Resumo: O artigo aborda como o Ministério Público em parceria com o CADE atua na defesa da ordem econômica, mais especificamente de acordo com a lei 12.529/11. Neste artigo será estudado a relação entre MPF e Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), coibindo os crimes contra a ordem econômica.
Palavras Chave: Ministério Público Federal. CADE. Ordem Econômica. Lei 12.529/11.
1. Introdução
1.1 Lei 8.884/94 e Lei 12.529/11 no que diz respeito ao MPF
No dia 30 de maio de 2012 entrou em vigor a lei 12.529 de 30 de novembro de 2011 que instituiu o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e dispôs sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica.
Esta nova lei criou o chamado “Super Cade”, lhe conferindo demais poderes não conferidos pela antiga Lei 8.884/94 revogada expressamente pela 12.529/11.
Contudo, o objeto do presente artigo se resume a atuação do Ministério Público Federal juntamente ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) na defesa da ordem econômica. Se não fosse a retirada do parágrafo único do artigo 12 da lei 8.884/94, a parte que trata do Ministério Público Federal perante o CADE ficaria quase que inalterada, porém o referido parágrafo foi retirado da atual legislação.
Importante transcrever como era e como ficou:
Art. 12 da lei 8.884/94: O Procurador-Geral da República, ouvido o Conselho Superior, designará membro do Ministério Público Federal para, nesta qualidade, oficiar nos processos sujeitos à apreciação do CADE.
Parágrafo único: O CADE poderá requerer ao Ministério Público Federal que promova a execução de seus julgados ou do compromisso de cessação, bem como a adoção de medidas judiciais, no exercício da atribuição estabelecida pela alínea b do inciso XIV do art. 6º da Lei Complementar n. 75, de 26 de maio de 1993.
Com a lei 12.529/11, assim ficou a redação conferida ao MPF perante o CADE:
Art. 20: O Procurador-Geral da República, ouvido o Conselho Superior, designará membro do Ministério Público Federal para, nesta qualidade, emitir parecer, nos processos administrativos para imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica, de ofício ou a requerimento do Conselheiro-Relator.
Percebe-se que com relação ao MPF quase nada mudou, vez que o sentido das palavras “oficiar” e “emitir parecer” é o mesmo, pois objetivam a mesma coisa, qual seja a participação do MPF no processo. A retirada do parágrafo único não significou muita coisa, uma vez que dispõe o art. 9º, XVIII da nova lei que, compete ao plenário do tribunal administrativo de defesa econômica do CADE “requisitar informações de quaisquer pessoas, órgãos, autoridades e entidades públicas ou privadas, respeitando e mantendo o sigilo legal quando for o caso, bem como determinar as diligências que se fizerem necessárias ao exercício das suas funções”.
Importante destacar que as palavras requisitar e principalmente determinar devem aqui ser vistas com um olhar crítico, pois o MP possui independência e autonomia funcional, não estando adstrito a nenhuma requisição e muito menos determinação de órgãos administrativos como o CADE.
2. A legitimidade do Ministério Público na defesa da ordem econômica
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 prescreve em seu artigo 127 que incumbe ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, e sem dúvida a ordem econômica é de suma importância para a sociedade, sendo interesse social. Tal entendimento é também o da Lei 12.529/11 que estabelece no parágrafo único do art. 1º que a coletividade é a titular dos bens jurídicos protegidos por esta lei.
“A coletividade tal como colocada no art. 1° daquele diploma legal denota a existência de um interesse geral que transcende os limites das estruturas do mercado, comum na tutela antitruste, abrangendo agentes econômicos de diferentes portes: consumidores, trabalhadores, população do entorno dos estabelecimentos empresariais e toda a sociedade” (FREIRE, Marusa Vasconcelos. A atuação do MPF junto ao CADE, in Revista de Direito Econômico, V. 24, Brasília, 1996, p. 118). Prescreve ainda a CF/88 que compete ao MP “exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas” (art. 129, IX).
A Lei Complementar 75/93 preceitua que o Ministério Público da União é a instituição incumbida da defesa da ordem jurídica, dos interesses sociais e dos interesses individuais indisponíveis (art. 1°) e possui dentre outras funções institucionais a de zelar pela observância dos princípios constitucionais relativos à ordem econômica (art. 5°, II, c), competindo-lhe, para isso, promover ações necessárias ao exercício das suas funções institucionais, especialmente quanto à ordem econômica e financeira (art. 6°, XIV, b).
Diante do exposto, fica cabalmente demonstrada a legitimidade do Ministério Público para intervir nos procedimentos sujeitos à apreciação do CADE, pois neles funciona como defensor da coletividade, titular dos bens jurídicos protegidos pela lei 12.529/11, bem como custos legis, por expressa previsão de aplicação subsidiária do Código de Processo Civil (art. 115 da lei 12.529/11).
3. A atuação do MPF junto ao CADE nos ditames da Lei 12.529/11
Como já dito no item 1.1, a lei 12.529/11 disciplinou a atuação do MPF no artigo 20, disciplinando que terá membro designado pelo Procurador-Geral da República depois de ouvido o Conselho Superior do órgão ministerial, para emitir parecer, de ofício ou a requerimento do Conselheiro-Relator do CADE, nos processos administrativos para imposição de sanções administrativas por infrações a ordem econômica.
Portanto, tem-se como novidade trazida pela legislação acima mencionada que o MPF pode, agora, emitir parecer, tanto de ofício como a requerimento do Conselheiro-Relator do CADE, o que não era disciplinado pela lei 8.884/94, nessa antiga lei não estava previsto a atuação de ofício do membro do MPF.
A atuação do órgão ministerial nos procedimentos sujeitos a apreciação do CADE é de importância ímpar, seja para efetivar as decisões do CADE que têm força de título executivo extrajudicial conforme preceitua o art. 93 da lei 12.529/11, dando maior eficácia e legitimidade às decisões do CADE, e principalmente para fiscalizar a aplicação da Constituição.
Importante é o ensinamento do Procurador da República Waldir Alves:
“Enfim, a atuação do Ministério Público Federal deve dar-se para fiscalizar a aplicação da Constituição, no que se refere ao seu Título VII (Da ordem econômica e financeira), o respeito e a defesa do consumidor, cuja garantia foi elevada à categoria fundamental (...) Tudo para dar maior eficácia às decisões do CADE, elevando ainda mais o prestígio e a imprescindibilidade da atuação do Órgão de Proteção da Ordem Econômica” (ALVES, Waldir. Ministério Público e a Ordem Social Justa. Atuação do Ministério Público Federal junto ao CADE e nos processos cíveis e penais de infração contra a ordem econômica e as relações de consumo, p. 292).
Dispõe o art. 118 da Lei 12.529/11 que “nos processos judiciais em que se discuta a aplicação desta Lei, o CADE deverá ser intimado para, querendo, intervir no feito na qualidade de assistente”. Infere-se do citado artigo que o Ministério Público, desde que munidos de documentos comprobatórios, seja por requerimento de interessado, seja de ofício, poderá instaurar ação civil pública ou ação judicial com a finalidade de recompor os danos morais e patrimoniais (art. 1º, V da Lei 7.347/85), bem como, para proteger a ordem econômica, os consumidores, os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos (art. 6º, XV, LC 75/93).
Assim sendo, ao ajuizar qualquer ação judicial que tenha por objeto a repressão ou prevenção de infrações contra a ordem econômica, seja ação civil pública ou não, o CADE deve ser intimado e funcionará como assistente técnico do MPF, e suas opiniões devem ser observadas pelo juiz, pois é o órgão que possui conhecimentos técnicos específicos sobre o assunto.
O artigo 15, III da legislação supracitada, prescreve que compete à Procuradoria Federal (que não se confunde com Ministério Público) que atua junto ao CADE promover a execução judicial das decisões e julgados deste órgão. Por este motivo é que entende Waldir Alves que o MPF atua subsidiariamente à Procuradoria do CADE, ou seja, “promoverá apenas no caso de recusa ou omissão desta e para a defesa da ordem econômica, do consumidor e do patrimônio público, a execução de seus julgados ou do compromisso de cessação” (ALVES, Waldir. Ministério Público e a Ordem Social Justa. Atuação do Ministério Público Federal junto ao CADE e nos processos cíveis e penais de infração contra a ordem econômica e as relações de consumo, p. 300). Entende ainda, o doutrinador, que o parecer do MP melhor se daria após a apresentação do parecer da Procuradoria do CADE, antes da sessão de julgamento.
Importante ainda destacar a importância no que diz respeito a ação do Ministério Público Federal na fiscalização da atuação dos membros do CADE, como nos casos de perda de mandato, devendo assim o MPF ser acionado em virtude de sua condição de garantidor da legalidade.
4. Conclusão
Após demonstrado a legitimidade do Ministério Público Federal para atuar junto ao CADE, pela função de defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis, zelar pela observância dos princípios relativos a ordem econômica, promovendo assim ações necessárias ao exercício das suas funções institucionais, especialmente quanto à ordem econômica e financeira.
Levando em consideração que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça, pode haver interferência políticas em seu ofício, o que não ocorre com o Ministério Público, vez que não está ligada a nenhum dos três poderes, não sofrendo influência de nenhuma forma, pois possui independência e autonomia funcional, prerrogativas estas, resguardas pela Constituição da República de 1988.
Além disso, a autuação do MP é necessária para garantir o cumprimento da Constituição e a proteção da coletividade, haja vista que a ordem econômica afeta a sociedade como um todo. A atuação do órgão ministerial é de suma importância, pois além das razões expostas, evita a nulidade dos procedimentos, pois este órgão é o garantidor da ordem jurídica, retirando assim do alcance dos infratores essa alegação na busca de se safarem das sanções cominadas à ilicitude de seu ato.
Contudo, sabe-se que a atuação do MP na maioria dos casos não é suficiente para dar efetividade às decisões. Sendo assim, é necessária uma maior correlação, uma sinergia, entre MPF e CADE, pois só assim teremos um salto quantitativo e qualitativo nos resultados de aplicação da Lei 12.529/11.
Referências:
ALVES, Waldir. Atuação do Ministério Público Federal junto ao CADE e nos processos cíveis e penais de infração contra a ordem econômica e as relações de consumo, in JÚNIOR, Flávio Paixão de Moura (org.), ROCHA, João Carlos de Carvalho (org.), DOBROWOLSKI, Samantha Chantal (org.), SOUZA, Zani Tobias: Ministério Público e a Ordem Social Justa. Dez anos da Lei Complementar n.75/93. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 283 -301.
BRASIL, Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para assuntos jurídicos. Lei 12.529/2011. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm > Acesso em 07/06/2012.
BRASIL, Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para assuntos jurídicos. Lei Complementar 75/93. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp75.htm > Acesso em 07/06/2012.
BRASIL, Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para assuntos jurídicos. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm > Acesso em 07/06/2012.
FONSECA, Antônio. O papel do Ministério Público na política da concorrência, in Revista de Direito Econômico, V. 25, Brasília, jan/ jul 1997. Disponível em http://www.cade.gov.br/Default.aspx?43e324ec33d152e87fc3 > Acesso em 07/06/12.
FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Lei de Proteção da Concorrência: Comentários à Legislação Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
FREIRE, Marusa Vasconcelos. A atuação do MPF junto ao CADE, in Revista de Direito Econômico, V. 24, Brasília, 1996, p. 117. Disponível em http://www.cade.gov.br/Default.aspx?43e324ec33d152e87fc3 > Acesso em 07/06/12.
Graduando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BELIZARIO, Deryck Miranda. O Ministério Público e o CADE em defesa da Ordem Econômica na Lei 12.529/11 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 jun 2012, 08:28. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/29496/o-ministerio-publico-e-o-cade-em-defesa-da-ordem-economica-na-lei-12-529-11. Acesso em: 23 dez 2024.
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