Introdução
Por ser um tema atual, discute-se muito hoje em dia o papel das agências reguladoras. Alguns consideram que deve haver uma total independência em relação ao Poder Executivo, outros consideram que esta independência deve ser mitigada, pois as agências desfrutam de enorme autonomia e poder normativo. Atualmente, tem-se ouvido muitas críticas no sentido de que as agências reguladoras dispõem de uma independência bastante ampla em relação ao Poder Executivo e funcionam mais em benefício dos setores econômicos. Este trabalho tem como objetivo apresentar um síntese dos aspectos regentes às agências reguladoras e o princípio constitucional da livre iniciativa, bem como uma análise crítica do papel destas agências nas diretrizes econômicas e constitucionais do país.
Agências Reguladoras e o Princípio Constitucional da Livre Iniciativa:
Primeiramente antes de adentrar-se ao tema específico das agências reguladoras, é preciso contextualizar-se a respeito dos fundamentos constitucionais e econômicos previstos em nosso ordenamento. O fundamento da atividade econômica tem como pressupostos a valorização do trabalho e livre iniciativa; no capitalismo até pareceriam ideias antagônicas, o que hoje revela-se ao contrário.
Apesar da atividade econômica capitalista ser baseada na livre iniciativa deve-se buscar a justiça social, com a valorização do trabalho. Não se trata só de remuneração, mas também dignidade à pessoa através do trabalho.
Neste sentido, o Estado precisa ter postura racional de criação de postos de trabalho (com capacitação dos cidadãos e educação de qualidade, principalmente educação básica), e não apenas uma postura filantrópica e paternalista, além da necessidade de incentivo para os empreendedores.
O art. 170 da Constituição Federal estabelece os princípios da atividade econômica, preconizando no caput que:
“a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[...] IV – livre concorrência”
Dentre os princípios da ordem econômica relacionados ao tema das agências reguladoras podem ser exemplificados:
- Livre concorrência:
Extremamente importante que o Estado busque desenvolver defesa, São exemplos as Leis 8.884 e Lei de Propriedade Industrial, para evitar cartéis, oligopólios e monopólios.
- Defesa do Consumidor:
Pela Constituição de 1988 foram estabelecidas regras importantes, que antes eram deixadas para segundo plano. Com o lançamento do Código de Defesa do Consumidor foi trazida uma nova ótica, com uma perspectiva muito grande com relação à legislação. Sua importância se deve pois na atividade econômica são necessárias as políticas interventivas, para que a ordem econômica beneficie o consumidor.
- Defesa do Meio Ambiente:
É necessária a preservação do meio ambiente, pois não se pode ter desenvolvimento econômico sustentável sem zelo pelo meio ambiente. Há que se ter a exploração do meio ambiente, mas de forma sustentável.
Se não desenvolve algumas áreas baseadas em pura necessidade de proteger o meio, cria-se um problema de segurança nacional. Hoje o maior exemplo disso é a Amazônia, pois é onde tem a maior riqueza mineral (maiores minas de diamantes, jazidas de ouro, petróleo) e vegetal do mundo (biodiversidade). Para isso é que existe a desenvolvimento sustentável – porque não adianta impedir a exploração econômica, mas há que regulamentar de forma a explorar de forma sustentável. Neste sentido, o ambiente não pode ceder às mazelas econômicas, de modo algum.
- Redução das desigualdades regionais e sociais (art. 170):
O sul é muito mais desenvolvido que as regiões norte e nordeste. Como um país continental, é preciso desenvolver igualitariamente, caso contrário criam-se problemas de segurança nacional. Para isso há instrumentos tributários. Neste sentido, há que se criar infraestrutura em todo o país para obtenção de uma igualdade social.
A eliminação da desigualdade é utópica,mas o que se deve buscar é redução dessa desigualdade. A inserção das agências reguladoras na estrutura político-organizacional do Estado brasileiro foi consequência de um processo de abertura econômica e de mudança do perfil de intervenção estatal.
Com base nestes pressupostos, passa-se a uma análise histórica com relação à necessidade de criação das agências reguladoras.
A primeira mudança no plano político-econômico foi a extinção de determinadas restrições ao capital estrangeiro, com a Emenda Constitucional n.6/95, que suprimiu o art. 171 da Constituição, que trazia a conceituação de empresa brasileira de capital nacional e admitia a elas a outorga de proteções e benefícios.
Num segundo momento houve a flexibilização dos monopólios estatais, com as Emendas Constitucionais n°s 5/95, 8/95 e 9/95 que possibilitaram aos Estados a concessão da exploração de serviços públicos (gás canalizado, telecomunicações, energia elétrica, por ex.) que, até então, só podiam ser delegados a empresas sob controle estatal.
A terceira mudança econômica importante foi a que conduziu à privatização, com a edição da Lei n° 8031/90, substituída pela Lei nº 9491/97 que instituiu o Programa Nacional de Privatização, que veio a permitir a alienação, em leilão na bolsa de valores, do controle de entidades estatais, tanto as que exploram atividades econômicas como as que prestam serviços públicos e a concessão de serviços públicos a empresas privadas.
A importância e atualidade no cenário estatal fizeram com que estes novos entes reguladores fossem dotados de autonomia reforçada tanto gerencial, normativa, financeira e técnica, razão pela qual foram eles revestidos de natureza jurídica de autarquia de “regime especial”.
Por conseguinte, no Brasil, pelo citado mandamento constitucional, a ordem econômica deve se orientar e ter como objetivo a justiça social, a solidariedade e a dignidade da pessoa humana. A livre concorrência, nesse plano, apresenta-se como princípio constitucional, princípio geral da atividade econômica.
A Constituição Federal interferiu na exploração da atividade econômica impondo-lhe limites e objetivos e estabelecendo-lhe a obrigação de sempre ser exercida de maneira a preservar a dignidade da pessoa humana e promover a justiça social, sempre norteando-se pela observância dos princípios que lhe são próprios por força constitucional, notadamente o princípio da livre concorrência.
A livre concorrência decorre da manifestação da liberdade de iniciativa de atuação no mercado econômico. A livre concorrência é a garantia da livre iniciativa, de modo que se não houver livre concorrência, fatalmente não se terá também a liberdade de iniciativa, pois a inexistência de uma livre concorrência praticamente impede a liberdade de iniciativa.
Neste sentido, a regulação exercida pelas agências possui papel fundamental no cumprimento das políticas determinadas pelo Estado, sua função é técnica e de controle sobre os entes regulados.
O artigo 174 da Constituição Federal afirma que compete ao Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica exercer na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento.
Ainda, o artigo 170 da Carta Magna traça uma série de princípios da Ordem Econômica, cuja finalidade é a busca da justiça social. Com este conteúdo, os artigos 170 a192 delineiam o Estado Regulador.
A intervenção do Estado no domínio econômico se dá pela regulação e pelo direito antitruste ou concorrência, ou seja, o Estado percebeu que não poderia deixar o mercado totalmente livre, pois, seus efeitos poderiam ser danosos.
A intervenção estatal na economia teve por base, além da ocorrência de imperfeições de mercado, a suscetibilidade do sistema capitalista a crises cíclicas, que não podiam ser solucionadas pelo simples jogo das forças do mercado.
As análises e bases históricas da intervenção do Estado na economia coincidem com a origem do Direito Econômico, ademais este ramo do direito tem por objeto justamente a instrumentalização jurídica da atuação do Estado para a implementação de sua política econômica.
Originalmente as normas de proteção contra atos destrutivos da livre concorrência e a repressão à concorrência desleal eram de caráter privatístico.
Num segundo momento é que surgiram as normas de caráter publicístico destinadas à proteção do mercado e da concorrência no interesse público, dos consumidores, da proteção à livre iniciativa e dos valores democráticos da sociedade.
Em uma perspectiva normativo-constitucional, o direito de proteção à concorrência é entendido com legislação que dá concretude aos princípios jurídicos da livre iniciativa, da livre concorrência e da repressão ao abuso do poder econômico.
Dentre os tipos de regulação existem a regulação econômica que visa facilitar, limitar ou intensificar os mercados pela correção das imperfeições de entrada e lidar com preço, confiabilidade do serviço, entrada e saída do mercado, e investimentos na infra-estrutura.
A regulação social intervém na provisão dos bens públicos e na proteção do interesse público, define padrões para saúde, segurança e meio ambiente e os mecanismos de oferta desses bens.
Já a regulação administrativa diz respeito à intervenção nos procedimentos administrativos e burocráticos, e aos procedimentos administrativos adotados.
A regulação é uma intervenção ativa, que não se restringe ao controle, mas preocupa-se com a verdadeira criação da utilidade pública através da regulação. A intervenção do Estado no domínio econômico, por meio da regulação, para dar concretude à prestação de serviços públicos em atendimento aos ditames da justiça social, por óbvio se insere neste contexto o cidadão com todas as suas decorrências.
Conclusão
O sustentáculo econômico do sistema econômico brasileiro encontra-se regulado nos arts. 170 a 192 da Constituição Federal, que trazem os fundamentos da ordem econômica, informadores de toda atividade econômica.
O princípio constitucional da livre iniciativa encontra-se expressamente previsto no texto constitucional, mediante a regra estatuída no parágrafo único do art.170, que a todos assegura o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização dos órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.
A liberdade de iniciativa compreende tanto o direito de acesso ao mercado - início de atividade econômica, como o de cessação da atividade econômica. Os agentes econômicos devem ser livres para produzir e colocar seus produtos no mercado, ações que conseguem desenvolver graças ao princípio da livre concorrência, que a todos assegura a liberdade dos mercados; devem, ainda, ser livres para cessar suas atividades, em obediência ao princípio econômico do custo de oportunidade.
O conceito de regulação, embora controvertido quanto a sua extensão, é único em delimitar como sendo a intervenção estatal junto a setores privados, conjunta ou isoladamente, para impor normas de conduta que visem obriga-los a atingir o bem estar da comunidade.
A função regulatória é essencial para a eficiência do processo de desestatização, pois na maioria das vezes trata-se de processo complexo que são realizados mediante contratos de longo prazo.
Neste sentido, pode-se concluir que as agências reguladoras são necessárias para regular e fiscalizar falhas de mercado a fim de criar uma estabilidade regulatória no fluxo de investimentos privados.
Ainda, podemos afirmar que o papel do Governo é o de formular as políticas públicas setoriais e o das agências é de regular e fiscalizar os mercados.
Através das agências reguladoras podem ser ampliados mecanismos de controle social e prestação de contas. Durante os séculos XIX e XX o Estado se agigantou e, como consequência, não é mais possível que, além do cumprimento de sua finalidade, o bem-estar da coletividade, ele também seja empresário e agente econômico, devendo permanecer apenas como fiscalizador e agente normativo da atividade econômica.
É mediante a livre concorrência que se melhoram as condições de competitividade das empresas, forçando-as a um constante aprimoramento dos seus métodos tecnológicos, dos seus custos, enfim, da procura constante de criação de condições mais favoráveis ao consumidor.
O contrário da livre concorrência significa o monopólio e o oligopólio, situações que privilegiam determinado agente produtor da atividade econômica em detrimento dos demais produtores e dos consumidores.
Com os desdobramentos ocorridos a partir daqueles fatos históricos mencionados na introdução e no decorrer do trabalho, com todo o processo de globalização, com a privatização e desregulação, não há como o Estado prosseguir sem as agências reguladoras para que atinja o princípio constitucional da livre iniciativa.
Referências
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MENEZELLO, Maria D'Assunção Costa. Agências reguladoras e o direito brasileiro. São Paulo: Atlas, 2002.
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http://www.diritto.it/pdf/26841.pdf
Graduada em Direito, pós-graduanda em Gestão Pública.Atualmente é servidora pública na Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão no Ministério Público Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SCOTTINI, Debora Tiemi. Agências Reguladoras e o Princípio Constitucional da Livre Iniciativa Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 abr 2012, 08:50. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/28601/agencias-reguladoras-e-o-principio-constitucional-da-livre-iniciativa. Acesso em: 23 dez 2024.
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