RESUMO: O presente trabalho possui o intuito de analisar o instituto da desaposentação, sendo que, no ordenamento jurídico brasileiro foi proibido, nos termos do § 2º do art. 18 da Lei nº 8.213/91, em consonância com os princípios constitucionais da distributividade e seletividade, insculpidos no artigo 194 da Carta Magna. É instituto que visa a majoração do benefício de aposentadoria após voltar ao labor e verter novas contribuições pelo beneficiário ao Sistema Previdenciário. Para tanto, o artigo discorrerá sobre conceito do instituto, analisando suas questões controversas e disposições legislativas acerca do tema.
Palavras-chave: Desaposentação. Princípios constitucionais. Análise legislativa.
UNRETIREMENT
ABSTRACT: This work aims to analyze the institute's unretirement. The Brazilian legal system was prohibited under § 2 of art. 18 of Law No. 8.213/91, in line with the constitutional principles of distributive and selectivity, according Article 194 of the Constitution. Is institute that aims to increase the retirement benefit after returning to work and shed new contributions by the beneficiary to Social Security System. For this, the article will discuss the concept of the institute, analyzing their controversial issues and laws on the subject.
Keywords: Unretirement. Constitutional principles. Legislative analysis.
1 INTRODUÇÃO
O § 2º do artigo 18 da Lei de Benefícios da Previdência Social, Lei nº 8.213/91, proibiu a desaposentação, em atendimento aos princípios constitucionais da distributividade e da seletividade.
A desaposentação seria uma burla ao já instituído fator previdenciário e acarretaria em um caos jurídico caso fosse permitida, pois os beneficiários, anualmente, utilizariam desse benefício.
A partir daí, o presente artigo discorrerá da legislação constitucional e infraconstitucional aplicável à espécie e analisará a possiblidade de aplicação deste instituto.
2 Conceito e características
Existem 04 tipos de benefícios previdenciários de aposentadoria: aposentadoria por tempo de contribuição, aposentadoria por idade, aposentadoria especial e aposentadoria por invalidez.
Na aposentadoria por invalidez e na aposentadoria especial, o salário de benefício é a média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a 80% de todo o período contributivo.
Na aposentadoria por invalidez, o segurado não poderá voltar a desenvolver atividade laborativa, sob pena de cancelamento do benefício. Esta regra só se aplica ao benefício de aposentadoria especial se o segurado voltar a exercer atividade insalubre, penosa ou perigosa que gere a aposentadoria especial. Poderá voltar a desenvolver atividade laborativa, desde que em condições diferentes.
Nas duas hipóteses citadas não é utilizado o fator previdenciário para cálculo do benefício.
Na aposentadoria por idade e na aposentadoria por tempo de contribuição, o salário de benefício consistirá na média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a 80% de todo o período contributivo, multiplicado pelo fator previdenciário. No caso do benefício de aposentadoria por idade, o fator previdenciário só será aplicado em benefício do segurado. Em ambos os casos o beneficiário poderá voltar a desenvolver atividade laborativa.
Salienta-se, que em qualquer hipótese, no Regime Geral de Previdência Social, caso o beneficiário de alguma aposentadoria que, podendo, volte a trabalhar, tem também que voltar a verter contribuições previdenciárias.
A desaposentação é o ato de desfazimento da aposentadoria por vontade do titular, para fins de aproveitamento do tempo de filiação em contagem para nova aposentadoria, no mesmo ou em outro regime previdenciário.
Melhor dizendo, é uma prerrogativa do aposentado de unificar os seus tempos de contribuição em uma nova aposentadoria, com o intuito de aumentar o valor mensal de seu benefício.
3. Constitucionalidade da contribuição
A existência de contribuintes para o sistema e não para sim mesmos, possui base constitucional. O princípio da solidariedade é expresso na Constituição Federal:
“Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:
V - equidade na forma de participação no custeio;
VI - diversidade da base de financiamento;”
“Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:”
“Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.”
Salienta-se que existe uma peculiaridade nas contribuições vertidas pelo segurado aposentado pelo Regime Geral da Previdência Social – RGPS que volta a trabalhar depois da jubilação: a nova contribuição não incide sobre o valor da aposentadoria, mas sobre o valor do salário-de-contribuição correspondente ao valor da sua nova remuneração, de sorte que o valor integral da aposentadoria é preservado, ao contrário da contribuição dos aposentados no Regime Próprio da Previdência Social prevista no art. 40 da Constituição Federal.
3.1 Autorização constitucional para seleção das prestações oferecidas aos segurados
Dois dos princípios esculpidos no artigo 194 da Constituição Federal são o da seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços.
A lei discriminará as necessidades que o sistema atenderá. Assim, o legislador tem autorização constitucional para definir as pessoas que serão beneficiadas com os recursos do sistema, ou seja, nem todas as pessoas terão todas as suas necessidades atendidas: a distribuição deve ser feita aos mais necessitados, em detrimento dos menos necessitados.
A condição do aposentado que retorna à atividade é mais favorecida comparada a de outros segurados, porquanto já é titular de um benefício custeado pelo sistema previdenciário.
4 Legislação infraconstitucional aplicável à espécie
Como já explicitado, a Constituição não veda expressamente a desaposentação e garante a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana. Delega à legislação infraconstitucional a especificação das necessidades a serem atendidas pelo Sistema Previdenciário.
Desde a sua edição, em 1991, a Lei n. 8.213 veda a utilização das contribuições dos trabalhadores em gozo de aposentadoria para a obtenção de nova aposentadoria ou elevação da já auferida. Dizia a Lei, na sua redação original:
“Art. 18, § 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social que permanecer em atividade sujeita a este regime, ou a ela retornar, somente tem direito à reabilitação profissional, ao auxílio-acidente e aos pecúlios, não fazendo jus a outras prestações, salvo as decorrentes de sua condição de aposentado, observado o disposto no art. 122 desta Lei.”
As alterações introduzidas pela Lei n. 9.032/95 preservaram o parágrafo na sua essência:
“Art. 18, § 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ela retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família, à reabilitação profissional e ao auxílio-acidente, quando empregado.” (Parágrafo com redação dada pela Lei n. 9.032, de 28-4-1995, DOU 29-4-1995).
A redação atual, vigente desde a MP n. 1.596-14, de 10-11-1997, mantém a vedação:
“Art. 18, § 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social – RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado.”
O Regulamento da Previdência Social, Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto nº 3.265/99, estabelece que os benefícios concedidos pela Previdência Social são irreversíveis e irrenunciáveis.
Existem entendimentos contrários no sentido de que a renúncia é cabível, sob o argumento de que ninguém é obrigado a permanecer aposentado contra seu interesse. E, neste caso, a renúncia objetiva a obtenção futura de benefício mais vantajoso, pois o beneficiário abre mão dos proventos que vinha recebendo, mas não do tempo de contribuição que teve averbado.
4.1 Benefícios devidos ao segurado aposentado que volta à atividade
De acordo com a redação atual, acima disposta, do dispositivo focado, o segurado aposentado poderá habilitar-se apenas ao benefício de salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado.
Ressalta-se que, nos termos do artigo 103 do Regulamento da Previdência Social – RPS, Decreto nº 3.048/99, é assegurado à aposentada que retorna à atividade o pagamento de salário-maternidade, hipótese que, além de rara na prática, em princípio poderá ser tida como ilegal.
5 Segurados, contribuintes e beneficiários
As categorias de segurados, contribuintes e beneficiários são diferentes.
a. Nem todos os segurados são contribuintes, tendo como exemplo, o segurado desempregado durante o período de graça;
b. Nem todos os beneficiários são segurados, como, por exemplo, os dependentes;
c. Nem todos os segurados são potenciais beneficiários de qualquer benefício, como os que não reúnem os requisitos e os que já estão aposentados, estes últimos do objeto em tela.
A partir daí, demonstra-se que a obtenção de alguns benefícios não é consequência automática do recolhimento de contribuições.
6 Desaposentação no Regime Próprio de Previdência Social – RPPS
No âmbito da Administração Pública Federal o assunto é tratado como reversão, instituto este conceituado no artigo 25 do Estatuto do Servidor Público Federal, Lei nº 8.112/90, que é o retorno à atividade do servidor aposentado.
O servidor que retornar à atividade perceberá, em substituição aos proventos da aposentadoria, a remuneração do cargo que voltar a exercer e somente terá os proventos calculados com base nas regras atuais se permanecer pelo menos cinco anos no cargo.
A reversão nada mais é do que a desaposentação, pois possibilita ao servidor contar o tempo anterior para cálculo da nova aposentadoria a ser concedida futuramente. Porém, cumpre destacar que, como dito, o servidor não perceberá salário e aposentadoria, como ocorre no Regime Geral de Previdência Social.
7 Devolução dos valores recebidos a título de aposentadoria
A autarquia previdenciária defende que, caso haja a desaposentação, deve haver o ressarcimento dos valores recebidos anteriormente a título de aposentadoria.
O argumento é acerca da injustiça com os demais segurados que permaneceram sem aposentar para requerer um benefício a maior posteriormente.
Impende considerar o argumento é totalmente plausível, uma vez que, por ser a desaposentação uma burla ao fator previdenciário, se a desaposentação não estiver condicionada à devolução integral do que foi recebido, todos os anos todos os aposentados vão requerer a desaposentação, pois o simples fato de ficar um ano mais velho já repercutirá, a cada ano, no cálculo do fator previdenciário.
8 CONCLUSÃO
Sendo o regime de financiamento da Previdência Social, nos termos da Constituição Federal, inspirado pelos princípios da solidariedade e da obrigatoriedade, a contribuição não pressupõe, sempre, uma contraprestação.
Ao aposentar-se em um determinado momento, o segurado fez uma opção por uma renda menor do que poderia vir a receber se adiasse sua aposentadoria para o futuro, mas recebida por mais tempo.
REFERÊNCIAS
ALENCAR, Hermes Arrais. Benefícios Previdenciários. 4. ed. São Paulo: Leud, 2009.
AMADO, Frederico Augusto Di Trindade. Direito Previdenciário Sistematizado. 2 ed. Salvador: Juspodivm, 2011.
ASSAD, Luciana Maria; COELHO, Fábio Alexandre; COLEHO, Vinícius Alexandre. Manual de Direito Previdenciário: Benefícios. 1 ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006.
BALERA, Wagner. Sistema de Seguridade Social. 3 ed. São Paulo: Ed. dos Tribunais, 2003, p. 133-160.
BRASIL, Ministério da Previdência Social. Panorama da previdência social brasileira. 3 ed. Brasília: MPS, 2008.
BRASIL, Ministério da Previdência Social. Previdência social: reflexões e desafios. Brasília: MPS, 2009.
CASTRO, Carlos Alberto Pereira; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 12 ed. Florianópolis: Conceito, 2011.
CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 4. ed. Salvador: Juspodivm, 2011.
DIAS, Eduardo Rocha; MACÊDO, José Leandro Monteiro de. Curso de Direito Previdenciário. 2 ed. São Paulo: Método, 2010.
EDUARDO, Ítalo Romano; EDUARDO, Jeane Tavares Aragão. Direito Previdenciário: Benefícios. 4 ed. São Paulo: Elsevier-Campus, 2011.
GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Acidentes do Trabalho, Doenças Ocupacionais e Nexo Epidemiológico. 4. ed. São Paulo: Método, 2010.
GONÇALVES, Ionas Deda. Direito Previdenciário. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
GONÇALVES, Odonel Urbano. Manual de direito previdenciário: acidentes do trabalho. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2005.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 16 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Resumo de direito previdenciário. 10 ed. rev. ampl. e atual. Niterói: Impetus, 2011.
KERTZMAN, Ivan. Curso prático de direito previdenciário. 8 ed, rev., ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2011.
LOPES JÚNIOR, Nilson Martins. Direito Previdenciário: Custeio e Benefícios. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2011.
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Comentários à lei básica da previdência social. 7 ed. São Paulo: LTr, 2006.
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de direito previdenciário. 3 ed. São Paulo: LTr, 2010.
MARTINEZ, Wladimir Novaes. A prova no direito previdenciário. 2 ed. São Paulo: LTr, 2009.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24 ed. São Paulo: Atlas, 2007.
MONTEIRO, Antônio Lopes. Acidentes do Trabalho e Doenças Ocupacionais. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
OLIVEIRA, Antônio Flávio de. Servidor Público – A averbação do tempo de serviço/contribuição. 3. Ed. São Paulo: Forum, 2007.
RIBEIRO, Maria Helena Carreira Alvim. Aposentadoria Especial – Regime Geral da Previdência Social. 4. Ed. São Paulo: Jurua, 2010.
SANTOS, Marco Fridolin Sommer. Acidente do Trabalho entre a Seguridade Social e a Responsabilidade Civil. 2. ed. São Paulo: Ltr, 2008.
SANTOS, Marisa Ferreira dos; LENZA, Pedro. Direito Previdenciário Esquematizado. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
SILVA, José Afonso da. Direito Constitucional Positivo. 15 ed. São Paulo: Malheiros, 1998.
TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário. 12 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2010.
Procurador Federal na Procuradoria Secional Federal em Uberlândia/MG. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia/MG. Pós graduando em Direito Previdenciário pelo Instituto Renato Saraiva e em Direito Público pela Universidade Federal de Uberlândia/MG.<br><br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NOLASCO, Lincoln. Desaposentação Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 set 2012, 06:55. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/31617/desaposentacao. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
Por: Maurício Sousa da Silva
Por: Maurício Sousa da Silva
Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
Precisa estar logado para fazer comentários.