O Sistema de Registro de Preço - SRP - tem cabimento, principalmente, para permitir que a Administração realize um certame público antes de suas necessidades, evitando contratações emergenciais diretas ou fracionadas cartas convites, bem como para impedir que a Administração celebre um contrato cujas quantidades, por imprevisão natural, possam não ser necessárias. Portanto, é um mecanismo que evita desperdício de recurso (em defesa da vantajosidade) e que evita contratações sem licitação ou por modalidades fracionadas (em defesa da isonomia).
O artigo 1º, parágrafo único, inciso III, do Decreto nº 3.931/2001, define o Órgão Gerenciador do SRP como a entidade da Administração Pública responsável pela condução do conjunto de procedimentos do certame que antecede o registro de preços e pelo gerenciamento da Ata de Registro de Preços dele decorrente. Adiante, o inciso IV institui a figura do Órgão Participante, aquele que interage nos procedimentos iniciais do SRP e integra a Ata de Registro de Preços.
O que ainda causa certa estranheza neste sistema licitatório é o fato de que outros entes, entidades ou órgãos da Administração Pública Direta e Indireta podem vir a aderir ao resultado do procedimento licitatório que gerou o respectivo registro dos preços o que é vulgarmente conhecido como “pegar carona”. Trata-se de um Participante Extraordinário que poderá interagir na contratação depois de concluído o processo, sem que tenha participado do certame licitatório.
A previsão regulamentar desse instituto visa à extensão da proposta mais vantajosa a todos os que necessitam de objetos semelhantes, em quantidade igual ou menor do que o máximo registrado.
Assim, o “carona” no processo de licitação é o órgão que, antes de proceder à licitação ou à contratação direta sem licitação, verifica se já existe, em outro órgão público, da mesma esfera ou de outra, o produto desejado em condições de vantagem comprovada de oferta sobre o mercado. Permite-se ao “carona”, diante da prévia licitação do objeto semelhante executada por outros órgãos, com acatamento das mesmas regras que aplicariam em seu procedimento, reduzir os custos operacionais licitatórios.
Para tanto, o aderente deverá obter a aquiescência do licitador (órgão gerenciador da ata) e da empresa fornecedora (vencedora do certame e signatária da Ata de SRP), por meio de pedido de adesão à respectiva Ata de Registro de Preços e de solicitação de aquiescência do fornecedor.
Em outras palavras, esse sistema permite que um organismo licite e órgãos públicos diversos venham a contratar, com fulcro em tal licitação, desde que cumpridos certos preceitos normativos e de ordem prática.
Tal possibilidade de adesão consta da legislação invocada, consoante se observa do extrato regulamentar abaixo:
Art. 8º A Ata de Registro de Preços, durante sua vigência, poderá ser utilizada por qualquer órgão ou entidade da Administração que não tenha participado do certame licitatório, mediante prévia consulta ao órgão gerenciador, desde que devidamente comprovada a vantagem.
§ 1º Os órgãos e entidades que não participaram do registro de preços, quando desejarem fazer uso da Ata de Registro de Preços, deverão manifestar seu interesse junto ao órgão gerenciador da Ata, para que este indique os possíveis fornecedores e respectivos preços a serem praticados, obedecida a ordem de classificação.
§ 2º Caberá ao fornecedor beneficiário da Ata de Registro de Preços, observadas as condições nela estabelecidas, optar pela aceitação ou não do fornecimento, independentemente dos quantitativos registrados em Ata, desde que este fornecimento não prejudique as obrigações anteriormente assumidas.
§ 3º As aquisições ou contratações adicionais a que se refere este artigo não poderão exceder, por órgão ou entidade, a cem por cento dos quantitativos registrados na Ata de Registro de Preços.
(Decreto Federal n.º 3.931/01, alterado pelo Decreto nº 4.342/2002).
Repisem-se, por relevantes, os requisitos jurídico-formais exigíveis para a contratação mediante adesão à Ata de Registro de Preços:
a) a devida comprovação da vantagem para a Administração Pública;
b) a manifestação de interesse ao órgão gerenciador da Ata, para indicação por este dos possíveis fornecedores e respectivos preços a serem praticados, obedecida a ordem de classificação;
c) a proposta aceita pelo fornecedor beneficiário da Ata de Registro de Preços, observadas as condições nela estabelecidas; e
d) a observância do limite máximo de até cem por cento dos quantitativos registrados na Ata de Registro de Preços, consoante o limite máximo estabelecido no artigo 8º, § 3º, do Decreto Federal n.º 3.931/2001, alterado pelo Decreto n.º 4.342/2002.
Destaque que a vantagem para a Administração aderente deve ser confirmada por pesquisa e pode até mesmo ser considerada, quando em igualdade de condições entre o preço registrado e o de mercado, pelo custo indireto da licitação.
Acresçam-se às exigências normativas, as decorrentes do órgão de cúpula da Advocacia Geral da União – AGU, consoante as ORIENTAÇÕES NORMATIVAS abaixo transcritas, que são de atendimento compulsório aos órgãos e entidades da Administração Pública Federal:
É vedada aos órgãos públicos federais a adesão à ata de registro de preços, quando a licitação tiver sido realizada pela administração pública estadual, municipal ou do distrito federal.
Orientação Normativa AGU n.º 21, de 01 abril de 2009
O prazo de validade da ata de registro de preços é de no máximo um ano, nos termos do art. 15, § 3º, inc.III, da lei n.º 8.666, de 1993, razão porque eventual prorrogação da sua vigência, com fundamento no § 2º do art. 4º do decreto n.º 3.931, de 2001, somente será admitida até o referido limite, e desde que devidamente justificada, mediante autorização da autoridade superior e que a proposta continue se mostrando mais vantajosa.
Orientação Normativa AGU n.º 19, de 01 abril de 2009
Portanto, diante da obrigatoriedade de cumprimento das orientações emanadas do Advogado-Geral da União na esfera federal, o órgão federal aderente, ou o popularmente chamado “carona”, somente pode aderir à ata de outro órgão público que seja da esfera federal.
Cumpre esclarecer que, em se tratando de procedimento de contratação por adesão à Ata de Registro de Preços, também a adesão segue os princípios fixados pelo Sistema de Registro de Preços – SRP, que visa à contratação de bens ou serviços conforme a demanda da Administração que gerencia, participa ou adere à Ata. Ou seja, trata-se, em ambos os casos, de um sistema sui generis de contratação: que não obriga o “Órgão Gerenciador ou Participante”, nem o “Órgão Aderente” a adquirir o bem ou serviço contratado com a empresa signatária (“fornecedor beneficiário”) da Ata de Registro de Preços.
Destaca-se também que, conforme estabelecido no art. 7º do Regulamento do SRP, há a possibilidade dos organismos públicos em questão, ao invés de contratarem com o fornecedor da Ata, realizarem licitação específica para a aquisição pretendida, desde que assegurada a preferência de fornecimento, em igualdade de condições, ao fornecedor beneficiário do registro. Vale lembrar, mais uma vez, que todos os fornecedores signatários da Ata de Registro de Preço estão obrigados a cumprir todas as cláusulas daquele instrumento, especialmente aquelas quanto a seus deveres contratuais.
A despeito das inegáveis vantagens da adesão à Ata de Registro de Preços de outros órgãos públicos, há doutrinadores que defendem estar-se diante de hipótese de violação ao princípio da obrigatoriedade de realização de um procedimento licitatório para cada contrato. Ademais, argumentam que haveria violação ao direito de isonomia de outros fornecedores/executores interessados, os quais não participaram da licitação do outro órgão público.
Entretanto, o que se observa é que na adesão não se está abrindo mão de um processo licitatório, uma vez que a melhor proposta para a Administração foi escolhida diante de um processo público de licitação e que seguiu todas as normas legais e regulamentares pertinentes. Por outro lado, diversas medidas legais e regulamentares, tais como a temporariedade da vigência da Ata de Registro de Preços e sua publicidade, além da possibilidade de impugnação de seus termos (artigos 16 da Lei nº 8666/93), foram editadas justamente para assegurar a realização do princípio constitucional da isonomia.
Dessa forma, a validade do Sistema de Registro de Preços e do sistema de “carona” reside, precipuamente, na desnecessidade de repetição de um processo oneroso, lento e desgastante quando já alcançada a proposta mais vantajosa.
Por sua vez, o aprimoramento do Sistema de Registro de Preços e a intensificação do uso do “carona” levarão inevitavelmente ao expurgo dos preços abusivos, pois a publicidade de ofertas disponíveis será cada vez mais ampliada. De fato, quanto mais Atas forem publicadas permitindo “carona”, mais preços serão sujeitos à comparação.
A transparência que o Sistema de Registro de Preços alcança é corroborada quando se observa que o Tribunal de Contas da União, na tarefa de assegurar uma razoável uniformidade de entendimentos da esfera de controle, tem recomendado que os preços registrados sejam parâmetros para outras licitações, em consonância com o disposto no art. 43, inc. IV, da Lei nº. 8.666/93.[1]
É necessário evidenciar, ademais, que o sistema de licitação não é um fim em si mesmo e que muitas vezes não consegue tornar o processo de seleção imune a irregularidades. Por outro lado, constitui-se em um procedimento extremamente oneroso, com possível custo de desenvolvimento superior à vantagem conquistada.
Nesse sentido, deve-se difundir a utilização do Sistema de Registro de Preços e nesse sistema o desenvolvimento do “carona”, com a consciência de que nenhum sistema está imune a desvios de finalidade. Essa possibilidade, no entanto, não pode impedir o desenvolvimento de processos de modernização.
[1] Nesse sentido: TCU – Primeira Câmara. Tomada de Contas. Acórdão 27/2002. TCU – Plenário. Auditoria. Acórdão 67/2000.
Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Brasília - Unb. Procuradora Federal da Advocacia Federal da União - AGU. Ocupa atualmente o cargo de Chefe da Divisão de Consultoria, Licitações e Contratos da Procuradoria Federal da Agência Espacial Brasileira - AEB.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COELHO, Fabiana de Oliveira. A possibilidade de adesão ao resultado do registro de preço na Administração Pública Federal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 jun 2012, 07:58. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/29572/a-possibilidade-de-adesao-ao-resultado-do-registro-de-preco-na-administracao-publica-federal. Acesso em: 23 dez 2024.
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