RESUMO: O direito de família no Brasil possui um instituto capaz de mudar a realidade, o destino de muitas crianças quando ocorre o divórcio entre os pais, qual seja a guarda compartilhada. Este instituto tem em bojo a capacidade de manter a integridade física, psíquica e social da criança e do adolescente, quando o vinculo matrimonial se desfaz, pois tem como uma de suas prerrogativas a manutenção da boa relação entre os pais, objetivando a preservação do bem estar dos filhos.
Palavras-chave: guarda; guarda compartilhada; preservação do bem estar dos filhos.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem o objetivo de mostrar o instituto da guarda existente no ordenamento jurídico brasileiro, mas com especial foco na guarda compartilhada, que se mostra uma das melhores alternativas para o bom desenvolvimento dos filhos de país divorciados. O legislador com a edição Lei nº 11.698 de 13 de Junho de 2008, vem para efetivar um instituto já existente e determinar que ele é juridicamente permitido, pois o Código Civil Brasileiro, já permitia ao casal divorciado estabelecer de comum acordo a guarda do menor,ou seja, já existia na prática tal instituto, entre pais que viam na divisão igualitária de direitos e deveres a ajuda necessária para redução dos efeitos do divórcio na vida de seus filhos. Como não havia proibição legal, os juízes determinavam a guarda compartilhada.
2 CONCEITO DE GUARDA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Não é muito simples conceituar o instituto da guarda, para Ana Maria Milano,citada por Leonardo Ribeiro: “no sentido jurídico, guarda é o ato ou efeito de guardar e resguardar o filho enquanto menor, de manter vigilância no exercício de sua custodia e de representá-lo quando impúbere ou , se púbere, de assisti-lo, agir conjuntamente com ele em situações ocorrentes”(Ribeiro,p.1,2007).
Ele cita ainda, Silvana Maria Carbonera que define guarda como:
Um instituto jurídico através do qual se atribui a uma pessoa, o guardião, um complexo de direitos e deveres a serem exercidos com o objetivo de proteger e prover as necessidades de desenvolvimento de outra que dele necessite, colocada sob sua responsabilidade em virtude de lei ou decisão judicial(Ribeiro,p.1,2007).
A Constituição de 1988 assegurou a criança e ao adolescente, como dever de família, da sociedade e do Estado, o direito a convivência comunitária e familiar. Daí ter procurado o Estatuto da aprimorar o instituto da guarda, buscando tornar efetivo estes direitos fundamentais da criança e do adolescente, o que já havia sido confirmado no art. 19 do ECA:
“Toda a criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes”.
Dessa forma, é necessário se perceber que o interesse do criança deve se sobrepor a qualquer outro, assim, se os pais não podem ser bons exemplos deve o juiz deferir a guarda à pessoa que revele a compatibilidade com a natureza da medida. Ou seja, a Lei 6.515/77, em seu artigo 13, já previa que, havendo motivos graves o juiz já poderia dispor das guarda da criança ou adolescente da maneira que achasse mais conveniente, mas sempre levando em consideração o interesse da mesma.Isto demonstra que as crianças e o adolescentes não são mais objetos de direitos dos pais, mas, sim, sujeitos de direitos que merecem proteção integral do Estado. O art. 6° do ECA ratificou este entendimento. A tônica do Interesse da Criança e do Adolescente foi priorizada pelo ECA, na medida em que, serve de escopo aos juízes no momento de decidir a guarda analisar sempre o que melhor vier a ser para o interesse do infante, seja ele na companhia dos pais ou de terceiros.
3 UM BREVE HISTÓRICO
Relevante se fazer, para melhor entendimento, um pequeno histórico do tema em estudo. No início do século XIX, o pai detinha a guarda exclusiva e o pátrio poder dos filhos, e a mãe se submetia as suas determinações. A legislação da época considerava a mulher relativamente incapaz para exercer os atos da vida civil, ela não podia dividir responsabilidades relativas ao vínculo matrimonial. Com o passar do tempo, vem a industrialização, o pai passar a trabalhar, ficando muito tempo fora de casa. A mulher ganha o status de plenamente capaz, se tornando apta a guarda dos filhos, ela agora, é vista como opção para guardiã, devido sua capacidade inata de cuidar bem de sua prole, ou seja, ao pai cabe trazer “dinheiro pra casa” e a mulher cuidar do lar.
A mulher passa a exercer papel importante no mercado de trabalho, e a divisão mais igual das tarefas de educação de filhos, levaram a uma mudança na estrutura familiar. A mudança social ocorrida dá o alicerce para a construção de novas teorias sobre a guarda, buscando, sempre a manutenção do contato do filho com ambos os pais, mesmo depois do rompimento. Assim, hoje, já se percebe que, nem sempre, dar a guarda à mãe, atende ao melhor interesse da criança, e o direito brasileiro traz a guarda compartilhada como excelente opção para o melhor desenvolvimento dos filhos.
4 GUARDA COMPARTILHADA
Esse breve comentário acima, sobre guarda e interesse da criança e do adolescente, nos leva a um questionamento primordial: qual a melhor forma de preservar a prole quando ocorrer o divórcio?
Antes de qualquer coisa, é preciso trazer o conceito de guarda compartilhada, como bem assevera Deirdre Neiva nomeada por Lucas Hayne Dantas Barreto,
A guarda compartilhada almeja assegurar o interesse do menor, com o fim de protegê-lo, e permitir o seu desenvolvimento e a sua estabilidade emocional, tornando-o apto à formação equilibrada de sua personalidade. Busca-se diversificar as influências que atuam amiúde na criança, ampliando o seu espectro de desenvolvimento físico e moral, a qualidade de suas relações afetivas e a sua inserção no grupo social. Busca-se, com efeito, a completa e a eficiente formação sócio-psicológica, ambiental, afetiva, espiritual e educacional do menor cuja guarda se compartilha(BARRETO,p.1,2003)
O instituto da guarda compartilhada vem para suprir deficiências que outros modelos de guarda, principalmente o da guarda dividida - onde há o tradicional sistema de visitas - possuem. Além de outros como, guarda alternada, na qual durante um período estipulado, um dos responsáveis detém de forma exclusiva os "poderes" e deveres sobre o filho,sendo que os papéis se invertem a cada troca; guarda exclusiva: quando a guarda é concedida à mãe, o pai terá direito de visitar o filho e vice- versa. Normalmente, as visitas são combinadas, e fixadas, em fins de semana alternados; Aninhamento,é um tipo de guarda raro, no qual os pais se revezam, mudando-se para a casa onde vivem as crianças, em períodos alternados; tais modelos privilegiam a mãe, na maioria dos casos, levam a profundos prejuízos aos filhos, tanto de ordem emocional quanto social, no seu desenvolvimento, atingindo também o pai, cuja falta de contato mais íntimo leva fatalmente a um enfraquecimento dos laços parentais.
A lei nº 11.698 de 13 de Junho de 2008 veio para alterar os arts. 1.583 e 1.584 do
Código Civil, para instituir e disciplinar a guarda compartilhada, dando ao ordenamento jurídico do nosso país a base legal para aplicação desse instituto que tem por objetivo o bem estar dos filhos de país divorciados. Para que esse tipo de guarda efetivamente aconteça, é necessário que os pais acordem nesse sentido, alguns casais, ao se separarem, decidem de comum acordo que a guarda dos filhos não fique sob a responsabilidade nem de um, nem de outro, mas dos dois. Do contrário, o menor ficará sob responsabilidade de um dos pais, o caso mais comum hoje em dia.
Na guarda compartilhada ou conjunta, o casal divide as responsabilidades, decide junto todas as questões que envolvem os filhos, responde igualmente pela criança e participa da vida e do desenvolvimento dos filhos. A guarda material ou física do filho pode ficar a cargo de um dos pais, mas os direitos e deveres do poder familiar são sempre de ambos. Quem não tem a guarda física também participa da educação e formação dos filhos. Entre as grandes vantagens da guarda compartilhada está o fim da problemática com relação à regulamentação de visitas e do afastamento do pai ou da mãe que não detém a guarda, principalmente porque os horários de visitação e os períodos de férias são mais flexíveis. Evita também que o menor fique por um período em cada casa e que o poder parental dependa de estar ou com o pai ou com a mãe, como acontece na guarda alternada e na qual as constantes mudanças provocam instabilidade emocional e psíquica.
Alguns requisitos são indispensáveis e não podem deixar de ser considerados para que o estabelecimento da guarda compartilhada possa efetivamente trazer benefícios, principalmente para os filhos. Preliminarmente, deve-se considerar tudo o que diz respeito às condições e à capacidade dos genitores, principalmente no que se refere a quanto cada um pode fazer com relação à confiança no outro genitor, confiança essa que deve ser transmitida à criança, ao seu comportamento no que tange ao bem-estar da criança, à sua disposição em fazer concessões, à sua capacidade de falar com o ex-cônjuge, pelo menos no que diz respeito à criança e também com relação à capacidade de reconhecer e aceitar as diferenças entre os genitores. Ainda que presentes tais condições, antes do estabelecimento da guarda compartilhada deve-se, também, avaliar se tal escolha atende aos interesses dos filhos e não dos pais.
O tema em foco nos remete ao trecho do livro O cortiço de Aluísio de Azevedo, na qual, Jerônimo e Piedade, discutem sobre a guarda de sua filha abaixo transcrito,
Agora, que o marido já não estava ali para impedir que a filha pusesse os pés no cortiço, a pequena ia passar os domingos com ela. Os antigos moradores da estalagem principiavam a distinguir a menina com a mesma predileção com que amavam Pombinha. Jerônimo, para ver a filha, tinha que ir ao colégio nos dias de semana. Mas, um belo dia, apresentou-se tão ébrio, que a diretora lhe negou a entrada, e as suas visitas à filha tornaram-se muito raras. Senhorinha entregou à mãe uma conta de seis meses da pensão do colégio. Foi a procura do marido, Jerônimo recusou-se, por vexame; mandou dizer que não estava em casa. Jerônimo apareceu afinal, a mulher, ao vê-lo, perdeu logo toda a energia com que chegara e comoveu-se tanto, que as lágrimas lhe saltaram dos olhos. E os dois emudeceram um defronte do outro, arquejantes. Jerônimo, deixou que a sua mão fosse descendo da cabeça ao ombro e depois à cintura da esposa. Por algum tempo choraram ambos abraçados. “— Volta para casa; eu irei pagar o colégio de nossa filhinha e hei de olhar por ti.”— Entretanto, Jerônimo não mandou saldar a conta do colégio. Rita era desperdiçada e amiga de gastar à larga, a lembrança constante da filha e da mulher apoquentava-o com pontas de remorso, quando Piedade, quinze dias depois da sua primeira visita, tornou lá, um domingo, acompanhada pela filhas, encontrou-o bêbado, numa roda de amigos. Obrigou-as logo a tomar alguma coisa e foi chamar a mulata, as duas trocaram um aperto de mão, sem se fitarem. Piedade estava escarlate de vergonha.
— “Agora para a coisa ser completa, hão de jantar conosco”— disse o português. Piedade, instigada por ele, esvaziara freqüentes vezes o seu copo e, ao fim foi então que ela, já com azedume na voz, falou na dívida do colégio e nas ameaças da diretora. —E não vim cá por passeio! Vim cá
para saber da conta do colégio... — bradou ela. “—Pague-a você, que tem lá o dinheiro que lhe deixei! Eu é que não tenho nenhum!” — respondeu ele. “— A pequena já não precisa de colégio! Deixe-a cá comigo, que nada lhe faltará!”
“— Eu quero antes ficar com minha mãe!...” — balbuciou a menina.
“—Pois vão com todos os diabos!” — e Piedade, com o rosto escondido no ombro da filha, esperava que as lágrimas cedessem um pouco, para as duas seguirem seu destino de enxotadas.(AZEVEDO, p.179,2008)
Se fizermos uma equiparação com a atual legislação e se Jerônimo e Piedade conseguirem se entender, vislumbrando o melhor interesse da filha, vê-se que a melhor opção seria a guarda compartilhada, pois ambos estão em situação econômico-financeira fragilizada. Se optarem por uma das outras formas de guarda podem vir a prejudicar o bom desenvolvimento sócio-psicológico, ambiental, afetivo, espiritual e educacional de sua prole. O principal foco da guarda compartilhada é, justamente, os filhos, deixando em segundo plano os desentendimentos do casal, buscando, assim, o bem estar dos seus herdeiros.
5 CONSIDERAÇÕE FINAIS
O ordenamento jurídico do Brasil tem disponível um instituto que pode mudar o destino de muitas crianças, que vem para regulamentar o que a Constituição Federal, em seu art. 5º, I, prevê: a igualdade entre o homem e a mulher, bem como o faz seu art. 226, § 5º, ao estatuir que "os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher", com base nos princípio da dignidade humana e paternidade responsável, nos termos do § 7º do mesmo artigo. Deste modo, não mais se justifica a preferência dada às mães para a guarda exclusiva do filho.
Dessa forma, deve-se vislumbrar que houve um avanço com a edição da Lei nº 11.698 de 13 de Junho de 2008, mas, a sua aplicabilidade depende, diretamente, das boas relações entre os pais, após o divórcio. Esse é um modelo onde é possível manter uma relação equilibrada entre as possibilidades e desejos dos filhos e de seus pais, sem isentar um ou outro de responsabilidades.
Referências
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Amaral, Sylvia Mendonça do. Guarda de menores, o que é melhor para a criança?. Disponível em : <http://guiadobebe.uol.com.br/bb2a3/guarda_de_menores_o_que_e_melhor_para_a_crianca.htm >. Acesso em: 05. 10. 2010.
AZEVEDO, Aluísio. O cortiço. 36 ed. 11 reimpressão. São Paulo: Ática,2008.
Barreto, Lucas Hayne Dantas. Considerações sobre a guarda compartilhada. Disponível em : < http://www1.jus.com.br/DOUTRINA/texto.asp?id=4352>. Acesso em: 05.10.2010.
BECKER, Maria Josefina. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. Comentários jurídicos e sociais.8 ed.São Paulo: Malheiros, 2006.
DINIS, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
Fontoura, Wilson . Guarda compartilhada: mais liberdade para pais e filhos após a separação. Disponível em : < http://papodehomem.com.br/guarda-compartilhada-mais-liberdade-para-pais-e-filhos-apos-a-separacao/>. Acesso em: 03. 10. 2010.
MATINS, Karine. Guarda: Conceito. deferimento e revogabilidade. Disponível em : < http://www.webartigos.com/articles/19309/1/Guarda-Conceito-Deferimento-e-Revogabilidade/pagina1.html > Acesso em: 03. 10. 2010.
Bacharelando do curso de direito da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais- AGES.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTANA, Mayk Carvalho. Guarda compartilhada: uma boa forma de preservação do bem estar dos filhos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 set 2012, 07:52. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/30828/guarda-compartilhada-uma-boa-forma-de-preservacao-do-bem-estar-dos-filhos. Acesso em: 23 dez 2024.
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