Neste trabalho busca-se expor a respeito dos critérios lançados pelo legislador no art. 4º do CTN, para determinação da natureza jurídica específica do tributo, que se revelam insuficientes na classificação exposta pela teoria pentapartida ou quinquipartida dos tributos.
A previsão legal de que a natureza jurídica específica do tributo, seja definida tão somente a partir da análise do fato gerador, não abarca as contribuições especiais e empréstimos compulsórios segundo a teoria pentapartida adotada pelo Supremo Tribunal Federal.
Com o advento da CF/88, a destinação legal do produto da arrecadação passa a assumir relevância, na definição das espécies de tributos.
1. Dos critérios estabelecidos no art. 4º do CTN
O Código Tributário Nacional adotou a posição da teoria tripartite, enquadrando os tributos de acordo com a tipologia do art. 5º, em impostos, taxas e contribuição de melhoria, como reflexo do entendimento predominante e seguido pelo legislador à época.
De outro lado, as principais correntes doutrinárias classificam os tributos em: a) dualista, bipartida ou bipartite (impostos e taxas); b) tripartida, tricotômica ou tripartite (impostos, taxas e contribuições de melhoria); c) quadripartida, tetrapartida ou tetrapartite (impostos, taxas, contribuições e empréstimos compulsórios) e d) pentapartida ou quinquipartida (impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições especiais)[1].
É que, a problemática da classificação dos tributos envolve diretamente a quantidade de variáveis utilizadas no estudo da classificação. Alguns autores adotam uma única variável como elemento de classificação, enquanto outros optam por utilizar mais de uma variável[2]. Nesse passo, compreende-se a numerosa variação doutrinária, quanto à classificação dos tributos.
De qualquer forma, o assunto encontra previsão legal no art. 4º do CTN, que em consonância com a teoria tripartida, fixou como critério tão somente o fato gerador: “Art 4º. A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la: I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei; II - a destinação legal do produto da sua arrecadação”.
Ocorre que, a apreciação unicamente do fato gerador, não é suficiente para definição dos diferentes regimes jurídicos a que cada espécie de tributo está sujeita, a partir da Constituição Federal de 1988, que além das espécies contidas no art. 5º do CTN traz as contribuições especiais e empréstimos compulsórios.
Fica evidente a superação do critério legal, já que os demais elementos da relação jurídica tributária também possuem relevância na identificação das espécies tributárias, como a base de cálculo e a destinação legal do produto da arrecadação, com o advento da CF/88.
Acerca das razões do legislador para excluir a destinação legal, como critério de classificação, ensina Leandro Paulsen:
Por certo que já houve tempo em que os próprios impostos eram identificados pela destinação do seu produto, o que se vê do Decreto-Lei nº 1.804/39, e que o CTN procurou limpar a matéria do que os tributaristas consideravam, na época, questões de Direito Financeiro. Assim, destacou que a espécie tributária seria definida pela análise do fato gerador (se não-vinculado à atividade estatal, imposto; se vinculado a serviço ou exercício do poder de polícia, taxa; se vinculado à obra pública, contribuição de melhoria), vendando a consideração da destinação legal[3].
A pretensão estabelecida no critério legal de afastar a referência sobre a destinação do produto da arrecadação, contudo, não permite a adequada delimitação do regime jurídico das prestações pecuniárias atinentes aos empréstimos compulsórios e contribuições especiais, na tipologia do art. 5º do CTN.
Nas situações em que a destinação do tributo decorre de previsão na Constituição Federal, como aspecto do regime jurídico da figura tributária, apresentando-se como condição ou aspecto do exercício legítimo da competência tributária, não é possível afastar tal questão como critério de distinção das outras figuras[4].
Diante da competência tributária constitucional atrelada à determinada destinação do produto, tem-se como não recepcionada pela Constituição Federal de 1988, a vedação do art. 4º, inc. II, do CTN em relação ao critério da destinação na análise da natureza jurídica. Se a norma constitucional incluiu, a destinação como elemento relevante, na definição do regime jurídico específico e como critério distintivo das demais espécies tributárias, não merecem aplicação os critérios legais previstos no Código Tributário Nacional, no que tange aos empréstimos compulsórios e contribuições especiais.
2. Da teoria pentapartida
A classificação dos tributos permite estabelecer o regime jurídico aplicável a cada tributo, seja quanto às normas gerais de direito tributário, também, em relação às normas específicas que devem ser atendidas para instituição e cobrança de cada espécie tributária.
O art. 5º, do CTN e o art. 145, I, II, e III da Constituição Federal dispõem sobre as espécies tributárias de competência concorrente da União, dos Estados e Distrito Federal e dos Municípios, de modo não taxativo, assim, indicando os tributos gerais e os respectivos entes tributantes. No tocante aos artigos 148 e 149 da CF/88 observa-se a competência exclusiva da União, para a instituição de empréstimos compulsórios e contribuições especiais.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n. 146.733-9/SP (Pleno), em voto condutor proferido pelo Ministro Moreira Alves, adotou a classificação pentapartida:
EMENTA: (...) De fato, a par das três modalidades de tributos (os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria), a que se refere o art. 145, para declarar que são competentes para instituí-los a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, os arts. 148 e 149 aludem a duas outras modalidades tributárias, para cuja instituição só a União é competente: o empréstimo compulsório e as contribuições sociais, inclusive as de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas.
Destarte, a partir das normas regulamentadoras contidas na CF/88 é inegável que o empréstimo compulsório e as contribuições especiais constituem-se em espécies tributárias autônomas[5], não sendo possível promover enquadramento diverso, consoante o ultrapassado critério legal do Código Tributário Nacional.
Pela teoria pentapartida, segundo Leandro Paulsen tem-se a classificação dos tributos, com suas espécies e subespécies, da seguinte maneira[6]:
“a) impostos
a.1. ordinários (art. 145, I, 153, 155 e 156)
a.2. residuais (art. 154, I)
a.3. extraordinários de guerra (art.154, II)
b) taxas
b.1. de poder de polícia (art. 145, II, primeira parte)
b.2. de serviços públicos específicos e divisíveis (art. 145, II, segunda parte)
c) contribuições de melhoria (art. 145, III)
d) contribuições especiais
d.1. sociais
d.1.1. gerais (art. 149, primeira parte)
d.1.2. de seguridade social
d.1.2.1. ordinárias (art. 149, primeira parte c/c art. 195, I, II, III)
d.1.2.2. residuais (art. 149, primeira parte c;c art. 195, §4 º)
d.1.2.3. de previdência do funcionalismo público estadual, distrital e municipal (art. 149, § 1º/EC 41/03)
d.2. de intervenção no domínio econômico (art. 149, segundo parte)
d.3. do interesse das categorias profissionais ou econômicas (art. 149, terceira parte)
d.4 de iluminação pública municipal e distrital (art. 149-A/EC 4 nº 39/02)
e) empréstimos compulsórios
e.1. extraordinários de calamidade ou guerra (art. 148, I)
e.2. de investimento (art. 148, II)”
Nessa perspectiva, entende-se que a teoria pentapartida é a que melhor aborda a classificação dos tributos, mediante critérios adequados na identificação das características inerentes a cada espécie tributária, assim, demonstrando a relevância da destinação do produto da arrecadação, na classificação dos tributos.
3. Da classificação das contribuições especiais e empréstimos compulsórios
A constituição Federal de 1988 atribuiu o caráter tributário às contribuições especiais e empréstimos compulsórios, mediante disciplinamento no capítulo do Sistema Tributário Nacional, ainda, conferiu distinção das demais espécies tributárias pelo critério da finalidade. Diante do caráter tributário assumido no texto constitucional, a destinação legal do produto da arrecadação passou a definir a natureza jurídica específica do tributo e a representar critério de validação constitucional[7], em relação às contribuições especiais e empréstimos compulsórios.
Sobre os empréstimos compulsórios, o Código Tributário Nacional evitou o problema da classificação, não os incluindo no rol dos tributos do art. 5 º do CTN, no entanto, inseriu a figura no art. 15, na seção das “disposições especiais”, do capítulo que trata das “limitações da competência tributária”, situação que importava no implícito reconhecimento da natureza tributária[8].
Com efeito, entre as particularidades dos empréstimos compulsórios, que não permitem o enquadramento ao regime jurídico dos impostos constata-se a ausência de fato gerador expresso na Constituição Federal e a obrigação da União de restituir o valor cobrado. Tais situações impedem amoldar os empréstimos compulsórios nas espécies do art. 5º, do CTN.
Da mesma forma, devido às características próprias das contribuições especiais, tais como, fatos geradores, base de cálculo e sujeito passivo, não se vislumbra adequação ao rol do art. 5º, do CTN.
Sobre o tema é a lição de Luciano Amaro[9]:
Ademais, tendo em vista que os fatos geradores das contribuições sociais não são atuações do Estado (cf. art. 195), essas contribuições são irredutíveis a categoria de taxa, se aceitarmos o conceito (proclamado, aliás, no art. 77 do CTN) de que o fato gerador da taxa é configurado por uma atividade do Estado.
Além disso, o tratamento jurídico-constitucional diferenciado que é dado a essas e às demais contribuições (destinação específica, a par de uma disciplina constitucional peculiar, no que respeita aos seus fatos geradores, bases de cálculo, contribuintes) também dificulta a afirmação singela de que essas contribuições são impostos, ou taxas, ou ora são uma coisa, ora outra.
Com isso, demonstra-se a insuficiência do critério legal do fato gerador previsto no art. 4º, do CTN e da teoria tripartite dos tributos a teor do art. 5º, do CTN, para fins de classificação dos empréstimos compulsórios e das contribuições especiais, que devem ser analisados com base nos critérios expostos no texto constitucional.
4. Considerações finais
A classificação da escola tripartite, que norteou o legislador do Código Tributário Nacional, em 1966, não se encontra em conformidade com a Constituição Federal de 1988, estando, portanto, desatualizada no tocante aos critérios adotados.
É insuficiente o critério legal do CTN, que utiliza tão somente o fato gerador da respectiva obrigação, e, expressamente, considera irrelevante a destinação legal do produto da arrecadação, na determinação da espécie do tributo.
O art. 4º, inciso II, do CTN trata-se de norma revogada pela Constituição Federal de 1988, que inseriu e disciplinou os empréstimos compulsórios e as contribuições especiais no capítulo destinado Sistema Tributário Nacional, por meio dos artigos. 148, 149 e 149-A, não prevalecendo o entendimento que rejeita a destinação legal para a identificação das espécies tributárias.
A classificação dos tributos exposta pela teoria pentapartida, em impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições especiais, encontra-se validada pelo Supremo Tribunal Federal, representando a classificação dos tributos em espécies, em conformidade com as normas constitucionais.
Enfim, a teoria pentapartida ao utilizar o critério da destinação legal do produto da arrecadação amplia o rol das espécies tributárias prevista no Código Tributário Nacional, de modo integralmente compatível com as determinações da CF/88, em vantajosa superação ao entendimento da clássica escola tricotômica.
5. Referências Bibliográficas
ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. São Paulo: Método, 2007.
ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO, Vicente. Manual de Direito Tributário. 5ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007.
AMARO, Luciano. Direito Tributário brasileiro. 13ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2007.
HARADA, Hiyoshi. Direito Financeiro. 16ª ed., 2. reimpr.São Paulo: Atlas, 2007.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direto Tributário. 26ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2005..
PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 9 ed. rev. atual.Porto Alegre: Livraria do Advogado: Esmafe, 2007.
PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.
[1] ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado, p. 40
[2] AMARO, Luciano. Direito Tributário brasileiro. pág. 67.
[3] PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, pág. 35.
[4] AMARO, Luciano. Obra citada. pág. 77.
[5] PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, pág. 37/8.
[6] PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, pág. 38
[7] PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 9 ed. rev. atual.Porto Alegre: Livraria do Advogado: Esmafe, 2007, pág. 613.
[8] AMARO, Luciano. Obra citada. pág. 60.
[9] AMARO, Luciano. Obra citada. pág. 62
Procurador da Fazenda Nacional.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: IANCZKOVSKI, Elvis. Os critérios legais do artigo 4º do Código Tributário Nacional e a classificação pentapartida dos tributos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 jun 2012, 08:53. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/29523/os-criterios-legais-do-artigo-4o-do-codigo-tributario-nacional-e-a-classificacao-pentapartida-dos-tributos. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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