Estela no livro "O Cortiço" de Aluísio de Azevedo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 mar 2012, 07:44. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/28230/os-deveres-referentes-a-sociedade-conjugal-tendo-sob-enfoque-a-relacao-de-miranda-e-estela-no-livro-quot-o-cortico-quot-de-aluisio-de-azevedo. Acesso em: 22 dez 2024.
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